terça-feira, 19 de novembro de 2024

Apresentação de Nossa Senhora-Memória, 21/11/2024

FESTA DA APRESENTAÇÃO DE NOSSA SENHORA

SER MEMBRO DA FAMÍLIA DE JESUS CRISTO

Primeira Leitura: Zc 2,14-17

 

14 “Rejubila, alegra-te, cidade de Sião, eis que venho para habitar no meio de ti, diz o Senhor. 15 Muitas nações se aproximarão do Senhor, naquele dia, e serão o seu povo. Habitarei no meio de ti, e saberás que o Senhor dos exércitos me enviou a ti. 16 O Senhor entrará em posse de Judá, como sua porção na terra santa, e escolherá de novo Jerusalém. 17 Emudeça todo mortal diante do Senhor, ele acaba de levantar-se de sua santa habitação”. 

Evangelho: Mt 12, 46-50

Naquele tempo, 46 enquanto Jesus estava falando às multidões, sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, procurando falar com ele. 47 Alguém disse a Jesus: “Olha! Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar contigo”. 48 Jesus perguntou àquele que tinha falado: “Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?” 49 E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse: “Eis minha mãe e meus irmãos. 50 Pois todo aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.

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A Apresentação de Nossa Senhora confunde-se, às vezes, com a Apresentação de Menino Jesus no Templo, festa que é celebrada no dia 2 de Fevereiro em comemoração de um fato amplamente descrito nos Evangelhos e que corresponde à lei judaica que obrigava aos israelitas a oferecer seus primogênitos a Deus.

Hoje especificamente celebramos a memória da Aparesentação de Nossa Senhora. Esta festa começou a ser celebrada na Igreja oriental, que sempre foi muito sensível à piedade mariana mais ou menos desde o século VI e oficialmente em 1143. Tardiamente foi incorporada ao calendário ocidental, romano, em 1472 pelo papa Sisto IV (governou de 9 de agosto de 1471 até 12 de agosto de 1484). Na verdade desde o século XII esta festa já se celebrava no Sul da Itália e em alguns lugares na Inglaterra.

A apresentação de Nossa Senhora não é narrada nos evangelhos (canônicos). Ela é uma tradição muito antiga (Evangelho Apócrifo do século II: Evangelho apócrifo de São Tiago). Segundo esta tradição (Apócrifo), os pais de Maria, Joaquim e Ana, piedosos israelitas, não conseguiram ter filhos até sua idade avançada por causa da esterilidade. Não ter filhos significava, na época, o castigo de Deus pelos pecados cometidos. Mas os dois eram justos. Em sua angústia Ana fez uma oração fervorosa, prometendo ao Senhor oferecer-lhe o fruto de suas entranhas se lhe concedesse descendência. O nascimento de Nossa Senhora foi o resultado dessa oração e dessa promessa: “Ó Deus de nossos pais, abençoa-me e ouve minha oração como abençoaste o ventre de Sara, dando-lhe um filho, Isaac”, assim Ana,  mãe de Maria rezava (Apócrifo de Tiago, 2,1). Quando se retirou para o deserto durante quarenta dias e quarenta noites Joaquim, pai de Maria, dizia para si mesmo: “Não descerei nem para comida, nem para bebida, enquanto o Senhor não me visitar; a minha oração será para mim comida e bebida” (cf. Apócrifo de Tiago 1,4). Joaquim e Ana, fiéis ao seu voto, apresentaram a menina quando tinha três anos no templo e permanecia, no templo, dedicada à oração até seu casamento com José (cf. Evangelho apócrifo de São Tiago 7,1-8,1). Os pais de Maria No protoevangelho de Tiago lemos: “Quando a menina completou três anos, Joaquim disse:Chamai as meninas dos hebreus que não tenham qualquer mancha e tome cada uma delas uma lâmpada, uma lâmpada que não se apague. A menina não deverá voltar atrás e o seu coração não permanecerá fora do Templo do Senhor’. Elas obedeceram àquela ordem e foram juntas ao Templo do Senhor. E o sacerdote acolheu a menina, tomou-a nos braços e abençoou-a dizendo: ‘O Senhor glorificou o teu nome em todas as gerações. Em ti, nos últimos dias, revelará a redenção que concede aos filhos de Israel’. E mandou sentar a menina no terceiro degrau do altar. E o Senhor encheu-a de graça e ela dançou e tornou-se querida por toda a casa de Israel. Os seus pais deixaram o Templo cheios de admiração, louvando a Deus: a menina não procurou voltar atrás. E permaneceu no Templo do Senhor, semelhante a uma pomba, e a mão de um anjo oferecia-lhe o alimento(Protoevangelho de Tiago 7, 2-8,1).

A apresentação de Nossa Senhora é a festa de entrega voluntária a Deus. É a festa da total entrega da Virgem Maria a Deus e da sua plena dedicação aos planos divinos. A Virgem Maria nunca negou nada a Deus. Sua correspondência à graça divina e às moções do Espirito Santo foi sempre plena.  É a festa que nos ensina a renunciar a nossa própria vontade a fim de fazer somente a vontade de Deus para formar uma família com Deus e ser instrumento divino para levar os outros para Deus: “Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”, diz Jesus (Mt 12,50).

Maria se apresentou a Deus em sua infância, e antes de sua obediência ela colocou sua alma na postura de humilde disponibilidade que foi característica constante de sua vida e que ela mesma resumiu numa frase cujo conteúdo não se esgotará jamais por muito que se medite: “Eis aqui a serva do Senhor!”.

A Apresentação de Nossa Senhora é a festa da entrega voluntária a Deus, é a festa dos que aspiram de verdade a renunciar a sua vontade para fazer somente a vontade do Senhor. E para os consagrados e as consagradas na vida religiosa e muitas ordens religiosas, geralmente, renovam seus votos neste dia. No entanto, também deve ser a festa de todos os cristãos, porque ninguém, se eles realmente querem ser, pode escapar da obrigação de se apresentar humildemente diante de Deus e colocar-se em Suas mãos para que Deus possa tranformá-los em instrumentos eficazes para salvar a humanidade, a partir dos dons recebidos. A liturgia de hoje nos convida, então, a meditarmos sobre o sentido de uma apresentação de nós mesmos diante do Senhor. nossa própria presença diante do Senhor, em cada celebração, se converte em apresentação de nossa vida ao Senhor para que Ele nos use para o bem da humanidade.

Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a Vossa Palavra é o resumo da entrega total de Maria à vontade de Deus. é uma entrega voluntária. Por isso, não podemos imaginar que Maria seja uma mulher passiva, imóvel e submissa. Ela é corajosa, valente e revolucionária. E sua força vem de Deus. Ela se compromete a partir de sua própria liberdade e libertação com a libertação de Deus. Quem é devoto de Maria deve ser uma pessoa valente, corajosa e revolucionária como Maria. “Para Deus e com Deus nada é impossível”.

Serva é aquela que está totalmente à disposição do seu senhor. Maria se submete totalmente à vontade e à sabedoria divina. Ela segue o ritmo de Deus, segundo seu projeto de amor. Por isso, Maria é a mulher crente, a melhor discípula de Jesus, a primeira cristã. O “sim” de Maria à Palavra de Deus, desd a infância, expressa seu total compromisso, sua absoluta confiança no amor e no poder de Deus - que a faz sair de si mesma - e pendura toda sua vida na Palavra de Deus, porque ela acredita que Deus nunca falha. Maria está totalmente vazia de si mesma e de toda sombra de egoísmo, para deixar Deus encher totalmente seu coração, o que dá sentido à sua vida. É uma fé que se traduz em doação completa de si mesma ao Pai (Lc 1,38) para colaborar na salvação da humanidade. Por estar totalmente cheia de Deus, ela se torna um bem para a humanidade.

Quantas vezes Deus se comunica conosco, mas a sua Palavra não penetra em nós. Por que isso acontece? Com toda a agitação e barulho ao nosso redor ou dentro de nosso coração temos muita dificuldade em parar para escutar a voz interior, a voz de Deus. Certamente a vida equilibrada e com sentido começa com a criação de um espaço interior, no qual a pessoa vai juntando os acontecimentos e procura seu sentido e com certeza pode perceber os sinais de Deus na vida.

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O oráculo de Zacarias proclama a presença de Deus no Templo e transmite a Palavra do próprio Deus. A presença salvadora de Deus no meio do povo, no Templo é o motivo de alegria para todos os repatriados da Babilônia. Judá voltará a ser a herança do Senhor. “Emudeça todo mortal diante do Senhor, ele acaba de levantar-se de sua santa habitação”, assim concluiu a Primeira Leitura de hoje. O contexto dessa conclusão é litúrgico no Templo. Toda a alegria do profeta Zacarias celebrando o futuro triunfo e glória de Israel, nos a vemos espiritualmente no coração de Maria, Virgem Imaculada, que sente dentro de si a presença do Senhor que virá para habitar no seu ventre e dará ao mundo como Salvador.

O evangelho fala da presença de Maria, implicitamente, no lugar em que Jesus e suas Palavras fazem a apresentação da identidade de quem Ele considera sua autêntica família, na qual Maria, sua mãe é um exemplo pelo seu Fiat, seu “Faça-se em mim segundo Sua Palavra”, por ser “Serva do Senhor”.

No texto do evangelho deste dia, onde os familiares de Jesus não são mencionados por seus nomes, “a mãe”, aqui, representa Israel enquanto origem de Jesus e “os irmãos” representam também Israel enquanto membros do mesmo povo. Israel fica “fora” em vez de se aproximar de Jesus. Jesus rompe sua vinculação de seu povo de origem para formar uma nova família com os que se associam com o compromisso de formar uma comunidade de irmãos vivendo o amor fraterno (ágape) como maior mandamento (cf. Jo 13,34-35; 15,12).

A maior parte das religiões do mundo se apóia na família, comunidade natural. Jesus edifica sua religião ou sua comunidade não sobre as relações familiares e sim sobre uma comunidade de tipo seletivo em virtude da fé para elevar a família humana para a família de Deus. Para divinizar a família humana é preciso que Deus seja de todos e centro da vida e de qualquer convivência (família, comunidade, grupos etc.). Os membros da Sagrada Família de Nazaré são unidas pela Palavra de Deus obedecida e vivida no cotidiano: Maria, através de seu Fiat; José através da obediência à Palavra de Deus; Jesus é a Própria Palavra de Deus (Jo 1,1-3.14).

A evolução do mundo técnico tende a tirar o homem de suas comunidades naturais para submergi-lo em comunidades mais “artificiais” ou “mais seletivas”. Por isso, a família vive, muitas vezes, de maneira dramática o conflito das gerações que caracteriza a nossa época. Os pais rezam melhor em companhia de seus amigos do que em família, com seus filhos e familiares. Mas se todos se preocuparem com a vontade de Deus ao praticar o bem, ao viver o amor fraterno, o único que nos edifica, humaniza e diviniza, acabarão salvar a comunidade natural que é a família humana. Por isso, Jesus afirma hoje: Todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt 12,50). Trata-se de uma família ou uma comunidade de Deus, e por isso, de uma comunidade de salvação.

Jesus, por sua encarnação, entrou no mundo e formou parte de nossa humanidade, de uma verdadeira humanidade, com os laços de sangue e de cultura e cresceu em uma família. Ele se tornou humano para nos divinizar. Ele nasceu numa família para santificar a família. Ele viveu em um país determinado, Palestina; tinha uma mãe, Maria. Essas realidades humanas têm grande importância, constituem realmente o lugar de nossa vida.

“Quem é minha mãe? Quem são meus irmãos?”, pergunta Jesus. A pergunta não significa um desprezo de Jesus aos seus parentes ou familiares. Ninguém amou Sua mãe melhor que Ele. E nenhuma mãe amou melhor seu Filho, Jesus Cristo, Deus-Conosco do que a própria Maria, a mãe de Jesus.

Com esta pergunta Jesus quer nos revelar algo muito importante: o discípulo, cada cristão, cada cristã que vive os ensinamentos de Jesus é um parente de Jesus. Jesus oferece aos homens a qualitativa intimidade de sua família. A família humana de Jesus viveu conforme a vontade de Deus: José que criou Jesus era chamado de “o justo”, aquele que vive segundo os mandamentos de Deus (cf. Mt 1,19). Maria, a Mãe de Jesus foi chamada pelo anjo de “cheia de graça” (cf. Lc 1,28) e ela viveu a vida conforme a vontade de Deus: “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a Tua palavra” (Lc 1,38).  Por isso, a família humana de Jesus serve de exemplo para todas as famílias humanas. Que é possível formar uma família de Deus nesta terra quando Jesus se torna centro de todos e quando todos vivem de acordo com a Palavra de Deus. A única maneira de salvar a família humana é transformá-la em família de Deus, família que vive de acordo com os mandamentos de Deus.

Entre Deus e os homens já não há somente relações frias de obediência e de submissão como entre o patrão e o empregado. Com Jesus entramos na família divina, como seus irmãos e irmãs, como sua mãe. Se em todos os meus atos e atitudes de cada dia, se em todos os minutos de minha vida procurar me manter unido a Deus na vivência do amor fraterno, serei irmão de Jesus, farei parte da família de Deus desde aqui na terra junto aos outros irmãos e irmãs no mundo inteiro que fazem a mesma coisa.

Todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”. Esta frase deve servir de orientação para nossa vida diária. É lindo e desejável ter um lar, um aconchego. É o sonho de todos. É o desejo de qualquer coração. Ter um lar é um sonho vivo de qualquer ser humano. No lar podemos descansar, conviver amorosamente e estar juntos como pessoas amadas. Mas é preciso incluir Jesus como membro de nosso lar e nós como membros do lar do Senhor. Somente assim nosso lar na terra se transformará em céu antecipado onde há paz e amor, segurança e alegria, festa e descanso. Nosso ler definitivo no céu deve começar desde já aqui na terra tendo Jesus como membro de nossa família e nós, da família de Jesus. A disponibilidade de Maria diante da Palavra e do desígnio divino nos indicam o grado máximo que devemos aspirar no serviço da Palavra divina: “Faça-se em mim segundo a sua Palavra” (Lc 1,38).

Reflita:

Ó Deus de nossos pais, abençoa-me e ouve minha oração como abençoaste o ventre de Sara, dando-lhe um filho, Isaac”, assim Ana,  mãe de Nossa Senhora, rezava (Apócrifo de Tiago, 2,1).

Não descerei nem para comida, nem para bebida, enquanto o Senhor não me visitar; a minha oração será para mim comida e bebida”, disse Joaquim, pai de Nossa Senhora (cf. Apócrifo de Tiago 1,4).

Por acaso não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que estão clamando por Ele dia e noite? ... Digo-vos que em breve Deus lhes fará justiça (Lc 18,7-8).

P. Vitus Gustama,svd

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

20/11/2024-Quartaf Da XXXIII Semana Comum

OS DONS DE DEUS SÃO DADOS PARA SEREM MULTIPLICADOS

Quarta-Feira da XXXIII Semana Comum

Primeira Leitura: Ap 4,1-11

Eu João, 1vi uma porta aberta no céu, e a voz que antes eu tinha ouvido falar-me como trombeta, disse: “Sobe até aqui, para que eu te mostre as coisas que devem acontecer depois destas”. 2I mediatamente, o Espírito tomou conta de mim. Havia no céu um trono e, no trono, alguém sentado. 3Aquele que estava sentado parecia uma pedra de jaspe e cornalina; um arco-íris envolvia o trono com reflexos de esmeralda. 4Ao redor do trono havia outros vinte e quatro tronos; neles estavam sentados vinte e quatro anciãos, todos eles vestidos de branco e com coroas de ouro nas cabeças. 5Do trono saíam relâmpagos, vozes e trovões. Diante do trono estavam acesas sete lâmpadas de fogo, que são os sete espíritos de Deus. 6Na frente do trono, havia como que um mar de vidro cristalino. No meio, em redor do trono, estavam quatro Seres vivos, cheios de olhos pela frente e por detrás. 7O primeiro Ser vivo parecia um leão; o segundo parecia um touro; o terceiro tinha rosto de homem; o quarto parecia uma águia em pleno voo. 8Cada um dos quatro Seres vivos tinha seis asas, cobertas de olhos ao redor e por dentro. Dia e noite, sem parar, eles proclamavam: “Santo! Santo! Santo! Senhor Deus Todo-Poderoso! Aquele que é, que era e que vem!” 9Os Seres vivos davam glória, honra e ação de graças ao que estava no trono e que vive para sempre. 10E cada vez que os Seres vivos faziam isto, os vinte e quatro anciãos se prostravam diante daquele que estava sentado no trono, para adorar o que vive para sempre. Colocavam suas coroas diante do trono de Deus e diziam: 11“Senhor, nosso Deus, tu és digno de receber a glória, a honra e o poder, porque tu criaste todas as coisas. Pela tua vontade é que elas existem e foram criadas”.

Evangelho: Lc 19,11-28

Naquele tempo, 11 Jesus acrescentou uma parábola, porque estava perto de Jerusalém e eles pensavam que o Reino de Deus ia chegar logo. 12 Então Jesus disse: “Um homem nobre partiu para um país distante, a fim de ser coroado rei e depois voltar. 13 Chamou então dez dos seus empregados, entregou cem moedas de prata a cada um e disse: ‘Procurai negociar até que eu volte’. 14 Seus concidadãos, porém, o odiavam, e enviaram uma embaixada atrás dele, dizendo: ‘Nós não queremos que esse homem reine sobre nós’. 15 Mas o homem foi coroado rei e voltou. Mandou chamar os empregados, aos quais havia dado o dinheiro, a fim de saber quanto cada um havia lucrado. 16 O primeiro chegou e disse: ‘Senhor, as cem moedas renderam dez vezes mais’. 17 O homem disse: ‘Muito bem, servo bom. Como foste fiel em coisas pequenas, recebe o governo de dez cidades’. 18 O segundo chegou e disse: ‘Senhor, as cem moedas renderam cinco vezes mais’. 19 O homem disse também a este: ‘Recebe tu também o governo de cinco cidades’. 20 Chegou o outro empregado e disse: ‘Senhor, aqui estão as tuas cem moedas que guardei num lenço, 21 pois eu tinha medo de ti, porque és um homem severo. Recebes o que não deste e colhes o que não semeaste’. 22 O homem disse: ‘Servo mau, eu te julgo pela tua própria boca. Tu sabias que eu sou um homem severo, que recebo o que não dei e colho o que não semeei. 23 Então, por que tu não depositaste meu dinheiro no banco? Ao chegar, eu o retiraria com juros’. 24 Depois disse aos que estavam aí presentes: ‘Tirai dele as cem moedas e dai-as àquele que tem mil’. 25 Os presentes disseram: ‘Senhor, esse já tem mil moedas!’ 26 Ele respondeu: ‘Eu vos digo: a todo aquele que já possui, será dado mais ainda; mas àquele que nada tem, será tirado até mesmo o que tem. 27 E quanto a esses inimigos, que não queriam que eu reinasse sobre eles, trazei-os aqui e matai-os na minha frente’”. 28 Jesus caminhava à frente dos discípulos, subindo para Jerusalém.

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Deus Onipotente é Fiel Àqueles Que São Fieis à Sua Vontade Até O Fim Da Vida Terrena

A Primeira Leitura fala da visão do Trono de Deus. Entrando no céu, a primeira coisa que se vê, segundo o livro do Apocalipse é o Trono: “Eu João, vi uma porta aberta no céu, e a voz que antes eu tinha ouvido falar-me como trombeta, disse: “Sobe até aqui, para que eu te mostre as coisas que devem acontecer depois destas”. Imediatamente, o Espírito tomou conta de mim. Havia no céu um trono e, no trono, alguém sentado(Ap 4,1-2).

A visão que o autor contempla é de uma porta aberta nos céus. E uma voz convida o autor a subir: “Sobe até aqui, para que eu te mostre as coisas que devem acontecer depois destas”. A visão do céu aberto e Deus que convida a subir  para mostrar os seus desejos encontra uma fundamentação na tradição bíblica. No Êxodo, Moisés é convidado a subir o Monte Sinai para receber de Deus as revelações e instruções para o povo (Ex 19,20.24). O profeta Daniel recebe dos céus as revelações e interpretações para os sonhos de Nabucodonosor (Dn 2,27-28).

Para captar as mesnagens de Deus é preciso sairmos da rotino para “subir” até Deus na nossa meditação da Palavra de Deus diariamente. Subir” é uma chamada para a própria superação, pois supõe a existência de muito fôlego. Sempre podemos nos superar. O caminho da subida é o caminho que nos eleva e nos faz crescer, o que nos leva à transcendência. Somos chamados a subir à verdade mais plena, à fé mais pura, ao amor maior, ao desprendimento mais radical. Subir significa superar-se a si mesmo, transcender-se, ir adquirindo os critérios de Deus. Sempre podemos nos superar, sempre podemos, quando subimos com o Senhor. “Subir” é o processo simbólico de aproximação de Deus que se traduz na aproximação do irmão em necessidade.

Nesta subida o autor viu que “Havia no céu um trono e, no trono, alguém sentado” (Ap 4,1-2). O trono é a imagem da realeza e do poder. Trono é assento aparatoso onde os grandes personagens, como o Sumo Sacerdote, juizes, generais, governadores, reis exerciam sua autoridade (Gn 41,40; 2Sm 3,10; Neh 3,7; Sl 122,5; Jr 1,15; Mt 19,28). O rei, com grande pompa, se sentava no trono para as audiências, para julgar, para promulgar os decretos (1R 2,19; 7,7;22,10; 2Rs 11,19; Jonas 3,6).

Com frequência, o têrmino “Trono” simboliza a oniptência e o governo de Deus (Sl 9,5.8; Ez 1,26; Ap 1,4). O trono nos céus revela a transcendência. “A visão do trono é o pano de fundo para todo o Apocalipse, desde o início (1.4) até o fim (22.3). Esta visão revela a grandeza de Deus. Invisível do alto do trono, Deus dirige a última fase do seu plano, que começará agora (4,1). A visão do trono é como música tocada com muitos instrumentos. Começa muito suavemente, cresce e explode na exclamação: "Santo, Santo, Santo! Senhor! Deus Todo-Poderoso!" (4.8). O nome de Deus é proclamado. "ERA, É E VEM" (4,8). É o nome que vem do Êxodo: Javé, Deus conosco, Deus libertador! (Êx 3,14-15). Ao iniciar a última fase de seu plano de salvação, Deus mantém o mesmo nome com que iniciou a primeira etapa. E ele manterá seu nome até o fim (11,17). Deus não mudou! E não vai mudar” (Carlos Mestres).

A grandiosa apresentação da corte celestial inicia a série de visões que culminarão na visão final da nova Jerusalém. Uma linguagem colorida descreve a liturgia que acontece "noite e dia" diante do trono do Deus onipotente, localizado com grande majestade na abóbada do firmamento (“um mar de vidro cristalino” do v 6).

A afinidade entre a experiência do vidente (João) e as teofanias do Antigo Testamento é clara, tanto na estrutura da história quanto nas imagens utilizadas. João depende de Daniel (cap. 7), Ezequiel (cc. 1 e 10) e Isaías (cap. 6), lugares onde se fala das manifestações da glória do Senhor. Recordemos também a cena de Moisés no monte Horebe (Ex 3).

As imagens se sucedem, no estilo de profetas como Isaías, Ezequiel ou Daniel: o trono e aquele que está sentado nele, o arco-íris, os vinte e quatro anciãos com vestidos brancos e coroas em suas cabeças, as sete lâmpadas ou espíritos , o mar transparente como cristal, os quatro seres viventes que dia e noite cantam "Santo, Santo, Santo é o Senhor", e os anciãos respondem com mais hinos de louvor, lançando suas coroas aos pés daquele que está sentado no trono . Tudo isso com o som de trombetas e relâmpagos e o estrondo do trovão.

São João, como muitos de seus leitores da época, conhece a Bíblia de cor, e espontaneamente para expressar suas ideias ele recolhe imagens bíblicas, conhecidas de todos, como foi dito anteriormente. A página de hoje está cheia de símbolos tirados de Isaías 6,15... de Ezequiel 1,4-27... de Daniel 7,9-10.

Os quatro seres misteriosos têm a figura de um leão, um touro, um homem e uma águia: são símbolos que já apareceram no profeta Ezequiel, e que mais tarde a catequese dos Santos Padres aplicou estes símbolos aos quatro evangelistas:  Marcos: LEÃO (Apresenta a figura de João Batista como a VOZ que clama no deserto semelhante ao RUGIR de leão). Lucas: TOURO (Refere-se ao ofício de Zacarias. Como sacerdote oferecia sacrifícios. Jesus vem suprimir esses sacrifícios de animais). Mateus:  HOMEM-ANJO (Apresenta a genealogia humana de Jesus) e João:  ÁGUIA (É a altura de sua teologia como uma águia que voa alto).

O Apocalipse não é, acima de tudo, uma catástrofe. Pelo contrário, seu significado principal é "mensagem de esperança". Mas este livro foi escrito em meio à perseguição, entre Nero e Domiciano, em um contexto de crise violenta para a Igreja. A mensagem apocalíptica é, portanto, um estimulante: “Os cristãos, que lutam nas piores dificuldades, mantêm a confiança na onipotência de Deus, que prometeu salvar seu povo de todo mal!”

Eu João, vi uma porta aberta no céu, e a voz que antes eu tinha ouvido falar-me como trombeta, disse: ‘Sobe até aqui, para que eu te mostre as coisas que devem acontecer depois destas’”. Para alguns cristãos vacilantes na fé, preocupados com o futuro da Igreja, por causa da dureza da perseguição... João dirá que esta prova será apenas temporária: os perseguidores não vencerão, pois Deus terá a última palavra para a humanidade. Todas as imagens aqui acumuladas querem nos fazer apresentar visualmente a grandeza e a onipotência de Deus, Dono de tudo, pois Ele criou tudo o que era e é bom (Gn 1,10. 12.18.21.25) e o homem era muito bom na sua primordialidade (Gn 1,31). O homem se esquece de que pertence a Deus, seu Criador e não ao mundo, Sua criatura.

Um dos aspectos que mais devemos lembrar, cada vez que participamos da Eucaristia ou de outros encontros de oração, é que estamos unidos à comunidade dos salvos no céu, que já celebram na presença de Deus a verdadeira liturgia, cantando hinos e jogando suas coroas no ar, por causa da alegria sem fim. Não comemoramos sozinhos. Fazemos isso junto com os anjos, a Virgem Maria, os santos, nossos entes queridos. A liturgia do céu e a da terra estão intimamente relacionadas.

Não importa muito encontrar a chave simbólica para interpretar a quem correspondem esses seres ou personagens misteriosos ao redor de Deus, que a Primeira Leitura nos apresenta, nem o significado que os números nesta cena magnífica possam ter: sete, vinte e quatro, quatro. O importante é que nos seja apresentada uma imagem de triunfo, de cantos jubilosos, de uma liturgia festiva para aqueles que já estão salvos, e esta é uma mensagem de esperança para nós que caminhamos um pouco cansados ​​pela vida, ladeira abaixo em direção a Jerusalém celeste. E o Salmo Responsorial da missa quer nos contagiar com este otimismo: “Louvai o Senhor Deus no santuário, louvai-o no alto céu de seu poder! Louvai-o por seus feitos grandiosos, louvai-o em sua grandeza majestosa! Louvai-o com o toque da trombeta, louvai-o com a harpa e com a cítara! Louvai-o com a dança e o tambor, louvai-o com as cordas e as flautas! Louvai-o com os címbalos sonoros, louvai-o com os címbalos de júbilo! Louve a Deus tudo o que vive e que respira, tudo cante os louvores do Senhor!” É para isso que estamos destinados. Já estamos unidos a isso, em nossa celebração, embora ainda não o vejamos com clareza.

O Senhor está no meio do seu povo. E todo o universo participa da Liturgia do céu. Tudo, no céu e na terra, deve se tornar um louvor contínuo ao nosso Deus e Pai. É por isso que Deus Pai enviou seu Filho, para nos purificar de tudo o que nos manchou. Assim, perdoados e feitos filhos de Deus, toda a nossa vida deve ser um louvor contínuo ao Seu Santo Nome. Santo, Santo, Santo é o Senhor, Deus Todo-Poderoso. Santificado seja o seu Nome. E nós o santificamos através de nossas vidas, porque tudo o que foi criado, e de maneira especial nós, temos que nos tornar um louvor contínuo ao Nome de Deus. Deus chamou tudo à existência. Ele, sendo o Criador de todas as coisas, nos destinou para que, sendo conformes à imagem de seu próprio Filho, um dia, depois de perseverar na fé, possamos participar eternamente de sua glória e nos tornarmos um louvor eterno por ele, unido ao seu próprio Filho.

Os Talentos São Dados a Nós Por Deus Para o Bem De Todos

Estamos no fim da viagem de Jesus para Jerusalém. Jesus está perto de Jerusalém (Lc 9,51-19,28). E Ele continua a aproveitar o momento para dar suas ultimas e importantes lições para nossa vida como cristãos. Desta vez, através de uma parábola, Jesus nos fala sobre os dons que Deus nos deu, e que precisamos frutificá-los para o bem de todos. Nisto consiste o sentido de nossa passagem neste mundo.

A parábola, lida no texto do evangelho de hoje, é semelhante à parábola dos talentos na versão de Mateus (cf. Mt 25, 14-30) embora cada evangelista tenha sua própria acentuação. Lucas fala de “mina” (“mina” equivale a 571 gr). Mateus fala de “talento” (“talento” equivale a 34,272 kg). Mas ambos os evangelistas querem nos alertar que, um dia, cada ser humano prestará contas para Deus ou Deus vai pedir contas a cada homem dos dons e talentos recebidos que deveriam ser frutificados através da vivência do amor fraterno (cf. Mt 25,31-46). O encontro derradeiro com Deus será inevitável (cf. 2Cor 5,1-10), pois neste mundo somos apenas passageiros. O critério do julgamento será a vivência do amor fraterno. O amor é a moeda do reino que precisamos fazê-lo circular e frutificar. Se um dia nós formos condenados, não por termos amado demais e sim por termos amado de menos. Tudo será revelado e nada será escondido sobre tudo que fizemos, cometemos, praticamos, falamos e comentamos durante nossa passagem neste mundo. Precisamos ter temor do Senhor e não medo, pois o temor do Senhor é o início da sabedoria de viver na graça e pela graça de Deus (cf. 1Cor 15,10). O temor de Deus nos faz respeitarmos a vida e a dignidade do outro. O temor de Deus orienta nosso tratamento fraterno para com os demais: tratamento mais respeitoso por causa da vivência profunda do mandamento do amor fraterno (cf. Jo 13,34-35; 15,12). O temor de Deus nos faz vivermos como pessoas gratas, agradecidas e agraciadas.

O evangelista Lucas nos relatou que um homem nobre entregou cem moedas de prata para cada empregado para que eles pudessem multiplicá-los. A palavra “entregar” nos faz pensarmos no dom. Isto significa que ninguém escolhe os dons recebidos. Simplesmente cada um recebeu os dons de Deus. Eles são fruto da benevolência divina e não por nossos méritos. Ao Deus nos dar os talentos conforme a capacidade de cada um de nós, o evangelho quer nos dizer que Deus nos ama, tem confiança em nós e na nossa capacidade, nos estima, e por isso, deu-nos uma missão a realizar na vida. Deus nunca dá seus dons ou talentos acima de nossa capacidade. Diante da confiança depositada em mim por Deus, eu tenho que ter uma justa confiança em mim mesmo, porque, se assim não for, não posso revelar os meus dons ou talentos, não posso pôr a render os talentos que Deus me deu, não posso agir e produzir e fechar-me em mim mesmo, triste, na minha árida esterilidade e terminarei minha passagem neste mundo como pessoa ressentida pela vida vivida pela metade. Como é triste morrer sem ter sabido viver e como é triste viver sem aprender a morrer.

Se os dons são dados por Deus para cada um de nós gratuitamente, isto significa que estamos no mundo de gratuidade. Viver no mundo de gratuidade nos faz vivermos na constante gratidão e na permanente ação de graças que se traduz na generosidade com os demais. Viver na gratidão e na permanente ação de graças é uma grande revelação de que somos capazes de olhar para a vida e seus acontecimentos com o olhar positivo, com o olhar do Senhor. Quem vive na constante gratidão suas forças se renovam, sua auto-estima aumenta e seu ânimo de viver se dobra cada dia. E se tudo que temos e somos é o fruto da generosidade de Deus, cada um precisa ser prolongamento dessa generosidade divina partilhando e dividindo com os outros o que se tem e o que se é. A generosidade é o caminho de libertação das garras do apego das coisas terrenas. Mesmo que tenhamos dificuldade de largar o apego, um dia, quando chegar nosso momento nós seremos obrigados a renunciar a tudo que temos.

Para o evangelista Lucas, a história da salvação é dividida em três partes. Primeiro, o tempo de Israel. A história da salvação tem suas raízes no passado representado pelo Antigo Testamento, isto é, no tempo de Israel e em suas promessas. Segundo, o tempo de Jesus. Para Lucas, Jesus e seu ministério público representam o centro do tempo. Terceiro, o tempo da Igreja. O Espírito Santo (Pentecostes) funda a missão da Igreja.

Lendo a parábola dentro dessa divisão de tempo entendemos que o tempo da Igreja, isto é, o espaço da vida terrena é um tempo de plantio, floração, frutificação. Semear a bondade é a tarefa de cada cristão. A bondade é o único investimento que nunca falha. Ninguém pode esperar trigo, se na vida vive plantando o joio que só danifica o que é bom. Mas a bondade triunfará, pois Deus é o Supremo Bem. Nós não somos os donos do espaço e do tempo de nossa vida. Somos criaturas de Deus. O documento Lúmen Gentium do Concílio Vaticano II afirma: “Todos os fieis cristãos são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade” (LG 40). Ou na linguagem de São Paulo: “A caridade é o pleno cumprimento da lei” (Rm 13,10).

O Senhor confiou à Sua Igreja uns ministérios, uns dons ou talentos. E um dia todos serão chamados a prestar contas. Dons são de Deus. O homem é administrador dos dons. Alguns os fazem frutificar em serviços, solidariedade e fortalecimento dos ministérios para o bem comum. Estes verão o fruto de suas boas obras. Outros, somente esperam que seus ministérios lhes sirvam como um simples título de prestígio. Os que foram negligentes com seu ministério e sepultaram seus dons, verão como seu nome desaparecerá.

A mensagem da parábola é clara. Temos que ser criativos até a chegada da segunda vinda do Senhor na nossa vida (parusia). O Senhor nos concede Seus dons para continuarmos construindo Seu projeto do Reino. Ele faz de nós pequenos criadores (ser criativos). Pode ser que a cultura atual seja uma fábrica de passividade. Mas os cristãos continuam sendo, “geneticamente”, criativos, pois o Senhor concede-lhes dons para serem frutificados ou multiplicados. Sem exageros, podemos dizer que nascemos gênios, mas muitos morrem na mediocridade por falta de esforço.

Para ter muita imaginação temos que ter muita memória. Grande parte das operações chamadas “criadoras” depende de uma hábil exploração da memória. Com efeito, a desvinculação das raízes (memória), a falta da profundidade impede a criatividade. Quando se elimina a memória (raiz), se elimina também a criatividade profunda.

Afinal, a vida cristã não consiste em estar pendente do futuro. A existência cristã se joga no presente e por isso, não consiste na simples espera ou expectativa, e sim no compromisso de amor. Deus não quer saber se frutificamos muito ou pouco com os talentos que recebemos. Mas que os frutifiquemos. O que se enfatiza é o esforço, isto é, usar todo esforço que se tem para frutificar os dons recebidos: sejam 30%, 60% ou 100% de resultado. A Bíblia não tem uma única palavra de louvor para o preguiçoso e a pobreza, quando é conseqüência da preguiça, pois a preguiça nunca é considerada como virtude.

O que eu tenho multiplicado nos meus dons até agora é a pergunta que cada um deve fazer diariamente, especialmente neste momento.

Na Eucaristia o Senhor nos entrega sua Palavra, sua Vida que nos salva, e a comunhão fraterna no amor. Este grande tesouro certamente deve ser aproveitado primeiramente por cada um de nós. Nós somos os primeiros beneficiados pelo Senhor, e Sua presença em nós há de ser uma presença transformante, transfigurante, de tal modo que, dia a dia, vamos não somente sendo iluminados pela Luz do Senhor e sim que nos convertamos em luz que ilumine o caminho daqueles que nos rodeiam. Não podemos deixar que o Senhor acende sua Luz em nós para depois apagarmos d’Ele. Sua presença em nós há de ser contínua, unidos a Ele mediante a oração e a escuta de Sua Palavra, pois a salvação não é obra do homem e sim de Deus no homem com a colaboração do homem.

Na nossa comunidade, será que conhecemos e valorizamos os dons dos outros membros da mesma? Nossa comunidade é um espaço para frutificar os dons?

P. Vitus Gustama,svd

sábado, 16 de novembro de 2024

19/11/2024-Terçaf Da XXXIII Semana Comum

DEUS ME CHAMA PELO NOME, POIS ME CONHECE

 

Terça-Feira da XXXIII Semana Comum

Primeira Leitura: Apocalipse 3,1-6.14-22

Eu, João, ouvi o Senhor que me dizia: 1 “Escreve ao anjo da Igreja que está em Sardes: ‘Assim fala aquele que tem os sete espíritos de Deus e as sete estrelas: - Conheço a tua conduta. Tens fama de estar vivo, mas estás morto. 2 Acorda! Reaviva o que te resta, e que estava para se apagar! Pois não acho suficiente aos olhos do meu Deus aquilo que estás fazendo. 3 Lembra-te daquilo que tens aprendido e ouvido. Observa-o! Converte-te! Se não estiveres vigilante, eu virei como um ladrão, sem que saibas em que hora te vou surpreender! 4 Todavia, aí em Sardes existem algumas pessoas que não sujaram a roupa. Estas vão andar comigo, vestidas de branco, pois merecem isso. 5 O vencedor vestirá a roupa branca, e não apagarei o seu nome do livro da vida, mas o apresentarei diante de meu Pai e de seus anjos. 6 Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz às Igrejas’. 14 Escreve ao anjo da Igreja que está em Laodicéia: ‘Assim fala o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus: 15 Conheço a tua conduta. Não és frio nem quente. Oxalá fosses frio ou quente! 16 Mas, porque és morno, nem frio nem quente, estou para vomitar-te de minha boca. 17 Tu dizes: ‘Sou rico e abastado e não careço de nada’, em vez de reconhecer que és infeliz, miserável, pobre, cego e nu! 18 Dou-te um conselho: compra de mim ouro purificado no fogo, para ficares rico, e vestes brancas, para vestires e não aparecer a tua nudez vergonhosa; e compra também um colírio para curar os teus olhos, para que enxergues. 19 Eu repreendo e educo os que eu amo. Esforça-te, pois, e converte-te. 20 Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa e tomaremos a refeição, eu com ele e ele comigo. 21 Ao vencedor farei sentar-se comigo no meu trono, como também eu venci e estou sentado com meu Pai no seu trono. 22 Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às Igrejas’”.

Evangelho: Lc 19,1-10

Naquele tempo, 1 Jesus tinha entrado em Jericó e estava atravessando a cidade. 2 Havia ali um homem chamado Zaqueu, que era chefe dos cobradores de impostos e muito rico. 3 Zaqueu procurava ver quem era Jesus, mas não conseguia, por causa da multidão, pois era muito baixo. 4 Então ele correu à frente e subiu numa figueira para ver Jesus, que devia passar por ali. 5 Quando Jesus chegou ao lugar, olhou para cima e disse: “Zaqueu, desce depressa! Hoje eu devo ficar na tua casa”. 6 Ele desceu depressa, e recebeu Jesus com alegria. 7 Ao ver isso, todos começaram a murmurar, dizendo: “Ele foi hospedar-se na casa de um pecador!” 8 Zaqueu ficou de pé, e disse ao Senhor: “Senhor, eu dou a metade dos meus bens aos pobres, e se defraudei alguém, vou devolver quatro vezes mais”. 9 Jesus lhe disse: “Hoje a salvação entrou nesta casa, porque também este homem é um filho de Abraão. 10 Com efeito, o Filho do Homem veio procurar e salvar o que estava perdido”. O encontro de Jesus com Zaqueu nos mostra a etapas da conversão até chegar a salvação: “Hoje a salvação entrou nesta casa”.

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É Preciso Reviver e Reanimar Nossa Fé Que Está Nem Quente Nem Fria Para Morrer Estando Vivo

No Livro de Apocalipse encontramos sete cartas para sete comunidades: Efeso (2,1-7), Esmirna (2,8-11), Pérgamo (2,12-17),   Tiatira (2,18-29), Sardes (3,1-6), Filadelfia (3,7-13), e Laodicéia (3,14-22). Todas elas têm a mesma forma, o mesmo estilo. São dirigidas ao “anjo da comunidade”. As cartas são apresentadas como Palavra de Jesus: “Asssim fala....”. Em cada Carta Jesus recebe um título (2,1.8.12.18; 3,1.7.14). Em todas as Cartas Jesus começa dizendo: “Eu conheço...” e descreve as qualidades positivas da comunidade (2,2-3.9.13.19; 3,8). Em cada carta Jesus descreve que cada comunidade tem de negativo e faz advertências (2,4-6.14-16.20-25; 3,2-3.15-19). Duas comunidades não tem nada de negativo: Esmirna e Filadelfia. Para estas duas comunidades Jesus pede para que sejam perseverantes (2,10; 3,11). Todas estas sete cartas têm a advertência final: “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às Igrejas” (2,7.11.17.29; 3,6.13.22). Finalmente, todas elas terminam com uma promessa ao vencedor (2,7.11.17.26-28; 3,5. 12,21). O caso da Igreja de Filadelfia é muito distinto. Aqui os cristãos que permaneceram firmes durante a perseguição judaica, recebem agora o reconhecimento por sua atitude valente: “Conheço as tuas obras: eu pus diante de ti uma porta aberta, que ninguém pode fechar; porque apesar de tua fraqueza, guardaste a minha palavra e não renegaste o meu nome” (Ap 3,8). O Senhor amou essa comunidade e correspondeu a sua fidelidade. Por ter guardado sua Palavra durante a tribulação, também Ele protegerá a Filadelfia no momento da prova definitiva.

No texto de hoje a carta é dirigida para a comunidade de Sardes (Igreja em Sardes) e Laodicéia. A comunidade de Laodicéia não tem nada de positivo, pois ela não é nem fria nem quente (3,15). Na comunidade de Sardes, o negativo é mais forte do que o positivo (3,4). Por isso, a ordem é invertida.

Será que conhecemos verdadeiramente a comunidade eclesial onde atuamos? O que é de positivo e de negativo nas nossas comunidades? Qual é a advertência de Jesus para nossas comunidades? Nossa comunidade é igual à de Laodicéia que nem morna nem quente? O que devemos fazer para que possamos chegar a ser comunidade em Esmirna e Filadelfia, as quais recebem elogio de Jesus? Se Jesus pudesse falar diretamente agora para nossa comunidade, qual seria a palavra de Jesus?

“Conheço a tua conduta. Tens fama de estar vivo, mas estás morto. Não és frio nem quente.  Acorda! Reaviva o que te resta, e que estava para se apagar! Pois não acho suficiente aos olhos do meu Deus aquilo que estás fazendo”, assim lemos na Primeira Leitura de hoje.

Das sete Cartas que João envia em nome de Cristo-Juiz para as diferentes comunidades da Ásia, a leitura de hoje abarca as duas Igrejas: Sardes (vv.1-6) e a Laodiceia (vv. 14-22).

O tom destas duas cartas é bastante pessimista. O ardor do princípio ficou debilitado consideravelmente: a queda de Jerusalém teve lugar sem que terminasse o mundo; se presente a queda de Roma, mas tampouco dela dependerá o fim do mundo. Isto significa que os cristãos perderam a chave que lhes permitia dar sentido religioso às catástrofes e perseguições. A fé padece, Deus parece estar morto.

O livro de Apocalipse tem por objeto desvelar o sentido religioso e misterioso dos acontecimentos escatológicos. O cristão em qualquer lugar e tempo escutará os ensinamentos de João para ouvir a revelação e reconhecer a presença de Cristo Ressuscitado no coração de todo ser e no sentido dos acontecimentos.

Mas a visita ou a vinda do Senhor “como ladrão” exige estar vigilante constantemente, isto é, estar pronto para acolhê-Lo. É a exigência que encontramos em Mt 24,44: “Por isso, estais também vós preparados porque o Filho do Homem virá numa hora em que menos pensardes”. A conversão é particularmente urgente em Sardes onde, ainda que uns pouco se mantenham sem mancha, muitos estão mortos porque esqueceram o que lhes foi anunciado com obras e palavras. Para a Igreja de Sardes são dirigidas as seguintes palavras: “Conheço a tua conduta. Tens fama de estar vivo, mas estás morto. Acorda! Reaviva o que te resta, e que estava para se apagar! Pois não acho suficiente aos olhos do meu Deus aquilo que estás fazendo”.

A última carta, a mais dura das sete contém a mensagem aos cristãos da Igreja de Laodiceia: “Conheço a tua conduta. Não és frio nem quente. Oxalá fosses frio ou quente! Mas, porque és morno, nem frio nem quente, estou para vomitar-te de minha boca... Esforça-te, pois, e converte-te. Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa e tomaremos a refeição, eu com ele e ele comigo”.

Laodiceia é uma cidade perto de Colossa, com nascentes termais, rica em indústria têxtil e famosa por uma escola de medicina ocular. As riquezas são seu grande obstáculo. Seguros de si mesmos e em seus bens, eles são expoentes visíveis de uma fé semi-vivida, de uma fé morna que tenta evitar o conflito apresentado por Jesus: “Em verdade vos declaro: é difícil para um rico entrar no Reino dos céus” (Mt 19,23). Se os cristãos de Laodicéia estavam orgulhosos de sua riqueza, aqui eles são rotulados como pobres e miseráveis; se seus médicos oculistas eram famosos, mas no geral são cegos. Pelo amor que o Senhor os tem, o anjo faz uma advertência para enriquecer-se com ouro autentico através da partilha com os necessitados e adornar-se com boas obras.

Não é preciso muito esforço para tirar mensagens das cartas para as duas Igreja: Sardes e Laodiceia. É uma boa oportunidade para nos examinarmos, agora que estamos no final do Ano Litúrgico. Como vai a nossa vida cristã? É cheia de vitalidade ou quente e medíocre, isto é, nem quente nem morno? Somos dos que o autor das cartas elogia ou louva porque "não têm roupa suja" pela corrupção deste mundo? Ou estamos incluidos nas queixas de Jesus, porque “Tens fama de estar vivo, mas estás morto, porque “Não és frio nem quente”?

É a atitude que Jesus mais criticou nos fariseus: uma brilhante aparência não pertence à grandeza que Deus quer, os túmulos muito ornamentados por fora, porém por dentro cheios de corrupção. Levemos a sério, na véspera do Advento, as recomendações do Apocalipse sobre a importância da conversão: "Esforça-te, pois, e converte-te. Ao vencedor farei sentar-se comigo no meu trono, como também eu venci e estou sentado com meu Pai no seu trono”.

Ao participar da Eucaristia somos convidados a reconhecer a voz de Jesus que nos diz: “Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa e tomaremos a refeição, eu com ele e ele comigo”. Se fizermos tudo isso, vamos juntar-se a procissão daqueles que compartilham sua vitória: “Ao vencedor farei sentar-se comigo no meu trono, como também eu venci e estou sentado com meu Pai no seu trono”.

Deus Conhece Meu Nome e Minha Situação e Quer Me Salvar Para Eu Salvar Os Outros

Estamos com Jesus no seu caminho para Jerusalém, escutando suas ultimas e importantes lições para todos nós como seus seguidores (Lc 9,51-19,28). Ele será crucificado, morto e glorificado. Ao viver seus ensinamentos nós vamos levar adiante a missão ou a causa de Jesus.

Na passagem do evangelho de hoje o evangelista Lucas nos descreve passo a passo o processo de conhecer Jesus que terminará na conversão e no seguimento.

O primeiro passo consiste no desejo de ver Jesus. O verbo “VER” é muito importante neste relato. O episódio que precede a nossa narrativa é a cura de um mendigo cego (=não pode ver) às portas da cidade (Lc 18,35-43). É claro que a graça de Deus faz surgir esse desejo de ver Jesus. O “ver” e o “subir” (em uma árvore) indicam aqui mais do que curiosidade: indicam uma procura intensa, uma vontade firme de encontro com algo novo, uma ânsia de descobrir o “Reino”, um desejo de fazer parte dessa comunidade de salvação que Jesus anuncia.

Zaqueu tem uma vontade intensa, profunda e imensa em ver Jesus a ponto de subir em uma arvore por causa de sua estatura pequena. Mas o que acontece nesse processo de querer ver Jesus? Em vez de ver Jesus, é o próprio Jesus quem quer ver Zaqueu, e Zaqueu é visto por Jesus antes de Zaqueu ver Jesus: “Zaqueu, desce depressa! Hoje eu devo ficar na tua casa”. Jesus chama Zaqueu pelo nome. Zaqueu deve pensar em silêncio, no meio daquela multidão de gente: “De onde Jesus sabe do meu nome? Eu sou pecador, pois sou publicano e chefe dos publicanos. Sou ladrão do dinheiro público. Eu sou excluído da sociedade. A sociedade faz questão de me esquecer, de não querer olhar para mim ou me olha com um olhar cínico e clínico. E Jesus me chama pelo nome e quer estar comigo na minha casa? Jesus me conhece?”.

Sim, Deus nos conhece e nos chama pelo nome: “Eu te chamo pelo nome, és Meu”, diz o Senhor Deus (Is 43,1), pois nosso nome está gravado na palma da mão de Deus (cf. Is 49,16). Deus não Se esquece de mim: “Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? Mesmo que ela o esquecesse, Eu não te esqueceria”, diz o Senhor (Is 49,15). Ninguém é anônimo diante de Deus. Eu posso estar no meio da multidão desconhecida, mas dentro dessa multidão eu tenho meu nome para Deus e Ele me chama pelo nome. Eu posso estar sozinho em casa, na rua ou em qualquer lugar e situação, mas Deus está comigo (cf. Mt 28,20), me conhece e me chama pelo nome. De fato, eu não estou sozinho nesse universo aberto com minhas perguntas e interrogações, meus desejos e sonhos, meus medos e preocupações. Deus me envolve de todos os lados, e me ama, pois Ele quer me salvar. Eu sou de Deus! Ele quer me dizer, como disse a Zaqueu: “Hoje eu devo ficar na tua casa!”.

O segundo passo exige a superação de todos os obstáculos. Para Zaqueu o maior obstáculo é sua baixa estatura. Não se trata de uma informação sem importância sobre o aspecto físico de Zaqueu. A intenção do evangelista é a de nos mostrar que, aos olhos de todos, Zaqueu é muito pequeno, insignificante, quase imperceptível por ser considerado um pecador público. É um pequeno ponto perdido numa sociedade que se considera sem mancha e sem falha. Zaqueu não é um simples publicano, mas é o “Chefe dos publicanos”, um gerente de ladrões, por isso é um grande pecador público.

Zaqueu resolve o obstáculo de baixa estatura ao subir numa árvore. Quando quisermos fazer algo de nossa importância ou de nossa necessidade, usaremos todos os meios para alcançá-la. Este homem tem tudo na vida, mesmo assim ainda está insatisfeito. É tão profunda, irreprimível, avassaladora a necessidade de ver Jesus que para satisfazê-la, está até disposto a expor-se ao ridículo diante de uma multidão que com certeza não tem simpatia por ele. Um dito popular diz: “Para quem faz o melhor ou quer melhorar a vida tanto material como espiritual não existe o ridículo nem medo nem vergonha”.

Assim deve ser a nossa busca de Deus: nem falsa vergonha nem medo ao ridículo devem impedir que ponhamos os meios para encontrar o Senhor. Zaqueu procura ver aquele que tem condições de compreender o seu drama interior, mas alguém quer impedi-lo. São os “grandes”, as pessoas “de elevada estatura” que cercam Jesus e não toleram que “os pequenos”, “os impuros” entrem em contato com Ele. Também na narrativa anterior a multidão agiu da mesma maneira: os que seguiam Jesus repreendiam o cego rudemente para que se calasse, mas a vontade de querer ficar curado era tão grande a ponto de o cego gritar a Jesus. Em Zaqueu os que se acham “puros e santos” só conseguem ver o publicano, o pecador, o aproveitador, nada mais. Não reconhecem nele nada de bom, nada de positivo. É um perdido para eles. É como se estivessem usando óculos escuros: estão enxergando tudo escuro. Mas Jesus vê os anseios de Zaqueu e quer conversar com ele. Jesus dedica seu tempo para conversar com Zaqueu, porque para Deus ninguém é pequeno por causa de Seu amor por nós. Nada é pequeno quando o amor é grande.

Um verdadeiro cristão jamais opta por um caminho de condenação ou de julgamento, e sim por um caminho que facilite a chegada dos outros próximos de Deus. Quem condena o outro, se condena. Quem salva o outro, se salva também: “Saiba”, diz São Tiago, “aquele que fizer um pecador retroceder do seu erro, salvará sua alma da morte e fará desaparecer uma multidão de pecado” (Tg 5,20).        

O terceiro passo comporta deixar-se amar por Jesus sem restrições nem desconfiança, abrindo-lhe as portas do coração. 

De seu posto de observador (árvore), não é Zaqueu quem vê Jesus. É Jesus quem o vê e o chama pelo nome e se auto-convida para hospedar-se na casa dele: “Zaqueu, desce depressa! Hoje eu devo ficar na tua casa”. Para Zaqueu tudo isto é uma grande surpresa. Deus é surpresa para quem tem o profundo desejo de encontrá-Lo. Como resposta Zaqueu desceu depressa da árvore para receber Jesus em sua casa, com alegria. A salvação entrou assim em sua casa.

Descer de pressa de uma arvore não é fácil, pois ao ver para baixo de cima de uma arvore, parece a distância se dobrar e por isso causa o medo de cair. Assim também, não é fácil sair de nossa posição para outra posição; de um lugar para outro lugar. Não é fácil aceitar a mudança. Geralmente mudamos por necessidade. Mas temos que aceitar e reconhecer que o código de um mundo em desenvolvimento é mudança e transformação. Não há nada que seja pior do que fazer muito bem o que não é necessário fazer. Os nossos pseudo-desejos não preenchem o nosso coração. Mesmo que consigamos realizá-los, eles nunca serão nossos desejos verdadeiros e por isso, eles vão deixar nosso coração vazio.        

O quarto passo é uma mudança radical de vida. Radical significa deixar de lado os esquemas e mentalidades antigos, para adequar-se às exigências do Reino de Deus. Isto não se faz com palavras ou com boas intenções, mas com gestos concretos: “Senhor, eu dou a metade dos meus bens aos pobres e, se defraudei alguém, vou devolver quatro vezes mais”.  Zaqueu dispõe-se a dar metade de seus bens aos pobres e a indenizar, quatro vezes mais, aquilo que roubou. Desta forma ele prova que, realmente, a salvação tem entrado em sua casa. Aqui Zaqueu nos mostra de que maneira a conversão influi em nossa relação com os bens materiais. O encontro verdadeiro com Cristo faz abrir o coração, o bolso e as mãos. O gesto de Zaqueu nasce da conversão interior, da mudança de vida, provocada pelo encontro com Jesus. Quando colocarmos o ouro e a prata acima de Deus que os criou, a conversão se tornará difícil. Mas quando reconhecermos que Deus deve estar acima de ouro e prata, o caminho da conversão se torna fácil.

Hoje A Salvação Entrou Nesta Casa...”. Com sua conversão radical, Zaqueu deu à sua família o melhor que podia lhe dar: o sentido da justiça, a honradez humana e o amor aberto para os outros. Ainda que devamos supor que seus filhos possam sair economicamente prejudicados, mas precisamos assinalar que Zaqueu lhes deixou a melhor de todas as heranças: o sentido da justiça, a honradez humana e o amor aberto para os outros: “Senhor, eu dou a metade dos meus bens aos pobres e, se defraudei alguém, vou devolver quatro vezes mais”, promete Zaqueu. Por isso, pode se afirmar que em sua casa, em sua família entrou a salvação de Deus e Jesus mesmo se encontra dentro dela. Podemos dizer que a verdadeira casa de Jesus é aquela onde a pai e a família em conjunto cumpre a exigência representada e resumida na atitude de Zaqueu.                 

A salvação cristã implica umas conseqüências sociais e econômicas. Zaqueu abandonou sue velho estilo de vida, evidentemente perdeu seu dinheiro, mas encontrou sua honradez humana, o sentido da justiça e o amor para com seu próximo, especialmente para com os necessitados. Do ponto de vista humano vale a pena perder-se por aquilo que se ganhar. Se ontem Jesus devolveu a vista a um cego, hoje ele devolveu a paz para uma pessoa de vida complicada.

Na casa de Zaqueu entrou a salvação de Deus e Jesus mesmo se encontra dentro dela. Podemos dizer que a verdadeira casa de Jesus é aquela onde o pai e a família, em conjunto, cumprem a exigência representada e resumida na atitude de Zaqueu. Deus entra em cada casa onde o amor fraterno tem seu lugar.                 

Será que a salvação também entrou na minha vida, na minha casa, na sua casa como entrou na casa de Zaqueu?  Será que tenho vontade de sair do chão da minha vida e de procurar algo que eu possa “ver” e conhecer Jesus? Quais são “arvores” que me ajudam com facilidade a “ver”e a conhecer Jesus? Se ontem (texto anterior) Jesus devolveu a vista a um cego, hoje ele devolveu a paz para uma pessoa de vida complicada. Precisamos dos solhos capazes de enxergar o sentido da vida e o caminho da salvação e da paz no coração para podermos viver como irmãos.

P. Vitus Gustama,svd

18/11/2024-Segundaf Da XXXIII Semana Comum

O APROXIMAR-SE DO SENHOR CAPACITA QUALQUER CRISTÃO A ENXERGAR MELHOR O SENTIDO DA VIDA

Segunda-Feira da XXXIII Semana Comum 

Primeira Leitura: Apocalipse 1,1-4; 2,1-5ª

1,1 Revelação que Deus confiou a Jesus Cristo, para que mostre aos seus servos as coisas que devem acontecer em breve. Jesus as deu a conhecer, através do seu anjo, ao seu servo João. 2 Este dá testemunho de que tudo quanto viu é palavra de Deus e testemunho de Jesus Cristo. 3 Feliz aquele que lê e aqueles que escutam as palavras desta profecia e também praticam o que nela está escrito. Pois o momento está chegando. 4 João às sete Igrejas que estão na região da Ásia: A vós, graça e paz, da parte daquele que é, que era e que vem; da parte dos sete espíritos que estão diante do trono de Deus. 2,1 Ouvi o Senhor que me dizia: Escreve ao anjo da Igreja que está em Éfeso: Assim fala aquele que tem na mão direita as sete estrelas, aquele que está andando no meio dos sete candelabros de ouro: 2 Conheço a tua conduta, o teu esforço e a tua perseverança. Sei que não suportas os maus. Puseste à prova alguns que se diziam apóstolos e descobriste que não eram apóstolos, mas mentirosos. 3 És perseverante. Sofreste por causa do meu nome e não desanimaste. 4 Todavia, há uma coisa que eu reprovo: abandonaste o teu primeiro amor. 5ª Lembra-te de onde caíste! Converte-te e volta à tua prática inicial. Se, pelo contrário, não te converteres, virei depressa e arrancarei o teu candelabro do seu lugar.

Evangelho: Lc 18,35-43

35 Quando Jesus se aproximava de Jericó, um cego estava sentado à beira do caminho, pedindo esmolas. 36 Ouvindo a multidão passar, ele perguntou o que estava acontecendo. 37 Disseram-lhe que Jesus Nazareno estava passando por ali. 38 Então o cego gritou: “Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!” 39 As pessoas que iam na frente mandavam que ele ficasse calado. Mas ele gritava mais ainda: “Filho de Davi, tem piedade de mim!” 40 Jesus parou e mandou que levassem o cego até ele. Quando o cego chegou perto, Jesus perguntou: 41 “Que queres que eu faça por ti?” O cego respondeu: “Senhor, eu quero enxergar de novo”. 42 Jesus disse: “Enxerga, pois, de novo. A tua fé te salvou”. 43 No mesmo instante, o cego começou a ver de novo e seguia Jesus, glorificando a Deus. Vendo isso, todo o povo deu louvores a Deus.

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Tu Abandonaste o Teu Primeiro Amor: É Preciso Voltar Ao Primeiro Amor Para Voltar a Ser Vencedor

Para a Primeira Leitura, durante as duas últimas semanas do Ano Litúrgico, antes do Advento, vamos ler e refletir sobre o livro de Apocalipse de são João, o último livro do Novo Testamento e, portanto, da Bíblia, que foi escrito entre os anos 90 e 100 (alguns especialistas colocam o ano 95 como ano da composição do livro), numa época de perseguição. Apocalipse em grego significa “revelação” ou “manifestação de algo oculto” ou “tirar o véu”. Os livros “apocalípticos” têm umas características muito especiais, e usam uma linguagem misteriosa, cheios de imagens e símbolos, não fáceis de entender. Falam-se neste livro de dragões e cavalos, de trombetas e cataclismos cósmicos, de simbolismo das cores e dos números, e, sobretudo, da luta entre a Besta e o Cordeiro.

O autor do Apocalipse se chama a si mesmo João. Mas não é João, o apóstolo a quem se atribui o Quarto Evangelho e as Cartas de são João. Além do nome o autor se apresenta como “irmão e companheiro na tribulação” (Ap 1,9). Isto quer nos dizer que o autor é também perseguido por causa da fé, e consequentemente, sofre a mesma coisa que os outros, pois é “irmão e companheiro”. Por isso, ele tem condições para animar os outros irmaos/companheiros através de suas revelações. Ele escreveu essas revelações por ordem de Deus (Ap 1,11.19) como a resposta de Deus para o povo que sofre aflições por causa das perseguições. Através do autor Deus quer revelar ao povo que o poder do império não dura muito tempo. O autor quer que o povo enxergue isso para não desistir nunca na luta pelo bem. “Esta é a Boa Nova que o Apocalipse quer revelar ao povo das comunidades: ‘O tempo está próximo’ [Ap 1,3]! Dentro do tempo da história, marcado pelas perseguições, existe o tempo de Deus, o plano de Deus. Este plano entrou na fase final. Esgotou-se o prazo. Deus está para chegar. Ele vai mudar a situação e libertar o seu povo!” (Carlos Mestres: Esperança De Um Povo Que Luta).

Por isso, o livro de Apocalipse, apesar de seus relatos catastróficos, contém uma mensagem de esperança para o povo continuar a luta, pois no fim da luta Deus tem a última palavra para a humanidade. Então, podemos entender a batalha dramática travada entre o dragão e o Cordeiro, entre o mal e o bem. O livro transmite uma mensagem clara de esperança, porque a Besta falha miseravelmente e o Cordeiro triunfa associada a toda a comunidade eclesial em sua alegria. Com a chave da luta, a morte e a ressurreição do Cordeiro que acaba triunfando contra o mal e a morte, acentua-se o caráter “pascal de todo o livro.

O Apocalipse vai nos ajudar a interpretarmos a história a partir dos olhos da fé, a não perdermos jamais a confiança ou a esperança, a termos uma visão pascal dos acontecimentos, por penosos que sejam, e por duras que sejam as dificuldades internas e externas, porque o Cordeiro venecerá e convidará para bodas sua Esposa: a Igreja.

A Carta hoje é dirigida à Igreja de Éfeso com o seguinte alerta: “Conheço a tua conduta, o teu esforço e a tua perseverança. Sei que não suportas os maus. És perseverante. Sofreste por causa do meu nome e não desanimaste. Todavia, há uma coisa que eu reprovo: abandonaste o teu primeiro amor”. Éfeso faz as coisas mais por dever do que por amor. Para fazer o bem é necessário ardor, o esntusiasmo e confiança do primeiro amor. E por isso, o autor do livro quer relembrar a Igreja de Éfeso sobre seu deslumbramento inicial, da sua vivacidade para bem viver no amor.

Éfeso era grande metrópole que ocupava a primazia politica, comercial e religiosa em tudo no contexto da província da Ásia. O Senhor se apresenta a esta Igreja revestido do fulgor de sua divindade. O Senhor conhece a perseverança dessa Igreja na luta para manter a fé intacta. Porém, o Senhor deixa bem claro que essa Igreja abndonou o seu primeiro amor.

A comunidade cristã decaiu daquele amor primordial: amor visto idealmente nas relações esponsais de Israel e Deus, amor que deve unir Cristo e a Igreja. Mas se voltar para o primeiro amor, a Igreja será vencedora e receberá um prêmio: comer da árvore da vida. Se for fiel, Cristo, verdadeira árvore da vida, concederá a Igreja, a toda comunidade cristã esta recompensa: a imortalidade, por meio da Eucaristia, isto é, a participação na mesma vida eterna de Deus (Cf. Ap 22,2).

A primeira carta das sete dirigidas às Igrejas da Ásia pode ser que nos retrate. Seguramente, em nossa vida sofremos por Cristo pelos valores cristãos que vivemos. Temos momentos de lucidez para discernir quem são verdadeiros apóstolos e quem são os falsos. Mas, ao mesmo tempo, a perseverança nos custa muito e ainda mais em meio de um mundo que não nos ajuda a segurimos os caminhos de Jesus. Cada um de nós, alguma vez ou outra, caiu e ficou longe do amor primordial. Nessa altura ressoa dentro de nós o convite do Senhor: “Volte para o primeiro amor para que volte a ser vencedor!”.

Por isso, é exigida de nós a fé e a perseverança. A persverança é importante, como cristãos, pois a natureza humana é geralmente caracterizada pela inconstância. Ficamos desanimados e apavorados diante do primeiro obstáculo que nos é apresentado na conseqüência de nossos projetos e metas. Abandonamos a nave diante do menor indício de tormenta ou tempestade. As coisas fáceis geralmente não são valiosas. Para vencer os obstáculos são necessárias a humildade, a confiança, a perseverança e paciência. A paciência nos ajudará a atravessar um período atribulado e ela é sempre maior quando vem acompanhada de fé. A fé torna mais fácil a confiança e a perseverança e fortalece a paciência que nos conduz através de épocas de desafio e incerteza. Para vencer as duras batalhas que a vida nos apresenta, é preciso ter a ajuda e a força de Deus; e essa ajuda e essa força brotam de um diálogo contínuo, nunca interrompido e nunca acabado, do crente com Deus. A partir do momento em que não mais orarmos, nós perderemos nossas forças para lutar, cairemos no desânimo.

O Salmo Responsorial de hoje (Sl1) nos convida a renovarmos nossa fidelidade ao Senhor: “Feliz é todo aquele que não anda conforme os conselhos dos perversos; que não entra no caminho dos malvados, nem junto aos zombadores vai sentar-se; mas encontra seu prazer na lei de Deus e a medita, dia e noite, sem cessar. Eis que ele é semelhante a uma árvore, que à beira da torrente está plantada; ela sempre dá seus frutos a seu tempo, e jamais as suas folhas vão murchar. Eis que tudo o que ele faz vai prosperar”.

Senhor Que Eu Enxergue Sua Presença Para Entender o Sentido Da Minha Vida

Continuamos escutando as ultimas e importantes lições dadas por Jesus no seu caminho para Jerusalém (Lc 9,51-19,28).

No Evangelho deste dia o evangelista Lucas conta como Jesus, depois de anunciar sua Paixão e ressurreição, curou um cego dentro do contexto de uma subida para Jerusalém. Em Lucas, essa é a única cura de um cego.

O evangelho de hoje nos fala que a cura de um cego acontece Jericó. Jericó é a porta da entrada para a Terra Prometida, término do longo êxodo da escravidão para a liberdade. Mas os discípulos ainda estão no Egito (cegos, sem liberdade), incapazes de cumprir e de compreender o caminho de Jesus Cristo. Por isso, esse cego é o protótipo do iluminado. Como cego, ele não pode ver, mas pode escutar bem, gritar e entrar em diálogo com Jesus, Luz do Mundo (Jo 8,12). Onde surge a Luz, cessa o caos, a escuridão e inicia o mundo novo.

A incredulidade dos apóstolos é um tema freqüente nos anúncios da Paixão e da subida para Jerusalém. Os apóstolos ficam como que cegos diante deste anúncio. Jesus não para de dar lições para que os apóstolos possam entender o sentido da missão de Jesus que, um dia, eles devem levá-la adiante.

Por isso, a intenção do evangelista Lucas é bem clara ao colocar este episódio aqui: para compreender o mistério da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus é preciso abrir os olhos da fé para poder entender as Escrituras. Os meios humanos são inadequados. É preciso deixar-se conduzir por outro para descobrir a Luz.                                 

Como Deus é Luz, ele colocou seus olhos nos olhos de Jesus para poder olhar para nosso mundo como ninguém neste mundo. E como Jesus é a Luz do mundo (cf. Jo 8,12), ele devolveu a visão para o mendigo cego: “Enxerga, pois, de novo. Tua fé te salvou!”, disse Jesus ao cego.

Um provérbio árabe diz: “Vem a mim com teu coração e eu te darei meus olhos”. Jesus também nos diz: “Vem a mim com teu coração!”. Temos que nos aproximar de Jesus com nosso coração, com nossa coragem de ver, de vê-Lo todo e de ver o mundo e os outros homens como Deus os vê: com amor e compaixão. A fé também é um grito de socorro: “Jesus, tem piedade de mim!”. Jamais podemos desistir de gritar a Jesus para pedir socorro, como pediu o cego mendigo. Somente os olhos de Jesus podem nos fazer ver com alegria a vida até nas suas dores. 

Não há nada que seja mais belo ou formoso na vida do que poder ver: ver o rosto da mãe ou do pai, ver o sorriso de uma criança, ver os olhos da pessoa amada, ver uma passagem, ver o sol, a natureza, a obra dos homens, ver “as obras dos dedos de Deus” (Sl 8,4) e assim por diante. Jesus nos chamou para ver: “Venham e vejam!” (Jo 1,39), disse Jesus aos dois discípulos de João que mais tarde se tornarão discípulos seus. É para ver a vida a partir de uma perspectiva especial para poder caminhar na direção certa.

O olhar é um dom precioso e fascinante legado pelo Criador. É uma das áreas humanas que mais chama a atenção das pessoas. O olhar é como uma bússola a guiar nossos passos, nossos gestos, nossas atitudes. O olhar sempre está aí atento a um ou outro detalhe. Os olhos determinam um pouco ou muito do que somos. E o olhar é sempre anterior às nossas palavras.  

É tão natural olhar, que nem nos damos conta desse misterioso gesto. Muitas vezes olhamos; poucas vezes, porém, nos encontramos. Alguns se limitam a olhar os outros para anotar seus possíveis defeitos. Não deixa de ser a mais trágica expressão de nossa crueldade. O olhar superficial jamais enxerga alguém; os outros são objetos de curiosidade, de conversa. 

O cego da nossa história está sentado à beira do caminho e pede esmola. O estar sentado significa acomodação, instalação, conformismo. Ele está privado da luz e da liberdade e está conformado com a sua triste situação, sabendo que, por si só, é incapaz de sair dela. E o pedir esmola indica a situação de escravidão e de dependência em que o homem se encontra.                 

Num diálogo público com o cego, Jesus pergunta ao cego sobre o que ele quer: “O que queres que eu faça por ti?”. E o cego sabe muito bem daquilo que ele quer: “Senhor, que eu veja!”. “Enxerga, pois, de novo. Tua fé te salvou” é a resposta de Jesus. E aconteceu o milagre. A Palavra de Jesus devolve ao cego a vista como símbolo da fé. Por isso, o evangelista Lucas nota que esse homem, depois que ficou curado, “seguia a Jesus”. É um corte radical com o passado, com a vida velha, com a anterior situação, com tudo aquilo em que se apostou anteriormente, a fim de começar uma vida nova ao lado de Jesus. 

Diante de Jesus e com Jesus não há situação por difícil que seja que não haja solução. É preciso, no entanto, que não nos fechemos no nosso egoísmo e na nossa auto-suficiência, surdos e cegos aos apelos de Deus; é preciso que as nossas preocupações com os valores efêmeros não nos distraiam do essencial; é preciso que aprendamos a reconhecer os desafios de Deus nesses acontecimentos banais com que, tantas vezes, Deus nos interpela e questiona.                 

Uma das razões que nos impedem de sermos autenticamente nós mesmos e encontrar nosso caminho é não compreender até que ponto estamos cegos. Mas a tragédia está no fato de que não estamos conscientes de nossa cegueira. Vivemos num mundo de coisas que captam ou chamam nossa atenção e se impõem. O que é invisível, ao contrário, que não se impõe, nós devemos buscá-lo e descobri-lo. O mundo exterior pretende nossa atenção. Enquanto que Deus se dirige a nós com discrição. 

Ser incapaz de perceber o invisível, ou ver somente o mundo da experiência significa ficar-se fora do mundo da experiência, significa ficar-se fora do pleno conhecimento, significa ficar-se fora da experiência da realidade total que é o mundo de Deus e Deus no coração do mundo.

Além de ser incapaz de perceber o invisível, o egoísmo reduz o homem a seus próprios desejos e interesses, lhe fecha os olhos e o coração, o paralisa à margem do caminho por onde percorre a vida. O homem que vegeta em seu egoísmo tem um coração demasiado estreito para acolher o próximo e demasiado estreito para receber Deus.

O encontro com o próximo é indispensável para o encontro com Deus, pois isto é o primeiro que cremos: que Deus se fez homem (Jo 1,14). Não é possível escutar a Palavra de Deus, se não estamos dispostos a escutar os homens. Por isso, a dificuldade da fé não é outra coisa que nosso próprio egoísmo, nossa auto-suficiência, porque a fé é abertura, encontro, aceitação.                 

O cego que voltou a ver é o símbolo de todos os homens que desejam ver, caminhar e viver. Sobretudo é um símbolo para todos em tempos de crise, de obscuridade, de desorientação. É um símbolo para o homem que, apesar de tudo, busca e continua buscando sua direção ou seu guia para sua vida. Junto ao homem que busca, Jesus passa como a Vida, a Luz e o Caminho para o homem. Com Jesus o homem se encontra consigo mesmo e com Deus que direciona a vida para sua plenitude. A fé em Jesus é uma luz que ilumina a vida. A luz da fé ilumina e dá sentido à nossa vida porque põe claridade na origem, de onde viemos e no término, no fim de nosso destino.

O cego não pede outra coisa a não ser a capacidade de enxergar de novo: “Senhor, que eu possa enxergar de novo”. A luz divina que opera nele não lhe permite ver outra coisa na vida a não ser o caminho que Jesus traçou que ele precisa trilhar para chegar à vida eterna.

E os nossos olhos servem para enxergar o caminho de Jesus ou para ver os defeitos dos outros? Quem enxerga apenas os defeitos dos outros é porque a luz divina ainda não operou na sua vida. Precisamos rezar com o cego mendigo: “Senhor que eu possa enxergar de novo!”.

P. Vitus Gustama,svd

Apresentação de Nossa Senhora-Memória, 21/11/2024

FESTA DA APRESENTAÇÃO DE NOSSA SENHORA SER MEMBRO DA FAMÍLIA DE JESUS CRISTO Primeira Leitura: Zc 2,14-17   14 “Rejubila, alegra-te,...