sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020


26/02/2020
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QUARTA-FEIRA DE CINZAS


Primeira Leitura: Joel 2,12-18
12“Agora, diz o Senhor, voltai para mim com todo o vosso coração, com jejuns, lágrimas e gemidos; 13rasgai o coração, e não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar o castigo”. 14Quem sabe, se ele se volta para vós e vos perdoa, e deixa atrás de si a bênção, oblação e libação para o Senhor, vosso Deus? 15Tocai trombeta em Sião, prescrevei o jejum sagrado, convocai a assembleia; 16congregai o povo, realizai cerimônias de culto, reuni anciãos, ajuntai crianças e lactentes; deixe o esposo seu aposento, e a esposa, seu leito. 17Chorem, postos entre o vestíbulo e o altar, os ministros sagrados do Senhor, e digam: “Perdoa, Senhor, a teu povo, e não deixes que esta tua herança sofra infâmia e que as nações a dominem”. Por que se haveria de dizer entre os povos: “Onde está o Deus deles?” 18Então o Senhor encheu-se de zelo por sua terra e perdoou ao seu povo.


Segunda Leitura: 2Cor 5,20-21.6,1-2
Irmãos: 20Somos embaixadores de Cristo, e é Deus mesmo que exorta através de nós. Em nome de Cristo, nós vos suplicamos: deixai-vos reconciliar com Deus.  21Aquele que não cometeu nenhum pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nele nós nos tornemos justiça de Deus. 6,1Como colaboradores de Cristo, nós vos exortamos a não receberdes em vão a graça de Deus, 2pois ele diz: “No momento favorável, eu te ouvi e, no dia da salvação, eu te socorri”. É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação.


Evangelho: Mt 6,1-6.16-18
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 1“Ficai atentos para não praticar a vossa justiça na frente dos homens, para serdes vistos por eles. Caso contrário, não recebereis a recompensa do vosso Pai que está nos céus. 2Por isso, quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem elogiados pelos homens. Em verdade vos digo: eles receberam a sua recompensa. 3Ao contrário, quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita, 4de modo que a tua esmola fique oculta. E o teu Pai, que o que está oculto, te dará a recompensa. 5Quando orardes, não sejais como os hipócritas, que gostam de rezar de , nas sinagogas e nas esquinas das praças, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: eles receberam a sua recompensa. 6Ao contrário, quando orares, entra no teu quarto, fecha a porta, e reza ao teu Pai que está oculto. E o teu Pai, que o que está escondido, te dará a recompensa. 16Quando jejuardes, não fiqueis com o rosto triste como os hipócritas. Eles desfiguram o rosto, para que os homens vejam que estão jejuando. Em verdade vos digo: eles receberam a sua recompensa. 17Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, 18para que os homens não vejam que tu estás jejuando, mas somente teu Pai, que está oculto. E o teu Pai, que o que está escondido, te dará a recompensa”.
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Quaresma-Conversão


Com a Quarta-feira de Cinzas iniciamos a nossa Quaresma. Quaresma é um programa, um caminho, um esforço para revisar e renovar nosso ser de cristãos, que consiste radicalmente em viver a vida de Cristo já desde agora, enquanto somos peregrinos e testemunhas do Reino de Deus. Quaresma é um caminhada da penitência feita por cada cristão, seguidor de Cristo. Esta caminhada vai durar durante quarenta dias a partir da Quarta-feira de Cinzas até a Ceia do Senhor, exclusiva (Paschalis Sollemnitatis: A Preparação e Celebração das Festas Pascais, n.27, da CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO, 16 de janeiro de 1988).


Hoje o sinal identificador do início da Quaresma é a Cinza. A imposição da cinza comunica com facilidade sua mensagem de humildade e de conversão. O sacerdote se impõe ele mesmo a cinza, porque ele também é débil, necessita converter-se à Páscoa do Senhor. Em seguida, o sacerdote impõe a cinza sobre a cabeça/fronte dos fiéis.


Na imposição das cinzas temos duas fórmulas, igualmente tradicionais: “Convertei-vos e Crede no Evangelho” ou “Lembra-te que és pó, e ao pó hás de tornar”. O sentido da conversão penitencial (Convertei-vos) e o da caducidade (és pó) são igualmente predicáveis ao homem de hoje. Nesta vida breve o homem velho há que alcançar o fogo e a luz do homem novo, ressuscitado na Páscoa. Morte e vida, cinza e água convivem na Quaresma.


O gesto simbólico deste dia é aquele que penetrou na comunidade cristã e pode ser muito pedagógico se for feito com autenticidade, sem precipitação; com sobriedade, mas de forma expressiva. A imposição da cinza facilmente comunica sua mensagem de humildade e conversão.


As três leituras de hoje expressam claramente o programa de conversão que Deus quer de nós durante Quaresma: converta-se e acredite no Evangelho; converte-me com todo o meu coração.


Cada um de nós, a comunidade e toda a sociedade, precisa ouvir este chamado urgente para a mudança pascal, porque somos todos fracos e pecaminosos e porque, sem perceber, estamos sendo derrotados pelo critério deste mundo. Para melhorar a comunidade e o mundo temos que ter coragem de nos converter. Sem a conversão nada mudará e seremos um fator de destruição da comunidade.


O caminho da conversão pascal começa com o símbolo da Cinza e terminará na Vigília Pascal com o símbolo do fogo, a água e a luz. É uma unidade dinâmica que quer comprometer a cada cristão em seu seguimento de Cristo e comunicar-lhe a graça pascal. Com a renúncia de tudo que não é de Deus chegaremos à nova existência de ressuscitados. O homem velho deve dar lugar para o homem novo.


A cinza nos fala de nossa fragilidade, de nossa condição humana: mortal e pecadora. Mas as palavras que acompanham iluminam o rito e elevam nosso olhar: “Convertei-vos e crede no Evangelho”. Assim pois, a cinza nos convence da necessidade do Evangelho, da necessidade de aceitar e crer na Boa Notícia. É um Evangelho que nos salva da fragilidade e da morte. Por isso é Boa Notícia. É um Evangelho capaz de transformar nossa cinza em luz. Hoje nos impomos a cinza para propiciar nossa conversão e para nos ajudar a crer mais no Evangelho. Hoje nos impomos a cinza para nos convencer de que nossa própria cinza pode ser redimida e ressuscitada, cinza iluminada, cinza consagrada. A imposição da cinza eleva nosso espirito para a realidade eterna, para Deus que é o princípio e o fim, o Alfa e o Ômega de nossa existência (cf. Ap 21,6).


Neste sentido a Quaresma nos convida a praticar o espirito da penitência no sentido de elevar nosso espirito, libertando-nos do mal e fazendo passos para a plenitude da vida. Penitência serve, então, como remédio, como reparação, como mudança de mentalidade para nos dispor à fé e à graça. Portanto, a penitência expressa nosso compromisso no seguimento de Cristo.


As três leituras de hoje expressam claramente o programa de conversão que Deus quer de cada um de nós na Quaresma: convertei-vos e crede no Evangelho; convertei-vos a Mim de todo coração; misericórdia, Senhor, porque pecamos; deixai-vos reconciliar com Deus; Deus é compassivo e misericordioso...


Cada um de nós, a comunidade e a sociedade inteira, necessita ouvir esta chamada urgente à mudança pascal, porque todos nós somos débeis e pecadores, e porque sem nos dar conta, nós vamos continuar sendo vencidos pelos critérios deste mundo que não são precisamente os de Cristo.


Há a triple direção desta conversão que aponta o Evangelho para nos ajudar a reorientarmos nossa vida para a Páscoa. Primeiro, é a abertura aos demais através da esmola que é, antes de tudo, caridade, compreensão, amabilidade, perdão e assim por diante. Segundo, a abertura a Deus, que é escuta da Palavra, oração pessoal e familiar, participação mais ativa e frequente na Eucaristia e o sacramento da Reconciliação. Terceiro, o jejum, que é autocontrole, busca de um equilíbrio em nossa escala de valores, renúncia à coisas supérfluas, sobretudo, se expressa na ajuda aos necessitados.


Cinza E Seu Significado Para Nossa Vida


Hoje, para encontrar a rota, é-nos oferecido um sinal: cinzas na cabeça. É um sinal que nos faz pensar naquilo que trazemos na cabeça. Frequentemente, os nossos pensamentos seguem coisas passageiras, coisas que vão e vêm. Os grãos de cinza que receberemos pretendem dizer-nos, com delicadeza e verdade: de tantas coisas que trazes na cabeça, atrás das quais corres e te afadigas diariamente, nada restará. Por mais que te afadigues, não levarás contigo qualquer riqueza da vida. As realidades terrenas dissipam-se como poeira ao vento. Os bens são provisórios, o poder passa, o sucesso declina. A cultura da aparência, hoje dominante e que induz a viver para as coisas que passam, é um grande engano. Pois é como uma fogueira: uma vez apagada, ficam apenas cinzas. A Quaresma é o tempo para nos libertarmos da ilusão de viver correndo atrás de pó. A Quaresma é descobrir que somos feitos para o fogo que arde sempre, não para a cinza que imediatamente se some; para Deus, não para o mundo; para a eternidade do Céu, não para o engano da terra; para a liberdade dos filhos, não para a escravidão das coisas. Hoje podemos interrogar-nos: De que parte estou? Vivo para o fogo ou para as cinzas?” (Papa Francisco: Quarta-feira, 6 de março de 2019).


O significado simbólico da cinza está ligado com sua semelhança com o pó e com o fato de que ela é o resíduo frio e ao mesmo tempo purificado da queima após a extinção do fogo. Por isso, em muitas culturas ela é símbolo da morte, da transitoriedade, do arrependimento e da penitência, mas também da purificação e da ressurreição. Para expressar luto, os gregos, os egípcios, os judeus, os árabes e as tribos primitivas espalhavam cinzas sobre a cabeça ou assentavam-se ou rolavam-se sobre as cinzas (alguns textos bíblicos para entender o que foi dito: Gn 18,27; Jó 2,8;13,12; Is 44,20;61,3; Jr 6,26; Ez 27,30; Lm 3,16;2Sm 13,19;J n 3,6; Mt 11,21). O homem expressa com isso (cf. Gn 18,27) a consciência da relativa nulidade da criatura diante do Criador. 


Ao recebermos as cinzas ouvimos uma das fórmulas usadas: “Tu és pó, e em pó te hás de tornar” (Gn 3,19). A cinza recorda ao homem o reconhecimento de sua origem. A cinza é leve e por isso, ela é a imagem das coisas frágeis e efêmeras. Tudo é caduco. E toda a vaidade, todo o brilho falso e esta vida mortal, um dia conhecerão um fim. Recebemos as cinzas para nos relembrar de que somos pó; é uma lembrança de que somos pó, de que não temos morada certa neste mundo, de que a morte é a única realidade inevitável no futuro de nossa existência. Na verdade, não é a morte que é absurda e sim a vida sem a morte. Muitos se esquecem da morte e por isso, acabam vivendo absurdamente e acabam vivendo somente em função do prazer. Como foi dito uma vez, quem vive em função do prazer, não tem prazer de viver. O prazer deve ser resultado de um viver bem. E para nós cristãos viver bem significa viver de acordo com os valores cristãos. A cinza é uma lembrança incômoda para quem acredita que o presente histórico é absoluto. Mas esta lembrança, na verdade, nos ajuda a vivermos bem, a colocarmos as coisas no seu devido lugar para ganhar seu justo valor e sua justa perspectiva.


Com as cinzas recebidas o homem experimenta o próprio nada. Para expressá-lo, cobre-se de cinza. Quando o homem experimenta o seu nada, não há lugar nele para a arrogância. Ao contrário, ele volta a ser humilde: humus, pó, criatura dependente de Deus. Quando vivemos a humildade que é a nossa própria existência o poder e a glória mundanos não vão nos atingir. Mas quando o homem deixar de reconhecer sua condição de criatura, querendo igualar-se a Deus, ele se tornará um pó morto e por isso, terá que voltar à terra de que fora tirado, “porque és pó, em pó te hás de tornar” (Gn 3,19).


E somente quando o homem reconhece que é pó, que faz parte da terra, e que tudo o mais provém de Deus, brotará novamente a vida desse pó. E certamente as cinzas usadas na Quarta-feira de Cinzas provêm das palmas do Domingo de Ramos do ano anterior, palmas triunfais do Cristo vitorioso sobre o pecado e a morte. Cristo, morrendo, deu nova vida à terra, conquanto o homem se reconheça como terra, pó. A quem assim confessa o próprio nada faz-se ouvir a promessa de Jesus Cristo que vem triunfar do pecado e da morte, consolar os aflitos e dar-lhes, em lugar de cinzas, um diadema, uma coroa de um rei.


Ao receber as cinzas, o cristão testemunha o absoluto de Deus em sua vida. E como consequência da profissão sobre o absoluto de Deus, o cristão relativiza todas as coisas. Isto quer dizer que as coisas somente têm seu valor em relação ao seu Criador. Sob o sinal das cinzas, o cristão reafirma hoje a sua liberdade de filho de Deus e ao mesmo tempo reafirma sua condição como pó ou criatura e que só pode sobreviver como tal por causa da misericórdia de Deus. E Deus não tem como não ajudá-lo, pois o ser humano foi feito de acordo com a própria imagem de Deus (cf. Gn 1,26). Devemos ler, portanto, as três práticas de piedade apresentadas através do evangelho deste dia que abre nossa caminhada quaresmal.


Hoje, todos nós somos convidados a reconhecer nossa fraqueza. Quanta distância existe entre nós e o Evangelho, entre nós e a vida de fidelidade, totalmente entregues, de Jesus! Hoje somos convidados a ser sinceros, de verdade, com nós mesmos. Se nos colocarmos diante de Deus, não podemos nos gloriar em nada.


Hoje, somos convidados a ser sinceros. Neste começo da Quaresma, temos de ter um olhar introspectivo e reconhecer o nosso pecado. E, ao mesmo tempo, olhemos para Deus, nosso Pai, e reafirmemos nossa confiança em seu amor. Hoje, a imposição das cinzas em nossa cabeça será esse sinal de reconhecimento. Será como dizer: somos fracos, somos pecadores, mas nosso Deus é o Pai misericordioso e por isso, posso voltar a Ele.


A leitura do Evangelho quer responder a seguinte pergunta: “Como agradar a Deus?”. A prática da esmola, da oração e do jejum tem finalidade de sintonizar-nos com a vontade do Pai, de forma a preparar-nos da melhor maneira possível, para a celebração da Páscoa.


Jesus enuncia o princípio geral sobre a prática dessa piedade. Estas obras de piedade não se devem praticar para ganhar prestígio diante dos homens e com isso, adquirir posição de poder ou privilégio. Os que fazem assim privam-se da comunicação divina, cessa a relação de filho-Pai com Deus. Segundo Jesus, ninguém merece a graça de Deus se ele finge executar ação que não corresponde à atitude interior que ele chama de hipocrisia.


 A esmola (vv.1-4)


A linguagem utilizada por Mt nesta passagem e nas outras duas seguintes revela uma forte polêmica entre cristãos e judeus. Os hipócritas são os fariseus do tempo do evangelista que praticavam e queriam impor aos outros um cumprimento externo da Lei de Moisés. Segundo Jesus aos quer querem entrar no Reino dos céus devem cumprir a vontade do Pai sem ostentação.


A expressão utilizada por Mt para descrever esta atitude e comportamento (praticar a justiça) somente aparece neste evangelho (sete vezes. Cinco delas se encontram em Mt 5-7) e tem uma grande importância para a teologia de Mt. Mas não se trata da justiça como a entendemos. Quando se fala da justiça nos círculos judaicos trata-se do conjunto de atos que fazem o homem merecedor da salvação. Entre os fariseus do tempo de Jesus estes atos de piedade eram fundamentalmente três: a esmola, a oração e o jejum. Mas para muitos estas práticas se tornavam uma questão puramente externa e um motivo de orgulho, até o ponto de que alguns faziam exibição pública de sua religiosidade (justiça).


Os profetas do AT falam frequentemente do dever da compaixão para com o pobre, mas eles acentuam muito mais a justiça do que a caridade. O mendigo ou o pobre é acusação de um sistema injusto que gera pobres e miseráveis, dependentes da “bondade” alheia.  Mendigo é o fruto de uma sociedade que não quer partilhar seus bens para os outros (Mas de outra lado, certo mendigo é aquele que quer uma vida fácil, pois pela experiência, muitos não querem trabalhar, apesar de alguém oferecer-lhe trabalho. Mas eles são apenas um grupo pequeno).


A esmola deve ser expressão da misericórdia que existe no coração de quem se faz solidário com a carência alheia. A solidariedade acontece quando o homem tem compaixão, quando sente na própria pele o sofrimento alheio. O que sobra para nós, por pouco que seja, sempre faz falta para os outros que não tem nada. Mas sempre ficamos incomodados, pois sabemos que isso nunca resolverá completamente o problema do mendigo ou do pobre. Mas a esmola é um sinal, um lembrete de que devemos lutar por um sistema econômico que realmente faça uma partilha justa dos bens. Reflitamos as palavras de São Basílio (+ 379): Ao faminto pertence o pão que guardas. Ao homem nu, o manto que guardas até nos teus cofres. Ao que anda descalço, o calçado que apodrece em tua casa. Ao miserável, o dinheiro que guardas escondido. É assim que vives oprimindo tanta gente que poderias ajudar”. E Santo Agostinho acrescenta: “O Senhor te fez servo bom, mas tu criaste em teu coração um mau senhor. Ficas alegres por causa da riqueza do cofre e não te lamentas pela pobreza de teu coração? Há acréscimo em tua arca, mas observa bem o que diminui em teu coração”.


O próprio Jesus menciona a esmola para censurar a ostentação (cf. Mt 6,22ss). Isso devemos começar dentro de nossa família. Enquanto isso não acontece, ficamos incomodados.


Ao dar a esmola Jesus pede a separação da pessoa quem a dá do seu gesto: “...a tua mão esquerda ignore aquilo que faz a direita...E o teu Pai...dar-te-á a recompensa” (vv.3-4). O resultado do bem fica escondido ao homem que recusa de ser o juiz de seus atos.  O único capaz de apreciar é um Deus invisível que habita no segredo e não presta conta a ninguém. Um dito popular diz: “Se você fizer um benefício, nunca se lembre dele; se receber um, nunca se esqueça dele”. A vida vivida apenas para satisfazer a própria pessoa nunca satisfaz ninguém. Não há melhor exercício para fortalecer o coração do que estender o braço para baixo e erguer pessoas. A bondade é o único investimento que nunca falha.


 A oração (vv5-6)


A instrução sobre a oração (vv.5-15) é a mais extensa das três práticas de piedade judaica e está situada no centro literário do Sermão da Montanha. Esta instrução é composta por uma introdução sobre a forma de orar (vv.5-8), o Pai-Nosso (vv.9-13) e uma conclusão que fala do perdão (vv.14-15).


Através deste texto Mt quer fazer uma catequese sobre a oração cristã, semelhante a de Lc (Lc 11,1-11), mas cada um dos dois evangelistas se dirige a um grupo distinto. Lc escreve para uma comunidade que necessita aprender a orar. Mt, ao contrário, escreve para uma comunidade que já sabe orar, mas necessita aprender a fazer a oração de outra maneira (“Quando orardes, não sejais como os hipócritas...” v.5.7). Lc tem diante de si uma comunidade de origem pagã que não tem hábito de orar (será que viraremos pagãos se pararmos de orar?). Mt, ao contrário, está diante de uma comunidade onde há bastantes judeus que haviam aprendido a orar três vezes por dia desde sua infância.


Mt enfrenta um problema em relação à prática de oração. A oração como as demais práticas religiosas os fariseus convertem em um motivo de ostentação e em uma prática pura externa. A oração não é mais um momento de falar com Deus, mas serve de instrumento para alcançar honra e prestígio diante dos homens.


Mt convida os cristãos a recuperar o sentido religioso da oração, purificando-a daquilo que há desviado a oração de seu fim. Para Mt a oração do cristão deve estabelecer um relacionamento íntimo com o Pai: “...entra no teu quarto, fecha a porta, e reza ao teu Pai” (v.6a), num clima de abandono e confiança em Deus: “O Pai de vocês já conhece as necessidades que vocês têm” (v.8). Os cristãos devem orar como Jesus orava. E o estilo desta oração é condensado na oração do Pai-Nosso (vv.9-13).


Uma das principais raízes da vida cristã que nos ajuda a sugar a energia inesgotável do amor divino é a prática da oração. Nossa oração deve ser discreta, vivida na intimidade de nosso coração, repleta de silêncio capaz de perceber as insinuações do Espírito Santo. Mas só se cresce na vida de oração, reservando a ela, diariamente, o mesmo tempo, pelo menos, que reservamos às refeições que nutrem o nosso corpo.


O Jejum


Sobre o jejum Mt utiliza o mesmo esquema literário que há utilizado nas duas instruções anteriores (quando...não façam como os hipócritas: v.2.5.16). Como já foi refletido no domingo anterior, o jejum era uma prática estendida entre os grupos religiosos ao redor de Jesus (Mt 9,14). Os fariseus jejuavam duas vezes por semana (Lc 18,12).


Mt relata que Jesus praticou o jejum para preparar-se antes de exercer sua missão (Mt 4,12). E a comunidade de Mt praticava o jejum (Mt 9,15), mas Mt quer dar um sentido novo a esta prática, evitando toda a ostentação exterior.   


Com o jejum evitamos que os bens deste mundo não nos escravizem. Faz uso deles para o bem próprio e do próximo, e neles degusta o Bem maior que é Deus. Jejuar, então, significa abster-se de alimento, tomar uma atitude de respeito e de liberdade diante das coisas, fazer espaço para os outros e para Deus, confiar na providência de Deus; constituir um ato de conversão a Deus através das coisas. Neste tempo quaresmal devemos aprender a morrer com Cristo para renascer com ele. Com a ajuda de sua graça, devemos combater tudo aquilo que, na nossa vida, impede o nascimento do homem novo anunciado pelo Evangelho: nossas tendências burguesas, nossos pequenos apegos, o comodismo ou o medo que nos impedem uma atuação mais eficaz, nosso farisaísmo em só querer fazer aquilo que nos dá vantagem ou prestígio, nosso vício/nossa dependência da TV ou do mundo virtual como a internet etc.


Muita gente acha que a quaresma é apenas um tempo em que não se come carne às sextas-feiras. No Brasil a grande maioria não come carne em dia nenhum não por causa de dieta ou por questão de saúde, mas porque não tem condição para comprar carne. Por isso, aqueles que não passam necessidade, devem mesmo por uma questão de solidariedade aos necessitados, privam-se de carne ou de outras coisas.


O jejum que agrada a Deus, diz o profeta Isaías (Is 58,1-14) é quebrar as cadeias injustas, libertar os oprimidos, realizar a justiça.


A quaresma, neste sentido, é o tempo em que reassumimos a nossa vida cristã com um engajamento efetivo de transformação do mundo em vista do Reino de Deus.


Hoje a liturgia nos convida a reconhecer nossa fraqueza ou debilidade. Quanta distância existe entre nós e o Evangelho, entre nós e a vida de fidelidade, totalmente, entregue de Jesus! Hoje, se olharmos para nós mesmos, em nosso modo de viver, agir, brotará das profundezas de nossos corações as palavras que rezamos no Salmo Responsorial: “Tende piedade, ó meu Deus, misericórdia! Na imensidão de vosso amor, purificai-me! Lavai-me todo inteiro do pecado e apagai completamente a minha culpa!”


Hoje somos convidados a ser sinceros, verdadeiramente, com nós mesmos. Se nos colocarmos diante de Deus, não poderemos nos gloriar em nada. Quanto nossos desejos e interesses nos dominam! Quantos desejos que temos que impõem nossos critérios e nossa vontade! Que pouca capacidade de renunciar (de dinheiro, tempo, tranquilidade) para o serviço dos outros! Quão pouco nos esforçamos para compreender os que não pensam como nós. Quão pouco temos rezado! Hoje Jesus me convida a rezar mais, a fazer mais caridade e a me controlar mais. Tudo isso deve ser meu programa para esta quaresma para poder experimentar a vida glorificada, a vida pascal.
P. Vitus Gustama,SVD

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