21/04/2015
SER
PÃO PARA OS OUTROS
SENHOR, DAÍ-NOS SEMPRE
O PÃO DA VIDA PARA QUE SEJAMOS VIDA PARA OS OUTROS
Terça-Feira da III Semana da Páscoa
Evangelho: Jo 6, 30-35
Naquele tempo, a multidão perguntou a Jesus: 30
“Que sinal realizas, para que possamos ver e crer em ti? Que obras fazes? 31Nossos
pais comeram o maná no deserto, como está na Escritura: ‘Pão do céu deu-lhes a
comer’”. 32Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade vos digo, não foi Moisés
quem vos deu o pão que veio do céu. É meu Pai que vos dá o verdadeiro pão do
céu. 33Pois o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao
mundo”. 34Então pediram: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. 35Jesus
lhes disse: “Eu sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê
em mim nunca mais terá sede”.
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Jesus acabou de realizar a multiplicação dos pães
para saciar a multidão (Jo 6,1-15). As pessoas
comeram um alimento
perecível ou
efêmero a fim
de sustentar a vida
no mundo . Mas
há outro alimento
que serve para
a vida eterna
(Jo 6,26-27). A multidão buscou um realizador
de “milagres ”, mas
a personalidade de Jesus é de outra ordem , e por isso , Jesus
se afastou da multidão que quis torná-lo rei .
Jesus não caiu na armadilha
do poder que mata a fraternidade e
a igualdade . As obras
que o povo
realizou até esse
momento não
são as que
vão merecê-lo a salvação. A única obra que conta é seguir
Jesus Cristo (Jo 6,28-29) e viver seus ensinamentos .
O “sinal ” da multiplicação dos pães
e dos peixes foi um
acontecimento de tal
profundidade que
se constitui para o evangelista
João num verdadeiro exemplo de uma leitura
simbólica. Jesus convida a multidão a ir além do sinal da multiplicação
dos pães e dos peixes
para descobrir seu verdadeiro
significado .
No Evangelho de hoje , as pessoas
simples pedem a Jesus “sinais ”: “Que
sinais tu
realizas para que
possamos ver e crer em ti?”. O “milagre ”
(= sinal) de partilha generosa dos pães não foi suficiente para levá-las à
verdadeira fé em
Jesus. Elas não
encontraram ainda o “milagre ” da partilha, que
faz todos saciados, e ninguém fica em
necessidade . Ao contrário ,
o egoísmo deixa
a maioria em
necessidade , pois
uns poucos agarram a maioria dos alimentos .
E quase como
provocando-lhe, elas disseram que Moisés havia feito
sinais : o maná
que proporcionou aos seus na travessia
do deserto (cf. Ex 16,1-36). Elas não saem
de seu horizonte
habitual : trabalhar …
comer … Mas , será
que a vida
consiste apenas em
trabalhar e comer ? Será que a verdadeira vida
consiste em ganhar
muito e muito
mais materialmente ?
Quanto por
cento conseguimos consumir de tudo que ganhamos? E o resto?
O povo permanece no nível superficial da fé: quer uma
solução fácil para seus problemas materiais; quer correr atrás de “milagres”. Por
mais espetacular que sejam os “milagres”, as pessoas continuam na sua
desconfiança sobre a identidade de Jesus como Filho de Deus apesar de estar
diante do “milagre” do Pai que é seu Filho Jesus, prova de sua benevolência
para a humanidade faminta de sentido. Jesus é o amor encarnado do Pai que
indica o caminho para chegar ao Pai: amor mútuo (cf. Jo 15,12). O amor nos abre
os olhos para enxergar o caminho para o céu e para perceber que os outros são
nossos irmãos. O amor nos torna bons e torna os outros bons. Quem acolhe Jesus
com seus ensinamentos que se resumem no amor fraterno (ágape), coloca-se no
caminho da fraternidade e da salvação. Qualquer outro sinal (milagre) seria
inútil, se este sinal fundamental, que é o amor, não fosse percebido. O amor
fraterno torna visível ou perceptível nosso discipulado: “Nisto reconhecerão todos que sois meus discípulos se tiverdes amor uns
pelos outros” (Jo 13,35).
Jesus busca despertar nas pessoas, a partir de suas
necessidades materiais, aspirações mais altas, de ordem religiosa e espiritual,
mas sempre com conseqüências ou aplicação na convivência humana diariamente. Jesus
sacia a multidão a partir do ato generoso de um menino que representa todos os
generosos para dizer que com a partilha há sempre alimento que sobra (cf. Jo
6,13). O egoísmo ou a ganância não deixa que os alimentos sejam partilhados com
os outros ou distribuídos para todos. Consequentemente, o egoísmo não deixa
nada para os outros, pois o egoísmo agarra e devora tudo. Uma das razões pelas
quais os animais se brigam é a comida. Mas os animais, na sua maioria,
abandonam a comida assim que ficarem satisfeitos. Parece-nos que os homens são
animais insaciáveis.
Literariamente o evangelista construiu a cena para dar lugar
à continuação ao discurso de Jesus sobre o Pão verdadeiro que é Ele próprio: “Eu
sou o pão da vida. Quem vem a mim não terá mais fome e quem crê em mim nunca
mais terá sede”. Todo o discurso seguinte vai ser como uma homilia em torno
do tema do pão: o pão que Jesus multiplicou no dia anterior, o maná que Deus
deu ao povo no deserto, e o Pão que Jesus quer anunciar. A frase crucial é uma
citação do Sl 77,24: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. “Não nos deixe, Senhor,
sem esse Pão, diariamente, pois nossa fome do sentido da vida não se satisfaz
somente com o pão material. Queremos nos alimentar com o Pão que nos dá calma,
paz, serenidade. E este Pão é o Senhor. Senhor, dá-nos sempre desse pão”.
Aqui se estabelece o paralelismo entre Moisés e Jesus, entre
o pão que não sacia e o pão que dá vida eterna, entre o pão com minúscula e o
Pão com maiúscula. A partir da experiência da multiplicação e da recordação
histórica do maná, Jesus conduz seus ouvintes para a inteligência mais profunda
do Pão que Deus lhes quer dar, que é ele mesmo, Jesus Cristo. Se no deserto o
maná foi a prova da proximidade de Deus para com seu povo, sinal de que Deus
não abandona seus fiéis, agora o mesmo Deus quer dar para a humanidade o Pão
verdadeiro que é Jesus em quem devemos acreditar e cujos ensinamentos devemos
viver ou praticar. Jesus é a encarnação do amor do Pai pela humanidade. Deus
quer fazer sua moradia no meio de nós em Jesus Cristo (Jo 1,14). O coração que
ama é a própria morada de Deus (cf. Jo 14,23).
“Senhor, dá-nos sempre desse pão”.
O homem de hoje está sedento, está faminto, mas o próprio
homem não sabe de quê? Ele quer
satisfazer seus desejos e deixa seus anseios profundos gritarem
permanentemente. Por isso, há uma busca sem trégua tratando de encontrar algo
que possa o saciar verdadeiramente. Ele o busca no prazer, no poder, na fama,
no dinheiro e assim por diante. Mas, infelizmente, quem vive somente em função
do prazer é porque não tem prazer de viver. Afinal, o resultado é sempre o
mesmo: vazio e solidão. Somente Jesus é o Pão que sacia. Somente a vida no amor
de Deus pode dar sentido à vida: “Eu sou o Pão da vida. Quem vem a mim, não
terá mais fome e quem crê em mim nunca mais terá sede” (Jo 6,35). Somente o
pão partilhado é que dá alegria e realização para qualquer pessoa. O Pão da
Vida não somente satisfaz a fomente física do homem, e sim satisfaz sua vida ou
sua existência. A única satisfação para a existência humana está em Cristo. Somente
seu amor enche nossos vazios e nossas solidões. A vida em Cristo se transforma
em plenitude. Por isso, quem tem Cristo tem tudo, quem não O tem, não tem nada.
Vive com Cristo e vive por causa de Cristo e seus ensinamentos é viver para
sempre, pois Ele é a Vida e a Ressurreição (cf. Jo 11,25-26).
Enquanto não crermos plenamente em Jesus Cristo, nosso ser
andará buscando saciar sua sede e sua fome em qualquer lugar. Por isso, nosso
coração continua inquieto enquanto não descansar em Deus e enquanto não se
nutrir do Pão da Vida que é seu Filho Jesus Cristo através de uma plena e
verdadeira comunhão com Ele. Uma vez que crermos em Jesus de todo coração, uma
vez que nascermos do Espírito Santo, “nascer do alto” então nos daremos conta
de que não teremos sede jamais. Simplesmente viveremos na Presença do grande “Eu-Sou”.
Quem se alimenta é porque quer continuar vivendo. Mas o
alimento temporal somente prolonga nossa vida por um pouco tempo neste mundo. O
Senhor Jesus nos dá vida eterna. Quem O aceitar, terá essa vida. Mas ter a vida
não significa somente usufruí-la de um modo egoísta ou passá-la bem. A vida é
como um fruto que os demais devem usufruir, pois, junto com eles, estaremos
trabalhando para que todos vivam com maior dignidade. Nós nos alimentamos de
Cristo para poder alimentar o mundo, convertidos em pão de vida e deixando de
ser, para o mundo, um pão venenoso, podre e deteriorado. Cada cristão deve
existir para o bem de todos, pois Jesus, a quem ele segue, veio para que todos
tivessem vida em abundância (cf. Jo 10,10).
Comungar o Pão Eucarístico, o próprio Corpo do Senhor
significa ser pão para os demais. O cristão é chamado a ser pão, a ser
alimento, a ser vida para os outros a exemplo de Cristo Jesus. Ser pão
significa que já não posso mais viver para mim e sim para os demais. Significa
que tenho que estar inteiramente disponível a tempo completo. Significa que eu
devo cultivar a ternura e a bondade porque assim é o pão, terno e bom.
Significa que devo estar sempre disposto ao sacrifício como o pão que se deixa
triturar. Significa que devo viver sempre no amor capaz de morrer para dar vida
aos demais, como o pão. Nisto se encontra o sentido da vida e a satisfação
plena de nossa existência. Para isso,precisamos pedir ao Senhor, o Pão da Vida,
por excelência: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. Ao que Jesus nos responde: “Eu
sou o Pão da vida. Quem vem a mim, não terá mais fome e quem crê em mim nunca
mais terá sede”.
P. Vitus Gustama,svd
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