quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Domingo, 27/09/2015

SER PARCEIRO DO BEM

XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO “B”


I Primeira Leitura: Nm 11,25-29

Naqueles dias, 25o Senhor desceu na nuvem e falou a Moisés. Retirou um pouco do espírito que Moisés possuía e deu aos setenta anciãos. Assim que repousou sobre eles o espírito, puseram-se a profetizar, mas não continuaram. 26Dois homens, porém, tinham ficado no acampamento. Um chamava-se Eldad e o outro Medad. O espírito repousou igualmente sobre os dois, que estavam na lista mas não tinham ido à Tenda, e eles profetizavam no acampamento. 27Um jovem correu a avisar Moisés que Eldad e Medad estavam profetizando no acampamento. 28Josué, filho de Num, ajudante de Moisés desde a juventude, disse: “Moisés, meu Senhor, manda que eles se calem!” 29Moisés respondeu: “Tens ciúmes de mim? Quem dera que todo o povo do Senhor fosse profeta e que o Senhor lhe concedesse o seu espírito!”


II Segunda Leitura: Tg 5,1-6

1E agora, ricos, chorai e gemei, por causa das desgraças que estão para cair sobre vós. 2Vossa riqueza está apodrecendo, e vossas roupas estão carcomidas pelas traças. 3Vosso ouro e vossa prata estão enferrujados, e a ferrugem deles vai servir de testemunho contra vós e devorar vossas carnes, como fogo! Amontoastes tesouros nos últimos dias. 4Vede: o salário dos trabalhadores que ceifaram os vossos campos, que vós deixastes de pagar, está gritando, e o clamor dos trabalhadores chegou aos ouvidos do Senhor todo-poderoso. 5Vós vivestes luxuosamente na terra, entregues à boa vida, cevando os vossos corações para o dia da matança. 6Condenastes o justo e o assassinastes; ele não resiste a vós.


Evangelho: Mc 9,38-43.47-48

Naquele tempo, 38João disse a Jesus: “Mestre, vimos um homem expulsar demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue”. 39Jesus disse: “Não o proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim. 40Quem não é contra nós é a nosso favor. 41Em verdade eu vos digo: quem vos der a beber um copo de água, porque sois de Cristo, não ficará sem receber a sua recompensa. 42E, se alguém escandalizar um destes pequeninos que creem, melhor seria que fosse jogado no mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço. 43Se tua mão te leva a pecar, corta-a! É melhor entrar na Vida sem uma das mãos, do que, tendo as duas, ir para o inferno, para o fogo que nunca se apaga. 45Se teu pé te leva a pecar, corta-o! É melhor entrar na Vida sem um dos pés, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno. 47Se teu olho te leva a pecar, arranca-o! É melhor entrar no Reino de Deus com um olho só, do que, tendo os dois, ser jogado no inferno, 48‘onde o verme deles não morre, e o fogo não se apaga’”.
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I.            Ser Parceiro Do Bem E Contra Intolerância (vv. 38-41)        


A prática de exorcismo era comum no período helenístico entre judeus(Mt 12,7) e pagãos. O admirável poder de exorcismo dos cristãos foi um argumento usado pelos autores patrísticos contra o paganismo. E esse poder se tornou tão importante na igreja, que ao final do século III d.C. havia em Roma um ofício especial de exorcista, que se manteve na igreja romana como uma “ordem menor” até o final do século XX. A Igreja apostólica (comunidade dos apóstolos) encontrou-se diante do problema de sua atitude perante exorcista não-cristão que invocou o nome de Jesus (At 19,13-16). Na época os exorcismos, como também outros tipos de cura, foram feitos através de invocar nome de várias pessoas poderosas ou deuses. Desde que Jesus tem tido grande sucesso no mesmo, sem apelar nome de ninguém, outros curandeiros usam o nome de Jesus no seu próprio ato de curar pessoas sem conhecer muito bem Jesus nem pretendem se comprometer como seguidores dele (se quiser aprofundar o tema de exorcismo, leia John P. Meier, Um Judeu Marginal,  vol. II Livro II, e Vol. II Livro III, Ed. Imago, e Oscar G. Quevedo, SJ, Antes que os demônios voltem, Ed. Loyola).
  

Este episódio é o único atribuído pelos evangelhos sinóticos a João e este é a única ocasião em que João aparece sozinho, embora fale também em nome do grupo pelo uso da primeira pessoa no plural. Na tradição de Lucas, ele e seu irmão Tiago manifestam o espírito de intolerância, querendo que fogo do céu desça sobre Samaria que não acolheu Jesus e seus discípulos (Lc 9,54-55).


O que tem por trás do protesto de João de ter encontrado a um exorcista que sem pertencer ao grupo dos discípulos, atuava com êxito “em nome do Mestre” (v.38), são as preocupações precedentes de grandeza e de prestígio e de arrogância dos discípulos. João equipara o exorcismo ao acréscimo de status e de poder, e deseja manter o monopólio sobre ele, o que é especialmente ridículo à luz da falta de poder de exorcismo dos discípulos (9,14-29). Com isso, ele contraria diretamente ao conselho de “receber” em 9,37, exortação à inclusão, não à exclusividade. O pior de tudo é que a censura de João se baseia no fato de o estranho “não nos estar seguindo”. Os discípulos querem ser seguidos, em vez de quererem ser seguidores do bem. A reação de João e dos outros é uma reação de dominadores, uma afirmação de poder e de monopólio. Nota-se a tendência de tornarem-se  um grupo fechado, e de sentirem-se os donos deste Cristo que os chamou primeiro.


A atitude de João em excluir aquele que faz o bem em nome de Jesus mesmo não sendo do grupo dos apóstolos, demonstra sua forte inveja.  O invejoso tem uma grande dificuldade para aceitar e celebrar o sucesso dos outros, pois ele sempre se acha perdedor toda vez que alguém tiver sucesso maior. Invejar é querer o que o outro tem, é sentir dor e raiva quando alguém alcançar o que você ainda não conseguiu. A inveja é algo tão destrutivo que uma pessoa pode sofrer muito por causa dela e ninguém percebe o que acontece dentro dela. O invejoso prefere sofrer para que o outro sofra mais, em vez de aprender a viver bem e deixar o outro viver bem. Todo invejoso tem uma língua bem afiada, tem sorrisos sarcásticos, gosta de humilhar e aniquilar o outro com as palavras. Ele vive fofocando e se metendo na vida de todo mundo. Quanto mais uma pessoa quer falar dos outros (falar mal), mais quer falar de si mesmo. Trata-se de uma pessoa insegura. Eu preciso ter confiança em mim e reconhecer minhas aptidões para sair de qualquer situação. Tenho que descobrir e explorar minha singularidade, pois eu nasci com meu próprios talentos ou minha aptidões .
   

Novamente Jesus ensina algo que vai contra a lógica dos discípulos. Jesus pede aos discípulos que sejam servos. O fato de expulsar demônios “em nome de Jesus” mostra que o exorcista reconheceu o poder de Jesus (cristão anônimo ou melhor dizer, cristão na prática); ele, então, não é contra Jesus e seus discípulos apesar de ele não pertencer ao grupo dos discípulos. Neste contexto, esta é a questão de exorcismo bem sucedido: o homem estava “expulsando demônios” (v.38), e Jesus fala de “milagres” feitos através de invocação de seu nome: “Não proibais, pois ninguém faz milagres em meu nome para depois falar mal de mim” (v.39). Aqui em vez de “expulsar demônio” Jesus fala de milagres (dynameis, grego: feitos poderosos). Ao contrário desse homem, os filhos de Sceva invocou  o nome de Jesus sem sucesso. Por que? (leia At 19,11-20).
  

Jesus, então, opõe-se ao exclusivismo. Para Ele o bem não tem fronteiras, nem religiosas, nem sagradas, nem denominacionais, nem ideológicas, nem partido. O espírito do Reino é de solidariedade com todos que trabalham para a verdadeira libertação daqueles que estão em qualquer tipo de prisão. O Reino de Deus vai além das demarcações visíveis das nossas comunidades. Ele é grande. Sua presença enche o mundo. Ninguém se escandalize da presença ativa do Espírito de Deus e do Senhor Jesus fora da Igreja. O homem não tem o direito de encurtar a mão de Deus e de se projetar como instrumento exclusivo dela. Temos que ser parceiros do bem e estar com aqueles que praticam o bem pela humanidade.
     

Com esse episódio, Marcos quer sublinhar, em primeiro lugar, um dos temas do seu evangelho: o universalismo. O caminho do seguimento está aberto para todo mundo; ninguém fica excluído dele, contudo que cumpra as normas da caminhada. E há muitos caminhos pelos quais Deus conduz os seus até o céu. O mundo é redondo, mas os dois podem  encontrar-se no mesmo lugar, embora eles comecem a caminhar numa direção opostos. É muito perigoso para todos quando uma pessoa ou uma Igreja pensa que ela tem monopólio de salvação. Ninguém pode alcançar toda a verdade. O universalismo da comunidade admite nele os casados (10,1-12), as crianças (10,13-16) e os ricos(10,17-31); todos podem entrar e participar do Reino, da salvação. O cristão não se define por estar contra alguém, não se caracteriza por repelir o outro, e sim por agir em nome de Jesus. Pode-se inclusive, seguir a Jesus sem pertencer ao grupo dos Doze, sem seguir a seus discípulos(9,38-41), porque “não há ninguém que faça prodígios em meu nome e logo depois possa falar mal de mim”(9,39). A realidade que chega até o pequeno detalhe do caso da água: o menor bem que façam aos discípulos, aos cristãos, como dar-lhes um copo de água porque são de Cristo, redunda em favor de quem o dá. O cristão está a favor de todos os homens, tem de continuar o trabalho que Jesus começou; não podem condenar, separar, ninguém que não esteja contra eles, que andam atrás de Jesus(cf. Jo 3,17).
     

Com este episódio Jesus abre os nossos olhos à realidade do Reino de Deus se manifestando na atuação de tantos homens e mulheres que não participam formalmente na Igreja, mas que testemunham por suas vidas que o Espírito de Cristo atua nos seus corações. Qualquer que seja a sua profissão religiosa, e talvez sem o saberem, estão orientados conosco à obediência daquele que Jesus ensinou a chamar de Abba, Papaizinho.
  

Em segundo lugar, Jesus nos ensina a usar um critério para conhecer pessoas: olhar para suas obras (cf. Mt 7,16-20). É assim também que Deus vai reconhecer os seus no fim do mundo. Não será pelo seu dizer: se são ou não cristãos (cf. Mt 25,31-46). Será pelo seu fazer. Quem é cristão ? Não é o que se diz cristão. É aquele que faz o que Jesus fez. Por isso, Santo Agostinho dizia: “Muitas pessoas que parecem estar dentro da Igreja, na verdade, estão fora dela. E muitas pessoas que parecem estar fora da Igreja, na verdade, estão dentro da Igreja por causa do amor fraterno”. Jesus procura mostrar que, assim como o bem pode vir “de fora”, a traição pode vir “de dentro”. Por isso, S. Justino diz: “Aqueles que viveram segundo o Verbo são cristãos, mesmo se passaram como ateus. Assim, por exemplo, entre os gregos, Sócrates, Heráclito e seus semelhantes”. Quem pratica o bem, o faz sob o impulso da graça, e deve ser acolhido com alegria.  A Igreja pertence a Jesus, mas Jesus não é propriedade da Igreja.
   

Em terceiro lugar, Jesus quer nos alertar que aquele que quer ser servido coloca-se na posição de poder julgar e condenar os outros, de rejeitá-los e de criar divisões na comunidade/no grupo. Somente o fariseu, e não o discípulo de Jesus, é intransigente, acusador, intolerante. Essa atitude é o resultado da incapacidade de compreender o verdadeiro sentido da cruz. Os cristãos, enquanto grupo, sempre têm a tentação de dominar, ao passo que a lei que Cristo dá à existência de seu grupo é a de servir. Esse texto é sempre atual.
   

Em quarto lugar, cada pessoa tem direito ao seu próprio pensamento (direito de pensar). Ela tem direito de pensar e de pensar diferente até chegar às suas próprias conclusões e à sua própria crença (fé). Esse direito temos que respeitar. Muitas vezes logo condenamos aquilo que não entendemos ou não compreendemos. Não podemos desprezar nem nos opor àquilo que não entendemos ou não compreendemos. Quando falamos abusadamente das coisas, porque não entendemos bem as coisas.


II. Não Pratiquemos Escândalo (vv.42-48)
    

A palavra “escândalo” (em grego “skándalon”: pedra de tropeça), na linguagem bíblica, tem dois significados fundamentais: o de “tropeço” e o de “obstáculo”. Na primeira acepção, indica alguma coisa que é causa de queda, que leva para fora do caminho(na teologia moral chama-se “Escândalo ativo direto”); na linguagem de Jesus, que conduz ao pecado e à Geena (a Geena é o vale do Hinon, em hebraico Gê-Hinon, de onde Gê-ena, onde, no tempo do rei Acaz, eram sacrificadas as crianças ao Deus Moloc, fazendo-as passar através do fogo (cf. 2Rs 16,3). O rei Josias, para “desconsagrar” aquele lugar infame, mandou jogar nele o lixo de Jerusalém, e o fogo ardia permanentemente para consumi-lo (2Rs 23,10). Segundo os profetas, naquele vale os inimigos do povo de Deus serão destruídos e devorados pelo fogo (Is 30,27-33;66,24 cf. Jr 7,30-8,3;19,3-13). À época do Novo Testamento nos textos judaicos a Geena se torna sinônimo de lugar de punição para os maus). No segundo sentido, indica algo que barra e impede o acesso, mais um muro que uma pedra; na linguagem de Jesus, aquilo que se opõe à fé e à entrada no Reino de Deus.
   

Nestes versículos (42-48) Jesus quer afirmar a possibilidade de alguém usar sua liberdade para dar um rumo à sua vida que o exclui definitivamente do Reino de Deus. Apesar do Reino ser dom gratuito, ele poderá exigir enorme sacrifício da nossa parte, para que entremos na Vida.
      

Por isso, estes versículos servem como o convite à conversão pessoal e interior que o Reino exige. Todos que seguem Jesus têm que “renunciar a si”(8,34), isto é, esforçar-se para alcançar a libertação daquilo “de dentro” que é raiz de pecado(cf.7,21-23). Esta exigência é repetida em linguagem figurativa: o aviso de “cortar e atirar fora” o membro do corpo que é causa de pecado é uma lembrança de que o Reino de Deus vale qualquer sacrifício. Em segundo lugar, o mundo espera de nós, cristãos, uma ação decisiva, visível, na luta contra o mal que fere nossos irmãos, especialmente os mais fracos e desamparados. Nessa luta são benvindos parceiros bem intencionados que promovam os valores do Reino, junto conosco ou por sua própria conta.

P. Vitus Gustama,svd

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