quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Festa Da Apresentação Do Senhor No Templo

A FESTA DA APRESENTAÇÃO DO SENHOR E SEU SENTIDO

Primeira Leitura: Ml 3,1-4

Assim diz o Senhor: 1 Eis que envio meu anjo, e ele há de preparar o caminho para mim; logo chegará ao seu templo o Dominador, que tentais encontrar, e o anjo da aliança, que desejais. Ei-lo que vem, diz o Senhor dos exércitos; 2 e quem poderá fazer-lhe frente, no dia de sua chegada? E quem poderá resistir-lhe, quando ele aparecer? Ele é como o fogo da forja e como a barrela dos lavadeiros; 3 e estará a postos, como para fazer derreter e purificar a prata: assim ele purificará os filhos de Levi e os refinará como ouro e como prata, e eles poderão assim fazer oferendas justas ao Senhor. 4 Será então aceitável ao Senhor a oblação de Judá e de Jerusalém, como nos primeiros tempos e nos anos antigos.

ou

Segunda Leitura: Hb 2,14-18

Irmãos,14 Visto que os filhos têm em comum a carne e o sangue, também Jesus participou da mesma condição, para assim destruir, com a sua morte, aquele que tinha o poder da morte, isto é, o diabo, 15 e libertar os que, por medo da morte, estavam a vida toda sujeitos à escravidão. 16 Pois, afinal, não veio ocupar-se com os anjos, mas com a descendência de Abraão. 17 Por isso devia fazer-se em tudo semelhante aos irmãos, para se tornar um sumo-sacerdote misericordioso e digno de confiança nas coisas referentes a Deus, a fim de expiar os pecados do povo. 18 Pois, tendo ele próprio sofrido ao ser tentado, é capaz de socorrer os que agora sofrem a tentação.

Evangelho: Lc 2,22-40

22 Quando se completaram os dias para a purificação da mãe e do filho, conforme a lei de Moisés, Maria e José levaram Jesus a Jerusalém, a fim de apresentá-lo ao Senhor. 23 Conforme está escrito na lei do Senhor: “Todo primogênito do sexo masculino deve ser consagrado ao Senhor”. 24 Foram também oferecer o sacrifício — um par de rolas ou dois pombinhos — como está ordenado na Lei do Senhor. 25 Em Jerusalém, havia um homem chamado Simeão, o qual era justo e piedoso, e esperava a consolação do povo de Israel. O Espírito Santo estava com ele 26 e lhe havia anunciado que não morreria antes de ver o Messias que vem do Senhor. 27 Movido pelo Espírito, Simeão veio ao Templo. Quando os pais trouxeram o menino Jesus para cumprir o que a Lei ordenava, 28 Simeão tomou o menino nos braços e bendisse a Deus: 29 “Agora, Senhor, conforme a tua promessa, podes deixar teu servo partir em paz; 30 porque meus olhos viram a tua salvação, 31 que preparaste diante de todos os povos: 32 luz para iluminar as nações e glória do teu povo Israel”. 33 O pai e a mãe de Jesus estavam admirados com o que diziam a respeito dele. 34 Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe de Jesus: “Este menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição. 35 Assim serão revelados os pensamentos de muitos corações. Quanto a ti, uma espada te traspassará a alma”. 36 Havia também uma pro­fe­tisa, chamada Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Era de idade muito avançada; quando jovem, tinha sido casada e vivera sete anos com o marido. 37 Depois ficara viúva, e agora já estava com oitenta e quatro anos. Não saía do Templo, dia e noite servindo a Deus com jejuns e orações. 38 Ana chegou nesse momento e pôs-se a louvar a Deus e a falar do menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. 39 Depois de cumprirem tudo, conforme a Lei do Senhor, voltaram à Galileia, para Nazaré, sua cidade. 40 O menino crescia e tornava-se forte, cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava com ele.

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1. Jesus Na Apresentação

A festa da Apresentação celebra uma chegada e um encontro: a chegada do Senhor desejado, núcleo da vida religiosa do povo e o bem-vindo concedido a ele pelos representantes dignos do povo eleito: Simeão e Ana. Por sua idade avançada os dois personagens simbolizam os séculos de espera e de anseio fervente dos homens e das mulheres devotos da Antiga Aliança (Antigo Testamento). Pode-se dizer que os dois simbolizam a esperança e o anseio da humanidade. 

Ao festejar e reviver este mistério na fé, a Igreja dá novamente as boas vindas para Jesus Cristo. Este é o verdadeiro sentido da festa. É a festa do encontro: encontro de Cristo e a sua Igreja. Isto vale para qualquer celebração litúrgica, mas especialmente para esta festa. A liturgia nos convida a dar boas vindas a Cristo e à sua Mãe, como fizeram Simeão e Ana. Ao celebrar esta festa a Igreja professa publicamente a fé na Luz do mundo (Jo 8,12), Luz de revelação para a humanidade.

A festa da apresentação é uma festa de Cristo, por excelência. É um mistério da salvação. O nome “apresentação” tem um conteúdo rico. Fala de oferecimento, de sacrifício. Recorda a auto-oblação inicial de Cristo, Palavra Encarnada, quando entrou no mundo: “Eis me aqui que venho para fazer Tua vontade”. Aponta para a vida de sacrifício e para a perfeição final dessa auto-oblação na colina do Calvário.  

2. A Presença De Maria Na Apresentação E Seu Significado 

Qual é o papel de Maria e José nessa Apresentação? Eles simplesmente cumprem o ritual prescrito, uma formalidade praticada por muitos outros casais? 

Para Maria, a Apresentação e oferenda de seu Filho no Templo não era um simples gesto ritual. Indubitavelmente, Maria não estava consciente de todas as implicações nem da significação profética desse ato. Ela não consegue alcançar todas as conseqüências de sua Fiat na Anunciação. Mas foi um ato de oferecimento verdadeiro e consciente. Significava que ela oferecia seu Filho para a obra da redenção, renunciando aos seus direitos maternais e toda a pretensão sobre seu Filho. Ela oferecia seu Filho à vontade de Deus Pai. São Bernardo comentou que Santa Virgem ofereceu seu Filho e apresenta ao Senhor o fruto bendito de seu ventre e o oferece para reconciliação de todos os homens (citado na Enciclica Marialis Cultius do Papa Paulo VI). 

Existe uma conexão entre esse oferecimento e o que sucederá na Gólgota quando se executam as implicações do ato inicial de obediência de Maria: “Faça-se em mim segundo Tua Palavra” (Lc 1,38b).

Na Apresentação Maria põe seu Filho nos braços do ancião Simeão. Esse gesto é simbólico. Ao atuar dessa maneira, ela oferece seu Filho não somente para Deus Pai, mas também para o mundo representado por aquele ancião. Dessa maneira, Maria desempenha seu papel de Mãe da humanidade e nos é recordado que o dom da vida vem através de Maria.

A festa deste dia não permite apenas revivermos um acontecimento passado. Ela também nos projeta para o futuro. Ela prefigura nosso encontro final com Cristo na sua segunda vinda, na Parusia. A procissão representa a peregrinação da própria vida. O povo peregrino de Deus caminha penosamente através deste mundo, no tempo, guiado pela Luz de Cristo e sustentado pela esperança de encontrar finalmente o Senhor da glória em Seu Reino eterno. Na bênção das velas o sacerdote pronuncia as seguintes palavras: “... Fazei que, levando as velas nas mãos em vossa honra e seguindo o caminho da virtude, cheguemos à luz que não se apaga”. A vela acesa na nossa durante a procissão recorda a vela de nosso batismo.  

3.   A Importância De Jerusalém Para Lucas          

Para Lucas, Jerusalém é importante, pois é centro de tudo. Por isso, todos os acontecimentos importantes da vida de Jesus acontecem em Jerusalém. Jerusalém é mencionado no início e no fim do relato (vv.22.25.38). A apresentação do Senhor acontece em Jerusalém. E em Jerusalém acontecerão sua morte e ressurreição. De Jerusalém ele subirá ao céu. E de Jerusalém partirá a missão cristã para o resto do mundo (cf. Lc 2,41-52;4,9-13;9,31.51.53;13,22;17,11;18,31;19,11.28-48;24,47-53;At 1,4.8). 

4. A Imposição Do Nome De Jesus          

Lucas, neste relato, quer sublinhar a importância da imposição do nome de Jesus que se afirma na frase principal: “Foi-lhe dado o nome de Jesus” (v.21). O nome “Jesus” foi escolhido pelo próprio Deus (Lc 1,31;2,21;cf. Mt 1,21).          

Para os judeus, o nome expressava a identidade e o destino pessoal que cada um devia realizar ao longo de sua vida.  E quando uma pessoa é eleita para uma nova missão, recebe um nome novo, em função da etapa de vida que começa (cf. Gn 17,5;17,15;32,29; Mt 16,18; cf. 2Rs 23,34;24,17;Is 62,2;65,15).          

Não há nenhum nome que coincidiu tão perfeitamente com o nome como no caso de Jesus. Jesus significa Salvador. Desde o primeiro instante de sua existência até a morte na cruz, ele foi o que significa seu nome: Salvador.          

Por isso, o nome de Jesus como Senhor e Salvador é invocado ao longo da história do cristianismo por bilhões de cristãos. O nome de Jesus é invocado, pois ele é o Senhor de tudo. Está acima de todo principado, de todo poder, de toda dominação e potência. Por mais poderoso que seja um político ou um atleta, um dia a morte o vencerá. Por mais rico que seja alguém, um dia a morte levará a melhor. Ao contrário, Jesus venceu a morte, pois ele ressuscitou. Por isso, São Paulo afirma: “Se confessas com tua boca que Jesus é o Senhor, e crês em teu coração, que Deus o ressuscitou dos mortos, tu serás salvo”(Rm 10,9; cf. Rm 8,35-39). Jesus é o Senhor porque vive uma vida sobre a qual a morte não tem poder algum. Ele detém a chave do segredo da vida e ilumina o mistério da vida.          

A soberania do Senhor Jesus pode nos dar uma força imensa para combater o mal dentro de nós e o mal ao nosso redor. Jesus é Senhor exprime uma fé libertadora que tira de nossas vidas toda a angústia exagerada. Jesus é Senhor implica que ele é Senhor de nossa vida. Exprime uma entrega, um total abandono nas mãos do Senhor. Implica construir a vida sobre ele (cf. Mt 7,24-25) e não sobre os fundamentos fracos e frágeis(cf. Mt 7,26-27).

5. Jesus É Sinal De Contradição         

Israel tinha murmurado contra Deus na passagem do deserto (Nm 20,1-13;Dt 32,51). Na apresentação do Senhor no templo, Simeão profetiza a nova rebelião de Israel contra Jesus, que será relatada no evangelho da vida pública e da paixão e a rejeição da missão cristã em Israel que será contada no livro de Atos. Tudo isto resulta também no sofrimento de sua mãe, Maria.          

Lucas relata ao longo de sua obra que diante de Jesus e sua missão, uns são a favor, outros contra; uns abrem os olhos à luz, outros os fecham; uns encontram força nele e por isso, se levantam, enquanto os outros tropeçam e caem por não crer. Isto quer dizer que ninguém pode ficar indiferente diante de Jesus: ou aceitar Jesus para ser libertado ou rejeitá-lo que significa tropeço na caminhada.         

Jesus e seu evangelho continuam sendo em todos os tempos e lugares sinal de divisão e de contradição. Perante Jesus e seu evangelho ninguém pode ficar indiferente: ou aceitar ou rejeitar, com conseqüências para cada opção feita. A salvação é oferecida a todos, mas não é dada automaticamente nem pode ser recebida passivamente. Ela tem que ser recebida conscientemente como um compromisso a ser assumido a vida toda. O Evangelho de Jesus, quando for proclamado e vivido verdadeiramente, sempre incomoda tanto para quem o prega e vive como para quem o escuta, pois ele é como uma luz que brilha na escuridão: revela o verdadeiro ser de pessoas e das coisas. Aquele que quer manter uma vida falsa e dupla ou camuflada, a presença do Evangelho funciona como se fosse um espinho que irrita a carne. Se alguém não tiver medo de ser feliz, a presença incômoda do Evangelho será um momento oportuno de libertação. Para quem vive somente em função do prazer, não tem prazer de viver. O prazer tem que ser fruto de um viver bem.

6. Nós E Ancião Simeão          

Na parte central do relato (vv.25-35) encontramos o ancião Simeão. Ele é apresentado como um homem justo e piedoso, isto é, um homem fiel aos mandamentos de Deus. Ele se deixa guiar pelo Espírito Santo e por isso, compreende o sentido de sua existência. Ele é o símbolo da perseverança. Apesar de ter consciência de sua iminente morte, continua esperando a salvação. Na sua velhice ele é premiado, pela sua fidelidade e perseverança, pela presença do Messias esperado. Ele é uma pessoa que sabe olhar para frente para viver melhor o presente.          

A partir de Deus e com Deus nada é perdido no mundo. Simeão é a testemunha e prova disto. Ele nos ensina a conversarmos com Deus permanentemente e a olharmos para a frente. Ele nos ensina a olharmos para Jesus, o nosso Salvador e a irmos ao Seu encontro. No encontro com Jesus, como aconteceu com Simeão, são realizadas nossas esperas e esperanças, encontramos alegria e paz, nossos olhos são iluminados para ver as pessoas e as coisas no seu justo valor, como também a nossa própria vida. Mas para que o nosso encontro com Jesus aconteça, precisamos nos deixar guiar pelo Espírito Santo. 

7. O Silêncio De Maria E O Nosso Silêncio          

No relato, Maria é descrita como uma personagem que não profetiza nem fala. Em outras palavras, ela está em silêncio total. Ela acolhe na obediência as profecias sobre o futuro de seu Filho silenciosamente.          

Maria nos ensina a fazermos o silêncio obrigatório no meio de nossa vida e trabalho para vermos melhor as coisas, os acontecimentos e as pessoas na sua justa perspectiva e no seu justo valor. O silêncio chega quando as nossas energias começam a descansar e nos acolhe quando o nosso ego fica em paz e sossego. Quando não sabemos o que é descansar, não sabemos também o que é viver. O nosso ego não é o nosso centro de gravidade. O ego é o centro de todos os desejos desenfreados, dos lucros, possessões e domínios. Hoje em dia há uma dependência exagerada do trabalho. Quando há dependência, não existe liberdade. Há pessoas que se entregam a tudo desde que não fiquem no vazio. A vida nunca é o que se consegue. Não é o que se tem. A vida é o que se é. Não se pode ignorar que tudo quanto se alcança, se perde. Só o que se é, permanece. O silêncio, por isso, é tão importante, pois ele nos leva a encontrarmos o nosso eixo. As nossas palavras serão boas, se brotarem do silêncio. E Deus nunca cessa de clamar, mas para escutarmos a sua voz é preciso criarmos o silêncio dentro de nós. E a escuta exige uma atenção total e plena. O silêncio é um vazio que faz tornar presente a plenitude. Mas a plenitude não se torna presente de repente. É preciso tempo. Na semente está a qualidade do fruto, mas naturalmente é preciso tempo. Dizia Cícero: “Há três coisas na vida nas quais não pode haver pressa: a natureza, um ancião e a ação dos deuses na tua história”. O silêncio é esvaziar-se para receber. No silêncio diminuem as defesas e fica-se pronto para receber o que vier. O silêncio quando se souber aproveitá-lo melhor, ele será frutificante e benéfico para quem o cria e consequentemente para os que o cercam.

P. Vitus Gustama,svd

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

01/02/2024-Quintaf Da IV Semana Comum

SER CRISTÃO É SER VERDADEIRO MENSAGEIRO DO SENHOR

Quinta-Feira da IV Semana Comum

Primeira Leitura: 1Rs 2,1-4.10-12

1 Aproximando-se o fim da sua vida, Davi deu estas instruções a seu filho Salomão: 2 “Vou seguir o caminho de todos os mortais. Sê corajoso e porta-te como um homem. 3 Observa os preceitos do Senhor, teu Deus, andando em seus caminhos, observando seus estatutos, seus mandamentos, seus preceitos e seus ensinamentos, como estão escritos na lei de Moisés. E assim serás bem-sucedido em tudo o que fizeres e em todos os teus projetos. 4 Então o Senhor cumprirá a promessa que me fez, dizendo: ‘Se teus filhos conservarem uma boa conduta, caminhando com lealdade diante de mim, com todo o seu coração e com toda a sua alma, jamais te faltará um sucessor no trono de Israel”’. 10 E Davi adormeceu com seus pais e foi sepultado na cidade de Davi. 11 O tempo que Davi reinou em Israel foi de quarenta anos: sete anos em Hebron e trinta e três em Jerusalém. 12 Salomão sucedeu no trono a seu pai Davi e seu reino ficou solidamente estabelecido.

Evangelho: Mc 6,7-13

Naquele tempo, 7Jesus chamou os doze e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os espíritos impuros. 8Recomendou-lhes que não levassem nada para o caminho, a não ser um cajado; nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura. 9Mandou que andassem de sandálias e que não levassem duas túnicas. 10E Jesus disse ainda: “Quando entrardes numa casa, ficai ali até vossa partida. 11Se em algum lugar não vos receberem, nem quiserem vos escutar, quando sairdes, sacudi a poeira dos pés, como testemunho contra eles!” 12Então os doze partiram e pregaram que todos se convertessem. 13Expulsavam muitos demônios e curavam numerosos doentes, ungindo-os com óleo.

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Palavras de “Adeus” e Palavras de “Enviados”

Depois que meditamos sobre o texto do livro de Samuel (1Sm e 2Sm) durante algumas semanas, agora começamos a acompanhar a leitura do Livro dos Reis durante alguns dias. 

Os livros dos Reis, na Bíblia hebraica, formavam um só livro sem divisão. A divisão em dois livros é tardia. E seu objetivo material é a história de Israel (Reino do Norte) e de Judá (Reino do Sul) e, mais concretamente, de seus reis, desde Salomão até os últimos reis de Israel e de Judá. Porém, com os livros dos Reis é produzido um fato novo: se em Josué, Juizes e nos livros de Samuel o que se narra é a história particular de Israel, a partir de agora, com os livros dos Reis, a história dos povos vizinhos e dos grandes impérios passa a fazer parte da história de Israel e, por sua vez, Israel é citado claramente na história de outros povos.

O conteúdo global dos Livros dos Reis é a história dos reis de Israel e de Judá, desde a morte de Davi até o exílio para Babilônia, que vão desde 970 a.C, aproximadamente, até 561 a.C. Apesar de sua finalidade teológica os Livros dos Reis são o mais importante documento bíblico para a reconstituição histórica do período que vai desde o reinado de Salomão até a destruição de Jerusalém em 587 a.C.

A Primeira Leitura nos conta que o reinado de Davi terminou, tão importante na história de Israel. Lemos os conselhos que Davi deu para seu filho Salomão antes de empreender “o caminho de todos os mortais” como ele próprio diz. Aparece aqui o esquema que se repete nas despedidas típicas da Bíblia (Jacó, Moisés, Paulo, Jesus).

Assim começamos a leitura do Primeiro Livro dos Reis, que continua a história do povo a partir da morte de Davi. Lemos uma primeira parte agora durante dez dias: desde o reinado de Salomão até a divisão de seu reino na época de seu sucessor. 

As últimas recomendações de Davi, antes de sua morte, são um programa completo de ação para um rei que deve ser politicamente eficaz, mas ao mesmo tempo um humilde servo de Deus: ser corajoso - "coragem, seja homem" - e anda segundo os caminhos de Deus, seguindo fielmente suas normas, a fidelidade de Deus, que fez uma aliança com seu povo, será assegurada. 

Como outros grandes personagens da história de Israel (Moisés, Samuel), Davi, no momento de morrer, deixa um legado a Salomão, seu filho. Esse testamento (1Rs 2,1-9) apresenta duas partes claramente diferenciadas: uma teológica e outra política. 

A primeira parte do testamento (1Rs 2,2-4) é uma exortação de estilo deuteronomista evidente e recorda a exortação de Moisés ao povo e ao seu sucessor, Josué (Cf. Dt 31,7.28; Cf. Js 1). Segundo Davi, o bem-estar e a proteção divina de Salomão dependerão da obediência fiel à Lei de Moisé e seu perfeito cumprimento. 

A segunda parte do testamento (1Rs 2,5-9) trata das medidas políticas que Salomão tem de tomar, as quais o encarregou seu pai. Esta segunda parte não aparece na leitura de hoje. 

Os dias da morte de David estão se aproximando. Seu papel tem sido muito importante. Ele criou solidamente a unidade das doze tribos de Israel, que até então viveram independentes. Ele pacificou o país da Palestina, de Dan a Bersabé, rejeitando todos os inimigos que ainda atacaram os hebreus. Ele deu uma capital e uma cidade santa, Jerusalém, ao povo de Israel. Já sabemos que Davi não é um homem perfeito. Mas, é incontestavelmente foi um homem que vivia "diante de Deus". O seu testamento espiritual, que confia a seu filho Salomão na Primeira Leitura de hoje, é a prova suprema disso. 

Vou seguir o caminho de todos os mortais, disse Davi a Salomão, seu filho. É uma fórmula maravilhosa para falar sobre a morte. A morte é o "caminho de todos". Morrer é caminhar de volta para o Criador do universo. Morrer é caminhar para a Casa paterna (cf. Jo 14,1-3). Ninguém escapa disso, pois quem nasce morre. Cada encontro termina com a despedida. Vou seguir o caminho de todos os mortais. Fórmula de humildade e solidariedade com toda a humanidade. Nem eu me escaparei disso e nem você se escapará disso. Um dia eu vou pegar aquele caminho através do qual todos os homens passam. Eu preciso ter consciência disso para começar a parar de ter tanta ganância, de tanta prepotência, de tanta falta de amor fraterno para começar a viver na fraternidade. Eu preciso valorizar a vida que cada dia, pois um dia se escapa de mim. Eu preciso valorizar minha família, minhas amizades, o almoço junto com a minha família, pois um dia tudo acabará neste mundo em que eu vivo. Eu preciso deixar uma marca boa de minha passagem neste mundo: que as pessoas melhorem por causa da minha presença com elas. 

Sê corajoso e porta-te como um homem. É o segundo conselho de Davi ao seu filho Salomão. É o conselho de valentia. Não se deixar abater. As pessoas podem tomar somente o que temos, mas nunca o que somos. Permanecer em pé nas adversidades confiando em Deus é o que Davi fala para seu filho, Salomão. Quando as forças humanas começarem a se esgotar, a fé vai renová-las outra vez. 

Sê corajoso e porta-te como um homem”. Aquele  que nos criou a sua imagem e semelhança é o único ponto de referência  para que o homem encontre sua realização plena. Por isso, Davi convida seu filho Salomão dizendo-lhe: tenha valor e seja homem! E em seguida, Davi indica a Salomão, seu filho que viva fiel a Deus seguindo Seus caminhos e observando seus mandamentos. À margem do Senhor, ninguém pode chegar a ser plenamente homem. Por temos que estar sempre dispostos não somente a caminhar na presença do Senhor, mas também a escutaar sua Palavra e a pô-la em prática. Aprendamos a crer n´Aquele que Deus Pai nos enviou e aprendamos a tomar nossa cruz de cada dia e ir, generosa e amorosamente atra´s de suas pegadas. Somente então que Deus se converterá para nós em uma bênção. 

Além disso as últimas recomendações de Davi são todo um programa de atuação para um rei que deve ser eficaz politicamente, mas, ao mesmo tempo, humilde servidor de Deus: “Observa os preceitos do Senhor, teu Deus, andando em seus caminhos, observando seus estatutos, seus mandamentos, seus preceitos e seus ensinamentos, como estão escritos na lei de Moisés. E assim serás bem-sucedido em tudo o que fizeres e em todos os teus projetos”. 

Palavras de “adeus” são as do rei Davi moribundo, que se sente, por uma parte, coberto de bênçãos do alto do céu, e, por outra parte, marcado por muitos pecados que acontecem em sua vida. Quer nos dizer que Deus atua muita por cima de nossos merecimentos, porque sua escolha de nós e sua fidelidade duram para sempre. Deus se compadece em derramar bondades sobre aqueles que sendo pecadores reconhecidos, Lhe pedem perdão, como Davi. Vivamos, pois, sempre na presença do Senhor, ao menos como pecadores arrependidos. 

Começa assim o reinado de Salomão no qual a monarquia chegará a seu maior esplendor, que durará muito pouco, porque imediatamente depois, com a divisão do Norte e o Sul, começará a decadência. 

Também deveria ser este o tom das recomendações que uns pais fazem para seus filhos ou uns educadores aos que estão se formando. Os valores que mais lhes vão servir em sua vida, mais que as riquezas ou os títulos, são os valores profundos humanos e cristãos. Valores que, num tempo de tanta corrupção, de tanta mentira e de tana superficialidade, lhes darão consistência humana e lhes atrairarão a bênção de Deus e a simpatia e a solidariedade dos homens. 

Quando programarmos nossa vida, ou uma próxima etapa ou o próximo ano, também deveríamos dar importância aos valores mais profundo, e não aos mais aparentes. Não viver superficialmente; Viver com responsabilidade; Estar antento a Deus; Seguir os caminhos de Deus e Estar em comunhão com a vontade de Deus são os conselhos de Davi que jamais perdem sua atualidade, pois estão ai o coração de nossa vida. 

Também deveria ser este o tom das recomendações que uns pais fazem para seus filhos, ou uns educadores para aqueles que estão se formando. Os valores que vao servir-lhes em sua vida, mais que as riquezas ou títulos ou as qualidades humanas, são os valores profundos humanos e cristãos. São valores que, em um tempo de tanta corrupção e superficialidade, lhes darão consistência humana e lhes atrairão a benção de Deus e a dos homens. 

Somos Todos Os Enviados Do Senhor

O texto do evangelho de hoje faz parte de uma seção chamada a “Seção dos Pães” (Mc 6,6b-8,30), seção que nos leva até a confissão de Pedro, ponto culminante da primeira parte do evangelho de Marcos. 

O texto do evangelho nos fala do envio dos discípulos para a missão. Eles já têm acompanhado Jesus durante um período relativamente longo. Eles têm escutado os ensinamentos de Jesus em parábolas e suas explicações complementares. Têm presenciado seus milagres. Agora eles devem empreender a segunda fase do programa, pregando a conversão e dando a conhecer a oferta divina de salvação. 

 “Jesus chamou os doze e começou a enviá-los...”. Esta é a primeira vez que os Doze vão se encontrar sós, sem Jesus, longe dele. É o tempo da Igreja. É o tempo da prática. 

Durante os cinco primeiros capítulos de seu relato, o evangelista Marcos nos apresentou Jesus com seus discípulos, com muita insistência, diante da multidão e dos adversários. No momento de sua vocação (Mc 3,13-14), o evangelista Marcos havia dito: “Jesus constituiu Doze para que ficassem com ele, para enviá-los a pregar...”.  É igual ao movimento do coração: diástole, sístole... O sangue vem ao coração e do coração é enviado ao organismo. Dessa maneira é que o organismo pode se manter. É o mesmo movimento do apostolado: viver com Cristo, ir ao mundo para levar o Cristo; intimidade com Deus, presença no mundo com o espírito de Deus. Quem não vive, primeiro, com Cristo, não pode ser um bom missionário, não pode ser um cristão crível no mundo. Um cristão tem que animar tudo com espírito de Cristo.       

O texto procura mostrar como deve agir o seguidor de Jesus e o que vai acontecer com ele se sair pelo mundo para pregar o Evangelho. Tudo isto se resume numa só idéia: o seguidor deve agir como o Mestre Jesus agiu. O que aconteceu com o Mestre vai acontecer também com o discípulo, pois o discípulo não é maior do que o próprio Mestre (Mt 10,24).        

No Evangelho de hoje Jesus anuncia alguns pontos fundamentais para o discípulo/seguidor realizar a missão:          

Em primeiro lugar, o texto diz que Jesus envia os discípulos dois a dois. “Jesus chamou os doze e começou a enviá-los dois a dois...” (Mc 6,7). O andar dois a dois em uma missão era costume hebraico (cf. Lc 7,13; Jo 1,37 e das narrativas dos Atos dos Apóstolos). Para a tradição hebraica eram necessárias duas testemunhas, para que as suas palavras fossem juridicamente válidas.  Isto nos mostra que “Dois a dois” quer enfatizar que a missão é um serviço comunitário e os cristãos devem ajudar-se mutuamente em suas atividades; não é um trabalho de promoção pessoal; é um trabalho de conjunto ou coletivo. “Ir dois a doisimplica também a afirmação da igualdade e exclui a subordinação de um ao outro (cf. Dt 19,15). Quem vive o Evangelho do Senhor deve estar em sintonia com os irmãos da sua comunidade.

Jesus começou a enviá-los dois a dois...” Independentemente das razoes bíblicas esta expressão é muito moderna e avançada. Na Igreja de Jesus não se trabalha só e sim em equipe. É a vontade explicita de Cristo. A atitude de quem trabalha na Igreja, na comunidade eclesial deve ser interrogada a partir daqui. O individualismo tem formas muito sutis: não gostamos que os nossos irmãos controlem nossos próprios comportamentos apostólicos e outros comportamentos; cada um quer ser uma estrela solitária a ponto de apagar o brilho do outro; nada se discuta, cada um vai fazer as coisas do jeito que quer. O pior é que o Cristo fica de lado ou de costas para a pessoa em questão estar em destaque.          

Em segundo lugar, Jesus deu aos doze o poder messiânico de Cristo contra as forças do mal, ou seja, a autoridade para libertar as pessoas de tudo aquilo que aliena, oprime e despersonaliza as pessoas. Jesus faz seus discípulos participarem de sua própria autoridade, que é o poder de acompanhar o ensinamento com obras prodigiosas (Mc 1,22ss). Com esse poder e a esse poder as forças do mal ou as forças da violência se submentem. Essas forças do mal ou da violência são representadas pelos “espíritos imundos” (cf. Mc 1,23). O evangelista Marcos resume o poder dos enviados em três palavras: o carisma da “palavra” que proclama a necessidade de mudança de vida; o carisma de expulsar demônios, isto é, o poder contra o mal; e o carisma de “curar os enfermos”, isto é, melhorar a vida humana na sua qualidade. 

Eles são enviados com autoridade sobre os espíritos imundos, para dominá-los e não para dominar os outros irmãos.  O cristão tem o poder de tirar esse mal, pois o Senhor Jesus lho deu. A primeira tarefa de cada cristão consiste em tirar o mal que está no meio das comunidades, no meio da própria família, de dentro do próprio coração. Quem é livre pode libertar os outros. O enviado de Jesus, cada cristão deve instaurar um mundo mais justo e fraterno; deve melhorar a vida humana.           

Em terceiro lugar, Jesus exige dos doze um modo de vida baseada num desprendimento absoluto dos bens materiais (vv.8-9). Jesus pede que os discípulos vivam um estilo de austeridade e a pobreza evangélica de modo que não se ponham ênfase nos meios humanos: econômicos ou técnicos e sim na força de Deus que ele lhes transmite. Deus não se serve de anjos nem de revelações diretas. É a Igreja, ou seja, os cristãos que continuam e visibilizam a obra salvadora de Cristo e o modo de vida do cristão deve ser reflexo do de Cristo. A linguagem que o mundo de hoje facilmente entende: austeridade e o desinteresse na hora de fazer o bem: o cristão deve fazer o bem pelo bem e não por algum interesse por trás. É claro que necessitamos os meios que fazem parte da evangelização, porém jamais podemos nos deixar de nos apoiar na graça de Deus e na nossa fé sem buscar seguranças e prestígios humanos.

Trata-se de uma pobreza voluntária, porque somente assim eles poderiam ser considerados como fidedignos. Jesus enfatiza mais o ser dos discípulos do que o seu ter. Jesus não despreza os bens deste mundo, não apresenta a miséria como um ideal de vida, mas alerta para o perigo de nos deixarmos condicionar pela posse de bens materiais. A porta da morte é tão estreita que somente passa aquilo que é a bagagem de amor na condivisão dos bens materiais com os irmãos e irmãs que não têm nada para sua vida. 

O desapego a tudo não implica somente a renúncia a uma carga pesada de bens materiais, mas também o abandono de preconceitos, de tradições, de idéias retrógradas, às quais muitas vezes estamos amarrados de uma forma emocional e irracional. Referimo-nos ao pesado ônus representado por certos usos, por certos costumes, por certas tradições religiosas embutidas em determinado ambiente histórico e cultural, que muitos, confundem ou equiparam com os valores do Evangelho. Não podemos acumular “bastões”, “dinheiro”, “sandálias” e “túnicas”.          

Em quarto lugar, Jesus envia os doze para pregar a mudança de vida (conversão) para si e para os outros (v.12). Para Jesus, a conversão é condição sine qua non para construir uma sociedade nova ou Reino de Deus (Mc 1,15). A conversão sempre envolve movimento de uma dimensão para outra. E isso envolve a pessoa toda, não apenas seu senso moral, sua capacidade intelectual ou sua vida espiritual. Corpo, mente e alma juntos são afetados pelo ato da conversão, e as conseqüências são sentidas em todos os aspectos da vida da pessoa, inclusive nos campos social e político.           

Em quinto lugar, a outra instrução de Jesus prevê uma atitude de bom senso e formação de comunidade: “Quando vocês entrarem numa casa, fiquem aí até partirem” (v.10). 

É interessante observar que não se fala para os discípulos irem às sinagogas, instituição judaica, o que seria contrario à finalidade do envio. Menciona-se somente “o lugar” e “a casa/ família” que podem encontra-se em qualquer país. Hão de aceitar a hospitalidade que a eles é oferecida, sem mudar de casa, para não desprezar a boa vontade do povo nem afrontar a hospitalidade oferecida. Os discípulos devem aceitar o que a eles são oferecidos sem mostrar reações ao uso do lugar. 

“Quando vocês entrarem numa casa, fiquem aí até partirem (v.10). Isto não indica a plena estabilidade para os discípulos, mas um local onde, com a sua partida, a comunidade possa continuar a se reunir e dar prosseguimento à Boa Nova do reino. Os cristãos devem ensinar os outros a assumirem o compromisso, a andarem com as próprias pernas. 

Para os Doze, o novo Israel, esta instrução implica uma mudança radical de mentalidade: entrar em casa de pagãos, desprezados pelos judeus, e depender deles para a sobrevivência. Jesus pretende que os discípulos esqueçam sua identidade judaica para colocar-se no plano da humanidade. É preciso viver a humanidade para se tornar humano para os outros. 

Sacudi a poeira dos vossos pés”. Trata-se de um gesto quase proverbial, habitual aos hebreus, quando, passando pela região pagã, entravam em sua terra, para significar que deixavam para traz aquilo que era impuro.            

À luz do Evangelho de hoje procuremos nos perguntar: será que somos meros espectadores e admiradores de Jesus ou somos seus seguidores? O que pode estar tornando menos convidativo e pouco crível a nossa mensagem? Qual é o testemunho que devemos dar para que os outros acreditem na nossa mensagem? É impossível ser um verdadeiro cristão sem estar com Cristo antes.

P. Vitus Gustama,svd

31/01/2024-Quartaf Da IV Semana Comum

DEUS ESTÁ NO NOSSO COTIDIANO: ESTEJAMOS ATENTOS SOBRE SUA PRESENÇA ENTRE NÓS

Quarta-Feira Da IV Semana Comum

Primeira Leitura: 2Sm 24, 2.9-17

Naqueles dias, 2 disse o rei Davi a Joab e aos chefes de seu exército que estavam com ele: “Percorrei todas as tribos de Israel, desde Dã até Bersabéia, e fazei o recenseamento do povo, de maneira que eu saiba o seu número”. 9 Joab apresentou ao rei o resultado do recenseamento do povo: havia em Israel oitocentos mil homens de guerra, que manejavam a espada; e, em Judá, quinhentos mil homens. 10 Mas, depois que o povo foi recenseado, Davi sentiu remorsos e disse ao Senhor: “Cometi um grande pecado, ao fazer o que fiz. Mas perdoa a iniquidade do teu servo, porque procedi como um grande insensato”. 11 Pela manhã, quando Davi se levantou, a palavra do Senhor tinha sido dirigida ao profeta Gad, vidente de Davi, nestes termos: 12 “Vai dizer a Davi: Assim fala o Senhor: dou-te a escolher três coisas: escolhe aquela que queres que eu te envie”. 13 Gad foi ter com Davi e referiu-lhe estas palavras, dizendo: “Que preferes: três anos de fome na tua terra, três meses de derrotas diante dos inimigos que te perseguem, ou três dias de peste no país? Reflete, pois e vê o que devo responder a quem me enviou”. 14 Davi respondeu a Gad: “Estou em grande angústia. É melhor cair nas mãos do Senhor, cuja misericórdia é grande, do que cair nas mãos dos homens!” 15 E Davi escolheu a peste. Era o tempo da colheita do trigo. O Senhor mandou, então, a peste a Israel, desde aquela manhã até o dia fixado, de modo que morreram setenta mil homens da população, desde Dã até Bersabéia. 16 Quando o anjo estendeu a mão para exterminar Jerusalém, o Senhor arrependeu-se desse mal e disse ao anjo que exterminava o povo: “Basta! Retira agora a tua mão!” O anjo estava junto à eira de Areuna, o jebuseu. 17 Quando Davi viu o anjo que afligia o povo, disse ao Senhor: “Fui eu que pequei, eu é que tenho a culpa. Mas estes, que são como ovelhas, que fizeram? Peço-te que a tua mão se volte contra mim e contra a minha família!”

Evangelho: Mc 6,1-6

Jesus voltou com os seus discípulos para a cidade de Nazaré, onde ele tinha morado. No sábado começou a ensinar na sinagoga. Muitos que o estavam escutando ficaram admirados e perguntaram: - De onde é que este homem consegue tudo isso? De onde vem a sabedoria dele? Como é que faz esses milagres? Por acaso ele não é o carpinteiro, filho de Maria? Não é irmão de Tiago, José, Judas e Simão? As suas irmãs não moram aqui? Por isso ficaram desiludidos com ele. Mas Jesus disse: - Um profeta é respeitado em toda parte, menos na sua terra, entre os seus parentes e na sua própria casa. Ele não pôde fazer milagres em Nazaré, a não ser curar alguns doentes, pondo as mãos sobre eles. E ficou admirado com a falta de fé que havia ali.

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É Preciso Pôr Sempre Nossa Confiança Em Deus Que Nos Garante a Vitória Final

Cometi um grande pecado, ao fazer o que fiz. Mas perdoa a iniquidade do teu servo, porque procedi como um grande insensato”. É a lamentação e a oração do rei Davi depois do recenseamento que lemos na Primeira Leitura de hoje.

Estamos no fim da leitura do segundo livro de Samuel  (2Sm 24). Porém, a dramática da sucessão de Davi não se acaba com o capítulo 20 do Segundo Livro de Samuel, e sim continuará em 1Rs 1-2. No final do Segundo Livro de Samuel é interrompido o fio da narração por causa da intercalação como em uma espécie de apêndice seis documentos ou relatos heterogêneos relativos ao reinado de Davi. Um deles é o do censo da população que hoje lemos.

Este capítulo 24 do segundo livro de Samuel mantém relação com 2Sm 21,1-14 que fala da fome que durou três anos (2Sm 21,1). E no texto de hoje fala de três dias de peste (2Sm 24,13). Em outras palavras, nestes dois capítulos (21 e 24) fala-se de calamidades públicas tomadas como castigo de Deus em consequência dos pecados cometidos (em 2Sm 21: pecados de Saul; em 2Sm 24: pecados de Davi), conforme a crença na época. Em ambos os casos o favor divino é invocado e Deus deu resposta positiva. O texto de hoje fala do recenceamento do povo e da peste durante três dias.

Depois de ter feito o recenseamento, Davi sentiu remorso: “Cometi um grande pecado, fazendo isso!” (2Sm 24,10). Mais uma vez, a grandeza de Davi se manifesta no fato de saber reconhecer suas faltas. Ele é pecador, como todos os homens, porém lúcido e leal.

 Por que Davi reagiu deste modo? O livro de Samuel quer nos enfatizar a teologia da graça no sentido de que as vitórias e a salvação em geral se devem não aos exércitos humanos e sim à força de Deus (Cf. 1Sm 2,1-11: o canto de Ana; 1Sm 7,10-12: a vitória de Samuel sobre os filisteus; 1Sm 17: a vitória de Davi sobre Golias, e assim por diante). Em vista desta teologia, o pecado de Davi consiste em pôr a confiança não na força e na graça de Deus e sim nas forças e estratégias humanas. Consequentemente, Davi mandou fazer o recenseamento para saber com quantos homens Davi poderia contar na batalha contra os inimigos. Sem querer querendo Davi não conta com Deus. “Quem não conta com Deus é porque não sabe contar”, dizia o filósofo B.Pascal.

Depois do pecado vem o castigo em forma de peste. Mas fica para nós uma pergunta: Como pode Deus fazer o povo pagar um pecado do rei (Davi)?”. Em todo o Antigo Testamento há um grande sentido de solidariedade coletiva, de todos os membros do povo eleito entre si e entre eles e seu líder (chefe). O povo se beneficia da oração e dos sacrifícios oferecidos pelo rei e sofre as consequências de seus pecados. E por sua vez, o povo reza pelo rei, e a infidelidade coletiva causará a queda do reino. Recordemos o tema de Jesus Cristo, Novo Adão: se pela transgressão  de somente um a morte reinou, os que receben a abundancia da graça e o dom da justiça reinarão pela obra de um só: Jesus Cristo (Cf. Rm 5).

Esta é a lógica geral do Antigo Testamento sobre pecado e castigo: Não existe pecado sem castigo nem castigo que não tenha sua origem no pecado. No Novo Testamento, ao encontrar-se com o cego de nascença, os discípulos perguntam a Jesus, dentro desta teologia, se aquela cegueira é o fruto do pecado dos pais do cego ou consequência do próprio pecado do cego? (Cf. Jo 9,1). Jesus e o NT acabaram com esse círculo vicioso e esclareceram uma doutrina nova (Cf. Jo 9,2-3; Lc 13,1-15). 

A exemplo de Davi, podemos também cair no pecado da autossuficiência, do orgulho, da prepotência, da confiança excessiva nas nossas capacidades e nos meios humanos, econômicos, estruturais, ideológicos, estratégicos. A arrogância ou “o orgulho é o complemento da ignorância(Bernard de Fontenelle). O excesso de confiança não dá margem para melhorar. O orgulhoso termina, em muitas ocasiões, humilhado. “A ciência é orgulhosa pelo muito que aprendeu; a sabedoria é humilde pelo que sabe(William Cowper). Quando não contarmos com Deus, um dia experimentaremos o fracasso fatal. Mas se contarmos com Deus, mesmo tendo cruz no caminho, porém terminará na vida glorificada. Jamais podemos descartar Deus de nossa vida para ficar apenas com os recursos tecinicos e políticos. Jesus nos diz: “Sem mim nada podeis fazer” (Jo 15,5b). Muitos de nossas frustrações nos atingem porque pomos somente nossa confiança nos meios humanos que cedo ou tarde nos trazem muitas falhas. Precismos colocar uma margem de dúvida para nossas certezas para não sermos surpreendidos pela vida. Jesus nos ensinou a irmos pelo mundo sem demasiados cálculos, sem demasiadas túnicas e assim por diante. Jesus que não tinha onde reclinar a cabeça nos recorda que somos peregrinos nesta terra. Só caminhando é que encontramos as respostas de Deus para nossas perguntas ou interrogações. Não são as forças humanas que dão eficácia a nosso trabalho pastoral/evangelizador e sim Deus.

Muitos pastores, dirigentes, coordenadores da Igreja ou da comunidade podem cair na mesma tentação: pensar que poderiam levar adiante a tarefa de evangelização, de santificação do povo na medida em que tenham os recursos humanos, o planejamento necessário para se dedicar ao trabalho e a confiança nas forças da Igreja como toda. Mas quem salva o mundo é o próprio Deus com nossa indispensável colaboração. Não é errado concordar com todos esses recursos; mas devemos saber que, por fim, o Evangelho que santifica e salva não tem força em nós ou no que planejamos, e sim em Deus, em quem devemos ter a confiança e a abertura suficientes para ouvi-lo e nos deixar guiar por Ele através de seu Santo Espirito que sempre nos inspira diariamente.

Mensagem Do Evangelho Deste Dia

O Evangelho de hoje nos narra que até agora o número de pessoas que recorrem a Jesus fica cada vez maior. Essas pessoas vêm de toda parte da Palestina, inclusive do território pagão (Mc 3,7-8). As pessoas se reúnem em torno de Jesus a ponto de Jesus e seus discípulos não terem tempo nem para comer (Mc 3,20). Eram tão numerosas essas pessoas que faz Jesus subir a uma barca para ensinar (Mc 4,1). Que pensa de Jesus de todas essas pessoas? Quem é Jesus para elas? Será que elas crêem nele? Que crêem nele? O Evangelho não nos dá nenhuma resposta explícita para essas perguntas. Percebemos apenas o entusiasmo e a admiração do povo sobre o ensinamento de Jesus (Mc 1,27). 

Agora Jesus está de volta para sua terra, Nazaré. Mais ou menos durante trinta anos vivendo em Nazaré, convivendo com as pessoas comuns de Nazaré, vivendo com elas e Ele era tão comum como seus conterrâneos. Mais ou menos trinta anos mantendo-se tão semelhante àquele povo que não se notava diferença alguma entre Ele e Tiago, José, Judas ou Simão. Mais ou menos durante trinta anos morando num lugar desconhecido e desprezado: Nazaré. Até um dos futuros discípulos de Jesus, Natanael, lançará esta pergunta: “De Nazaré pode sair algo de bom?” (Jo 1,46). Jesus está de volta para Nazaré depois que instituiu os Doze (Mc 3,13-19). Ele volta para suas raízes antes de continuar sua missão itinerante. Agora é a hora de se manifestar e de receber o juízo de seu povo sobre ele. O que pensa o povo de Nazaré sobre Jesus? Quem é Jesus para seus conterrâneos? Será que Deus tem um aspecto tão humano? Será que é possível Deus estar tão próximo dos homens comuns como os de Nazaré? Será que Deus não pode estar tão perto dos homens no seu dia a dia como em Nazaré? Ou onde está Deus? Onde Deus habita? Para o povo, onde Deus mora? Onde fica Sua morada? 

É preciso abrir os olhos e a mente, e deixar o coração aberto para poder experimentar Deus e sentir Sua presença no cotidiano, no aspecto cotidiano da vida. Deus está aqui e agora. Sinta e experimente Sua presença! Aprenda a saborear o momento, mesmo que ele não dure para sempre. Há momentos de nossas vidas que podem ser eternos mesmo que não sejam permanentes, por causa da presença da própria eternidade que é Deus. Deus estar presente permanentemente como o silêncio está sempre presente, mas somos nós que preenchemos o silêncio com barulho. Assim que o barulho cessar o silêncio volta a reinar novamente o ambiente. Deus sempre nos surpreende, porque na sua atuação ele não tem esquemas prévios, métodos preestabelecidos, lógica precisa ou raciocínio bem lógico. Pode desistir de uma lógica, mas não desista da vida cuja origem está em Deus! Deus está sempre acima de nosso raciocínio, “Pois meus pensamentos não são os vossos, e vosso modo de agir não é meu” diz o Senhor (Is 55,8). Por isso, onde menos O esperamos, onde O menos imaginamos, Ele aparece, comunicando-se conosco e convivendo conosco (Jo 1,14). “No meio de vós está quem vós não conheceis”, alerta-nos o evangelista João (Jo 1,26). Deus habita e está no homem e não nas paredes de um templo ou de uma igreja (cf. Mt 25,40.45). Os animais não questionam o sentido da vida, mas as pessoas sim porque em cada um de nós há uma dimensão divina e somos imagem de Deus (Gn 1,26) que nos faz perguntar por que estamos vivos. Nós somos homens com dimensão transcendente e por isso somos capazes de ir e de ver além da aparência. Deus quer encontrar seu povo onde este vive e atua. 

A encarnação de Deus em um carpinteiro de Nazaré nos descobre que Deus não é um exibicionista que se oferece em espetáculo. Deus não é o Ser todo-poderoso que se impõe, mas propõe e convida. Podemos descobrir Deus nas experiências mais normais de nossa vida cotidiana: em nossas tristezas inexplicáveis, na felicidade insaciável, na solidão em busca da comunhão, em nosso amor frágil, mas apaixonante, na saudade de uma presença de quem se foi, mas que está presente fortemente na sua ausência, e nos sonhos de uma vida de paz e serenidade, na reconciliação por amor, nas perguntas mais profundas sobre a vida e seu sentido, em nosso pecado mais discreto, nas nossas decisões mais responsáveis, na nossa busca sincera do bem e da verdade, no nosso “bom dia, boa tarde, boa noite” endereçado para as pessoas para o seu bem, no nosso “obrigado” pelo bem que o outro fez por nós, no nosso agradecimento pelo novo dia que nos é dado por puro amor de Deus. Por isso, a raiz da incredulidade é precisamente esta incapacidade de acolher a manifestação de Deus no cotidiano. 

O que necessitamos são uns olhos mais limpos, simples e menos preocupados em possuir coisas e em ter poder. As coisas são meios e elas jamais são fim de nossa vida. As coisas continuam alheias a nós, pois não são nossos semelhantes (cf. Gn 2,20-23). Um ônibus é um meio que me leva até o centro da cidade, mas o ônibus não é o centro da cidade. O que necessitamos é uma atenção mais profunda e desperta para o mistério da vida que não consiste somente em ter “espírito observador” e sim em saber contemplar e acolher com simpatia as inumeráveis mensagens e chamadas que a mesma vida irradia permanentemente. Deus não está longe dos que O buscam. Deus está no centro de nossa vida. Deus nos visita (Lc 1,68; 7,16) como visitou seu povo em Nazaré que jamais ele abandonou. É preciso abrir a porta de nosso lar e de nosso coração para a visita do Senhor como a própria sinagoga em Nazaré aberta para o Senhor entrar nela e falar das coisas essenciais da vida para seu povo reunido nela. 

Em Nazaré o povo ficou admirado pelo ensinamento de Jesus, mas ficou desiludido por causa de sua origem: “De onde é que este homem consegue tudo isso? De onde vem a sabedoria dele? Como é que faz esses milagres? Por acaso ele não é o carpinteiro, filho de Maria? Não é irmão de Tiago, José, Judas e Simão? As suas irmãs não moram aqui? Por isso ficaram desiludidos com ele”. 

Quando seus conterrâneos falam dele, não pronunciam seu nome, o designam somente com pronomes depreciativos para sua pessoa e sua atividade (ele, este etc.). Os nazarenos, apesar de conhecer as Escrituras, não conseguiram recordar aquilo que Moises havia dito: “O Senhor, teu Deus, te suscitará dentre os teus irmãos um profeta como eu: a ele que deveis ouvir” (Dt 18,15). Os nazarenos não conseguiram captar a novidade de Deus em Jesus; não reconheceram nele o enviado de Deus. Somente são os discípulos que fazem a seguinte pergunta: “Quem é este?” (Mc 4,41), mas a multidão nunca e os nazarenos nem sequer  sonhavam uma pergunta semelhante, pois eles sabiam quem era Jesus: um artesão, o filho de Maria; conheciam seus parentes. Mas não quiseram ir além disso; eles ficaram presos em juízos puramente humanos; eles encontraram em Jesus um obstáculo para a fé.

E Jesus “ficou admirado com a falta de fé que havia ali”.  O amor oferecido é recusado. Mas o amor não pode resignar-se diante da recusa. O amor continua a existir mesmo tendo a recusa, pois é eterno. “Deus é amor”, afirmou São João (1Jo 4,8.16). Diante dessa recusa, Jesus precisa ir a outras aldeias onde o amor é bem acolhido. 

O evangelista Marcos acrescenta um provérbio citado por Jesus para explicar a incompreensão e a falta de fé de seus conterrâneos: “Um profeta é respeitado em toda parte, menos na sua terra, entre os seus parentes e na sua própria casa”. A fé não se adquire por ativismo ou por herança. A fé precede aos milagres, nunca ao contrário. Por isso, é inútil montar uma apologética para “provar” a divindade de Jesus partindo da existência de uns fatos superiores às forças da natureza. Quem vive sua vida profundamente e com muita consciência, quem leva seu ser a sério, não tem como não ter fé em Deus que está muito além da inteligência humana. 

Reconhecer em Jesus o Messias, o Ungido de Deus, não é fácil. Somente quem crê, O reconhece, aceita suas palavras e admira suas obras. Muitos olham sem ver e ouvem sem escutar. Cristo continua desconcertando: sua palavra escandaliza, sua mensagem gera oposição e sua vida e obras criam conflitos. Outros O conhecem, O aceitam e sua vida adquire um novo sentido. A fé madura caminha à descoberta e não evita as perguntas e a obscuridade. Hoje o Senhor nos pede mais fé n’Ele para realizar coisas que superam nossas possibilidades humanas.

Para Refletir:

“ELE NÃO É O CARPINTEIRO, FILHO DE MARIA?”

“Se o orgulho nos faz sair, a humildade nos faz entrar… Como o médico, depois de estabelecer um diagnóstico, trata o mal em causa, tu, cura a raiz do mal, cura o orgulho; então, já não haverá mal algum em ti. Para curar seu orgulho, o Filho de Deus se abaixou, se fez humilde. Por que tu te orgulhas? Para ti, Deus se fez humilde. Talvez tu tenhas vergonha de imitar a humildade do homem; imita pelo menos a humildade de Deus. O Filho de Deus se humilhou fazendo-se homem. Tu, homem, conhece que és homem. Toda sua humildade consiste em conhecer quem és.

Escuta a Deus que te ensina a humildade: ‘Eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou’ (Jo 6,38). Ele, humilde, veio para ensinar a humildade, como Mestre de humildade. Aquele que vem a Mim se faz um comigo; se faz humilde. Quem se aderir a mim será humilde. Não fará sua vontade e sim a vontade de Deus. E não será tirado fora (Jo 6,37), como quando era orgulhoso”. (Santo Agostinho: 354-430)

P. Vitus Gustama,svd

quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

30/01/2024-Terçaf Da IV Semana Comum

A VERDADEIRA FÉ EM JESUS CRISTO NOS TORNA VIVOS EM DEUS

Terça-Feira Da IV Semana Comum

Primeira Leitura: 2Sm 18,9-10.14b.24-25a.30-19,3

Naqueles dias, 18,9 Absalão encontrou-se por acaso na presença dos homens de Davi. Ia montado numa mula e esta meteu-se sob a folhagem espessa de um grande carvalho. A cabeça de Absalão ficou presa nos galhos da árvore, de modo que ele ficou suspenso entre o céu e a terra, enquanto a mula em que ia montado passou adiante. 10 Alguém viu isto e informou Joab, dizendo: “Vi Absalão suspenso num carvalho”. 14b Joab tomou então três dardos e cravou-os no peito de Absalão. 24 Davi estava sentado entre duas portas da cidade. A sentinela que tinha subido ao terraço da porta, sobre a muralha, levantou os olhos e divisou um homem que vinha correndo, sozinho. 25ª Pôs-se a gritar e avisou o rei, que disse: “Se ele vem só, traz alguma boa nova”. 30 O rei disse-lhe: “Passa e espera aqui”. Tendo ele passado e estando no seu lugar, 31 apareceu o etíope e disse: “Trago-te, senhor meu rei, a boa nova: O Senhor te fez justiça contra todos os que se tinham revoltado contra ti”. 32 O rei perguntou ao etíope: “Vai tudo bem para o jovem Absalão?” E o etíope disse: “Tenham a sorte deste jovem os inimigos do rei, meu senhor, e todos os que se levantam contra ti para te fazer o mal!” 19,1 Então o rei estremeceu, subiu para a sala que está acima da porta e caiu em pranto. Dizia entre soluços: “Meu filho Absalão! Meu filho, meu filho Absalão! Por que não morri eu em teu lugar? Absalão, meu filho, meu filho!” 2 Anunciaram a Joab que o rei estava chorando e lamentando-se por causa do filho. 3 Assim, a vitória converteu-se em luto, naquele dia, para todo o povo, porque o povo soubera que o rei estava acabrunhado de dor por causa de seu filho.

Evangelho: Mc 5,21-42

Naquele tempo, 21Jesus atravessou de novo, numa barca, para a outra margem. Uma numerosa multidão se reuniu junto dele, e Jesus ficou na praia. 22Aproximou-se, então, um dos chefes da sinagoga, chamado Jairo. Quando viu Jesus, caiu a seus pés, 23e pediu com insistência: “Minha filhinha está nas últimas. Vem e põe as mãos sobre ela, para que ela sare e viva!” 24Jesus então o acompanhou. Numerosa multidão o seguia e comprimia. 25Ora, achava-se ali uma mulher que, há doze anos, estava com hemorragia; 26tinha sofrido nas mãos de muitos médicos, gastou tudo o que possuía, e, em vez de melhorar, piorava cada vez mais. 27Tendo ouvido falar de Jesus, aproximou-se dele por detrás, no meio da multidão, e tocou na sua roupa. 28Ela pensava: “Se eu ao menos tocar na roupa dele, ficarei curada”. 29A hemorragia parou imediatamente, e a mulher sentiu dentro de si que estava curada da doença. 30Jesus logo percebeu que uma força tinha saído dele. E, voltando-se no meio da multidão, perguntou: “Quem tocou na minha roupa?” 31Os discípulos disseram: “Estás vendo a multidão que te comprime e ainda perguntas: ‘Quem me tocou’?” 32Ele, porém, olhava ao redor para ver quem havia feito aquilo. 33A mulher, cheia de medo e tremendo, percebendo o que lhe havia acontecido, veio e caiu aos pés de Jesus, e contou-lhe toda a verdade. 34Ele lhe disse: “Filha, a tua fé te salvou. Vai em paz e fica curada dessa doença”. 35Ele estava ainda falando, quando chegaram alguns da casa do chefe da sinagoga, e disseram a Jairo: “Tua filha morreu. Por que ainda incomodar o mestre?” 36Jesus ouviu a notícia e disse ao chefe da sinagoga: “Não tenhas medo. Basta ter fé!” 37E não deixou que ninguém o acompanhasse, a não ser Pedro, Tiago e seu irmão João. 38Quando chegaram à casa do chefe da sinagoga, Jesus viu a confusão e como estavam chorando e gritando. 39Então, ele entrou e disse: “Por que essa confusão e esse choro? A criança não morreu, mas está dormindo”. 40Começaram então a caçoar dele. Mas, ele mandou que todos saíssem, menos o pai e a mãe da menina, e os três discípulos que o acompanhavam. Depois entraram no quarto onde estava a criança. 41Jesus pegou na mão da menina e disse: “Talitá cum” — que quer dizer: “Menina, levanta-te!” 42Ela levantou-se imediatamente e começou a andar, pois tinha doze anos. E todos ficaram admirados. 43Ele recomendou com insistência que ninguém ficasse sabendo daquilo. E mandou dar de comer à menina.

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Um Coração Amoroso é o Lugar De Abrigo Para Todos Porque É Capaz De Perdoar 

Na Primeira Leitura do dia anterior lemos que o rei Davi era acusado pelo seu próprio filho, Absalão e pelos inimigos. O rei Davi figiu, então de Jerusalém. Era o momento de duro fracasso. Porém, através dos livros históricos percebemos que fracasso e fraqueza não contrapõem o plano de Deus. Deus é capaz de alcançar seu fim, mesmo usando aparências contrárias. Toda a história da salvação é uma boa prova disso. 

Eu preciso meditar seriamente sobre meus fracassos e fraquezes, pois neles posso também enxergar os planos de Deus sobre mim, “Pois a loucura de Deus é mais sábia do que os homens, e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens"(1Cor 1,25). 

Novamente hoje estamos diante de uma cena comovedora: as lágrimas de Davi pela morte de seu filho, Absalão: “Meu filho Absalão! Meu filho, meu filho Absalão! Por que não morri eu em teu lugar? Absalão, meu filho, meu filho!”. É o pranto de Davi, pai de Absalão.  Sabemos muito bem que quem perde um filho(a), perde o futuro, e quem perde o marido/esposa, perde o presente/companhia. Mesmo que Davi sofra pela rebeldia do seu próprio filho, mas Absalão saiu das entranhas de Davi. É muito difícil um pai não se entristecer quando seu filho morrer. É como se uma parte de sua vida fosse embora. Davi e Absalão formam um lar. Nenhuma pessoa se torna pessoa sem lar. O lar é a base ou o ponto de partida de uma história. Somos o que somos também por causa de nosso lar. 

Em Davi qualquer pai ou mãe pode se espelhar através da frase de Davi: “Por que não morri eu em teu lugar? Absalão, meu filho, meu filho!”. Davi está velho. Seu filho ainda é jovem. Hoje em dia presenciamos muitas cenas trágicas em que os pais enterram os filhos por causa da violência cada vez mais crescente. Outras vezes, por prudência do próprio filho. Mas qualquer morte sempre traz tristeza. Muitos jovens se tornam vitimas de um mundo violento por causa da ingenuidade e inocência ou por outras razões. O próprio Jesus cheio de sabedoria nos disse: “Os filhos deste mundo são mais espertos/prudentes do que os filos da luz” (Lc 16,8). É preciso saber escolher os amigos para não entrar numa vida trágica. Certas “amizades” podemos nos causar danos, se não adotarmos um pouco de sabedoria e prudência. O verdadeiro amigo nos alerta permanentemente, pois nos ama. “Para conhecermos os amigos é necessário passar pelo sucesso e pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade” (Confúcio).

Com astúcia e habilidade militar, o exército do rei Davi conseguiu derrotar o rebelde (Absalão) e foi morto tragicamente entre as árvores da floresta. Mas o que poderia ter sido uma vitória e o fim de uma rebelião incômoda, para Davi, o próprio pai de Absalão, é uma grande dor. 

Mais uma vez o texto quer nos mostrar a magnanimidade de Davi: seu coração é tão amoroso a ponto de ter espaço para quem está contra ele, como seu próprio filho, Absalão, o rebelde. Davi já havia dado ordens para respeitar a vida de seu filho, mas o capitão Joab aproveitou a tragédia de Absalão (“A cabeça de Absalão ficou presa nos galhos da árvore, de modo que ele ficou suspenso entre o céu e a terra, enquanto a mula em que ia montado passou adiante”) para liquidar partidas adversárias e matou o rebelde Absalão. Davi já havia chorado pela morte do rei Saul apesar do mal feito contra ele, agora Davi chora por seu filho Absalão apesar da rebeldia do filho. Para Davi não há festa para celebrar esta triste vitória! Enquanto Davi chora por seu filho morto, o exército vitorioso não se atreve a comemorar a vitória e entra na cidade de Jerusalém. “A mais vergonhosa das vitórias é aquela que é obtida em uma guerra civil” (Valério Máximo). 

Em Davi podemos ver  como Deus se comporta diante de nós pecadores. Nosso Pai celeste, mesmo que fiquemos rebeldes contra Ele e nos opomos a Ele, continua nos amando. “Eu não quero a morte do pecador, e sim que se converta e viva” (Ez 33,11). 

Eu me disponho a meditar sobre meus próprios pecados, para sentir em mim toda dor de Deus, toda a misericórdia de Deus. Se Davi compreendeu tão bem o perdão para seu filho é porque ele mesmo tinha experimentado o perdão de Deus. Davi recorda que depois do homicídio de Urias, o profeta Natã foi a seu palácio para revelar-lhe sua falta..e a superabundância da misericórdia divina. E Jesus nos recordará esta lei: “Se vocês não perdoarem, tampouco Deus os perdoará” (Mt 6,14-15; cf. Mt 18,35).

O Salmo Responsorial (Sl 85) põe nos lábios de Davi uma súplica muito sentida a Deus para que Deus o ajude neste momento de dor: “Inclinai, ó Senhor, vosso ouvido, escutai, pois sou pobre e infeliz! Protegei-me, que sou vosso amigo, e salvai vosso servo, meu Deus, que espera e confia em vós! Piedade de mim, ó Senhor, porque clamo por vós todo o dia! Animai e alegrai vosso servo, pois a vós eu elevo a minh’alma”.

Realmente Davi é um sinal profético do grande amor que Deus nos tem, pois quando ainda éramos pecadores e inimigos de Deus, nos enviou seu próprio Filho e entregou sua vida para o perdão de nossos pecados. Deus não quer a morte do pecador e sim que se converta e viva. Deus nos ama com um amor eterno. Tudo pode desaparecer, mas o amor de Deus por nos permanece para sempre. Por isso, não devemos perseguir os pecadores para acabar com eles e sim que como Cristo saímos ao encontro do peridido a fim de voltar para a comunhão de irmãos na família de Deus.

O bom coração de Davi nos recorda a imensidade do amor de Deus que nos ama até o fim em Jesus Cristo (Jo 13,1), seu filho unigênito que nos enviou para nos salvar de nossos pecados (Jo 3,16). Como Davi não queria a morte de seu filho, Absalão, assim Deus nos diz: “Porventura, tenho eu prazer na morte do ímpio? ... Não tenho prazer na morte de quem quer que seja. Convertei-vos e vivereis!” (Ez 18,23.32). Jesus Cristo nos retrata o coração de Deus descrevendo como um pastor que se alegra imensamente quando encontra novamente a ovelha perdida ou um pai que celebra uma grande festa pela volta do filho pródigo (Cf. Lc 15,1-32). 

A partir do texto da Primeira Leitura vale a pena nos perguntarmos: Temos/tenho um coração igual ao de Davi, especialmente ao de Jesus Cristo, o Bom Pastor? Sabemos/sei perdoar o que nos ofendem ou cremos que nos ofendem, inclusive os que nos perseguem? Quanto tempo dura o rancor no nosso/meu coração?

"Eu, porém, vos digo: amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos [maltratam e] perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos", disse-nos Jesus (Mt 5,44-45). 

O Evangelho e Sua Mensagem Para Nós

Estamos nos últimos dois milagres de uma serie de milagres no início do evangelho de Marcos (Mc 4,35-5,43). No texto do Evangelho de hoje Jesus é apresentado como aquele que tem poder de curar as doenças por graves que elas sejam e de devolver a vida para quem se encontra morto. Mas para que seu poder possa acontecer na vida do homem, há uma condição indispensável: fé.  “Não tenhas medo. Basta ter fé!”, disse nos Jesus. “A fé é a garantia dos bens que se esperam, a prova das realidades que não se vêem” (Hb 11,1). A mulher que estava doente de hemorragia durante 12 anos viveu a fé e ficou curada como premio de sua fé. 

1. O Reino de Deus é a Vida Para Todos (cf. Jo 10,10b).

Jesus percorre o país para anunciar o Reino de Deus e para estabelecê-lo. Ele fala e age com autoridade pelo bem de todos e pela a salvação da humanidade inteira. A sua fama se espalha, porque uma força brota d’Ele, é a força da ressurreição, a força do Espírito de vida, suas palavras estão cheias de autoridade, pois fazem todos crescerem na fraternidade e na igualdade. 

Fica curada!”. O imperativo de Jesus tem algo de afetuoso para com a mulher sofrida de hemorragia durante 12 anos, e é restaurada na sua dignidade, restabelecida na sociedade que excluía o seu mal. Este imperativo “fica curada” aparece também como uma constatação: é a fé dessa mulher que a salvou, e Jesus se alegrou por isso. A cura é conseqüência da fé, que é sempre fonte de vida e de felicidade. “Filha, a tua fé te salvou. Vai em paz e fica curada dessa doença”.   O justo viverá por sua fé” (Hab 2,4). O justo é aquele que tem a certeza de sentir-se olhado por Deus. Sabendo-se olhado e chamado por Deus, ele sempre se volta para Deus em seu interior, principalmente, nos momentos mais angustiantes de sua vida. É assim esta mulher!       

Levanta-te!”. Este segundo imperativo do Evangelho deste dia é dinâmico e traduz perfeitamente a paixão de Deus em ver o homem vivo, o seu amor incondicional pela vida, pois Ele é a própria fonte de vida (cf. Jo 11,25; 14,6; 10,10). “Adormecida”, no “sono da morte”… um estado do qual Deus nos quer fazer sair, um estado do qual Ele nos salva, Jesus, o Deus-Conosco, chamou a jovem mulher a voltar à vida. “Eu te ordeno: levanta-te”. A palavra evoca a ressurreição, o novo surgir da vida, o amor divino que nos coloca de pé. É um imperativo que quer nos mostrar que  a vida jamais acaba, pois sua origem está em Deus (cf Jo 1,4; 11,25; 14,6). É preciso mantermos nossa fé no Deus da vida, origem e destino da vida. Ter fé no Deus da vida significa não parar de existir. É viver para sempre. Jesus pede ao pai da jovem apenas uma coisa: fé. “Não tenhas medo. Basta ter fé!”.  E quanto a nós, cremos verdadeiramente em Jesus Cristo, Filho de Deus vivo? 

“Retirai-vos porque a menina não morreu e sim está dormindo”, disse Jesus à multidão.  Jesus quer dizer que para ele e para o poder de Deus a morte não significa mais que um sono ligeiro. Da mesma maneira Jesus também falou de Lázaro morto: “Nosso amigo Lázaro está dormindo e vou despertá-lo” (Jo 11,11). A morte para Deus não é um poder insuperável. Para quem ainda não está no caminho da fé tem dificuldade para entender tudo isso. As coisas têm um aspecto muito distinto diante do olhar de Deus e diante da experiência do homem. Mas se aprendermos a olhar tudo a partir de Deus, então a morte perderá seu caráter arrepiante e teremos alegria de tratar nossa vida com carinho e respeito, pois a vida é de Deus e Deus está nela.

As duas beneficiadas das ações de Jesus neste Evangelho têm algo em comum: a primeira estava doente durante 12 anos, e a jovem filha morreu aos 12 anos, a idade em que se devia tornar mulher. No povo de Israel, o percurso destas duas mulheres era sinal de um fracasso. Uma estava atingida, como Sara, a mulher de Abraão, na sua fecundidade, pois essa mulher de hemorragia perdia o seu sangue, princípio de vida na mentalidade semítica. A outra perdia a vida, precisamente na idade em que se preparava para transmiti-la (era tradição casar-se muito cedo). Cristo cura as duas mulheres e permite-lhes assim assumir a sua vocação maternal. “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância”, disse-nos Jesus (Jo 10,10b). Estar com Jesus significa estar com a vida em abundância. Longe dele perdemos a capacidade de produzir frutos para uma vida em abundância (cf. Jo 15,5). 

2. Transformação Pela Fé 

Um chefe de sinagoga cai de joelhos, reconhecendo a divindade de Jesus, e suplica a Jesus para salvar a sua filha… Uma mulher atingida por hemorragias não diz nada, mas contenta-se em tocar as vestes de Jesus, porque se considera impura ritualmente (por isso ela fez tudo silenciosamente). Isto basta para Aquele que veio para levantar, curar, salvar a humanidade ferida. Só a fé solicita um sinal de Jesus, a fé de Jairo, a fé da mulher, a fé de Pedro, Tiago e João… E esta fé faz Jesus agir e transforma os beneficiados: a mulher é curada, a jovem volta a viver (levantar-se. 

A fé nos diz que não há nada que seja perdido. A fé amplia nosso horizonte e alarga nossa perspectiva para mais longe. A fé nos levanta para um topo mais alto para ver até os vales da vida na sua profundidade. A fé nos coloca no mapa de nossa vida para que saibamos para onde vamos e por onde vamos. A fé é um tipo de “GPS” que nos leva até o endereço certo de nossa vida. Por causa da fé eu preparo o espaço necessário para que Deus possa atuar em mim. A fé é sempre e continua sendo a condição e o fundamento da ação salvadora de Deus em mim. 

Não tenhas medo. Basta ter fé!”. É o convite de Jesus para cada um de nós. Jesus não nos pede outra coisa a não ser fé. E isso Ele pede até quando nos encontrarmos numa situação impossível de superar. A exemplo da mulher com a hemorragia durante 12 anos que toca na veste de Jesus, precisamos tocar o próprio mistério para que possamos sair de nossa situação sem saída. Além disso, precisamos deixar nossa mão segurada pelo Senhor para que possamos nos levantar novamente de uma situação de morte, como a menina de 12 anos que se encontrou morta e voltou a viver, pois o Senhor segurou sua mão e a ajudou a se levantar. 

“Não temas; basta que tenhas fé!”. Este é o segredo. Ter fé é uma maneira mais eficaz para ficar perto de Deus. Mas a fé não se adquire nem nos livros, nem nas revistas nem nas receitas e sim está no encontro pessoal com Jesus. Para esse Jesus podemos pedir: “Toque-me, Senhor para que eu possa ficar curado e viva novamente!”. 

A fé move montanhas. Nossas montanhas de medo, de covardias, de falta de compromisso com a vida. Aquela mulher, com fluxo de sangue, considerada impura que não podia ser tocada por ninguém nem tocar alguém, tomou coragem de tocar o manto de Jesus, pois tem fé no poder de Jesus de que ficaria curada. Para ela não há lei que a detenha. E ficou curada. Diante  da morte de sua filha, Jairo escuta  a voz do Senhor que lhe diz: “Não temas; basta que tenhas fé!”. Quem tem fé não há nada nem ninguém possa o deter. 

3. A Vida Que Nos Aproxima e A Força Curadora Que Nos Atrai e Levanta 

Jesus se encontra no meio da multidão. Evidentemente há muita conversa, gritaria e barulho. A multidão esmaga Jesus. No meio dessa multidão eis que uma mulher se aproxima de Jesus, a todo o custo, somente para tocar ao menos as vestes do Senhor. Para ela chegou seu momento e Jesus passou providencialmente pela sua vida. Ela não quer perder esse precioso momento para se aproximar d’Aquele que é fonte da verdadeira vida. Ela conseguiu tocar as vestes do Senhor com muita fé. Destas vestes saiu uma força curadora para essa mulher. 

Há momentos preciosos na nossa vida em que nos esforçamos, isto é, usar toda nossa força em função daquele momento. E nenhum de nós quer perder aquela oportunidade. Por isso, costuma-se dizer: “Ou agora ou nunca mais!”. 

Se eu ao menos tocar na roupa dele, ficarei curada”. A mulher de hemorragia se esforça para tocar no corpo de Jesus em função de sua cura de uma doença de longos anos (12 anos). É claro que Jesus não crê que Seu corpo seja um tipo de talismã que emita umas forças misteriosas, pois Jesus atua sempre sabendo daquilo que faz, e cura os enfermos que crêem nele. Por isso, seus milagres não acontecem por debaixo de consciência. A fé é um ato consciente. É uma entrega total para Deus, aconteça o que acontecer, pois Deus é soberano nos seus atos e misericordioso em suas sábias decisões, pois tudo em função da salvação do homem. Tudo que Deus faz por nós é sempre para nos salvar. Basta correspondermos à ação de Deus para que aconteça a salvação. 

Apesar de estar sendo esmagado pela multidão Jesus mantém sua atenção para cada um. Jesus está atento a estas pessoas concretas, manifesta uma disponibilidade extraordinária, está extremamente atento à sua presença. Ninguém fica anônimo aos olhos de Jesus. Para Jesus cada um é chamado silenciosamente pelo nome (Jo 10,3b; Is 43,1), pois o nome de cada um está tatuado na palma da mão do Senhor (cf. Is 49,16). Jesus está habitado pelo amor de Deus Pai para com os seus filhos. No Coração do Pai, Jesus é capaz de uma atenção extrema a cada angústia do ser humano. Não interessa quem possa vir junto d’Ele, não interessa qual seja a situação: ele será sempre acolhido, Jesus dará sempre a sua atenção como se cada um estivesse sozinho no mundo com Ele, pois ele ama cada um na sua individualidade. Se eu também começasse a fazer silêncio em mim para melhor escutar Jesus, através da sua Palavra, se eu tivesse tempo para a oração interior, para aprofundar o meu silêncio interior… certamente ficaria mais disponível, mais atento aos outros. 

Na Eucaristia celebramos o memorial do amor de Jesus por nós. Ele veio como vem não somente para curar nossas enfermidades corporais, mas principalmente para nos libertar da enfermidade do pecado que nos separa do amor de Deus e do próximo. Deus não nos quer são em nosso corpo, mas principalmente que sejamos renovados no Seu amor para que possamos ver o outro como nosso irmão. Apesar de nossas rebeldias, Deus jamais nos abandona e jamais Ele deixa de nos amar. Essa fidelidade do Senhor é que celebramos em cada Eucaristia. Aceitamos o amor de Deus que tem por nós e nos deixamos conduzir por seu amor.

P. Vitus Gustama,svd

V Domingo Da Páscoa, 28/04/2024

PERMANECER EM CRISTO PARA PRODUZIR BONS FRUTO, POIS ELE É A VERDADEIRA VIDEIRA V DOMINGO DA PÁSCOA ANO “B” Primeira Leitura: At 9,26-31...