sábado, 30 de outubro de 2021

Sábado Da XXXI Semana Comum,06/11/2021

USAR OS BENS COM GRATIDÃO E SEM SER POSSUIDOS POR ELES

Sábado Da XXXI Semana Comum

Primeira Leitura: Rm 16,3-9.16.22-27

Irmãos, 3 saudai Prisca e Áquila, colaboradores meus em Cristo Jesus, 4 os quais expuseram a sua própria vida para salvar a minha. Por isso, eu lhes sou agradecido; não somente eu, mas também todas as Igrejas do mundo pagão. 5 Saudai igualmente a Igreja que se reúne na casa deles. Saudai meu muito estimado Epêneto, que faz parte dos primeiros frutos da Ásia para Cristo. 6 Saudai Maria, que trabalhou muito em proveito vosso. 7 Saudai Andrônico e Júnias, meus parentes e companheiros de prisão, apóstolos notáveis e que se tornaram discípulos de Cristo antes de mim. 8 Saudai Ampliato, a quem estimo muito no Senhor. 9 Saudai Urbano, nosso colaborador em Cristo, e a meu caríssimo Estaquis. 16 Saudai-vos uns aos outros com o beijo santo. Todas as Igrejas de Cristo vos saúdam. 22 Saúdo-vos eu, Tércio, que escrevo esta epístola no Senhor. 23 Saúda-vos Caio, meu hóspede e de toda a Igreja. 24 Saúda-vos Erasto, tesoureiro da cidade, e o irmão Quarto. 25 Glória seja dada àquele que tem o poder de vos confirmar na fidelidade ao meu evangelho e à pregação de Jesus Cristo, de acordo com a revelação do mistério mantido em sigilo desde sempre. 26 Agora este mistério foi manifestado e, mediante as Escrituras proféticas, conforme determinação do Deus eterno, foi levado ao conhecimento de todas as nações, para trazê-las à obediência da fé. 27 A ele, o único Deus, o Sábio, por meio de Jesus Cristo, a glória, pelos séculos dos séculos. Amém!

Evangelho: Lc 16,9-15

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 9“Usai o dinheiro injusto para fazer amigos, pois, quando acabar, eles vos receberão nas moradas eternas. 10Quem é fiel nas pequenas coisas também é fiel nas grandes, e quem é injusto nas pequenas também é injusto nas grandes. 11Por isso, se vós não sois fiéis no uso do dinheiro injusto, quem vos confiará o verdadeiro bem? 12E se não sois fiéis no que é dos outros, quem vos dará aquilo que é vosso? 13Ninguém pode servir a dois senhores: porque ou odiará um e amará o outro, ou se apegará a um e desprezará o outro. Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro”. 14Os fariseus, que eram amigos do dinheiro, ouviam tudo isso e riam de Jesus. 15Então Jesus lhes disse: “Vós gostais de parecer justos diante dos homens, mas Deus conhece vossos corações. Com efeito, o que é importante para os homens, é detestável para Deus”.

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Ser Grato: Agradecer e Lembrar-se Dos Nomes Dos Que Ajudam Na Evangelização 

Depois de quatro semanas hoje terminamos a leitura da Carta aos Romanos. Ficamos admirados pela delicadeza de São Paulo que saúda às pessoas muito concretas: ele cita nome por nome das pessoas que colaboram na sua missão evangelizadora. As pessoas a quem são Paulo saúda, as mulheres ocupam um lugar importante: Prisca, Maria, Trifena, Trifosa, Pérsida, Julia, mãe de Rufo, a irmã de Nero. E todas elas desempenham um papel muito ativo no empenho missionário.

Além disso, são Paulo também saúda as comunidades cristãs domésticas: “Saudai igualmente a Igreja que se reúne na casa deles”. As casas dos crentes se transformam em lugar habitual das reuniões eclesiais. A nova religião (cristianismo) estava destinada a penetrar na família, no trabalho, na diversão, nos negócios. Por tanto, não é uma religião que se encerra nos templos e muito menos nas sacristias. Trata-se de uma Igreja em saída, na expressão do Papa Francisco (Leia a Exortação Apostólica, Evangelii Gaudium no.49). 

Na sua maioria, essas pessoas, que são Paulo saúda, são laicas. Para todos e para cada uma delas São Paulo tem uma palavra de louvor e de aprecio. São Paulo quer também constar o nome do escrevente de sua Carta: Tercio. Por fim, ele saúda também a Igreja de Roma como toda. A carta termina com um louvor a Deus, através de Jesus Cristo.

Tudo isto quer nos transmitir, além de sua delicadeza para com as pessoas, que São Paulo trabalhava em equipe. Nada funcionaria sem a equipe. Na Igreja de Cristo ninguém pode ser um lutador solitário, pois cada um nasceu com seu próprio carisma para a edificação da comunidade, da Igreja. É preciso contar com as qualidades dos outros e unir essas qualidades para o bem comum. 

É interessante que apreçam aqui nomes como Andrónico, Júnias, Ampliato, Urbano, Estaquis, Gayo, Cuarto. Quem são eles que colaboraram com São Paulo? Quantos leigos e leigas “anônimos” que não saem nas revistas da Igreja, mas que dão sua contribuição na catequese, nas Pastorais sociais caritativas e dos enfermos, na pastoral da saúde, na pastoral familiar, na economia da Igreja, na pastoral das crianças, e outras tantas pastorais e muitos movimentos. Muito pouco agradecimento é dado para essas pessoas. Mas todas elas estão na lista ou no livro de Deus. Para elas também Jesus Cristo dirige sua palavra: “Alegrai-vos porque vossos nomes estão inscritos nos céus” (Lc 10,20b). 

São Paulo saúda a todos. Será que sabemos saudar os outros e agradecer a todos que nos ajudam? Sabemos os nomes das pessoas que nos ajudam e colaboram para a construção da vida da comunidade? Ou nossa comunidade é uma comunidade anônima?

Não existe um só dia em que Deus não nos conceda alguma graça particular e extraordinária. Pare e verifique e agradeça! Agradecer é uma atitude própria de quem tem dignidade. Quem não sabe agradecer está mal preparado para conviver.  “Expresse gratidão com palavras e atitudes. Sua vida mudará muito de modo positivo” (Masaharu Taniguchi). Quem vive na constante gratidão suas forças se renovam, sua autoestima aumenta e seu ânimo de viver se dobra cada dia.

Usar Os Bens Materiais Sem Ser Usados e Dominados Por Eles

Possuamos as coisas terrenas sem deixar-nos possuir por elas. Que não nos deslumbre sua multiplicação nem nos afunde sua carência. Façamos que com elas nos sirvam sem fazer-nos seus servidores

(Santo Agostinho: Epist. 15,2).

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Continuamos a escutar as últimas lições do Senhor no seu caminho para Jerusalém (Lc 9,51-19,28). E estamos na segunda parte de Lc 16 onde podemos encontrar o convite de Jesus a usarmos o dinheiro ou os bens materiais corretamente. É o tema central de todo capítulo 16 deste Evangelho.          

O dinheiro é uma faca de dois gumes, conforme se usa para o bem ou para o mal, isto é, para Deus e para os outros, ou apenas para si próprio, excluindo os outros. Para viver como filhos da luz (cf. Lc 16,1-8), como filhos de Deus, temos de ser irmãos dos outros, algo impossível para o que idolatra o dinheiro. Uma vez um economista escreveu: “Capitalismo é um sistema que funciona, porque se baseia no egoísmo humano”. E sabemos que o egoísmo é o contrário do plano de Deus, pois a alma do projeto de Jesus Cristo é a partilha. Com efeito, o Reino de Deus se alicerça no amor que produz a justiça e transborda em fraternidade e partilha para que todos tenham liberdade e vida (cf. Jo 10,10). O reino do dinheiro, ao usá-lo erradamente, repousa no egoísmo que produz a injustiça e transborda em não-fraternidade e não-partilha, que dá origem ao poder que oprime e que dá origem à riqueza que explora. O dinheiro dá muito “poder” para quem o tem. E normalmente o dinheiro é usado para oprimir os mais fracos e pode ser usado para qualquer tipo de crime.          

A advertência de Jesus sobre o perigo do dinheiro não é exclusivamente para os ricos. É para todos, pois todos têm o impulso natural que leva cada um a desejar alguma coisa ou dinheiro. O dinheiro é um deus que tem altar em quase todos os corações, tanto num adulto realista como num jovem idealista, tanto no rico como no pobre, tanto no leigo como no religioso/sacerdote. Até as crianças são educadas para ganhar dinheiro ao escolher bem uma profissão futura. Além disso, muitas vezes as brigas numa comunidade, seja familiar, seja civil, seja eclesial, surgem ou partem desse deus que se chama dinheiro. Por isso, Martinho Lutero observou astutamente: “Três conversões são necessárias: a conversão do coração, a da mente e a da bolsa”.          

A segunda parte deste texto começa dizendo: “E eu vos digo: Usai o dinheiro injusto para fazer amigos, pois, quando acabar, eles vos receberão nas moradas eternas” (v.9). Usar “o dinheiro da iniquidade” para fazer amigos é metáfora de “dar esmolas”, isto é, dar aos necessitados. “vocês serão recebidos nas moradas eternas” é a promessa de Deus. A palavradexontai” (grego) é empregada aqui na forma passiva e refere-se ao ato de Deus (veja também Lc 6,32-36; 14,7-14). Por isso, podemos ler da seguinte maneira: “Usai o dinheiro injusto para fazer amigos (=esmola) para serdes recebidos por Deus nas moradas eternas” (cf. Mt 25,34-40). “Os famintos, os maltrapilhos, os mendigos, os peregrinos, os prisioneiros, os doentes... são teus “batedores” no Reino dos céus”, dizia Santo Agostinho (Serm. 11,6).          

Esta segunda parte termina com esta frase: “Vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (v.13b; cf. também Mt 6,24). Aqui não há meio-termo: ou servir ao Senhor Deus ou servir ao senhor dinheiro. Um é incompatível com o outro, porque cada um tem as suas próprias regras. E não se diga que o Evangelho é ingênuo, porque ele não está criticando uma cédula de dinheiro, mas o capital, o acúmulo de dinheiro. “Servir a Deus” é uma dependência que nos faz livres para servir aos mais necessitados, enquanto que “servir ao dinheiro” é uma escravidão que esmaga à pessoa e perverte nossas relações com Deus e com os demais, como descreve a parábola do rico e Lázaro (Lc 16,19-31). O dinheiro pode se transformar num ídolo e por seu caráter totalizante impede o serviço autêntico a Deus e ao próximo.

Reflitamos:

1.    Se você deprecia o dinheiro dos outros, pergunte-se se não o adoraria caso ele fosse seu. Não admiro o seu desprendimento pelo dinheiro que lhe falta por você não saber ganhá-lo com seu esforço; mas sim o admira se você é generoso com o dinheiro que ganha com seu trabalho. E se você tem dinheiro acumulado, pergunte-se como o ganhou e como o usa. Se você continua acumulando mais dinheiro do que precisa para viver, sabe para que você o faz? Os bens um dia nos escapam. Por isso, podemos ter os bens materiais, mas eles não podem nos possuir.

2.    “O grande risco do mundo atual, com sua múltipla e avassaladora oferta de consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada. Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de haver espaço para os outros, já não entram os pobres, já não se ouve a voz de Deus, já não se goza da doce alegria do seu amor, nem fervilha o entusiasmo de fazer o bem. Este é um risco, certo e permanente, que correm também os crentes. Muitos caem nele, transformando-se em pessoas ressentidas, queixosas, sem vida. Esta não é a escolha duma vida digna e plena, este não é o desígnio que Deus tem para nós, esta não é a vida no Espírito que jorra do coração de Cristo ressuscitado”. (Papa Francisco: Evangelii Gaudium n.2). “Posso dizer que as alegrias mais belas e espontâneas, que vi ao longo da minha vida, são as alegrias de pessoas muito pobres que têm pouco a que se agarrar. Recordo também a alegria genuína daqueles que, mesmo no meio de grandes compromissos profissionais, souberam conservar um coração crente, generoso e simples. De várias maneiras, estas alegrias bebem na fonte do amor maior, que é o de Deus, a nós manifestado em Jesus Cristo. Não me cansarei de repetir estas palavras de Bento XVI que nos levam ao centro do Evangelho: ‘Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo’” (Idem n.7).

P. Vitus Gustama,svd

Sexta-feira Da XXXI Semana Comum,05/11/2021

OS FILHOS DA LUZ DEVEM VIVER PARA EVANGELIZAR COM SAGACIDADE

Sexta-Feira da XXXI Semana Comum

Primeira Leitura: Rm 15,14-21

Meus irmãos, 14 de minha parte, estou convencido, a vosso respeito, de que tendes bastante bondade e ciência, de tal maneira que podeis admoestar-vos uns aos outros. 15 No entanto, em algumas passagens, eu vos escrevo com certa ousadia, como para reavivar a vossa memória, em razão da graça que Deus me deu. 16 Por esta graça eu fui feito ministro de Jesus Cristo entre os pagãos e consagrado servidor do Evangelho de Deus, para que os pagãos se tornem uma oferenda bem aceite santificada no Espírito Santo. 17 Tenho, pois, esta glória em Jesus Cristo no que se refere ao serviço de Deus: 18 Não ouso falar senão daquilo que Cristo realizou por meu intermédio, para trazer os pagãos à obediência da fé, pela palavra e pela ação, 19 por sinais e prodígios, no poder do Espírito de Deus. Assim, eu preguei o Evangelho de Cristo, desde Jerusalém e arredores até a Ilíria, 20 tendo o cuidado de pregar somente onde Cristo ainda não fora anunciado, para não acontecer de eu construir sobre alicerce alheio. 21 Agindo desta maneira, eu estou de acordo com o que está escrito: “Aqueles aos quais ele nunca fora anunciado, verão; aqueles que não tinham ouvido falar dele, compreenderão”.

Evangelho: Lc 16,1-8

Naquele tempo: 1 Jesus disse aos discípulos: 'Um homem rico tinha um administrador que foi acusado de esbanjar os seus bens. 2 Ele o chamou e lhe disse: 'Que é isto que ouço a teu respeito? Presta contas da tua administração, pois já não podes mais administrar meus bens'. 3 O administrador então começou a refletir: 'O senhor vai me tirar a administração. Que vou fazer? Para cavar, não tenho forças; de mendigar, tenho vergonha. 4 Ah! Já sei o que fazer, para que alguém me receba em sua casa quando eu for afastado da administração'. 5 Então ele chamou cada um dos que estavam devendo ao seu patrão. E perguntou ao primeiro: 'Quanto deves ao meu patrão?' 6 Ele respondeu: 'Cem barris de óleo!' O administrador disse: 'Pega a tua conta, senta-te, depressa, e escreve cinquenta!' 7 Depois ele perguntou a outro: 'E tu, quanto deves?' Ele respondeu: 'Cem medidas de trigo'. O administrador disse: 'Pega tua conta e escreve oitenta'. 8 E o senhor elogiou o administrador desonesto, porque ele agiu com esperteza. Com efeito, os filhos deste mundo são mais espertos em seus negócios do que os filhos da luz.

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É Preciso Esforçar-se Para Que o Cristo Salvador Seja Conhecido Por Todos Ao Nosso Redor A Exemplo De São Paulo       

Eu preguei o Evangelho de Cristo, desde Jerusalém e arredores até a Ilíria, tendo o cuidado de pregar somente onde Cristo ainda não fora anunciado, para não acontecer de eu construir sobre alicerce alheio”. 

O epílogo da Carta aos Romanos, no qual se encontra o texto da Primeira Leitura, é uma meditação sobre o carisma apostólico agora encarnado num momento concreto da vida de São Paulo. Neste momento de sua vida São Paulo contempla já o triunfo do Evangelho como cumprimento das profecias messiânicas e do mandato missionário, como a marcha triunfante do sol, que sai do Oriente e chega sem obstáculos sérios ao Ocidente (Roma): “Ide e fazei que todas as nações se tornem discípulos...” (Mt 28,19). São Paulo evangelizou dois mundos: o mundo oriental e o mundo ocidental. 

O texto da Primeira Leitura tem uma dupla intenção: a justificação e a apologia. São Paulo explica sua ousada decisão de escrever aos cristãos de Roma, para uma comunidade que ele não fundou e apresenta, ao mesmo tempo, a defesa do seu apostolado. A legitimidade da sua intervenção na comunidade cristã em Roma decorre da legitimação divina da sua pessoa como apóstolo do mundo pagão. Por isso, logo no início da Carta aos Romanos, são Paulo escreveu duas frases a respeito disso: “De Jesus recebemos a graça de ser apóstolo, a fim de conduzir, para a honra do seu nome, à obediência da fé todos os pagãos, dos quais vocês também fazem parte” (Rm 1,5-6ª). A segunda frase: “Sinto-me devedor dos gregos e dos bárbaros, dos sábios e dos incultos. Estou, pois, pronto para anunciar o evangelho também a vocês que estão em Roma” (Rm 1,14-15). 

Na verdade, são Paulo repete aqui temas já expressos sobre sua consciência apostólica já antes falados. 1). A missão apostólica foi confiada por Deus a são Paulo como um dom (Rm 1,5; 12,3; 1Cor 3,10; Gl 2,9). 2). O campo da ação de são Paulo é tão vasto quanto o mundo dos incircuncisos (Rm 1,5.13; 11,13; Gl 1,16). 3). São Paulo está a serviço de Deus e de Cristo. A palavra “diakonein” (servir à mesa) e “diákonos” aparecem também em Rm 11,13; 2Cor 4,1; 5,18; 11,23. E “doulos” (servo) aparece em Rm 1,1; Gl 1,10; Fl 1,1. Mas o conjunto assume uma original dimensão de culto através da palavra “leitourgós” (ministro). São Paulo é apenas o instrumento de Jesus Cristo: ele é “ministro” (“liturgo”) de Jesus Cristo para os pagãos. 

Através da Primeira Leitura de hoje percebemos que São Paula não pode viver sem evangelizar. Seu interesse básico e quase único é anunciar “somente onde Cristo ainda não fora anunciado”. Agora se interessa por Roma, a capital do mundo onde decide anunciar o Evangelho. 

É admirável a força que tem São Paulo pela missão recebida. Ele dedica sua vida para a evangelização. Ele põe todas as suas energias para que o Evangelho chegue a todas as partes, mas é obra de Cristo e de seu Espírito.

Se cada um de nós, cristãos, tivesse tanto amor a Jesus Cristo como São Paulo, jamais pararíamos diante de qualquer dificuldade ou problema no trabalho de evangelização. Não ficaríamos assustados diante das dificuldades e transformaríamos cada dificuldade em oportunidade para anunciar Cristo, o Salvador do mundo.

Fica para cada um de nós a pergunta: Qual é o tamanho de seu amor por Cristo e pelo próximo para saber qual é sua força para o trabalho pastoral? Você desiste facilmente diante de qualquer dificuldade no trabalho pastoral? O que é que São Paulo diria para você nesta situação? 

O Salmo Responsorial (Sl 97) de hoje nos ajuda a termos um sentimento missionário e a partirmos para a evangelização para que o mundo contemple a vitória de Deus: “O Senhor fez conhecer a salvação, e às nações, sua justiça... Os confins do universo contemplaram a salvação do nosso Deus”. Esperamos que no fim de nossa vida cada um de nós possa dizer: “Eu aproveitei todas as possibilidades para comunicar minha fé aos outros!”.

É Preciso Confiar Em Deus Para Ter a Sábia Sagacidade 

Continuamos a acompanhar Jesus no seu caminho para Jerusalém, escutando atentamente suas últimas e importantes lições para os discípulos e para nossa vida de cristãos (Lc 9,51-19,28).

Por todo o seu evangelho Lucas revela preocupações quanto a atitude correta no uso dos bens materiais deste mundo, como encontramos em todo capítulo 16 deste evangelho. Na verdade, podemos encontrar este tema já no capítulo 15 implicitamente sobre o filho pródigo que esbanja a riqueza numa vida desenfreada. 

O que se enfatiza no texto do evangelho de hoje é a sagacidade do administrador em procurar soluções para seus problemas. Diante dos problemas existentes ele não fica de braços cruzados, nem desesperado. Ele vai atrás das soluções. O que Jesus elogia é a capacidade do administrador em buscar a melhor saída possível para seus problemas existentes para que seu futuro não seja comprometido, e não a desonestidade do administrador. Jesus não elogia a desonestidade do administrador. 

Ao lado da esperteza do administrador, Jesus censura o comportamento dos “filhos da luz”, os seus seguidores: “Com efeito, os filhos deste mundo são mais espertos em seus negócios do que os filhos da luz”. Jesus quer nos dizer: “Vocês como filhos de Deus devem aprender a viver muito melhor do que este administrador. Vocês como filhos e filhas de Deus não devem ficar desesperados diante dos seus problemas porque o Pai do céu vai ampará-los”.

Se este administrador que Jesus considera “filho deste mundo” que não acredita em Deus, não fica desanimado diante da situação crítica, os filhos da luz, aqueles que acreditam em Deus (todos nós), devem ser muito mais do que este. Porque a razão do ser de um filho de Deus é o próprio Deus que na sua misericórdia nos amou primeiro (1Jo 4,19) e nos salvou para si. Por isso, quem crê em Deus não é um otimista, pois ele não precisa do pensamento positivo. Quem crê em Deus também não é pessimista, pois ele não precisa da lógica da dialética negativa. Quem confia em Deus, sabe que Deus aguarda por ele, que Deus espera por ele, que ele está convidado para o futuro de Deus e tem em suas mãos, com isso, o mais maravilhoso convite de sua vida. Desespero é a doença mortal, doença do espírito, doença do eu (Kierkegaard), porque o desesperado não acredita mais em nada e em ninguém nem em Deus. Mas não adianta fugir; não adianta querer sumir diante da situação de ameaça e angústia. Tentar fugir é fugir da vida; fugir da vida é fugir de Deus porque Deus é a VIDA (Jo 14,6). E quem foge é porque não está livre.         

Os cristãos são convidados a não fugir deste mundo, mas a viver no meio do mundo com critérios de generosidade e desprendimento diametralmente opostos aos habituais. Jesus nos chama a reconhecermos a nossa força porque a graça de Deus nos basta (2Cor 12,9). Jesus nos convida a termos coragem (Jo 16,33).  Mas devemos ter coragem com previdência, pois a coragem sem previdência é imprudência. Mas não basta ter somente previdência sem coragem, pois a previdência sem coragem faz a pessoa ficar escrupulosa. O cristão deve ser uma pessoa de esperança. Na angústia antecipamos o possível perigo, mas na esperança, a possível salvação. A lei do cristão é descobrir o apelo de Deus em cada momento, na confiança inabalável de que tudo tem sentido e tudo é abrigado por um sentido absoluto, acolhido no mistério da plenitude de Deus. O cristão tem motivos para afastar de si qualquer tentação de desespero. Jesus Cristo é o exemplo mais alto e mais indiscutível. Perante a iminência ameaçadora da morte, Jesus, com toda a serenidade, tomou o caminho para Jerusalém (Lc 9,51). Se Jesus Cristo morreu de braços abertos, nós não podemos ficar com os braços cruzados. 

Nós devemos nos mostrar criativos na prática da caridade e da misericórdia em relação aos pecadores, na solidariedade com os pobres e excluídos, na disponibilidade para o perdão e a reconciliação, no empenho para criar um mundo mais humano e fraterno onde a dignidade de cada pessoa é respeitada. Para qualquer cristão existe sempre algo a ser feito, alguma iniciativa a ser tomada, visando o crescimento da amizade com Deus. Importa estarmos sempre em ação, pois nós desconhecemos a hora do encontro com Deus. Por isso, devemos usar de esperteza para sermos dignos de salvação. Jesus quer nos dizer que devemos estar atentos ao momento presente, porque hoje, não amanhã nem ontem, temos nas mãos as possibilidades reais de fazer algo para nossa salvação. O hoje é o único que temos. Temos que ter a sagacidade em praticar o bem, a justiça, o respeito pela dignidade dos outros e assim por diante. 

Esta parábola quer nos dizer também que não somos “proprietários” das coisas e sim “gerentes” ou “administradores”. Nossa relação com as coisas não é a de propriedade e sim de uso. Tudo o que possuo: meus bens, minhas qualidades, minhas riquezas intelectuais e morais, minhas faculdades afetivas, os aspectos do meu caráter, de tudo isto Deus pedirá conta. Não sou mais do que o gerente de tudo isto que me foi confiado por Deus e tudo continua pertencendo a Deus. Não tenho direito de menosprezar os dons de Deus. Terei que prestar contas das riquezas que não foram desenvolvidas ou não foram multiplicadas para o bem dos necessitados. O Senhor pede que abandonemos nosso olhar egoísta e míope e abramos nossos olhos para trabalhar colaborando para que o Reino de Deus chegue aos que são aleijados dele ou vivem dominados pela maldade. 

Nesta Eucaristia o Senhor nos reúne para encher-nos de sua Vida e de seu Espírito. Ele não limita sua entrega para nós. Ele se dá plenamente a todos e a cada um de nós em particular. A presença do Senhor em nós é como uma grande luz que se acende; mas essa luz não pode se acabar sem que ilumine todos ao redor. Quem comunga o Corpo do Senhor se converte em portador de seu amor salvador para os demais. Se não a Eucaristia se tornaria um ato mágico que careceria de sentido. Não podemos denegrir o nome do Senhor em nós através de nosso egoísmo.

P. Vitus Gustama,svd

sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Quinta-feira Da XXXI Semana Comum,04/11/2021

DEUS NOS AMA COM AMOR MISERICORDIOSO

Quinta-Feira da XXXI Semana Comum

Primeira Leitura: Rm 14,7-12

Irmãos, 7ninguém dentre nós vive para si mesmo ou morre para si mesmo. 8Se estamos vivos, é para o Senhor que vivemos; se morremos, é para o Senhor que morremos. Portanto, vivos ou mortos, pertencemos ao Senhor. 9Cristo morreu e ressuscitou exatamente para isto, para ser o Senhor dos mortos e dos vivos. 10E tu, por que julgas o teu irmão? Ou, mesmo, por que desprezas o teu irmão? Pois é diante do tribunal de Deus que todos compareceremos. 11Com efeito, está escrito: “Por minha vida, diz o Senhor, todo joelho se dobrará diante de mim e toda língua glorificará a Deus”. 12Assim, cada um de nós prestará contas de si mesmo a Deus.

Evangelho: Lc 15, 1-10

Naquele tempo, 1 os publicanos e pecadores aproximaram-se de Jesus para o escutar. 2 Os fariseus, porém, e os mestres da Lei criticavam Jesus. “Este homem acolhe os pecadores e faz refeição com eles”. 3 Então Jesus contou-lhes esta parábola: 4 “Se um de vós tem cem ovelhas e perde uma, não deixa as noventa e nove no deserto, e vai atrás daquela que se perdeu, até encontrá-la? 5 Quando a encontra, coloca-a nos ombros com alegria, 6 e, chegando a casa, reúne os amigos e vizinhos, e diz: ‘Alegrai-vos comigo! Encontrei a minha ovelha que estava perdida!’ 7 Eu vos digo: Assim haverá no céu mais alegria por um só pecador que se converte, do que por noventa e nove justos que não precisam de conversão. 8 E se uma mulher tem dez moedas de prata e perde uma, não acende uma lâmpada, varre a casa e a procura cuidadosamente, até encontrá-la? 9 Quando a encontra, reúne as amigas e vizinhas, e diz: ‘Alegrai-vos comigo! Encontrei a moeda que tinha perdido!’ 10 Por isso, eu vos digo, haverá alegria entre os anjos de Deus por um só pecador que se converte”.

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Conhecer Jesus, O Salvador Do Mundo, É Maior Do Que Qualquer Riqueza Do Mundo 

O texto da Primeira Leitura se encontra na parte exortativa da Carta aos Romanos (Rm 12,1-15,13). Esta parte começa com um significativo: “Eu os exorto” (Rm 12,1). Numa parte exortativa, os verbos no imperativo predominam todo o conjunto. Há imperativos negativos como também há imperativos afirmativos. Por exemplo: “Não façam isso, mas aquilo” (cf. Rm 12,2.3.16.19.21; 13,13-14; 14,13). 

De modo especial o texto da Primeira Leitura se encontra no conjunto de Rm 14,1-15,13 no qual se fala dos fortes e dos fracos na comunidade. Somente dentro deste conjunto podemos entender o conteúdo do texto da Primeira Leitura. 

A comunidade cristã de Roma estava dividida. Em seu interior havia dois grupos com posições diferentes que são Paulo denomina “fracos” (Rm 14,1.2;15,1) e “fortes” (Rm 5,1). Eram fracos e fortes em relação à fé cristã, interpretada e vivida diversamente. Fraqueza e força de fé eram entendidas em relação em relação à concepção sacral ou não do mundo.

Qual é a posição de são Paulo? Teoricamente são Paulo faz parte dos mais “fortes”. Porém, ele repreende a sua atitude prática de ostentação da própria liberdade, em prejuízo dos fracos. Do mesmo modo, ele reconhece o direito dos “fracos” de seguir a própria prática ascética e ritual, mas rejeita sua pretensão de julgar os fortes. 

Concretamente podemos dizer que são Paulo vê que nas comunidades há distintas maneiras de pensar: uns dão importância para alguns detalhes, outros dão importância para outros detalhes. Por exemplo sobre as comidas: “Há quem, pela fé, acredita que pode comer tudo; mas quem é fraco só come legumes. Pois bem, quem come não despreze aquele que se abstém; e quem se abstém não julgue aquele que come, porque Deus o acolheu.  ...  quem come o faz para o Senhor, porque a Deus se dirige a prece de agradecimento. E quem se abstém o faz para o Senhor, e também ele agradece a Deus” (Rm 14,2-6). 

Para nós vem a lição: nessas coisas que não são importantes, temos de ser tolerantes e não querer impor nossa opinião: “Quem come não despreze quem não come”. Uns e outros que sigam sua consciência, pois “quem come o faz para o Senhor. Quem não come o faz para o Senhor”. Por isso, o seguinte ponto de referência deve ser mantido: “Se estamos vivos, é para o Senhor que vivemos; se morremos, é para o Senhor que morremos. Portanto, vivos ou mortos, pertencemos ao Senhor. Cristo morreu e ressuscitou exatamente para isto, para ser o Senhor dos mortos e dos vivos” Rm 14,8-9). 

Em qualquer grupo humano e nas comunidades cristãs, temos necessidade de uma maior abertura de coração. Precisamos ser mais pluralistas e respeitar a conduta dos demais ainda que seja distinta da nossa. O que é fundamental que saibamos distinguir o que é importante e o que pode deixar-se livremente à consciência de cada um e que vivamos e trabalhemos para o Senhor e para os irmãos, em consequência. 

Afinal “Todos somos próximos uns dos outros pela condição de nascimento terreno e irmãos pela esperança da herança celestial” (Santo Agostinho: In ps. 25, 2,2). “Vivos ou mortos, pertencemos ao Senhor”.  Esta é uma das persuasões fundamentais da vida cristã: que sempre estejamos nas mãos, no coração, na providência de Deus sobre nós. E não devemos duvidar disto, pois para isso viveu, morreu e ressuscitou Jesus Cristo.

Tudo isso se exige de nós a conversão sincera e permanente. A razão de nossa conversão é que Deus nos ama com um amor infinito. Seu amor por nós jamais acabará. Esse amor levou o Filho de Deus a descer da eternidade para fazer-se um de nós, para sair em nossa busca, pois desandamos, como enfatiza o Evangelho de hoje. 

E na Eucaristia, o Senhor sai ao nosso encontro para nos oferecer seu perdão, sua Vida, seu Espírito. Alimentar-se de Cristo é entrar em comunhão de vida com o Senhor. E entrar em comunhão de vida com o Senhor significa abrir nosso coração para que habite o Senhor em nós e nos transforme fazendo-nos viver como filhos seus, deixando-nos amor por Ele, amando-O acima de tudo e amando ao próximo como Deus nos mandou. Quem vive sua fé fechado em si mesmo, não pode identificar-se com Cristo que sai a buscar a ovelha perdida até encontrá-la.

Deus Me Ama Apesar Das Minhas Fraquezas e Do Meu Afastamento D´Ele 

Estamos acompanhando Jesus no seu caminho para Jerusalém escutando suas últimas e importantes lições para todos nós, seus seguidores (Lc 9,51-19,28).

O capítulo 15 de são Lucas, onde se encontra o texto de hoje, é chamado “o coração do evangelho”. Ele nos transmite umas parábolas muito característica, as da misericórdia: hoje lemos a da ovelha agarrada e a da moeda perdida. A do filho pródigo, a mais famosa, lemos na Quaresma. Deus é rico em misericórdia. Seu coração está cheio de compreensão e clemência. Apesar de nos afastarmos d´Ele, Deus nos busca até nos encontrar e se alegra mais que o pastor pela ovelha e a mulher pela moeda.

Este Evangelho nos faz sentirmos o gozo, mas, sobretudo, a esperança. Quem não se sentiu alguma vez como a ovelha perdida? Não somente pelo pecado, mas também há tantos conflitos e problemas na vida! Todos nós conhecemos dias mais amargos de nossa vida. Mas nossa vida tem sentido porque Deus cuida de nós, nos ama e se alegra com nossas alegrias e soluciona conosco nossas dificuldades. Deus está sempre ao nosso lado e não ao lado de nosso pecado. Ele odeia o pecado, mas ama o pecador.

Na passagem do evangelho de hoje Jesus nos revela o amor sem limite de Deus para todos nós, o amor misericordioso. Deus nos ama apesar de nossos pecados. Esse amor misericordioso deve nos fazer voltarmos para Deus. Quando tivermos consciência dessa verdade, viveremos na alegria permanente, e na constante ação de graças, pois saberemos que há Alguém que nos envolve e nos ama de todos os lados: nosso Pai do céu. 

Com a passagem do evangelho de hoje, começam aqui as três parábolas chamadas de as parábolas da misericórdia: a parábola da ovelha perdida (Lc 15, 3-7); a da moeda de prata perdida (Lc 15,8-10); e a parábola do pai misericordioso, ou conhecida como a parábola do filho pródigo (Lc 15,11-32). Ao contar estas parábolas Lucas procede do menos precioso (ovelha e moeda de prata) ao mais precioso (ser humano). Nestas três parábolas Jesus nos mostra, como uma característica do coração de seu Pai, a predileção com que seu amor se inclina até os mais necessitados, contrastando com a mesquinhez humana que busca sempre os triunfadores.

O que é admirável na parábola da ovelha reencontrada é a medida drástica que o pastor toma para buscar uma ovelha perdida. Ele deixa noventa e nove ovelhas para que a perdida possa ser trazida de volta ao aprisco. A ovelha não se desgarrou (cf. Mt 18,12), mas “se perdeu”, e o pastor toma a iniciativa de encontrá-la. Essa é a condição do pecador antes da conversão, e a resposta de Deus é buscar o perdido. Um cardeal escreveu que Deus não sabe matemática, pois deixa 99 ovelhas para buscar uma ovelha perdida. Isto nos mostra que cada um tem seu próprio valor diante de Deus. Outro aspecto que Lucas sublinha também é o tom de alegria que acompanha essa bem-sucedida conversão. Para Lucas, o resultado da verdadeira conversão é a experiência de estar perdido, depois encontrado, que leva à alegria sem limites.         

A segunda parábola é a da moeda reencontrada, desta vez usando uma mulher como personagem central. É uma parábola paralela do mesmo motivo. A mulher pobre faz tudo para encontrar a moeda perdida. ”Acende uma lâmpada, varre a casa e procura cuidadosamente até encontrá-la” (Lc 15,8). Os verbos mostram o esforço incansável para recuperar a moeda perdida. Com essa solicitude, com essa impaciência amorosa, com esse carinho Deus se comporta como pai paciente e misericordioso que busca todos os meios para encontrar e salvar os perdidos.          

O tema de perdido e reencontrado culmina na parábola do Pai misericordioso ou na do filho reencontrado (filho pródigo). Na parábola do Pai misericordioso, não se trata mais de um animal, ainda que de estimação, como uma ovelha, nem de um objeto, mesmo precioso como uma moeda de prata, mas de um ser humano amado por Deus, por ser Seu filho ainda que seja um filho transviado. Cada um de nós é precioso nos olhos de Deus e ninguém escapa do olhar misericordioso de Deus. “Veja, Eu tatuei você na palma da Minha mão: suas muralhas estão sempre diante de mim “(Is 49,16). Basta que um de nós esteja perdido para que seja objeto da preocupação de Deus. 

 Por isso, Lucas 15 é o coração do Evangelho de Lucas. É quase um “evangelho“ dentro do Evangelho. Neste capítulo Jesus fala de sua doutrina sobre a Divina Misericórdia e a alegria de Deus por ter reencontrado o que estava perdido. Estes dois temas, misericórdia e alegria, são características da obra de Lucas. Por isso, sem dúvida nenhuma “a face mais bonita do Amor de Deus é a Misericórdia” (João Paulo II). 

Para falar desse tema Jesus começou com esta frase, na parábola sobre a ovelha perdida: “Quem de vós que, tendo cem ovelhas e perdendo uma delas, não deixa as noventa e nove no deserto e vai em busca da que se perdeu, até encontrá-la?” (Lc 15,4).

A aritmética ou a matemática de Deus é diferente de nossa. Por isso, a matemática de Deus não é nossa. O número e a quantidade nos impressionam sempre. Para nós “um” não é igual a “noventa e nove”, pois o nosso critério é a quantidade. Para Deus “um” é igual a “noventa e nove”, pois o critério de Deus é baseado sobre o valor de cada um. Cada homem tem um valor inestimável para Deus. É o mistério do respeito que Deus tem para cada um de nós. Cada um de nós é amado por Deus com um amor “pessoal”, “individualizado”. Deus ama cada um na sua individualidade. Sou amado por Deus independentemente da minha situação atual ou do meu passado. Ele me ama por aquilo que sou. E esse amor me potencia para melhorar minha vida e minha convivência. 

“O pastor vai em busca da ovelha que se perdeu, até encontrá-la?”. É precisamente aquela que se escapou, se perdeu. É para aquela ovelha perdida que o pensamento do pastor é dirigido. É assim nosso Deus! Um Deus que continua pensando nos que O abandonaram, um Deus que ama os que não O amam, um Deus que anda em busca de seus filhos perdidos e desaparecidos de Sua presença. É a ovelha que causa preocupação para Deus. Esta ovelha talvez seja eu, talvez seja você, porque podemos estar ausentes na presença de Deus, podemos comer diante de Deus e não com Deus (cf. Lc 13, 26-27).

E depois de encontrá-la, o pastor a põe nos ombros, cheio de júbilo” (Lc 15,5).   É um homem, um pastor feliz, sorridente, exultante e muito contente. É assim que Deus é apresentado para nós. Deus é um Ser que se alegra, e de Sua alegria faz partícipes os demais. A alegria de Deus é encontrar novamente os filhos que estavam perdidos. Um só que se converteu passa a ter uma importância desmesurada diante dos olhos de Deus. Onde há experiência da graça de Deus (grego: “cháris”) sempre há alegria (grego: “chára”). Somente quando experimentamos que Deus é alegre e que nos contagia sua alegria é que poderemos renunciar a tudo sem sentir que nossa vida fique vazia. Nada é possível sem um coração alegre. A alegria é fonte de heroísmo. O esforço sem alegria gera ressentimento, pois não tolera os erros, como se comportam os fariseus criticados por Jesus. 

Este evangelho nos faz sentirmos gozo, sobretudo esperança. Quem de nós que, alguma vez, não se sentiu como a ovelha perdida? Não só pelo pecado. Há tantos conflitos e problemas na vida. Todos nós conhecemos dias amargos na vida. Mas nossa vida tem sentido porque Deus cuida de nós, nos ama, se alegra com nossas alegrias e nos consola nas nossas tristezas. Além disso, precisamos estar conscientes de que onde estivermos, para onde formos, em que situação nos encontrarmos, Deus continua nos amando do mesmo jeito, pois para Ele cada um tem nome (cf. Is 43,1) e nosso nome está tatuado na palma das mãos de Deus (cf. Is 4916). Quando tivermos essa consciência, aconteça o que acontecer, Deus é nosso Pai que nos ama eternamente (cf. Jr 31,3). Como é bom saber que nós somos amados de Deus e por Deus. Essa consciência nos leva a vivermos nossa vida com força total e com carinho. Sabemos que Deus nos ama e cremos no seu amor.

P. Vitus Gustama,svd

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Quarta-feira Da XXXI Semana Comum,03/11/2021

RENUNCIAR POR AMOR NO SEGUIMENTO DE CRISTO JESUS

Quarta-Feira da XXXI Semana Comum

Primeira Leitura: Rm 13,8-10

Irmãos, 8 não fiqueis devendo nada a ninguém, a não ser o amor mútuo – pois quem ama o próximo está cumprindo a Lei. 9 De fato, os mandamentos: “Não cometerás adultério”, “Não matarás”, “Não roubarás”, “Não cobiçarás”, e qualquer outro mandamento se resumem neste: “Amarás a teu próximo como a ti mesmo”. 10 O amor não faz nenhum mal contra o próximo. Portanto, o amor é o cumprimento perfeito da Lei. 

Evangelho: Lc 14, 25-33

Naquele tempo, 25 grandes multidões acompanhavam Jesus. Voltando-se, ele lhes disse: 26 “Se alguém vem a mim, mas não se desapega de seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs e até da sua própria vida, não pode ser meu discípulo. 27 Quem não carrega sua cruz e não caminha atrás de mim, não pode ser meu discípulo. 28 Com efeito: qual de vós, querendo construir uma torre, não se senta primeiro e calcula os gastos, para ver se tem o suficiente para terminar? Caso contrário, 29 ele vai lançar o alicerce e não será capaz de acabar. E todos os que virem isso começarão a caçoar, dizendo: 30 ‘Este homem começou a construir e não foi capaz de acabar!’ 31 Ou ainda: Qual rei que, ao sair para guerrear com outro, não se senta primeiro e examina bem se com dez mil homens poderá enfrentar o outro que marcha contra ele com vinte mil? 32 Se ele vê que não pode, enquanto o outro rei ainda está longe, envia mensageiros para negociar as condições de paz. 33 Do mesmo modo, portanto, qualquer um de vós, se não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo!”

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Amar Como Deus Nos Ama

São Paulo conclui a primeira parte de seção exortativa da Carta (Rm 12-13) com dois pedidos para os cristãos em Roma e para todos os cristãos de qualquer época e lugar: Que os cristãos construam sua vida sobre o amor (Rm 13,8-10) e que estejam conscientes da hora da história que lhes toca a viver (Rm 13,11-14).

No texto lido na Primeira leitura encontramos o primeiro pedido de são Paulo: “Não fiqueis devendo nada a ninguém, a não ser o amor mútuo, pois quem ama o próximo está cumprindo a Lei”. Para são Paulo, no mandamento do amor são inseridos os demais preceitos: “O amor é o cumprimento perfeito da Lei”. 

No texto anterior (cf. Rm 12,5-16), São Paulo comparava a vida de uma comunidade cristã a um corpo em que todos tinham que colaborar para o funcionamento da comunidade. 

Nos versículos anteriores de Rm 13, São Paulo nos acaba de falar de nossos deveres de justiça para com os poderes públicos, da obediência e da obrigação de pagar os impostos. Agora nos diz que não devamos nada a ninguém.... Mas ao escrever estas palavras, cai em conta de que há uma dívida que sempre teremos em aberto: amor. Por isso, São Paulo diz: “... a não ser o amor mútuo”. O amor, uma vez pago, sempre ficaremos em dívida, pois amar não somente uma vez para sempre. 

Para São Paulo a chave geral para que a comunidade funcione bem é o amor fraterno. Onde houver o amor, não tem necessidade da existência da lei, “pois quem ama o próximo está cumprindo a Lei”. O próprio Jesus coloca o amor como o principal mandamento, pois quem ama a Deus e ao próximo cumpre tudo o que tem que cumprir. 

Qual é a medida do amor fraterno? Há três expressões embora sejam difíceis. A primeira expressão dessa medida é “amar o próximo como a nós mesmos” (como a ti mesmo). A segunda expressão desta medida: “Amar o próximo como Deus ama a todos”. E a terceira expressão é a medida de Cristo: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Jesus amou até o fim, até a morte de cruz. E da cruz Jesus ama seus inimigos, perdoando-os: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). As três medidas são difíceis porque supõe radicalidade, maturidade espiritual, gratuidade no amor, sair de si mesmo e buscar o bem dos demais. A maturidade cristã consiste em amar por amor, sem segundas intenções. 

Creio que o mundo não pede milagres dos cristãos. O que o mundo pede é o amor fraterno, a delicadeza, a ternura, a compreensão fraterna, ajuda mútua, a solidariedade, a compaixão, o perdão mútuo e assim por diante que são fundamentais para uma boa convivência e sem os quais a convivência se torna difícil. 

Ao terminar cada dia, o exame de consciência feito por cada cristão deve ser sobre o amor fraterno. Um dia sem o amor fraterno, sem a prática do bem e da bondade é um dia jogado fora da vida de um cristão ou de todas as pessoas de boa vontade. 

Seguir a Jesus Firmemente Apesar De Tudo 

Continuamos a acompanhar Jesus no seu Caminho para Jerusalém onde Ele será crucificado, morto e glorificado (Lc 9,51-19,28). Durante este caminho Jesus deu aos seus discípulos Suas últimas lições: Lições do Caminho. As lições apresentadas no texto do evangelho de hoje são sobre as condições para seguir a Jesus. O seguimento de Jesus pede, muitas vezes, a renúncia e o despojamento. Nem as relações familiares (Lc 14,26), nem posses (Lc 14,33) podem ser um obstáculo no compromisso total do seguimento. Além disso, neste seguimento qualquer cristão deve estar preparado para as perseguições e o sofrimento (Lc 14,27). Ou seja, O que nos torna verdadeiros discípulos de Jesus? 

É preciso sabermos que as condições do seguimento apresentadas por Jesus têm caráter universal, pois são dirigidas às multidões que o acompanham em seu caminho para Jerusalém. Todas elas são centradas no caráter global que tem o seguimento de Jesus. 

E Jesus nos adverte que o seguimento em questão não é fácil. Podemos explicar isso através do texto do evangelho de ontem em que muitos não aceitaram o convite para participar do banquete do Reino, pois é exigente e não se trata somente de sentar-se à Sua mesa (cf. Lc 14,15-24). É necessário cumprir as exigência básicas. 

Hoje Jesus nos diz que para ser seus discípulos temos que colocar a importância do Reino acima dos sentimentos familiares, pois a nossa salvação está em jogo.

Se alguém vem a mim, mas não se desapega de seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs e até da sua própria vida, não pode ser meu discípulo”. Assim Jesus começou suas lições sobre o seguimento. Somos advertidos sobre onde colocamos nosso maior amor. O amor sem condições e sem fronteiras não é um suave sentimento muito tranquilo e fácil. É uma revolução. Jesus pede uma renúncia total para que nossa entrega a Ele seja total. Sabemos que Jesus quer que amemos aos nossos (cf. Jo 13,34-35; 15,12). O amor filial, o amor conjugal, o amor fraterno são “sagrados”. Todavia, o amor de Deus, que nos sustenta, anima e salva, deve ser maior. 

Trata-se, desta primeira condição, de uma opção radical pela pessoa de Jesus e pela nova escala de valores que Ele propõe. Os valores do Reino devem estar acima de tudo. Quem não fizer opção pela Vida, por excelência, que o próprio Jesus personifica (cf. Jo 11,25; 14,6), terá que contentar-se com uma vida raquítica, isto é uma vida limitada sem desenvolvimento e não conseguirá jamais superar os problemas que estabelecem as relações humanas. 

A segunda condição é consequência da anterior: “Quem não carrega sua cruz e não caminha atrás de mim, não pode ser meu discípulo”. A exemplo de Jesus, cada discípulo deve estar preparado para afrontar a recusa da sociedade que vive os valores contrários aos do Reino. O discípulos tem aceitar a sensação de fracasso ou experimentar o aparente fracasso. O “aparente fracasso” porque a última palavra sobre o homem será a de Deus e não a do homem. O discípulo deve estar preparado para sentir a sensação sem segurança.

Ao seguir a Jesus ficamos frente a frente com a cruz: a cruz da contrariedade, a cruz da injustiça, a cruz da desonestidade, a cruz da perda de um inocente, a cruz da corrupção e assim por diante. E Jesus continua nos chamando a caminhar atrás dele vivendo uma vida honesta, justa, fraterna no amor. A cruz nos convida a nos deixarmos contagiar pelo amor. Quem carrega a cruz com amor, une-se a Cristo. Quem a carrega sem amor, encontra-se com condenação. 

Carreguemos nossa cruz de cada dia, sendo fieis à missão que o Senhor nos confiou de anunciar Seu Evangelho. Sejamos um Evangelho encarnado do amor de Deus para os demais. Passemos a vida, como Cristo, fazendo o bem a todos (cf. At 10,38). Somente edificaremos a Igreja sobre a Pedra angular que é Cristo, se renunciarmos a nossos egoísmos, a nossas injustiças, a nossas paixões ordenadas, a nossas inclinações desenfreadas aos bens materiais ou ao poder. Cristo nos quer livres de toda carga de maldade, de toda injustiça e de todo sinal de morte. 

Podemos dizer que a moral cristã é uma moral simples que tem seu grande ponto de referência no amor ao próximo: “Não fique devendo a ninguém, a não ser o amor mútuo, pois quem ama o próximo está cumprindo a Lei. O amor é o cumprimento perfeito da Lei”, diz São Paulo aos romanos (Rm 13,8.10). Todos os preceitos da ética cristã ficam profundamente condicionados pelo preceito do amor ao próximo. Por isso, uma falta contra qualquer dos preceitos se descobre como uma falta contra a lei do amor. Todas as injustiças são consequências da falta de amor. Para os justos, os bons, os honestos, os que têm amor no coração não necessitariam de nenhuma lei.

Amar, não tem término. Há que avançar sempre no amor para alcançar o Deus de amor (1Jo 4,8.16). Amor é um grande desafio de cada dia, pois ele é essencial para os seres humanos e sua convivência diária a fim de chegar à sua plenitude. Por ser essencial, tudo deve partir dele e nele tudo deve terminar. Quando cumprirmos as leis civis, diremos que estamos dentro da lei. Mas o amor é uma “chamada” dirigida a todos para que o ser humano seja mais humano a fim de ser mais divino. 

A partir do amor podemos entender o seguimento renunciante de Jesus, que nos recorda a passagem do evangelho lida neste dia. Jesus, para levar até o fim Sua missão salvadora da humanidade, renunciou a tudo, inclusive, a sua vida. Por isso, foi constituído Senhor e Salvador de todos. E nos diz que também nós devemos saber carregar a cruz de cada dia para fazer o bem como Ele e com Ele.

A fé em Cristo abarca toda nossa vida. Por isso, para ser um verdadeiro cristão é preciso aprender a renunciar a muita coisa na vida. Renunciar não é um ato negativo e sim uma opção por aquilo que é superior na escala de valores. Cada renúncia supõe o amor. Se cada renúncia não se complementar por, com e no amor, a renúncia poderá se converter em anti-entrega. Somente o amor é que transforma qualquer renúncia em doação gratificante.

A adesão a Jesus leva cada pessoa ou cada cristão a um comportamento novo diante de todas as coisas e diante de todas as pessoas, inclusive diante das pessoas que tem uma ligação afetiva.

Para ser seus discípulos, Jesus não nos pede que cumpramos as regras, ou que sejamos bons. Tudo isso é necessário. Jesus nos pede que sejamos absolutamente disponíveis. Ser discípulo de Jesus não é somente ser bom, pois todos têm que sê-lo independentemente de ser ou de não ser cristão. Ser discípulo de Jesus é ser diferente, por ser disponível e pronto para renunciar a tudo pelo valor superior. Ser cristão é sério e difícil. Por isso, muitos caminham com Jesus, mas poucos chegam a ser discípulos.

Nesta Eucaristia ou celebração, o Senhor nos manifesta quanto nos ama, dando sua vida por nós todos, e fazendo-nos participes da Vida que Ele recebeu do Deus Pai. Em seu amor por nós, Jesus carregou sobre si nossos pecados para nos redimir. Por isso, ele se converteu para nós no Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Entremos em comunhão de vida com Ele e estejamos dispostos a ir atrás de suas pecadas, carregando nossa cruz de cada dia. Carreguemos nossa cruz de cada dia, sendo fieis à missão que o Senhor nos confiou de anunciar seu Evangelho de salvação. Sejamos um evangelho encarnado do amor de Deus para os demais. Vivamos fazendo o bem para todos.

Que Deus nos conceda a graça de viver com lealdade nossa fé em Jesus Cristo para que, sendo luz em meio das trevas do mundo, colaboremos para que todos encontrem o caminho que leva a Cristo que é o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo 14,6), Luz das nações e salvação para todos os homens.

Pe.Vitus Gustama, SVD

FINADOS,02 De Novembro De 2021

DIA DE FINADOS

MISSA DA RESSURREIÇÃO 

Falar sobre a morte não mata ninguém. Um sábio oriental contou: Um dia, a vida perguntou à morte: “Por que as pessoas me amam, e não gostam de você, morte?”. A morte respondeu: “Porque você, vida, é uma mentira bonita e eu, morte, sou a verdade dolorosa”. 

O mundo secularizado divide a vida humana em duas realidades biológicas contrárias: a vida e a morte. Pretende extrair da vida o máximo rendimento em êxito, poder, dinheiro e prazer. E diante da morte o homem experimenta horror, espanto, pavor, desespero e angústia. E inconscientemente, o mundo adota a atitude de avestruz: silencia a morte como se não existisse. Como resultado, absolutiza-se a vida terrena e se recusa a existência da morte. A morte vira tabu e por isso, fala-se pouco nela e dela.

Quem não tem fé pode facilmente pensar que a morte é o maior mal, porque com ela se volta ao nada, ao mundo de não ser. O cristão, ao contrário, olha para a morte com outros olhos, porque a morte não é o aniquilamento do ser e sim a porta para um novo modo de ser e de viver para sempre. O maior mal do homem é mau uso da liberdade, é a vontade de recusar Deus agora no tempo e logo para sempre no mais além. 

Ao celebrar a missa pelos nossos queridos falecidos devemos estar conscientes de que a vida é um mosaico de tempos diversos. Cada momento é assinalado por algo que se deixa ou por algo que se descobre. Cada momento comporta a separação daquilo que se era, para se aventurar em direção do que se pode vir a ser. Nesta dinâmica universal e constitutiva da vida, relação e separação não se excluem, mas se atraem. O encontro atrai a despedida e a separação. O nascimento atrai a morte. Aquele que é capaz de acolher, saberá também se separar, assim como a separação é pré-requisito de qualquer encontro.          

Além disso, a biografia de cada um de nós está repleta de sucessão de perdas que relembram continuamente a precariedade e a provisoriedade de toda relação e de qualquer realidade. Ao nascer, a criança perde a segurança e relação simbiótica com a mãe, a criança perde a infância para entrar na adolescência, da adolescência para a juventude, da juventude para a idade adulta, do adulto para a velhice e termina com a morte, se seguir seu ritmo normal. Sem contar outras perdas como a perda da própria cultura, dos bens materiais, de laços afetivos, de identidade pessoal, de bens humanos e espirituais, de saúde etc. Cedo ou tarde chegará o momento de dizer “adeus”: o amor ganha, então, as feições da dor. E repentinamente o passado reaparece com suas recordações, o presente se impregna de solidão e o futuro se desdenha repleto de incertezas.          

Cada perda representa uma separação de uma parte de si mesmo. Quem perde um genitor, chora a perda do passado; quem perde um cônjuge lamenta a perda do presente; quem perde um filho chora a perda do futuro; quem perde pai ou mãe, perde a referência de sua vida. 

Muitas dessas perdas passam despercebidas no contexto da existência cotidiana, outras deixam sinais profundos, cujas marcas permanecem por toda a vida. O crescimento de uma pessoa está ligado à capacidade de gerir de maneira construtiva as perdas da vida.          

As “pequenas perdas” preparam para encarar as grandes rupturas, representadas pelas duas separações mais significativas na vida humana: o nascimento e a morte. O dom do nascimento comporta a inevitabilidade da morte como parte integrante da vida. A outra face da morte está ligada à perda de uma pessoa querida. Cada situação de perda nos coloca em um contexto específico. Dizer adeus a alguém significa fazê-lo no contexto de uma relação em que o falecido tinha funções específicas na vida daqueles que o pranteiam.        

Cada pessoa dentro da família assume um papel que garante segurança e continuidade e, quando vem a faltar, provoca um balanço no equilíbrio. A gravidade do desajuste é proporcional ao papel exercido por aquele que morreu. Além disso, o processo de condolência é condicionado principalmente pela qualidade da relação com o falecido. Quanto maior a qualidade da relação com o falecido, mais se sente a sua perda. Sente-se a ausência de segurança e de referência.          

Morrer é, então, o acontecimento humano mais universal; é algo a que todos teremos de chegar. Podemos dizer que “a morte é a doença incurável que contraímos ao nascer. A nossa vida é realmente um viver morrendo. Por isso, quem chora a morte de uma pessoa querida, na verdade, chora um pouco da própria morte” (St. Agostinho). 

Mas tudo isso não é uma fatalidade para nós cristãos. A Igreja sempre acredita na imortalidade da alma. Por isso, no Credo professamos: “Creio na comunhão dos santos…Creio na ressurreição da carne... Creio na vida eterna”. Este Credo se baseia sobre a ressurreição de Jesus. A ressurreição do Senhor vem nos dizer que o homem não nasce para morrer, e sim nasce para ressuscitar. A partir da ressurreição do Senhor Jesus, a vida não pertence à morte e sim a morte pertence à vida. Por isso, um cristão nunca morre, e sim ele nasce duas vezes: nasceu do ventre materno, pela primeira vez, para este mundo, e nasce para a vida eterna pela segunda vez. Não é por acaso que o dia de um santo ou santa é comemorado não no dia em que ele nasceu para este mundo e sim no dia em que ele partiu deste mundo. A morte é considerada como uma passagem para a vida. O destino do homem, então, não é o cemitério. Não estamos caminhando para o cemitério, mas para a comunhão plena com o nosso Criador, para a Casa Paterna no céu (Cf. Jo 14,1-3). 

Se o nosso destino não é o cemitério, e sim a união plena com o nosso Criador, então o que devemos fazer para alcançar esta comunhão? Para responder a esta pergunta, devemos responder antes uma outra pergunta: Quem é Deus para nós?          

Na revelação cristã Deus é amor (1Jo 4,8.16). Isto quer dizer que quem ama, ele é de Deus. E quem não ama, não é de Deus. Por isso, ateu ou crente não se define a partir da pertença religiosa, e sim a partir da capacidade de amar. Ateu não é aquele que não tem religião e sim aquele que não ama, pois Deus é amor. O homem morre não quando deixar de viver, mas quando deixar de amar. Onde está o amor está Deus. Onde existe o amor, está o cristianismo, embora se trate de ateísmo. Onde não existe amor, não existe cristianismo. Mas quando se trata de amor, trata-se de amor ágape a exemplo de Cristo que se doa e se entrega até o fim (cf. Jo 13,1), até a cruz para salvar a humanidade. “Ninguém tem amor maior do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15,13).  São Paulo diz aos Corinthians: “Eu posso até fazer milagres, profecias, dominar muitas línguas até a língua dos anjos, conhecer todos os mistérios e toda a ciência, ter fé, mas sem caridade sou nada.” E acrescenta: “Permanecem estas três: a fé, a esperança e o amor. Mas a maior delas é o amor” (cf. 1 Cor 13,1-13). A fé e a esperança nos levam até a porta do céu. O que nos faz entrar é a caridade, pois Deus é Amor. Amor é o resumo da vida eterna. Seremos julgados sobre o amor. Se um dia formos condenados, não será por termos amado demais, mas por termos amado de menos. Por isso, as nossas reflexões de cada dia devem ser feitas em torno da caridade. E os nossos atos, palavras e pensamentos devem ser sempre orientados para a caridade. Fora da caridade, não existe Deus. 

Em segundo lugar, para olhar o mundo, a nós mesmos, aos outros e todos os acontecimentos na plenitude da verdade não há ponto de observação melhor do que o da morte. A partir dali tudo é visto em sua justa perspectiva. Visto a partir desse ponto, tudo ganha seu justo valor. Olhar a vida a partir da morte nos ajuda extraordinariamente a vivermos e convivermos bem. A morte nos impede que nos prendamos às coisas, e nos impede que fixemos aqui embaixo a morada de nosso coração esquecendo que “não temos aqui residência permanente” (cf. Hb 13,14). Não é a morte que é absurda, mas a vida sem a morte. A morte é o fim de todos os privilégios e diferenças que existem entre os homens. 

E nós que ainda nos resta a vida, o que devemos fazer? 

Em primeiro lugar, precisamos valorizar a presença, pois ela é um dom. Muitas vezes sentimos a importância de uma pessoa somente na sua ausência. Precisamos estar conscientes de que como é bom estarmos juntos enquanto for dado a nós o dom de convivência, pois vai chegar um dia em que seremos obrigados a viver de outra maneira. 

Em segundo lugar, não precisamos acumular as flores para formar um dia uma coroa de flores para um caixão, pois uma flor oferecida para uma pessoa viva vale muito mais do que uma coroa de flores para um morto. Que a coroa de flores oferecida na morte de alguém represente todas as flores dadas durante a vida daquele que já se foi.

Em terceiro lugar, não precisamos esperar alguém morrer para elogiá-lo ou para falar de suas virtudes. É bom elogiarmos quem merece ser elogiado enquanto ele estiver convivendo conosco. Pois um elogio sincero dado para um vivo vale muito mais do que um elogio triste para um caixão. Perdoemo-nos mutuamente enquanto estivermos vivos, pois como é bom experimentarmos o que é que a ressurreição ou a libertação enquanto para nós é dado o dom de viver um pouco mais. 

Em quarto lugar, como é triste morrer sem ter sabido viver e ao mesmo tempo como é triste viver sem aprender a morrer. Para vivermos melhor e com outra intensidade precisamos aprender a morrer. É o paradoxo da vida: para viver verdadeiramente precisamos aprender a morrer.

Precisamos aprender a morrer de nosso egoísmo, de nossa prepotência, de nosso rancor, de nossa falta de perdão, de nossa vingança, de nossa soberba que mata a caridade e a fraternidade, de nossa preguiça de rezar e de participar do banquete celeste aqui na terra que é a eucaristia. Em outras palavras, precisamos aprender a morrer de nossa morte para que possamos ressuscitar para uma vida com Deus. 

A missa que celebramos é uma confissão da fé na ressurreição, pois em cada missa celebramos a ressurreição do Senhor e, portanto, o nosso também, desde já. Esta fé é que nos reúne aqui nesta celebração. A fé na ressurreição é a fé da Igreja. Esta fé ilumina nossa vida, nossa experiência de morte e ressurreição, de pecado e de graça, de morte e de vida. Cremos no Deus da vida, o Único que pode purificar nossas vidas e nos levar à assembleia dos santos. Por isso, tem sentido de orarmos pelos defuntos: é pôr nossa confiança em que o Pai do céu acrescentará, na sua misericórdia, aos defuntos o que lhes faltava para chegar à bem-aventurança. E a partir dessa confiança somos conduzidos também pela mesma misericórdia para que possamos alcançar a plenitude de vida, na comunhão eterna com Deus. 

Portanto, a verdadeira questão não é se há vida após a morte e sim, se há a vida antes da morte. “A grande desgraça acontece quando você pensa que você tem tempo” (Budá). Mas repentinamente, você perde tudo e todas as oportunidades. Aprendamos a valorizar o que temos, para não ser tarde demais em valorizar o que você tinha. Às vezes você nunca vai saber do valor do momento até que se torne uma memória. Como um dia bem aproveitado traz um sono feliz, assim também a vida bem vivida e convivida traz a morte feliz. Se você quiser ter algo que nunca teve, faça algo que nunca fez. Você nunca vai ser corajoso, se nunca sofreu alguma ferida; você nunca vai aprender, se nunca errou na vida; e você nunca vai ser uma pessoa sucedida, se nunca falhou na vida. A grande tragédia não é a morte e sim algo valioso que está morrendo dentro de você enquanto você está vivo. Que os falecidos descansem em paz e que convivamos em paz neste mundo. Assim seja!

P. Vitus Gustama,SVD

V Domingo Da Páscoa, 28/04/2024

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