quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Domingo, 03 De Janeiro de 2021-EPIFANIA

EPIFANIA DO SENHOR

Primeira Leitura: Is 60,1-6

1Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor. 2Eis que está a terra envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem os povos; mas sobre ti apareceu o Senhor, e sua glória já se manifesta sobre ti. 3Os povos caminham à tua luz e os reis ao clarão de tua aurora. 4Levanta os olhos ao redor e vê: todos se reuniram e vieram a ti; teus filhos vêm chegando de longe com tuas filhas, carregadas nos braços. 5Ao vê-los, ficarás radiante, com o coração vibrando e batendo forte, pois com eles virão as riquezas de além-mar e mostrarão o poderio de suas nações; 6será uma inundação de camelos e dromedários de Madiã e Efa a te cobrir; virão todos os de Sabá, trazendo ouro e incenso e proclamando a glória do Senhor. 

Segunda Leitura: Ef 3,2-3ª

Irmãos: 2Se ao menos soubésseis da graça que Deus me concedeu para realizar o seu plano a vosso respeito, 3ae como, por revelação, tive conhecimento do mistério. 5Este mistério, Deus não o fez conhecer aos homens das gerações passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: 6os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho.

Evangelho: Mt 2,1-12

1 Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na Judeia, no tempo do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém, 2 perguntando: “Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo”. 3 Ao saber disso, o rei Herodes ficou perturbado, assim como toda a cidade de Jerusalém. 4 Reunindo todos os sumos sacerdotes e os mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias deveria nascer. 5 Eles responderam: “Em Belém, na Judeia, pois assim foi escrito pelo profeta: 6 ‘E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá um chefe que vai ser o pastor de Israel, o meu povo’”. 7 Então Herodes chamou em segredo os magos e procurou saber deles cuidadosamente quando a estrela tinha aparecido. 8 Depois os enviou a Belém, dizendo: “Ide e procurai obter informações exatas sobre o menino. E, quando o encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-lo”. 9 Depois que ouviram o rei, eles partiram. E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino. 10 Ao verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande. 11 Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele, e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. 12 Avisados em sonho para não voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho.

---------------------

Epifania- Natal

Neste Domingo celebramos a festa de Epifania. O Natal e a Epifania são festa complementares e mutuamente enriquecedoras. Ambas celebram, de perspectivas diferentes, o mistério da Encarnação, a vinda e a manifestação de Cristo ao mundo. O Natal enfatiza a vinda. A Epifania enfatiza a manifestação. A Epifania é a solenidade da manifestação do Messias, o Deus feito homem, aos povos pagãos, significados nos personagens vindos do Oriente. Importa muito não desligar a Epifania do Natal. O mistério, no fundo, é o mesmo, varia a perspectiva da amplitude e da universalidade da manifestação. Epifania é manifestação do Deus-Conosco aos povos pagãos.

Epifania aprofunda e estende o mistério celebrado no Natal. Este mistério se explica no prefácio: “Quando Cristo se manifestou em nossa carne mortal, vós nos recriastes na luz eterna de sua divindade”. Aqui reside a profundidade do mistério: Cristo Jesus é o Deus que assume toda a realidade do homem, exceto o pecado. Assim, ele nos enriquece com a glória de sua realidade divina. É a “admirável intercâmbio” daquilo que São Leão Magno fala: Damos a Ele nossa pobreza (humanidade) e Ele nos comunica sua riqueza (divindade).

Mas a Epifania estende este mistério a todos os povos. São Paulo na Segunda Leitura (Ef 3,2-3ª): “Este mistério, Deus não o fez conhecer aos homens das gerações passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho”. Este é o núcleo da celebração de Epifania.

A antífona de entrada da missa, que abre a celebração nos introduz no clima do mistério da Epifania. A antífona da entrada é um texto composto, inspirado livremente em Malaquias (Mal 3,1) e em 1Crônicos 19,11-12. A antífona de entrada canta poeticamente a grandeza e a solenidade do mistério: “Chegou o Senhor nosso Rei: em suas mãos está o reino, o poder e a glória”. Esse Senhor é o Menino pobre que nasceu em Belém. Deus nos revela que este Menino é o Filho unigênito do Pai. Jesus nascido em Belém é a Luz de todos os povos, como enfatiza a Primeira Leitura (Is 60,1-6). Por isso, os povos caminhão para esta Luz representados pelos magos. Epifania é, portanto, uma solenidade evangelizadora e missionária. 

A própria palavra, do grego “Epiphaneia” (” manifestação”) ressalta o significado original da festa. No uso secular a palavra Epifania podia referir-se a chegada. A chegada de um rei era registrada como Epifania. A vinda de Cristo para este mundo, segundo são Paulo é uma Epifania (Cf. 2Tm 1,9-10). No uso religioso, a palavra Epifania denotava toda e qualquer manifestação de poder divino em favor do homem. Dentro do contexto do Natal, através da Encarnação, Deus manifestou o seu poder benevolente e misericordioso para nós homens. Deu, na sua Encarnação, vem para nos amar e perdoar.

Em outras palavras, Natal e Epifania são festas complementares que se enriquecem mutuamente ou festas irmãs. Ambas celebram, de diferentes perspectivas, o mistério da encarnação, a vinda e a manifestação de Cristo ao mundo. Natal acentua mais a vinda (embora o próprio Natal seja uma manifestação do amor de Deus pela humanidade), enquanto que epifania enfatiza a manifestação.

Os Magos são verdadeiramente nossos pais e nossos mestres na fé. O caminho dos Magos em busca de um Salvador é uma história de fé. Destaquemos alguns ensinamentos dos Magos:

Primeiro, a capacidade para ver a estrela, abertos para a chamada de Deus, vigilantes, homens de oração. Eles sabem distinguir os sinais dos tempos. Não são homens distraídos nem sonolentos nem fechados. Eles escutam a voz do céu e a voz de seu próprio coração. Eles escutam seu Eu profundo. Somente aquele que está aberto a Deus tem capacidade de captar os sinais de Deus na vida. 

Segundo, sua disponibilidade para deixar tudo e pôr-se em caminho. Os Magos não são homens instalados nem apegados a coisas e lugares, porque vivem de esperança. Eles fazem parte daqueles que buscam a terra prometida. São homens livres de toda atadura e livres para toda aventura, famintos de luz e de Deus. Somente quem é livre de tudo pode libertar os outros. Quem vive instalado e isolado não pode ver a novidade da caminhada e as novidades da vida.

Terceiro, sua constância no seguimento da estrela. Não lhes faltaram dúvidas e provações no caminho. Às vezes a estrela desapareceu e sentiram a tentação de voltar ao conhecido, como os hebreus no deserto que queriam voltar para a escravidão no Egito. Os Magos passaram pela experiência da escuridão na vida, quando não se vê nada nem se entende nada. Mas na sua dúvida os Magos não têm vergonha de perguntar a quem sabe melhor como se deve viver a vida de melhor maneira. Assim pode acontecer também na nossa vida. Às vezes perdemos o guia de nossa vida ou alguma referência para nossa caminhada. Os Magos nos ensinaram a ter humildade em pedir socorro aos que tem mais conhecimento e experiência na vida para que possamos continuar com nossa missão neste mundo.

Quarto, sua responsabilidade na busca. A fé é dom de Deus, mas exige nossa colaboração continuada. A fé não está renhida com a reflexão, o diálogo e a oração. Até dos incrédulos se pode receber alguma luz.

Quinto, a generosidade dos Magos na oferta ou na oferenda. Eles compreenderam a necessidade de compartilhar. Escolheram presentes significativos, porque esperavam encontrar um Rei dos reis.

Sexto, sua capacidade da leitura dos fatos. Quando a estrela pára diante da casa pobre, onde se encontra o Menino Jesus, os Magos não se escandalizam. Ao contrário, eles O reconheceram como Messias. A maioria do povo eleito não tinha capacidade de fazer este tipo de leitura. Deus é sempre surpreendente: se veste de simplicidade e somente se manifesta aos humildes e aos pequenos.

Sétimo, diante do Messias os Magos se ajoelharam e O adoraram. Não basta ver. A fé é entrega e amor. Eles, mais que o ouro, o incenso e a mirra, ofereceram seu coração. Creram e adoraram: esse é o melhor perfume. Adoraram: essa será nossa definitiva vocação.

Oitavo, a capacidade de mudança dos magos. Eles foram capazes de voltar por outro caminho, pois foram avisados por Deus para fazer isso. É coisa segura que Deus muda sempre nossos planos. Crer é viver confiados na insegurança, é estar dispostos a iniciar sempre um novo caminho, é ter capacidade de renovação constante. No final, essa capacidade de renovação produz sempre uma imensa alegria.

Por fim, a transformação na vida dos Magos. Na viagem de volta já não necessitavam mais de estrela porque eles levavam a estrela dentro de seu coração. Era tal a luz e a alegria que receberam, que eles mesmos se converteram em estrelas. Voltaram com o rosto resplandecente, como Moisés depois que falou com Deus, como Jesus que foi transfigurado no monte Tabor. Por isso, os Magos se tornaram missionários de alegria e de amor. Desde então, as estrelas já não se encontraram no céu e sim entre nós, entre todos aqueles que de uma ou de outra maneira se encontraram profundamente com Deus. Quem contempla Deus profundamente se torna reflexo de Deus para os demais.       

Cada um tem sua luz própria. Por isso, não precisa nem deve apagar a luz dos outros. Juntar duas ou mais estrelas só resulta na claridade maior. Por isso, tem toda a razão aquilo que o ditado popular diz: “Para que a sua estrela brilhe, não é preciso apagar a minha”. Cada um tem sua luz dentro de si e é preciso que brilhe para iluminar a vida dos outros. Isto se chama amor na unidade, amor fraterno. Se realmente somos crentes, não podemos continuar dissimulando nossa fé. 

Estendamos um pouco mais nossa meditação sobre outros pontos da festa da Epifania!   

1. A Epifania Do Senhor Na Nossa Vida        

O termoepifania” vem do grego “epiphaneia” (manifestação). No grego clássico este termo podia expressar duas ideias: uma, secular e outra, religiosa.         

No uso secular, epifania podia referir-se a uma chegada. Por ex., quando um rei visitava uma cidade com uma entrada solene, esse acontecimento se considerava como epifania. São Paulo utiliza este termo para falar da vinda de Cristo. Para São Paulo, a vinda de Cristo ao mundo é uma epifania: “Essa graça, que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos, foi manifestada agora pela aparição (epiphaneia) de nosso Salvador, o Cristo Jesus” (2Tm 1,10). Com o uso neotestamentário do termo epifania entendemos facilmente que o nascimento de Jesus se entende também como epifania, porque celebram-se a vinda, a chegada e a presença da Palavra encarnada entre nós.        

No uso religioso, o termo epifania se usa para denotar alguma manifestação do poder divino em benefício dos homens. Dentro do uso religioso do termo estamos próximos do uso litúrgico da epifania, pois através da encarnação de Jesus, o Verbo divino, Deus manifesta seu poder benevolente para os homens. Por isso, a vinda de Cristo à terra é uma epifania em si mesma. Dentro do significado do termo, na verdade, a epifania não se limita na celebração da vinda histórica de nosso Senhor, Jesus Cristo, ao mundo, mas também dos diversossinaispelos quais durante sua vida, ele revela seu poder e sua glória.       

A partir do significado do termo, a epifania é uma festa de cada dia porque nãomomento nem acontecimento que não tragam uma revelação do Senhor. Para poder captar a manifestação divina em cada momento e acontecimento necessitamos ser pobres no espírito e estar abertos à novidade. Não podemos ter medo da novidade de Deus que se manifesta diariamente. Os ricos, Herodes, os sumos sacerdotes, os escribas e os fariseus temem a novidade e criam a guerra. A novidade é sempre uma ameaça para quem tem algo a perder. Para defender-se da novidade eles se refugiam nos costumes humanos. A epifania, que é a revelação de Deus que engloba tudo, nos abre para horizontes infinitos, fonte permanente da novidade e da surpresa de Deus. Uma grande novidade que aprendemos da encarnação de Deus em Jesus Cristo é o reconhecimento de Deus em cada homem para respeitar sua dignidade, porque Deus se fez homem. Santo Tomás de Aquino ao comentar o Pai-Nosso disse: “Devemos amar nossos semelhantes porque são nossos irmãos, pelo fato de serem filhos de Deus (leia 1Jo 4,20). Devemos reverenciá-los, tratando-os como filhos de Deus (leia Ml 2,10)” [In Orationem Dominicam: Pater Noster, Expositio].

2. Os Magos e a Universalidade Do Amor De Deus   

Os grandes Padres latinos como Santo Agostinho, São Leão, São Gregório e outros, nas suas reflexões sobre Mt 2,1-12 chegaram à mesma conclusão de que os Sábios do oriente (os magos) representavam as nações do mundo. Eles simbolizavam a vocação de todos os homens à única Igreja de Cristo.        

Com esta interpretação, a festa de epifania toma um caráter mais universal. Deus deixa de se manifestar somente a um povo privilegiado, a uma raça humana para se dar conhecer a todos, sem exceção. A boa nova da salvação é oferecida a todos os homens. Com a vinda de Deus feito carne, a humanidade forma uma família porque o amor de Deus abraça a todos. Isto significa que Deus jamais abandona seus fiéis. Este amor imenso de Deus por nós deve aquecer o nosso coração e animar nossa vida para levarmos adiante os nossos compromissos como filhos e filhas de Deus. São Paulo fala (na segunda leitura) com muita admiração sobre a grandiosidade deste mistério, que estava oculto nas gerações passadas, mas se revela agora através do Espírito, queos pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho” (Ef 3,6). Da mesma forma São Pedro recordava aos pagãos convertidos: “Vós que outrora não éreis povo, mas agora sois o Povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas agora alcançastes misericórdia” (1Pd 2,10). Todos podem alcançar a misericórdia de Deus desde que tenham a vontade de alcançá-la, vivendo os ensinamentos de Cristo. E todos os que aceitarem Cristo e seus ensinamentos serão herdeiros das promessas de Cristo. Consequentemente todos devem ser servidores desta graça para todos que ainda não têm consciência da grandiosidade do amor de Deus que liberta e salva.

3. Os Magos e A Busca De Deus        

Os magos puseram-se a caminho e deixaram sua terra em busca do Rei recém-nascido. Guiados pela estrela e com uma grande esperança no coração, os magos puseram-se a caminho. São João Crisóstomo comentou: “Não se puseram a caminho porque viram a estrela, mas viram a estrela porque se tinham posto a caminho”. Põem-se a caminho porque têm perguntas e inquietações no coração. Os magos são o símbolo dos que buscam Deus, como diz Santo Agostinho: “Anunciam e perguntam, creem e buscam; simbolizando aqueles que caminham na fé e desejam a realidade”.          

Somos peregrinos nesta terra. Mas para onde caminhamos? Consciente ou inconscientemente, no fundo todos procuram Deus. “A busca de Deus é a busca da felicidade. O encontro com Deus é a própria felicidade, pois Deus é o bem perfeito, o sumo bem” (Santo Agostinho). O destino do homem é, certamente, a união plena com Deus. E na espera desse destino, o homem vive sobre a Terra com fé. A fé é ter confiança em Deus apesar das próprias dúvidas, perguntas e interrogações, queixas e murmurações; a fé é ter a coragem de agir apesar dos próprios medos; é esperar no amanhã apesar dos sofrimentos e dificuldades de hoje, porque Deus é fiel às suas promessas.  Deus veio antes ao nosso encontro e semeou no nosso coração a fome e a sede da justiça e da paz, da felicidade e da comunhão, enfim, da salvação que só podemos encontrar nele.      

Para chegar ao encontro de Deus é necessário pôr-se a caminho e encarar os desafios e vencer novos obstáculos e refutar argumentos velhos e novos a fim de chegar à meta desejada, isto é, encontrar o sentido da vida na união plena com Deus. Quem quer encontrar Deus, não pode ficar preso ao passado. Precisa partir sempre de novo, com o coração cada vez mais leve e livre, porque na nossa vida costumam acontecer fatos carregados de sentido, que exigem a nossa atenção e o nosso êxodo. Mas se a pessoa não se põe a investigar e a tentar perceber o que Deus lhe quer dizer, com certeza vive mais tranquilo, não se interroga, não levanta problemas. Consequentemente, não avança, move-se num horizonte estreito, mesquinho, sem dimensões, e priva-se do que as suas capacidades lhe proporcionam para progredir. E Deus, quando queremos encontrá-lo de verdade, vem em nossa ajuda, indica-nos o caminho, às vezes, através de meios menos aptos. Mas, com certeza, Deus não se encontra na soberba que nos separa dele, nem na falta de caridade que nos isola.          

Os magos iniciaram uma longa caminhada, desejando encontrar Deus guiando apenas pela estrela. Na vida, é preciso seguir uma estrela, um ideal, um modelo de santidade.  E tem que se seguir, apesar de todos os sacrifícios. Jesus, no fim, está à nossa espera.

4. Os Magos e A Estrela         

“Vimos sua estrela no Oriente”, dizem os magos. A estrela é um elemento indispensável na narração de Mateus. Mas o que a estrela representa?        

A estrela é a metáfora do rei messias, como pode-se ler em Nm 24,17: “Surgirá uma estrela de Jacó e surgirá um cetro de Israel”. Em Mt, porém, a estrela não é apenas uma metáfora ou imagem do Messias, porque ela guia os magos. Pela sua função de guia, ela é sinal de Deus. A estrela é a Providência divina que guia o homem no caminho de sua realização como homem e filho de Deus. A estrela também é símbolo da fé. A fé é a estrela que nos guia. A fé é a luz pela qual conhecemos Deus. A fé é um dom de Deus, é uma iluminação para nossa vida. Não se pode chegar à luz da verdade revelada através do recurso exclusivo da razão humana. Deus é quem revela; é Ele “mesmo quem reluziu em nossos corações, para fazer brilhar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo” (2Cor 4,6). Mediante a fé conhecemos realmente Deus, ainda que este conhecimento seja escuro. É um conhecimento que nos une a Deus e leva consigo a “garantia” e a substância das coisas esperadas: “A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11,1).        

A fé nos situa na nossa rota e nos mostra o caminho que temos que percorrer. De vez em quando perdemos nossa direção. Mas isto não quer dizer que estejamos perdidos. Esta obscuridade é momentânea e serve de prova para nossa fé. Temos que aprender dos magos. Eles não ficaram desanimados quando perderam a estrela. Ao contrário, eles pediram conselhos aos homens capazes de dizer-lhes onde nasceria Cristo. Nós também podemos pedir conselhos de quem tem mais fé do que nós ou nós mesmos podemos dar conselhos aos outros caso tenhamos fé profunda. A luz da fé é algo que pode e deve ser compartido, especialmente através do testemunho de nossa vida, pois o testemunho de uma vida correta, de uma fé viva é muito mais eficaz do que qualquer discurso bonito.        

Se a epifania é uma festa de cada dia porque não há momento nem acontecimento que não tragam uma revelação do Senhor, será que, algumas vezes, você parou para procurar perceber nos sinais de cada dia a vontade ou algum recado de Deus para você?

P. Vitus Gustama,SVD

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

02 De Janeiro de 2021

SER VOZ E REFLEXO DE JESUS NA VIDA DIÁRIA

Primeira Leitura: 1Jo 2,22-28

Caríssimos: 22Quem é mentiroso, senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? O Anticristo é aquele que nega o Pai e o Filho. 23Todo aquele que nega o Filho também não possui o Pai. Quem confessa o Filho possui também o Pai. 24Permaneça dentro de vós aquilo que ouvistes desde o princípio. Se o que ouvistes desde o princípio permanecer em vós, permanecereis com o Filho e com o Pai. 25E esta é a promessa que ele nos fez: a vida eterna. 26Escrevo isto a respeito dos que procuram desencaminhar-vos. 27Quanto a vós mesmos, a unção que recebestes da parte de Jesus permanece convosco, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine. A sua unção vos ensina tudo, e ela é verdadeira e não mentirosa. Por isso, conforme a unção de Jesus vos ensinou, permanecei nele. 28Então, agora, filhinhos, permanecei nele. Assim poderemos ter plena confiança, quando ele se manifestar, e não seremos vergonhosamente afastados dele, quando da sua vinda.

Evangelho: Jo 1,19-28

19Este foi o testemunho de João, quando os judeus enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para perguntar: “Quem és tu?” 20João confessou e não negou. Confessou: “Eu não sou o Messias”. 21Eles perguntaram: “Quem és, então? És Elias?” João respondeu: “Não sou”. Eles perguntaram: “És o Profeta?” Ele respondeu: “Não”. 22Perguntaram então: “Quem és, afinal? Temos de levar uma resposta àqueles que nos enviaram. Que dizes de ti mesmo?” 23João declarou: “Eu sou a voz que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor’” — conforme disse o profeta Isaías. 24Ora, os que tinham sido enviados pertenciam aos fariseus 25e perguntaram: “Por que então andas batizando, se não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?” 26João respondeu: “Eu batizo com água; mas no meio de vós está aquele que vós não conheceis, 27e que vem depois de mim. Eu não mereço desamarrar a correia de suas sandálias”. 28Isso aconteceu em Betânia além do Jordão, onde João estava batizando.

----------------------

A Primeira Leitura, tirada da Primeira Carta de são João, se encontra na parte que fala da heresia ou do anticristo (1Jo 2,18-27). O anticristo é aquele que não tem a suficiente fé em admitir a verdadeira encarnação do Filho de Deus; é o negador do Cristo verdadeiro. Para o autor da Primeira Carta de são João aquele que nega a qualidade divina do Filho de Deus, Jesus Cristo separa-se do Pai (1Jo 2,23) e portanto, da vida eterna da qual é a fonte (1Jo 2,25). Ao contrário, aquele que “confessa” o Filho (1Jo 2,23) não é apenas aquele que reconhece especulativamente a divindade de Jesus, mas também adere a seu mandamento de amor. Não basta confessar que Jesus é Deus, mas tem que mostrar esta confissão com a vivência do amor fraterno. 

Para aquele nega a divindade de Jesus, o autor da Carta usa os termos “sedutores”, “pseudoprofetas” e “anticristos”. A palavra no singular e no plural (anticristo/anticristos) designa todos aqueles que se opõem a Cristo; eles negam que Cristo seja homem verdadeiro. Eles não admitem que o mundo de Deus (o mundo de cima) possa manchar-se tocando o mundo de baixo. Este tipo de crença se espalha dentro da comunidade para a qual a Carta foi dirigida (1Jo 2,19).

O ato de ser anticristo é uma heresia. Heresia é confundir Cristo com o nosso pensar e o nosso querer; é fabricar um Cristo a nossa imagem e semelhança. Este Cristo manipulado e tantas vezes mudado é claro que não pode ser o Cristo Salvador. A final, “Todo aquele que nega o Filho também não possui o Pai. Quem confessa o Filho possui também o Pai” (1Jo 2,23).

O fragmento da primeira leitura revela as linhas essenciais da falsa doutrina divulgada peloanticristoem uma época atormentada do final do século primeiro. Para essa falsa doutrina, Jesus não era considerado como o Messias nem como o Filho de Deus. Essa heresia cristológica considerava impossível que o Verbo Divino se fizesse carne à maneira humana. Mas para o apostolo João, testemunha ocular do Verbo Divino, o Verbo da vida (cf. 1Jo 1,1-4), negar a divindade de Jesus significa não ter comunhão com o Pai e não ter a verdadeira vida (1Jo 2,22-23; cf. Jo 20,30-31); negar a união do divino e do humano em Jesus significa seranticristoporque o humano em Jesus é o reflexo perfeito do divino, é o reflexo do Pai: “Aquele que me viu, viu o Pai(cf. Jo 14,9). E em outra ocasião Jesus disse: “Eu e o Pai somos um(Jo 10,30).

São João nessa Primeira Carta quer orientar nossa sensibilidade. Não se trata de fazer de Jesus um ídolo e sim de abrir nossos ouvidos à sua Palavra, pois Sua Palavra é vida e luz para nós todos: “No Verbo havia vida, e a vida era a luz dos homens” (Jo 1,4) e por isso nos orienta (cf. Jo 8,12). Um Jesus que não nos servir como caminho ao Pai (cf. Jo 14,6) é um Jesus que não nos interessa do ponto de vista da . Muitos querem um Jesus milagroso para ter uma vida confortável aqui neste mundo e esqueceram-se de um Jesus que os leva para a vida eterna. Jesus é o misterioso laço de união entre a humanidade caída e o Pai pronta para nos salvar: “Todo aquele que nega o Filho também não possui o Pai. Confessa o Filho possui também o Pai” (1Jo 2,23).               

Como cristãos somos essencialmente ouvintes da Palavra da Salvação, aceitadores do Filho, e escutando-O nos realizamos como filhos do Pai celeste e irmãos dos demais homens. A Igreja é formada pela escuta da e pela vivência da Palavra de Deus. O que nos é pedido não é essencialmente nosso conhecimento ou nosso saber, e sim nossa fidelidade. Fidelidade é guardar ou observar o que é ouvido da Palavra de Deus (cf. Mt 7,24; Jo 14,23). Por isso, o verbo que mais vezes se repete na primeira leitura, é “permanecer”. É um verbo que fala de fidelidade, de perseverança, de manter na verdadeira sem deixar-se enganar. Permanecer em Jesus significa ter nele.  Há várias maneiras de ser fiel: com o pensamento e o coração, com as palavras de testemunho que damos diante dos demais e com as ações, com os compromissos, com as obras e com as decisões da vida diariamente, de acordo com o mandamento do Senhor resumido no amor fraterno.   

De nós não será pedido conta de nossos conhecimentos e sim de nossa fidelidade. Seremos cristãos e seremos salvos, se aceitarmos Jesus, o Enviado do Pai e nos identificarmos com Ele. É contemplar Jesus para contemplar Deus. Jesus é a única e verdadeira revelação de Deus. Há certas afirmações típicas de são João sobre esta revelação: “Ninguém vai ai Pai senão por mim” (Jo 14,6); “Quem conhece o Filho, conhece também o Pai” (Jo 8,19); “o Filho é o único capaz de revelar o Pai” (Jo 14,7).              

E lemos no texto do Evangelho de hoje o testemunho de João Batista acerca de Cristo. Para a perguntaQuem és tu?”, João Batista confessa, evitando qualquer mal-entendido acerca de sua pessoa e de sua própria missão, que não é o Cristo, o Salvador esperado. Este testemunho em forma de afirmação negativa que sai da boca de João Batista é uma autêntica confissão de no messianismo de Jesus. João Batista se define apenas com as palavras do profeta Isaias: “Voz que clama no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor’” para preparas vinda de Cristo. Ser voz é ser uma mensagem, é ser uma chamada aos demais para o bem, para a Luz que ilumina. A voz é feita para proclamar, para anunciar e para denunciar. É preciso nivelar as relações humanas, pois todos os seres humanos têm a mesma substancia humana. Não há super-criatura. É preciso aplainar. Onde houver estrada plana, haverá facilidade para caminhar. Quando um reconhece no outro como ser humano, a convivência se torna mais fácil. Ninguém tratará a outro desumanamente. Eu sou ser humano. O outro é ser humano. Deus se fez humano para salvar o ser humano. 

João Batista não é a luz. Ele é apenas uma lâmpada que tem tempo limitado de duração. Ele é apenas aquele quetestemunha da verdadeira Luz que é o próprio Jesus Cristo (cf. Jo 8,12). Ele não é a Palavra Encarnada, mas somente a voz que prepara o caminho com a purificação dos pecados através de seu batismo: Eu batizo com água; mas no meio de vós está aquele que vós não conheceis”. 

O testemunho de João Batista pretende suscitar a em todo mundo para o grande desconhecido, o Portador da salvação, que vive entre os homens (Jo 1,14). Por isso, a de João Batista está orientada ao anúncio de Jesus e não é apenas para o consumo próprio. João Batista é aquele que chama atenção, não para si mesmo e sim para Aquele é o verdadeiro Salvador. João Batista nos ensina que a deve ser transformada em anúncio, o fiel deve se tornar em anunciador da Boa Nova. Todo cristão é um propagador da Palavra de Deus na aridez espiritual de nosso mundo, um propagador que chama os outros ao encontro de Jesus Cristo que é “o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6).               

João Batista testemunha Jesus Cristo com fidelidade e valentia. Não quer falar de si mesmo, nem contar seus méritos nem suas façanhas. João Batista somente quer que os outros o considerem como “a voz que clama no deserto”, a voz que prepara os caminhos de Deus, a voz que chama todos a preparar o lugar de Deus no mundo, especialmente no coração de cada um. A voz desaparece, mas a mensagem fica. 

O cristão é chamado a ser anunciador da Boa Nova, a ser a voz que grita, com a própria vida, a verdade de Cristo apesar da pobreza que experimenta e da fragilidade de suas palavras humanas. O cristão é o homem que se define em função de Cristo, d’Aquele que vem sempre aos seus para comunicar salvação e vida. 

Como cristãos e como pessoas do bem devemos ser a voz de Deus sobre o amor neste mundo. Podemos desaparecer, mas a marca de amor que testemunhamos e transmitimos deve ficar para sempre entre as pessoas. Além disso, nós, como João Batista, deveríamos falar menos de nós mesmos, acreditar menos em nós mesmos e nos converter em “a vozquetestemunho de Deus, de seu amor presente em Jesus Cristo. Santo Agostinho comenta: João era voz, mas o Senhor é a Palavra que no princípio existia. João era uma voz provisional; Cristo, do princípio, é a Palavra eterna. Ao tirar a palavra, o que será a voz? Se não houver conceito, tudo será nada mais do que ruído vazio. A voz sem palavra chega ao ouvido, mas não edifica o coração. João é a voz que grita no deserto, a voz que rompe o silêncio...”.               

Eu sou a voz que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor’”. Somos chamados a ser voz do Senhor neste mundo. Ser voz é uma vocação muito humilde, mas é maior de todas. Ser voz é ser uma mensagem, é ser uma chamada aos demais para o bem, para a Luz que ilumina. A voz é feita para proclamar, para anunciar e para denunciar. A voz deixará de ser voz, se não gritar, se não proclamar, anunciar e denunciar. A voz se condenará, se deixar de anunciar a mensagem sobre o bem. Uma voz do bem é capaz de renovar o mundo. Se faltarem as vozes do bem para anunciar e denunciar, o mundo perderá sua consciência. Por esta razão, como vale e quanto vale sua voz! Como vale e quanto vale sua palavra! Como vale e quanto vale sua mensagem! Como vale e quanto vale seu grito que rompe o comodismo, que rompe o modo de viver sem vida.

Quem és tu?”. João Batista, nesta passagem, não nos indica o que devemos fazer e sim o que devemos e podemos ser. Trata-se da transparência de um homem. 

João Batista era um personagem realmente raro: vivia no deserto, mal alimentado. Mas ele se converteu em um homem perigoso, criador de um movimento popular que alarmou às autoridades supremas religioso-políticas de Jerusalém que lhe enviam uma comissão para investigar com o intuito de detê-lo se pretender ser o Messias cuja iminente chegada se esperava naquele ambiente tenso da Palestina de mediados do século I, a causa principal da miséria e da dominação romana.

A interrogação começa autoritariamente, sem fórmulas de cortesia: “Quem és tu?”. Os enviados vindos de Jerusalém querem que o próprio João Batista declare suas intenções. De maneira tão simples e direta, João responde-lhes: “Eu não sou o Messias!”. Para os judeus declarar-se Messias significava opor-se às autoridades existentes, que se sentiam inseguras diante dos movimentos populares. Porque, segundo uma opinião muito estendida na época, um dos principais objetivos do Messias haveria de ser a reforma das instituições e a destituição da hierarquia existente. Não é estranho, por isso, o alarme dos dirigentes diante da atividade de João Batista e ficam desorientados.

O evangelista João põe em boca de João Batista a triple negação, porque as três figuras vão ser apresentadas por Jesus. O Messias, Elias e o Profeta encarnavam diversos aspectos da salvação esperada com instrumentos do Espírito.

Quem és tu?”. As autoridades pedem que João Batista se defina. As autoridades querem uma resposta clara para julgar se João Batista representa um perigo. Querem saber o que pretende com sua atividade. João Batista se define como “a voz que clama no deserto”. É alguém que deve ocultar-se para não fazer sombra para Aquele que vem. João é “a voz”, Jesus é “a Palavra”.

A pergunta Quem és tu?” também é dirigida a cada um de nós. Por acaso, cada um de nós, do ponto de vista cristão, pode se definir? Se soubermos quem somos, saberemos também o que devemos fazer e o que não devemos fazer.

Para que possamos nos definir é preciso fazer o encontro pessoa com Jesus e contemplar Jesus Cristo, Luz do mundo para que sejamos reflexos de sua luz para os outros, iluminado suas vidas embora o reflexo dure apenas em pouco tempo. Ser reflexo de Cristo é levar um raio de esperança aos corações entristecidos. Ser reflexo de Cristo é levar um sorriso gratuito numa sociedade violenta. Ser reflexo de Cristo é saber apreciar o lado bom das coisas e das pessoas e entender que nem tudo é relativo, pois existe o Absoluto: Deus. Ser reflexo de Cristo é encontrar o sentido da vida a partir da luz da Palavra de Deus. Sejamos como vela. Ela se consome iluminando a circunstância. A vida de uma vela dura pouco tempo, mas é suficiente para espantar a escuridão e mostrar o caminho a seguir. Neste mundo todos os cristãos são vozes vivas de Cristo para os outros e são luzes para apontar o caminho certo a ser trilhado.

P. Vitus Gustama,svd

20/03/2024-Quartaf Da V Semana Da Quaresma

PERMANECER NA PALAVRA DE JESUS QUE LIBERTA PARA SER SALVO DEFINITIVAMENTE Quarta-Feira da V Semana da Quaresma Primeira Leitura: Dn 3,...