Domingo,13/01/2019
O
BATISMO DO SENHOR É A FESTA DA MANIFESTAÇÃO DE SUA DIVINDADE
ANO
C
I Leitura: Is 42,1-4.6-7
Assim fala o Senhor: 1 ”Eis
o meu servo – eu o recebo; eis o meu eleito – nele se compraz minha alma; pus
meu espírito sobre ele, ele promoverá o julgamento das nações. 2 Ele não clama
nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas. 3 Não quebra uma cana rachada
nem apaga um pavio que ainda fumega; mas promoverá o julgamento para obter a
verdade. 4 Não esmorecerá nem se deixará abater, enquanto não estabelecer a
justiça na terra; os países distantes esperam seus ensinamentos. 6 Eu, o
Senhor, te chamei para a justiça e te tomei pela mão; eu te formei e te
constituí como o centro de aliança do povo, luz das nações, 7 para abrires os
olhos dos cegos, tirares os cativos da prisão, livrares do cárcere os que vivem
nas trevas”.
II Leitura: At 10,34-38
Naqueles dias, 34 Pedro
tomou a palavra e disse: “De fato, estou compreendendo que Deus não faz
distinção entre as pessoas. 35 Pelo contrário, ele aceita quem o teme e pratica
a justiça, qualquer que seja a nação a que pertença. 36 Deus enviou sua palavra
aos israelitas e lhes anunciou a Boa-nova da paz, por meio de Jesus Cristo, que
é o Senhor de todos. 37 Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar
pela Galileia, depois do batismo pregado por João: 38 como Jesus de Nazaré foi
ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder. Ele andou por toda a parte,
fazendo o bem e curando a todos os que estavam dominados pelo demônio; porque
Deus estava com ele”.
Lc 3,15-16.21-22
Naquele tempo, 15 o povo
estava na expectativa e todos se perguntavam no seu íntimo se João não seria o
Messias. 16 Por isso, João declarou a todos: “Eu vos batizo com água, mas virá
aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno de desamarrar a correia de
suas sandálias. Ele vos batizará no Espírito Santo e no
fogo”. 21 Quando todo o povo estava sendo batizado, Jesus também recebeu o
batismo. E, enquanto rezava, o céu se abriu 22e o Espírito Santo desceu sobre
Jesus em forma visível, como pomba. E do céu veio uma voz: “Tu és o meu Filho
amado, em ti ponho o meu bem-querer”.
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Natal-Epifania-Batismo:
Manifestação
A festa do Batismo do Senhor é uma festa que
comporta uma certa complexidade tanto em seu sentido como em sua compreensão,
mas, ao mesmo tempo, uma grande riqueza de conteúdo.
Por um lado, este domingo é um domingo de
transição: o Batismo do Senhor encerra o ciclo de Natal e inaugura, ao mesmo
tempo, a primeira semana do tempo comum. Com a cena do batismo culmina a
manifestação de Jesus como Filho de Deus que temos celebrado ao longo de todo o
Natal, mas, ao mesmo tempo, nos é apresentado um Jesus já adulto, disposto a
iniciar seu ministério público.
Por outro lado, o batismo de Jesus tem um
conteúdo e um sentido próprio que o diferencia do sentido e significado do
batismo cristão.
Este Domingo está plenamente na órbita das
celebrações de Natal-Epifania. O que se sublinha, consequentemente, é ainda a
manifestação de Jesus Cristo. E esta manifestação adulta de Jesus Cristo pode
compensar a apresentação predominantemente centrada na infância de Jesus.
Os três ciclos dominicais (Ano A, B, e C)
repetem hoje as duas primeiras leituras e variam o evangelho. As duas primeiras
leituras indicam que não se trata fundamentalmente de celebrar o Batismo de
Jesus (e menos o nosso batismo) e sim da manifestação de Deus que autentica a
pessoa e a missão de Jesus Cristo. Tudo o que o povo de Deus esperava (Primeira
Leitura) e tudo o que Jesus fez e a Igreja crê e anuncia (Segundo Leitura) está
incluído na proclamação do Jordão: Jesus é o homem cheio do Espirito de Deus
que poderá manifestar e comunicar o Pai, o Deus de amor já que ele é o Filho, o
Amado, o Predileto.
A cena do Batismo nos é apresentada por Lucas
com evidente intenção de paralelismo com o que ele mesmo descreverá como
acontecimento inicial da Igreja (Pentecostes). Dai que Lucas atribui a João
Batista a profecia de que “Ele vos
batizará no Espírito Santo e no fogo”. Trata-se, portanto, de sublinhar o
início da missão profética de Jesus Cristo, que depois continuará na Igreja de
seus discípulos.
Por isso, o perigo fácil para a pregação de
hoje seria o de abandonar o tema e o fato do Batismo de Jesus Cristo para
dedicar-se a falar catequeticamente de nosso batismo. Perigo porque se omitirá
uma importante complementação do ciclo Natal-Epifania que é, por sua vez,
introdução para os domingos durante o ano litúrgico que vamos começar em que Jesus,
o homem cheio do Espírito nos revela o amor do Pai. E perigo também porque
poderia identificar-se excessivamente o batismo de João com o batismo da
Igreja. O batismo da Igreja é mais assimilável ao fato de Pentecostes e não ao
fato do Jordão.
Contudo, isso não significa que não haja uma
possibilidade de relacionar um e outro. A narração do batismo de Jesus permite interpretar
este fato como uma tomada de consciência do homem Jesus da missão que o Pai lhe
encomenda. Tomada de consciência na qual indubitavelmente influi a pregação de
João Batista e a espera dos “pobres de Israel”. E que se manifestará
progressivamente: Transfiguração, Paixão com a afirmação diante do Sinédrio.
Também nosso batismo-confirmação tem um aspecto
de tomada de consciência do amor gratuito de Deus, da doação do Espirito que
nos impulsiona a realizarmos uma missão também messiânica de viver e comunicar
o amor de Deus, continuando o caminho de Jesus.
Portanto, o esquema possível para a reflexão,
primeiro, deveria começar-se sublinhando a vinculação desta festa com o que
temos celebrado nos dias de Natal-Epifania. Aquele menino (Jesus) é um homem
que vem revelar e realizar a vontade de Deus que nos ama. Por isso, é o ungido
com o Espirito de Deus. Durante todos os domingos do Tempo Comum escutaremos
sua Palavra para seguir seu caminho.
Em segundo lugar, também recebemos o Espirito
de Deus para manifestar e realizar o amor de Deus. É o que significou nosso
batismo-confirmação.
Em terceiro lugar, a Primeira e a Segunda
Leitura oferecem amplas possibilidades de concretizar sobre o significado de
continuar o caminho de Jesus Cristo. Fala-se de trazer o direito às nações, de
libertação dos oprimidos como lemos na Primeiro Leitura, sem quebrar “uma cana rachada nem
apaga um pavio que ainda fumega”. E são Pedro nos define a tarefa de Jesus
Cristo como um passar “fazendo o bem”, como lemos na Segunda Leitura, e
libertando “os oprimidos” de qualquer mal. Note-se também como (e é uma nova
conexão com a festa da Epifania) ambas leituras acentuam o caráter universal,
aberto a todos, da manifestação de Deus em Jesus Cristo (e, portanto, na Igreja).
O batismo de Jesus é uma cena epifânica, que
certifica uma vez mais a divindade de Jesus. Neste sentido o batismo culmina o
ciclo natalino: se o Natal é a manifestação de Cristo no âmbito humilde de
Belém, e a Epifania é a manifestação universal, a todos os povos, o Batismo é a
manifestação absoluta, em plenitude, da divindade de Cristo. De fato, poderíamos
afirmar que, propriamente, o Batismo é um eco ou continuação da festa da
Epifania, já que completa seu sentido com outra cena de tipo epifânico ou teofánico.
Mensagem
Do Evangelho Deste Domingo
O texto do evangelho deste domingo pertence ao
grande complexo lucano que trata da missão de João Batista e dos começos da
vida pública de Jesus (cf. Lc 3,1-4,30). Como no relato da infância, também
aqui Lucas se preocupa em apresentar a atividade de João Batista em paralelismo
com o começo da atividade de Jesus. Uma vez que João Batista desaparecerá da
cena, se iniciará o ministério de Jesus (Lc 3,21-4,13). Esta separação tão
profunda expressa claramente a concepção da história salvífica de Lucas. Para
ele João Batista é a última testemunha da antiga aliança (Lc16,16), enquanto
que Jesus é o centro do tempo ou da história que inaugura o tempo novo, o hoje
da salvação, que depois prolonga-se no tempo da Igreja. Em Jesus se realiza a
promessa (Lc 4,21).
Ser Testemunha de Jesus Na Humildade Como João Batista
“Eu vos
batizo com água, mas virá aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno
de desamarrar a correia de suas sandálias. Ele vos batizará no Espírito Santo e
no fogo”.
Com esta declaração, João mostra claramente a
sua inferioridade diante daquele que há de vir. João Batista reconhece a
grandeza de Jesus. Certamente este reconhecimento faz com que João Batista se
torne um grande profeta ou um grande Precursor. Mais tarde, através do
evangelho de João, ele dirá sobre Jesus: “Que ele cresça e eu diminua” (cf. Jo
3,30).
Isto quer dizer que quando reconhecermos a grandeza
de Deus e a nossa pequenez ou indignidade diante da santidade de Deus, seremos
grandes. Esta passagem nos pede que voltemos ocupar o nosso lugar como
criaturas para deixar Deus como o Criador. A nossa grandeza depende de nosso
reconhecimento sobre a grandeza de Deus. Este reconhecimento faz com que
sejamos capazes de ficar maravilhados com o Salmista: “Quando olho para o céu, obra de tuas mãos, veja a lua e as estrelas que
criaste quem é o homem para dele te lembrares, quem é o ser humano para o visitares?
Como é glorioso teu nome em toda a terra!” (cf. Sl 8). O ser humano é
apenas um pontinho num cosmos de luz, mas é mais importante de todas as
criaturas. Quando reconhecermos a grandeza de Deus, seremos capazes de louvar a
Deus em todos os momentos de nossa vida. A tristeza não haverá lugar dentro de
nosso coração.
A exemplo de João Batista, somos chamados,
através do batismo, a ser precursores de Jesus Cristo. O nosso aparecimento não
deve nem pode diminuir a grandeza de Jesus. A nossa missão é levar as pessoas
para Jesus e não para nós. Isto exige muito esvaziamento. Será um grande erro
se deixarmos que fiquemos na frente de Jesus, embora dure apenas por alguns
minutos (cf. Mt 16,23). A nossa tarefa é apontar para Jesus para que as pessoas
possam vê-Lo sempre e não para elas nos verem. Para isso, precisamos nos
converter diariamente e voltar para o nosso próprio lugar, pois somos apenas
seguidores de Jesus, o nosso Mestre. Quando ocuparmos o nosso lugar, a paz vai
reinar a nossa vida. Como dizia Santo Agostinho: “A paz é a tranquilidade da
ordem”.
Quem pretende ser portador do mesmo Espírito de
Jesus deve ser humilde como João Batista. Por seu ensinamento, João Batista se
esforça por fazer o povo admitir quão humildes e pobres realmente são todos e
quão desesperadamente necessitam da salvação. Desta maneira ele dirige o olhar
de todos para o Salvador, Messias, que será “mais forte que eu”. João Batista
conduz o povo a Jesus. Ele é fiel, santo, não retém as pessoas para si,
permanece na condição de instrumento para não ser obstáculo ao encontro com
Jesus. Seria bom pensarmos hoje se, até na Igreja, não ficamos pelo meio do
caminho, presos a devoções, grupos, movimentos, costumes que acabam se tornando
objetivos em si mesmos, em vez de encaminharem a Jesus e ao conjunto do povo de
Deus. Todos nós somos de alguma forma precursores de Jesus daqueles que conhecem
mal a sua mensagem ou a desconhecem.
Batismo De Jesus E Seu Significado
1. Por que Jesus foi batizado?
Antes de iniciar sua atividade, Jesus, repleto
do Espírito Santo e sob a guia do mesmo Espírito, escolhe seu próprio caminho
como Messias de Israel, abandonando os modelos de prestígio e poder para
assumir o de serviço e a fidelidade ao Pai. Por isso, no deserto, lugar
clássico da verificação e da prova do povo de Deus, Jesus rejeita decididamente
o caminho do prestígio fácil, do poder, do privilégio, e escolhe o caminho da
fidelidade (Lc 4,1-13). É um caminho que se concluirá na suprema provação de
Jerusalém: a morte de cruz.
Pergunta-se frequentemente sobre a
historicidade do batismo de Jesus. Por qual motivo Jesus foi batizado se o batismo
de João é o de arrependimento para remissão dos pecados (cf. Mc 1,4; Mt 3,6; Lc
3,3)? Exatamente o significado “penitencial” do batismo de João, explicitamente
notado pelos sinóticos, é que causa problema no caso de Jesus.
Na verdade, nota-se claramente que, ao
apresentar o batismo de Jesus, os sinóticos apenas acenam ao rito batismal para
dar o máximo espaço à visão do Espírito que desce sobre Jesus e à voz do céu
que O apresenta como Filho de Deus, amado e fiel. Por isso, o evangelista Mateus
apresenta a objeção explícita de João Batista diante de Jesus que pede o
batismo: ”Sou eu que devo ser batizado por
ti e tu vens a mim?” (Mt 3,14). Em Lc João Batista coloca a superioridade
de Jesus com esta expressão: “Eu vos
batizo com água, mas virá aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno
de desamarrar a correia de suas sandálias. Ele vos batizará no Espírito Santo e
no fogo” (Lc 3,16). A tradição sinótica deixa o fato do batismo de Jesus em
plano secundário para dar o máximo realce à descida do Espírito Santo sobre
Jesus em conexão com o seu batismo no Jordão. A novidade evangélica está na
acentuação do papel do Espírito que desce do céu e na solene investidura de
Jesus como Filho amado de Deus e fiel executor da sua vontade. Jesus por meio
do dom do Espírito, no momento do batismo, fica plenamente habilitado para a
sua missão de Filho de Deus com a atitude do servo fiel. Este é o significado
que a tradição primitiva deu ao batismo de Jesus e que os evangelistas fizeram
seu, embora com acentuações diferentes.
Todos nós recebemos o batismo. O batismo não é
um peso nem uma moda cristã e sim um dom, uma predileção de Deus, um chamamento
a estar em comunhão com Deus, um chamamento à fé nele. Através do batismo, Deus
não impõe as obrigações sobre nós, mas nos ama e nos oferece a sua graça e
salvação em Jesus Cristo. Como resposta a este dom e a este amor é o amor e a
entrega a Deus e aos irmãos na Igreja em que somos incorporados e a vivência
desta filiação divina no mundo em que vivemos. Temos que assumir livre e
conscientemente e satisfatoriamente a nossa condição de batizados. O nosso
compromisso pessoal e comunitário de batizados é configurar com Cristo no seu
estilo, na sua mentalidade e na sua doutrina. Crer em Cristo é comprometer-se
com a pessoa e a causa de Jesus Cristo.
2. Alguns Detalhes Deste Relato Que Chamam A Nossa Atenção
2.1.
O Batismo Acontece Num Clima De Oração
O texto diz ”...Enquanto rezava...” (v.21). A
oração é o tema muito caro para Lucas. O seu evangelho chama-se também de “o
evangelho da oração”. O verbo “orava” retorna freqüentemente no terceiro
evangelho: dezenove vezes o verbo “proseúchesthai” (Lc11,1: orar, implorar) e
oito vezes o verbo “deístai” (pedir, suplicar, Lc 5,12). Este evangelho inicia (Lc 1,8-10) e termina
com o tema da oração (Lc 24,53). O terceiro evangelho, e nenhum outro, contém
as orações mais conhecidas e recitadas pela Igreja: o Magnificat (1,46-56); o
Benedictus (1,67-79); o Glória(2,14); o
Nunc Dimittis (2,29-32). Em Lucas, a oração marca os momentos mais
decisivos e importantes da vida de Jesus: no batismo (3,21-22); na escolha dos
Doze (6,12-13); no ensinamento do Pai Nosso (11,1); na confissão de Pedro
(9,18); na transfiguração (9,28). Além disso, Lucas é o único evangelista que
nos apresenta três parábolas sobre a oração (11,5-13: o amigo importuno;
18,1-8: a viúva importuna; 18,9-13: o fariseu e o publicano). Ele também nos
apresenta a comunidade primitiva como uma comunidade orante (At 1,14;2,42); a
oração está presente nos momentos mais importantes da Igreja Primitiva (At
1,24;8,15;11,4;12,5;13,2;14,23).
A oração é importante porque ela desempenha um
papel fundamental na Teologia e na vida de cada seguidor de Jesus, ou
simplesmente na vida de quem acredita em Deus. Ela é a expressão mais viva da
fé. Quem acredita em Deus precisa rezar e quem reza precisa acreditar em Deus.
A oração é o lugar da revelação. Empobrecer a oração é empobrecer toda a
Teologia e a vida cristã. No seguimento de Jesus, a oração sustenta a caminhada
do cristão. Na medida em que ele reza, a sua vida se transforma. A sua vida é
colocada em consonância com a oração. Oração e vida se tornam uma unidade. O
cristão, através da oração, pode discernir os sinais dos tempos e o chamamento
de Deus em determinadas circunstâncias.
Uma lição importante do exemplo de Jesus é
rezar antes de tomar decisão. Todas as decisões na Igreja, ou nas comunidades
cristãs quaisquer que elas sejam, devem ser tomadas numa atmosfera de oração (e
não em torno de uma mesa de café ou salgadinhos), pois o Cristo continua
presente na Igreja. Ele não abandonou a Igreja (Mt 18,20). Ele continua sendo
como a suprema autoridade na Igreja. Se as nossas decisões quiserem ser
evangélicas devem ser feitas em oração e assim poderão contar com a presença de
Jesus ressuscitado, pois ele preside a Igreja. Qualquer coordenação ou
autoridade na Igreja recebe sua inteligibilidade a partir de sua relação com o
Cristo. Separada do Cristo, ela se torna espúria e falsa.
Rezar significa saborear a presença do amor maior
que é Deus. Rezar não é uma tentativa humana para trazer Deus aos nossos
interesses, mas levar os nossos interesses a Deus e para conformar-se com a
vontade de Deus, porque “vosso Pai sabe do que precisais, antes que lho peçais”
(Mt 6,8). Rezar é acolher Deus e sua vontade e entregar-se totalmente a Ele.
Rezar é penetrar o mundo divino com a profundidade de olhar de Deus. Rezar é
outra forma de dizer “eu amo Deus”. Amar, neste sentido, significa trazer a
eternidade para a história e levar a história para a eternidade, mas sempre
dentro da vontade de Deus. É unir o céu e a terra, tempo e eternidade, Deus e
pessoas. Se um cristão parar de ser uma pessoa de oração, ele se torna inútil
para o mundo e para Deus, porque se torna como sal insípido, bom apenas para
ser pisado (cf. Mt 5,13). O mundo não precisa de corações vazios e de almas
vazias. Todo o autêntico agir nasce da oração autêntica e da vida
contemplativa. Pois tudo o que é grande neste mundo provém da oração e da vida
contemplativa.
2.2.
”... O Céu Se Abriu”
O “céu fechado” designa a desgraça, o abandono
dos homens e a infertilidade do solo. O profeta Isaías, por isso, chegou a
clamar: “Oh! Se abrísseis os céus e descêsseis! Diante de ti as montanhas iriam
derreter” (Is 64,1). A abertura do céu que se rasgam (cf. Mc 1,10) significa a
abertura de novas relações entre Deus e os homens, o início de um novo diálogo
de Deus com os homens, um novo tempo de graça, de novos dons dados por Deus aos
homens. Jesus é o lugar do novo, definitivo e pleno encontro de Deus com os
homens, dos homens com Deus e, consequentemente, dos homens entre si. São
Gregório comentou: “Jesus sai das águas elevando consigo o mundo que estava
submerso, e vê rasgarem-se e abrirem-se os céus que Adão fechara para si e sua
posteridade”. Os tempos de manifestação de Deus estão de volta. A fé da
comunidade primitiva vê desde o começo no batismo de Jesus uma ação definitiva
de Deus em favor dos homens. Com o batismo de Jesus, começa uma nova era na
história do mundo, na história da intervenção salvífica de Deus na humanidade.
2.3.
”... O Espírito Santo Desceu Sobre Jesus Em Forma Visível Como Pomba”
Lucas é designado também como “o evangelista do
Espírito” e Lucas- Atos seria um verdadeiro tratado de pneumatologia. No livro
dos Atos o emprego do termo “Espírito” na acepção de Espírito de Deus é o mais
frequente de todo o Novo Testamento. Aqui o termo ocorre ao todo 45 vezes.
O Espírito Santo repousa sobre Jesus e encontra
nele a shekinah, a morada permanente de Deus. O Espírito Santo funda a
missão de Jesus e funda a missão da Igreja. Ele é o ponto de união entre Antigo
e Novo Testamento. Ele está no início e no decurso do ministério de Jesus. Ele
está no início e na caminhada da Igreja: as comunidades são fruto do Espírito e
manifestação do Espírito Santo. E o Espírito Santo sopra onde quer. É
dinamismo. É abertura para o novo. É convite a descobrir o tempo de Deus atrás
dos sinais dos tempos. É fidelidade criativa. É liberdade. É dom e compromisso.
É força que leva a enfrentar o novo e o desconhecido. Ele escancara portas e
derruba barreiras.
2.4.
”E Do Céu Veio Uma Voz: ‘Tu És O Meu Filho Amado, Em Ti Ponho O Meu
Bem-Querer’”
Para compreender melhor a declaração da
filiação de Jesus na sua relação com Deus- Pai, temos que ter na mente alguns
textos do AT: 1) Is 42,1 em que apresenta o Servo de Javé: “Eis o meu servo que eu sustenho, o meu
eleito, em quem me comprazo. Pus sobre ele o meu espírito, ele trará o
julgamento às nações”. 2) O Sl 2,7 que fala das expectativas messiânicas e
escatológicas: “Vou proclamar o decreto
de Javé: Ele me disse: ‘Tu és meu filho, eu hoje te gerei’”. Jesus Cristo
cumpre todas estas expectativas. Tudo se cumpre nele.
A voz vinda do céu revela quem é Jesus, sua
verdadeira identidade: o Filho amado pelo Pai com um amor único, no qual tem
toda a sua complacência, todo o seu bem-querer. Este é o momento decisivo da
vida de Jesus. É assim declarada a sua verdadeira identidade. Ele é o Filho amado
de Deus. Como “Bem-Amado” é enviado ao mundo para que, por meio dele, todas as pessoas
descubram e proclamem a própria “amabilidade”. Quando o Espírito Santo tomou
morada nele, Jesus entra na relação de filho com Deus e percebe as relações de
Deus com ele como paternidade. Neste batismo, certamente, acontece uma nova
revelação do nome de Deus: Deus é o Pai. Em suas orações, até a hora do
Getsêmani, Jesus vai se dirigir a Deus exclusivamente e com incomparável
intimidade com Abba, Paizinho. Quando Jesus anuncia a proximidade do Reino (cf.
Mc 1,15), ele anuncia, ao mesmo tempo, a íntima proximidade de Deus, o Pai,
proximidade que se expressa no nome “Abba”.
O mesmo Espírito que desceu sobre Jesus e
afirmou a sua identidade como Filho Amado de Deus também o conduzirá ao deserto
para ser tentado pelo diabo (cf. Lc 4,1-13). Mas Jesus resistirá às tentações
do sucesso, da popularidade e do poder reclamando energicamente a sua
verdadeira identidade. Jesus não tem que provar ao mundo que é digno de amor.
Ele já é o “Amado”, e esta “Amabilidade” permite-lhe viver livre dos jogos de
manipulação do mundo, sendo sempre fiel à voz que lhe tinha falado no Jordão.
Toda vida de Jesus é uma vida de obediência, de atenta escuta daquele que lhe
chamou Amado. Tudo que Jesus diz e faz provém dessa íntima comunhão espiritual.
Jesus revela-nos que nós, seres humanos
pecadores e fracos, somos convidados à mesma comunhão que ele viveu, que somos
os filhos e filhas prediletos de Deus, precisamente como ele é o seu Filho
amado, que somos enviados a este mundo a proclamar a “amabilidade” de toda a
gente, como ele o foi, e que finalmente poderemos escapar aos poderes
destrutivos da morte, como ele conseguiu. Cada vez que proclamamos a nós mesmos
a certeza da nossa “amabilidade”, a nossa vida alarga-se e aprofunda-se e
estende-se muito para além dos limites do nosso nascimento e da nossa morte. A
nossa amabilidade é eterna. Deus diz: “Eu te amo com amor eterno” (Jr 31,3).
Para isso, é necessário rezar. A oração é o
exercício para escutar essa voz de amor. Sem oração, tornamo-nos surdos à voz
do amor e ficamos confundidos com as muitas vozes competitivas que exigem a
nossa atenção.
Somos Batizados No Espírito Do Senhor
Todos nós recebemos o Batismo. Nosso Batismo é
um sacramento real que nos faz filhos de Deus e, pela força do Espírito Santo,
nos incorpora a Cristo morto e ressuscitado. De alguma maneira, o Batismo de
Jesus prefigura o nosso, no sentido de que, assim como naquele momento o Pai
certificou a filiação divina de Jesus ungindo-o com o Espírito antes de iniciar
sua missão, também nós, no Batismo, somos consagrados filhos de Deus em Jesus
Cristo pelo Espírito Santo. O Batismo é o
fundamento da chamada à santidade, o fundamento do dever e direito a viver o
culto “em espírito e em verdade”. No sacramento do Batismo conflui todo o mistério
da vida: o passado do pecado, o presente do homem novo e a esperança do mundo
definitivo. O Batismo é regeneração de uma vida nova, nascimento do alto,
participação da ressurreição, revestimento de Cristo, sinal da filiação divina,
unção do Espírito Santo.
O batismo não é um peso nem uma moda cristã e
sim um dom, uma predileção de Deus, um chamamento a estar em comunhão com Deus,
um chamamento à fé nele. Através do batismo, Deus não impõe as obrigações sobre
nós, mas nos ama e nos oferece a sua graça e salvação em Jesus Cristo. Como
resposta a este dom e a este amor é o amor e a entrega a Deus e aos irmãos na
Igreja em que somos incorporados e a vivência desta filiação divina no mundo em
que vivemos. Temos que assumir livre e conscientemente e satisfatoriamente a
nossa condição de batizados. O nosso compromisso pessoal e comunitário de
batizados é configurar com Cristo no seu estilo, na sua mentalidade e na sua
doutrina. Crer em Cristo é comprometer-se com a pessoa e a causa de Jesus
Cristo.
Além disso, o cristão não é batizado somente
para si mesmo e sim para todos os homens. Ele é batizado para a humanidade. O
batismo no Espírito de Deus convoca o batizado para uma tarefa concreta, para
uma missão de compromisso que lhe dá identidade e personalidade. Se Jesus
“andou por toda a parte fazendo o bem a todos” (At 10,38b), o cristão, o
seguidor de Jesus não pode fazer outra coisa a não ser o bem, ser parceiro do
bem. Cada cristão deve ser parceiro do bem. Nosso batismo tem um aspecto de
tomada de consciência do amor gratuito de Deus, da doação do espírito que nos
impulsiona a realizarmos uma missão também messiânica de viver e de comunicar o
amor de Deus aos demais continuando a missão de Jesus Cristo.
P. Vitus Gustama,svd
Um comentário:
Reflexão profunda.
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