SÃO
PEDRO E SÃO PAULO-SOLENIDADE
I Leitura:
At 12,1-11
Naqueles dias, 1o rei Herodes
prendeu alguns membros da Igreja, para torturá-los. 2Mandou matar à espada
Tiago, irmão de João. 3E, vendo que isso agradava aos judeus, mandou também
prender a Pedro. Eram os dias dos Pães ázimos. 4“Depois de prender Pedro,
Herodes colocou-o na prisão, guardado por quatro grupos de soldados, com quatro
soldados cada um. Herodes tinha a intenção de apresentá-lo ao povo, depois da
festa da Páscoa. 5Enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja rezava
continuamente a Deus por ele. 6Herodes estava para apresentá-lo. Naquela mesma
noite, Pedro dormia entre dois soldados, preso com duas correntes; e os guardas
vigiavam a porta da prisão. 7Eis que apareceu o anjo do Senhor e uma luz
iluminou a cela. O anjo tocou o ombro de Pedro, acordou-o e disse: “Levanta-te
depressa!” As correntes caíram-lhe das mãos. 8O anjo continuou: “Coloca o cinto
e calça tuas sandálias!” Pedro obedeceu e o anjo lhe disse: “Põe tua capa e vem
comigo!” 9Pedro acompanhou-o, e não sabia que era realidade o que estava
acontecendo por meio do anjo, pois pensava que aquilo era uma visão. 10Depois
de passarem pela primeira e segunda guarda, chegaram ao portão de ferro que
dava para a cidade. O portão abriu-se sozinho. Eles saíram, caminharam por uma
rua e logo depois o anjo o deixou. 11Então Pedro caiu em si e disse: “Agora
sei, de fato, que o Senhor enviou o seu anjo para me libertar do poder de
Herodes e de tudo o que o povo judeu esperava!”
II Leitura:
2Tm 4,6-8.17-18
Caríssimo, 6quanto a mim, eu já
estou para ser derramado em sacrifício; aproxima-se o momento de minha partida.
7Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé. 8Agora está
reservada para mim a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me dará
naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que esperam com amor a
sua manifestação gloriosa. 17Mas o Senhor esteve a meu lado e me deu forças,
ele fez com que a mensagem fosse anunciada por mim integralmente, e ouvida por
todas as nações; e eu fui libertado da boca do leão. 18O Senhor me libertará de
todo mal e me salvará para o seu Reino celeste. A ele a glória, pelos séculos
dos séculos! Amém.
Evangelho:
Mt 16,13-19
Naquele tempo, 13Jesus foi à
região de Cesareia de Filipe e ali perguntou aos seus discípulos: “Quem dizem
os homens ser o Filho do Homem?” 14Eles responderam: “Alguns dizem que é João
Batista; outros que é Elias; outros ainda, que é Jeremias ou algum dos
profetas”. 15Então Jesus lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?”
16Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”.
17Respondendo, Jesus lhe disse: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não
foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu. 18Por
isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja,
e o poder do inferno nunca poderá vencê-la. 19Eu te darei as chaves do Reino
dos Céus: tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que tu desligares
na terra será desligado nos céus”.
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Pedro e Paulo Servem a Igreja, Corpo de
Cristo, Até a Morte
Nesta data, tão tradicional no calendário litúrgico, toda a Igreja católica
volta os olhos para os dois apóstolos que são colunas da Igreja cuja pedra
angular é o próprio Cristo. Celebrar São Pedro e São Paulo é reconhecer que a
nossa fé se baseia neles. Em ligação com são Pedro, também neste dia a Igreja
Católica volta os olhos e o coração para o novo Pedro, que é o Papa de Roma,
que continua o ministério apostólico de confirmar a fé dos irmãos.
São Pedro e são Paulo, fundamento da Igreja, demonstram a sua grandeza no
sofrimento: um pela cruz (São Pedro) e outro, pela espada (São Paulo), que é a
prova suprema da vida. Eles não viveram um cristianismo alienante; a existência
deles foi difícil e eles experimentaram muitas tensões. Uma vez que eles
disseram sim a Jesus Cristo, até a morte eles não recuaram. Eles deram a vida
pela comunidade (pelo Corpo de Cristo, por Cristo).
Pedro e
Pablo. Duas figuras
impressionantes que dominaram os primeiros anos da vida da Igreja. A sua
presença foi tão importante que até hoje são considerados por todas as Igrejas
como as duas grandes colunas sobre as quais repousa a fé da Igreja. Quão diferentes
os dois! Eles são de origem diferente: um pescador simples; o outro fariseu e
conhecedor da lei. Diferentes em sua experiência de Cristo: um (Pedro) o seguiu
pelas estradas da Palestina em um longo processo de encontros e desencontros
com Jesus; o outro (Paulo) perseguiu os primeiros cristãos e se converteu por
uma experiência de luz no caminho de Damasco (Cf. At 9,1ss).
Os dois chegaram ao fim com bastante generosidade e capacidade de dar a
vida pelo Evangelho. Ambos nos lembram que o cristão não é santo desde o
nascimento, mas torna-se santo na medida em que abre o coração à ação da graça.
Mesmo sendo o fundamento da nossa Igreja, ambos (Pedro e Paulo) são
homens com um passado não exatamente brilhante.
Pedro é um dos prediletos de Jesus, desde o primeiro
momento. Vive com o Senhor os acontecimentos mais importantes da vida de Jesus,
todos aqueles momentos que foram reservados somente para poucos. Fogoso e
temperamental, não hesita em assegurar a Jesus que é capaz de morrer com Ele e
que o seguirá fielmente naquele caminho de dor e renúncia que o Senhor estava
pintando (Mt 26,35). Mas todos sabemos que o Pedro falhou em toda a linha.
Bastava a insinuação de uma mulher, em momentos de perigo, para que ele negasse
categoricamente conhecer o Mestre (Mt 26,69-75). Porém, não é para se
escandalizar. Todos nós temos motivos de sobra para entendê-lo e desculpá-lo. O
Senhor o compreendeu e o perdoou. Continuou a encontrar-se com ele depois da
ressurreição, concedendo-lhe, como sempre, «tratamentos favoráveis» e quis
deixá-lo a cuidar das suas ovelhas, sem nunca recordar-lhe o seu retumbante
fracasso (cf. Jo 21,15-17). Não houve repreensão para Pedro, por parte de
Jesus, mas perdão. Jesus não culpou Pedro pelo seu passado, mas sim é convidado
pelo sua futura missão, um futuro em que Pedro poderá, de fato seguir, passo a
passo, as pegadas do seu Mestre. E ficou claro que a única coisa que Jesus
exigia de Pedro para ser sua imagem fiel na terra, era que o amasse (cf. Jo 21,15-19).
Se há algo claro da parte de Cristo é o desejo de fundamentar os cristãos no
amor, no amor à sua Pessoa e, como consequência lógica, no amor a todos os
homens.
Pensar em Pedro é pensar no Apóstolo que confessou Jesus como o Cristo Filho
do Deus vivo no grupo dos Doze Apóstolos. Mas também é pensar no discípulo da
negação. Pedro encarna o apóstolo que amou Jesus com um amor de amigos, com o philéo, "eu te amo como amigo"
e não com um amor de causa, agapáo,
"eu te amo com amor ágape". Pedro é o anunciador do evangelho no
mundo judaico, mundo difícil para esse anúncio, pois a tradição judaica estava
profundamente enraizada na vida do povo eleito, e eles não aceitavam em sua
maioria a pregação que Pedro fazia do evento Jesus, o Cristo. Pedro deve ser
nosso exemplo para confessar Jesus e voltar a ele com humildade, apesar de
nossas negações.
As imagens mais antigas de São Pedro
sempre o representam com um galo ao
lado. É uma forma de nos recordar, e de recordar a você, que sua vida não foi
tão perfeita quanto deveria. Ele, que teve a coragem de confessar a Cristo como
o "Messias, o Filho do Deus vivo", foi o mesmo que mais tarde o traiu
no momento da Paixão. Para alguns de nós, isso seria motivo suficiente para
desprezar Pedro. Seu ensinamento não é apoiado pela prática de sua vida! É
certo. Mas também é verdade que a vida é um processo. E que o mais importante é
como chegar ao final do processo. Ao longo do caminho, até os mesmos erros são
ocasiões para aprender e para crescer, são momentos de graça quando sabemos
aproveitá-las para o nosso bem. Não são os anos que dão sabedoria a uma pessoa,
mas como ela assimilou sua própria experiência de vida. Pedro pede-nos que
cuidemos do rebanho de Deus, dos irmãos, à maneira de Deus, não pensando em
aproveitá-los, mas com uma dedicação generosa: “Apascenta minhas ovelhas!” E
podemos imaginar como Pedro, o pescador, o pecador, o valente, o covarde, o
líder, aquele que por três vezes negou conhecer Jesus na hora da verdade,
assimilou em seu coração o perdão e a misericórdia de Deus. Somente pessoas com
essa experiência devem se sentar na cátedra da Igreja.
É sempre uma graça meditar no Príncipe dos Apóstolos porque — com a sua
calorosa humanidade, com a generosidade do seu seguimento de Cristo, com as
mesmas fraquezas que tinha — o sentimos muito próximo, muito querido, muito
merecedor do nosso afeto.
Paulo também é um homem de origem triste. Adepto da Lei,
dogmático, duro e intransigente, caracterizou-se pela perseguição aos primeiros
cristãos, acreditando cegamente que assim prestava um bom serviço a Deus,
naturalmente ao “seu” Deus. Era necessário que cegassem os olhos, que viam com
tanta nitidez, para que neles se fizesse uma nova luz e rompessem completamente
com aquele estilo tão contrário ao do Senhor, a quem, desde então, foi indo
atender com dedicação exclusiva e excluente. Também para Paulo será o amor de
Cristo que cimentará a sua vida, agora para sempre orientada para um único
objetivo. Ao pregar o Cristo ressuscitado, Paulo nos mostra que a vida não termina com a morte. Com isso,
Paulo pede que vivamos na e conforme a graça de Deus.
Pensar em Paulo é pensar em Saulo de Tarso, perseguidor da Igreja e
assassino de cristãos. Paulo, chamado pelo próprio Jesus após sua ressurreição,
assume o desafio e anuncia ao mundo não judeu o amor de Deus manifestado em
Cristo Jesus. Graças à misericórdia de Deus que teve com ele ao chamá-lo à
verdadeira vida, e graças ao seu empenho em pregar no momento oportuno e no
momento inoportuno, o cristianismo se espalhou e a Boa Nova da Salvação foi conhecida
nos povos que não eram Judeus. Paulo, o Apóstolo da inclusão de todos os povos
e de todos os sujeitos históricos no amor de Deus, é um testemunho para a
Igreja em geral para que tenhamos a valentia de acolher todos aqueles que
desejam ser fiéis ao desígnio e plano de Deus para que se desenvolvam intergralmente
dentro de nossa comunidades.
Paulo, na 2ª leitura de hoje, homem de coração terno sob duras formas
exteriores, está à beira da morte, mas não tem medo, não se arrepende de nada,
mas está feliz por ter lutado e por ter resistido firme na fé . É o Senhor quem
o ajudou e lhe deu forças para anunciar a mensagem.
Pedro e
Paulo são as "pedras" fundamentais da nossa
Igreja. Umas pedras que tem suas rachaduras e quebraduras, porque a única Pedra
fundamental, aquela que os construtores rejeitaram, é Cristo e só Nele não há
fissura, nem mancha, nem rachadura. Em todos os outros, sejam mais ou menos
acima ou abaixo, sejam mais ou menos importantes ou comuns, a fenda é possível,
como foi possível em Pedro, que viveu tão próximo de Cristo e em Paulo, que foi
um estupendo guardião e cumpridor da Lei, um religioso de corpo inteiro. Esta é
uma realidade reconfortante e que também teve uma demonstração constante na
Igreja ao longo dos séculos.
Pedro e Paulo são dois cristãos para os quais devemos olhar com
frequência. Ambos tiveram seus fracassos pessoais, e ambos seguiram a Cristo
com tanta fidelidade que tornaram Cristo visível no mundo, aproximando dEle
todos aqueles que deles se aproximavam. Isto é o que conta e o que os torna
grandes aos olhos de Deus e também, claro, aos olhos dos homens e, por suposto,
a todos nós que, como eles, pretendemos continuar a ser Igreja, aquela Igreja
que construíram com seu próprio sangue.
Hoje é dia de pedir sinceramente pela Igreja, de sentir-nos identificados
com ela, de agradecer-lhe tanto quanto ela nos deu e de esperar sinceramente
que ela apague constantemente as arestas que possa ter e que impeçam os homens
de encontrar Deus. É um dia para nos examinarmos, como componentes dessa Igreja,
e de ver se o fundamento da nossa pertença a ela é, antes e acima de tudo, o
que Cristo exigiu de Pedro: o amor a Ele. Só se pudermos contestar, mesmo que
seja da nossa pequenez, com a mesma sinceridade com que Pedro fez isso, que, certamente,
nós amamos a Cristo, poderemos ser pedras úteis nesse edifício da Igreja que,
apesar de nós mesmos, nunca ruirá ou nunca será derrubada, pois o próprio Cristo
é a pedra angular desse edifício, e que
é absolutamente necessária para o mundo que se verdadeiramente cumpre com a
missão confiado a ela: conduzir os homens ao Reino, tornando-o realidade agora,
aqui e agora. Hoje é o dia de penetrar no conhecimento da Igreja, de aceitá-la
como ela é com toda a sua grandeza e as suas possíveis áreas ou zonas de sombra
que fazem resplandecer ainda mais a luz de Cristo, que é quem, em última
análise, a sustenta acima de qualquer terremoto. .
Jesus É o Messias,
Filho de Deus Vivo
O texto do Evangelho na solenidade de São Pedro e são Paulo relata a
confissão de Pedro que é conhecida como a profissão de fé petrina.
Jesus procede em dois tempos, fazendo sucessivamente a pergunta: quem
é Jesus na opinião dos homens (povo) e na opinião dos próprios
discípulos de Jesus. Há, portanto, duas maneiras de compreender
Jesus, uma que fica do lado de fora e a outra que atinge a realidade profunda.
“Quem dizem os homens ser o Filho do Homem (Filho do Homem = Eu)?”. Para
o povo (os homens), Jesus não tem personalidade própria. O povo simplesmente
assimila Jesus a personagens conhecidos do AT como Elias que era muito venerado
pelo povo e foi arrebatado até Deus de maneira milagrosa (2Rs 2,11) e cujo
retorno estava esperado como precursor do Messias (Ml 3,23-24; Eclo 48,10);
como João Batista (Herodes Antipas considerou Jesus como João Batista
ressuscitado dentre os mortos. cf. Mt 14,2); e como Jeremias que era associado
a uma renovação do culto no Templo. Jesus, então, é visto em continuidade com o
passado. O povo não consegue descobrir a novidade trazida por Jesus. Por isso
também o povo não é capaz de saber a originalidade de Jesus. A resposta do povo
fica na superfície e na margem da realidade verdadeira e profunda.
Jesus continua a perguntar para os mais íntimos, os seus discípulos: “E
vós, quem dizeis que Eu sou?”. Esta pergunta tem um sentido entre dois seres
que se amam e que descobrem o que são no olhar e no coração do outro. Tem um
sentido para aquele que assume uma responsabilidade para com os outros e que
tem necessidade de que ela seja reconhecida. Nesta pergunta coincidem
completamente o ser e a função. Ser o Messias significa existir exclusivamente
para todos os homens e ser Jesus significa ser aquele que salva todos os homens
(Mt 1,21). Por isso, é preciso que a resposta seja real, que exprima uma
experiência autêntica. Uma resposta puramente escolar ou a repetição duma
fórmula cuidadosamente registrada, criaria um equívoco total. Por isso, a
pergunta de Jesus obriga o homem a colocar-se de todo perante esse personagem
misterioso, a encontrar a resposta exclusivamente na contemplação da sua pessoa
e a empenhar todo o seu ser na resposta.
Em nome dos discípulos, Pedro responde: “Tu és o Messias, o Filho de Deus
vivo”. A resposta de Pedro atinge a verdadeira personalidade de Jesus, a sua
relação com Deus, diferente de tudo quanto conheceram os profetas e o povo, e a
sua missão no mundo, a qual interessa diretamente a todos os filhos de Israel
e, através deles, à humanidade inteira. A resposta de Pedro à pergunta de Jesus
é a mais comprometida. É uma profissão de fé messiânica que adquire dimensão
teológica. Estes dois títulos “Messias” (a profissão de fé pré-pascal) e “Filho de Deus vivo”
(a profissão de fé pós-pascal) resumem a fé da Igreja de Mateus.
O Messias” (“Mashiah”, hebraico = “Ungido”) é uma expressão
mais importante das esperanças de salvação no AT e no judaísmo subsequente. No
contexto da teologia bíblica, a questão do Messias tem especial relevância,
porque este título, em sua tradução grega “christos”, além de ser título
(Jesus, o Cristo), tornou-se praticamente o nome de Jesus (Jesus Cristo). No NT
este termo “Christos” é atribuído 530 vezes a Jesus de Nazaré.
Quando Pedro reconhece em Jesus o Messias, não renuncia à sua esperança
de judeu, mas dá a essa esperança o rosto que tem diante de si. É aquele que o
seu povo espera, aquele que vai mudar o destino das nações, que Pedro descobre
sob os traços de Jesus.
Se Jesus é o Messias, então, é preciso procurá-lo e é mister segui-lo.
Mas, certamente, acontece o contrário. Mt sublinha também o fato de Israel
desprezar o Messias que lhe foi enviado, principalmente foi desprezado pelas
autoridades (Mt 2,1-12;9,33s;12,23s;21,45s;26,4s etc...).
Pedro também professa que Jesus é o “Filho de Deus vivo”. “Filho de
Deus” é o título mais importante de Jesus, mas, sobretudo, é o mistério íntimo
de sua pessoa. Este segundo título, nesta profissão petrina, indica que Jesus
tem relação especial com Deus, como seu Filho. “Filho de Deus” é título
tradicional para líderes judaicos com aprovação divina. A autoridade e o poder
de Jesus vêm de Deus que o legitima em seu batismo (Mt 3,17) e na sua
transfiguração (Mt 17,5) e no reconhecimento da parte dos próprios discípulos
como tal quando Jesus anda sobre as águas (Mt 14,33). Até na cruz, Jesus é
tentado três vezes na sua qualidade de Filho de Deus (Mt 27,39-43). Estas três
tentações no final afirmam uma clara relação com três tentações do início do
relato (Mt 4,1-11). Ali, também, Jesus recém-proclamado Filho de Deus no
batismo, é tentado por Satanás para que use desta filiação numa demonstração de
poder em benefício próprio. Mas Jesus não é o Filho de Deus pela demonstração
de seu poder, e sim na aceitação da condição humana e na plena fidelidade à
vontade de Deus, seu Pai, na aceitação da cruz como consequência de sua
fidelidade ao projeto do Pai onde se manifesta a sua filiação divina.
Neste segundo título, Mt acrescenta também o adjetivo “vivo”: “Filho
de Deus vivo”. Jesus como o “Filho de Deus vivo” equivale à fórmula “Deus
Conosco/Emanuel” (Mt 1,23;18,20;28,20). Se Deus sempre está conosco porque Ele
é vivo. “Vivo” (cf. 2Rs 19,4.16;Is 37,4.17;Os 2,1;Dn 6,21) opõe o Deus
verdadeiro aos ídolos mortos; significa o que possui a vida e a comunica para
quem acredita nele (cf. Jo 10,10). O Deus de Jesus é vivo e vivificante. Jesus
é o Filho de Deus vivo, portanto também é doador de vida e vencedor da morte
(cf. Jo 11,25).
Consequentemente, quem crê em Jesus deve proteger a vida em todos os
instantes de sua existência, tanto a própria vida como a vida dos demais
homens. O Livro de Gênesis apresenta o homem como obra de Deus (Gn 2,7). O
sopro divino coloca o homem no âmbito humano e o distingue dos animais. A vida
de Deus é que sustenta a vida do homem. Nenhum outro vivente possui o hálito
divino. A vida do homem é divina. O homem pertence a Deus porque é obra de Suas
mãos. É o próprio do homem não pertencer a si mesmo. Ele é propriedade de Deus.
Por ser divina, a vida do homem jamais pode ser sacrificada, mal tratada,
agredida, vendida ou comprada. Jesus em quem acreditamos é “o Filho de Deus
vivo”.
Pedro É Rocha de Deus Sobre a Qual Se
Edifica a Igreja de Cristo
“Eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta rocha edificarei
a minha Igreja...”.
Jesus chama Simão de “Petros” (Pedro). “Petros” é tradução grega do
aramaico “Kepha” que significa “rocha”, e não pedra, pois pedra pode ser
arrancada ou ser jogada. A “rocha”, ao contrário, é símbolo da firmeza
incomovível/intransponível. Rocha é um termo que AT, especialmente nos Salmos
(por ex. Sl 18,3;31,4;71,3), se emprega ao próprio Deus. Deus é a rocha de
Israel, a guarita segura, o fundamento perene, o penhor da fidelidade e
perseverança. A segurança duradoura de um fundamento feito de rocha será
doravante representado por um homem chamado Simão. Ao ser chamado de “Petros”,
Simão não está recebendo um nome novo. Mas que o “ser rocha” será sua função e
sua missão. Ser “rocha” descreve plasticamente a tarefa que Jesus lhe confia:
ser rocha firme para que a Igreja não sucumba diante das dificuldades ou
problemas (cf. Mt 7,24-27).
“Edificarei
a minha Igreja”. A Palavra “Igreja” vem do grego “ekklesía” ( de
“ek-kaléin” = chamar de fora) e significava no princípio “convocação”. No texto
grego do AT (também chamado “Setenta”) “ekklesia” é um termo frequentemente
usado para designar a assembleia do povo eleito na presença de Deus (qahal, em
hebraico, indica a comunidade de Deus reunida em assembleia para o culto),
sobretudo quando se tratava da congregação no Sinai, onde Israel recebera a Lei
e fora constituído por Deus como seu povo santo.
Nos Evangelhos, o vocabulário “ekklesía” ocorre apenas duas vezes, ambas
em Mt (Mt 16,18;18,17). Mas nas Cartas paulinas se encontra 65 vezes, em At 23
vezes e em Ap 20 vezes. Quando a oposição entre judeus e os cristãos se tornou
viva e os discípulos de Cristo foram excluídos das sinagogas, eles constituíram
comunidades cristãs independentes com a designação genérica “ekklesía”. A
palavra grega, de fato, nunca foi traduzida, apenas adaptada.
Com um adjetivo possessivo “minha” em “minha Igreja” Mt sublinha assim o novo povo de
Deus criado por Cristo, a comunidade messiânica dos últimos tempos. Portanto,
não a antiga comunidade de Javé, mas a nova comunidade do Messias. Esta se
diferenciará pela profissão de fé em Jesus , o Messias (Cristo) e estar unida
em virtude dessa profissão.
A esta fundação Jesus promete duração perene: “...e o poder do inferno nunca poderá vencê-la” (v.18b). É a
consequência da solidez do edifício que se edifica sobre a rocha. Além da Igreja ir ser poupada da morte e ter
uma duração perpétua, também e sobretudo que, nela, haverá refúgio diante das
forças adversas da perdição. Esta explicação se baseia sobre a parábola de duas
casas, uma construída sobre a rocha e a outra sobre a areia, na conclusão do
Sermão da Montanha (Mt 7,24-27). Jesus constrói o novo povo de Deus, pondo
Simão como fundamento. Pedro torna-se rocha enquanto professa a sua fé em Jesus
Messias e Filho de Deus e os crentes do novo povo não cairão na perdição.
E a fé entra, então, como fator
qualitativo do fundamento.
Poder De Desligar e De Ligar
O texto deste domingo termina com a entrega da chave do Reino a Pedro: “Eu te darei as chaves do Reino dos Céus:
tudo o que tu ligares na terra, será ligado nos céus; tudo o que tu desligares
na terra, será desligado nos céus” (v.19).
A simbologia da chave refere-se ao fato de que ela tanto abre como fecha.
Na Bíblia, a chave significa a plenitude de poder dada ao seu dono (cf. Is
22,22;Ap 1,18;3,7). O Reino de Deus, aqui, parece se comparar a uma cidade,
guarnecida por portas, ou a uma casa na qual se entra pela porta. Para abrir e
fechar precisa-se de chave. E Pedro recebe as chaves de Jesus Cristo para ligar
e desligar.
Os termos “ligar” e “desligar” são a linguagem técnica usada pelos
rabinos que têm duplo significado: o poder de declarar que uma doutrina está
certa ou errada (no nível doutrinal), e o poder de excluir alguém da comunidade
de Israel temporária ou definitivamente ou de recebê-lo nela (no plano
disciplinar). Isso quer dizer que Jesus confere a Pedro o poder que abrange o
nível disciplinar de admitir na comunidade ou excluir da sua comunhão, e o
nível doutrinal de declarar autoritativamente, proibição ou permissão de uma
doutrina cujo fundamento são exigências divinas expressas nas Sagradas
Escrituras.
A decisão do Apóstolo tem valor que se indica através do uso dos termos
“terra” e “céu” (o ambiente humano e divino). Mt usa duas vezes esse par de
palavras de autoridade: aqui e em Mt 18,18. Em Mt 16,19, essa autoridade é
concedida a Pedro e, em Mt 18,18 (cf. Jo 20,23), é concedida à comunidade. Isto
quer dizer que Pedro é o primeiro, mas sempre entre os outros (primus inter pares).
A Igreja na qual o evangelista Mateus vivia, tinha a convicção de ser
Igreja “de Pedro”. Mateus se esforça em demonstrar que esta Igreja concreta tem
sua origem numa ordem expressa do Senhor. Ao dar “chave” a Pedro, Jesus faz no
fundo uma afirmação inaudita: alguém nesta terra tem, de fato, uma influência
sobre o acesso das pessoas ao Reino de Deus. A Igreja toda ficará
irrevogavelmente ligada ao múnus de Pedro, pois a ordem de Jesus é dada para
Simão Pedro. Não somente pela sua confissão de fé, mas por sua função de Kefa/Rocha, isto é, pedra fundamental.
Pedro tem a missão divina de representar, no seu múnus singular, o grupo todo
dos apóstolos na sua comum tarefa dada por Jesus.
O individualismo espiritualista hoje em dia, onde cada um quer regular
por si mesmo a relação com Deus, onde cada um quer fundar sua própria Igreja
sem ordem de Cristo, terá grande dificuldade de entender o enunciado do
Evangelho e a ordem de Jesus a Simão Pedro. Por isso, a pergunta fundamental
que cada seguidor de Jesus deve fazer é esta: Será que estamos sobre o
fundamento? Será que Pedro é rocha também para nós? Hoje, o Papa é esse Pedro.
“E vós, quem dizeis que Eu sou?”. Sem esta pergunta dirigida realmente a cada um
de nós, a leitura do evangelho de hoje poderá ser em vão. Não há Igreja a não
ser onde houver definição a respeito da pessoa de Jesus. Esta definição é
essencialmente uma opção. Dizer com Pedro que Jesus é o Messias significa não
ter mais a quem ir, senão a Jesus Cristo. É confessar sem a ajuda dos outros,
pois é uma opção. Significa que não há nenhuma salvação a não ser me Jesus.
Significa que não podemos voltar para trás, pois aquele que nos traz a salvação
está nos chamando para segui-Lo. Significa que tudo em mim, o mais íntimo e o
mais secreto, e o mais visível é julgado somente por Jesus que me conhece até
lá no fundo do meu coração. Significa que a opção por Jesus deve relativizar
toda nossa existência e deve pôr em questão tudo o que por nós construímos.
São Pedro e são Paulo são fundamento de nossa Igreja. São os dois homens
com um passado não precisamente brilhante.
Pedro é um predileto de Jesus desde o primeiro momento. Vive com o Senhor
os acontecimentos mais importantes de sua vida. Fogoso e temperamental, fala
que é capaz de seguir a Jesus até a morte. Basta uma insinuação de uma mulher
durante a Paixão do Senhor para negar-se discípulo do Senhor. No entanto, foi
escolhido para ser o primeiro entre as partes da Igreja.
Paulo também é um homem com tristes passados. Fiel à lei é muito
dogmático, duro e intransigente. Perseguia os cristãos pensando em fazer algum
favor para Deus. Mas no encontro com Jesus, Filho do Deus vivo, uma luz nova
penetrou seu interior e rompeu completamente com aquele estilo que tão
contrário com o estilo do Senhor. A partir de então, para Paulo será o amor de
Cristo que cimentará sua vida para sempre: “Ainda
que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria
como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de
profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse
toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada
seria. E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres,
e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada
disso me aproveitaria... Agora, pois,
permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor”
(1Cor 13,1-3.13).
Pedro e Paulo são as “pedras” fundamentais de nossa Igreja. Umas pedras
que têm suas gretas e suas rachadas, pois a única Pedra fundamental é o Cristo
e somente n´Ele não há fissura nem rachadura. Somente Cristo não tem mácula e
apresenta o verdadeiro e autentico rosto de Deus sem nenhuma deficiência.
As duas figuras, Pedro e Paulo, nos trazem uma mensagem de esperança. Na
vida podemos ter muitos defeitos e fraquezas a ponto de não conseguirmos sair
deles, mas ninguém pode escapar do amor de Deus desde que acolhamos este amor
com muita humildade. Pedro e Paulo são testemunhas de tudo isto. Como se os
dois quisessem nos dizer: “Não desista! Tudo tem seu tempo e sua solução, pois
Deus te ama”. É provável que, em
momentos difíceis de nossa vida, cheguemos a ouvir como Pedro: “Homem de pouca fé, por que duvidaste?”
(Mt 14,31). E veremos Jesus ao nosso lado, estendendo-nos a mão para nos
ajudar. Temos de saber perguntar a Jesus na intimidade da oração, como São Paulo:
“Que devo fazer, Senhor? Que queres que eu deixe por Ti? Em que desejas que eu
melhore? Neste momento da minha vida, que posso fazer por Ti?
Pedimos hoje a São Pedro e ao Apóstolo dos pagãos, Paulo, um coração como
o deles, para sabermos passar por cima das pequenas humilhações ou dos
aparentes fracassos que acompanham necessariamente a ação apostólica, ou a
nossa vida em geral. E dizemos a Jesus que estamos dispostos a conviver com
todos, a oferecer a todos a possibilidade de conhecê-lo e amá-lo, sem nos
importarmos com os sacrifícios nem pretendermos êxitos imediatos. Assim seja!
P. Vitus Gustama,svd