sábado, 30 de abril de 2022

Santos Filipe e Tiago, Apóstolos, 02/05/2022

SÃO FILIPE E SÃO TIAGO, APÓSTOLOS

03 de Maio

Primeira Leitura: 1Cor 15,1-8

1 Irmãos, quero lembrar-vos o evangelho que vos preguei e que rece­bestes, e no qual estais firmes. 2 Por ele sois salvos, se o estais guardando tal qual ele vos foi pregado por mim. De outro modo, teríeis abraçado a fé em vão. 3 Com efeito, transmiti-vos, em primeiro lugar, aquilo que eu mesmo tinha recebido, a saber: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras; 4 que foi sepultado; que, ao terceiro dia, ressuscitou, segundo as Escrituras’; 5e que apareceu a Cefas e, depois, aos Doze. 6 Mais tarde, apareceu a mais de quinhentos irmãos, de uma vez. Destes, a maioria ainda vive e alguns já morreram. 7 Depois, apareceu a Tiago e, depois, apareceu aos apóstolos todos juntos. 8 Por último, apareceu também a mim, como a um abortivo.

Evangelho: Jo 14,6-14 

Naquele tempo, Jesus disse a Tomé: 6 “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim. 7 Se vós me conhecêsseis, conheceríeis também o meu Pai. E desde agora o conheceis e o vistes”. 8 Disse Filipe: “Senhor, mostra-nos o Pai, isso nos basta!” 9 Jesus respondeu: “Há tanto tempo estou convosco, e não me conheces, Filipe? Quem me viu, viu o Pai. Como é que tu dizes: ‘Mostra-nos o Pai’? 10 Não acreditas que eu estou no Pai e o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo, não as digo por mim mesmo, mas é o Pai que, permanecendo em mim, realiza as suas obras. 11 Acreditai-me: eu estou no Pai e o Pai está em mim. Acre­ditai, ao menos, por causa destas mesmas obras. 12 Em verdade, em verdade vos digo, quem acredita em mim fará as obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas. Pois eu vou para o Pai, 13 e o que pedirdes em meu nome, eu o realizarei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho. 14 Se pedirdes algo em meu nome, eu o realizarei”.

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São Tiago, o Menor, chamado assim pela estatura e pela idade, é parente do Senhor segundo a carne (Mt 13,55). Ele faz parte das listas dos doze Apóstolos escolhidos pessoalmente por Jesus, e é sempre especificado como "filho de Alfeu" (cf. Mt 10, 3; Mc 3, 18; Lc 5; Act 1, 13). Com frequência ele foi identificado com outro Tiago, chamado "o Menor" (cf. Mc 15, 40), filho de uma Maria (cf. ibid.) que poderia ser a "Maria de Cleofas" presente, segundo o Quarto Evangelho, aos pés da Cruz juntamente com a Mãe de Jesus (cf. Jo 19, 25). Também ele era originário de Nazaré e provavelmente parente de Jesus (cf. Mt 13, 55; Mc 6, 3), do qual à maneira semítica é considerado "irmão" (cf. Mc 6, 3; Gl 1, 19). 

Foi o líder da primeira comunidade de Jerusalém (At 12,17). No Concílio de Jerusalém, o primeiro Concílio da Igreja, Tiago propôs que os gentios não fossem sobrecarregados da Lei judaica para serem cristãos (At 15,13-23). A sua proposta foi aceita. O próprio São Paulo o denominou, juntamente com Pedro (Cefas) e João, “colunas da Igreja (Gl 2,9). Judeus e cristãos se inclinavam diante de Tiago pelo amor que tinha à ei e pela sua grande austeridade. Conforme uma tradição (testemunhada por Hegesipo e recolhida por Eusébio) os judeus e os cristãos em Jerusalém chamavam Tiago com o apelativo de “o justoporque levou uma vida sem mancha e austeridade. Tiago foi o primeiro apostolo a dar a vida pelo Reino de Deus. Foi martirizado no ano 62 d.C. 

A ele é atribuída a Carta de São Tiago dirigida às doze Tribos de diáspora (fora de Palestina). Nesta Carta São Tiago exorta a todos a terem a paciência nas provas e nas tentações pela qual conduz qualquer um à perfeição, a terem o amor fraterno sem acepção de pessoas. Ele instrui todos sobre a doutrina da e das obras: “A sem obras é morta”, diz São Tiago. Ele exorta a todos para que evitem os pecados da língua; ensina a discernir a verdadeira sabedoria da falsa sabedoria (da verdadeira humildade da falsa humildade). Nesta Carta a Igreja encontrou o fundamento do Sacramento da Unção dos Enfermos (na Quinta-Feira Santa o bispo abençoa o óleo para a unção dos enfermos) onde São Tiago escreveu: “Se um de vocês está enfermo, chame o presbítero da Igreja para ungi-lo em nome do Senhor; a oração da o salvará...” (Tg 5,14-15). E São Tiago terminou sua Carta com estas palavras: “Meus irmãos, se alguém dentre vós se desviar da verdade e outro o reconduzir, saiba que aquele que reconduz o pecador desencaminhado salvará sua alma da morte e cobrirá uma multidão de pecados” (Tg 5,19). 

Filipe era natural de Betsaida de Galiléia, a cidade de André e Pedro, seus amigos (cf. Jo 1,44), uma pequena cidade pertencente à tetrarquia de um dos filhos de Herodes, o Grande, também ele chamado Filipe (cf.Lc3,1). Nas listas dos Doze, ele é sempre colocado no quinto lugar (assim em Mt 10, 3; Mc 3, 18; Lc 6, 14; Act 1, 13), portanto substancialmente entre os primeiros. Apesar de Filipe ter origens hebraicas, o seu nome é grego, como o de André, e isto é um pequeno sinal de abertura cultural que não se deve subestimar. As notícias que temos sobre ele são-nos fornecidas pelo Evangelho de João. 

Segundo o evangelho de São João Jesus o chamou a ser seu discípulo com estas palavras: “Vem e segue-me”. Filipe respondeu esse convite com generosidade e admiração. Mas Filipe não ficou contente em ser discípulo de Jesus. Ele levou Natanael para se encontrar com Jesus. Ao se encontrar pessoalmente com Jesus, Natanael confessou sua em Jesus: “Mestre, tu és o Filho de Deus, tu és o rei de Israel” (Jo 1,49). Filipe apareceu na multiplicação dos pães onde ele se mostrou pessimista em dar comida para uma grande multidão com pouco dinheiro que tinha, sem ter consciência de que ele estava com o Senhor dos milagres (Jo 6, 5-7). Diante dos seus olhos Filipe presenciou a multiplicação dos pães. Filipe apareceu também, em outra ocasião, como mediador daqueles prosélitos (recéns-convertidos) que se encontravam em Jerusalém com motivo da Páscoa e que queriam ver Jesus. Filipe e André se dirigiram ao Senhor para contar o desejo dos gregos em quererem ver o Senhor (Jo 12,20). A última intervenção de Filipe se encontra no evangelho deste dia (Jo 14,6-14). Para ele Jesus dirigiu estas palavras: “Quem me viu, viu o Pai”. Isto significa que conhecer Jesus, escutar suas palavras, viver seus mandamentos equivale a conhecer plenamente Deus, a contemplar seu rosto amoroso reflexo na bondade de Jesus Cristo, em sua misericórdia e amor para os pobres e simples. 

São três pontos dignos de menção aqui sobre Filipe. Primeiro, Filipe, assim como Pedro e André, é um bom exemplo daquelas pessoas que que “receberam” Jesus rápida e e entusiasticamente numa época em que a maioria dos “seus não O receberam” (Jo 1,11). Segundo, embora existam indicações de que ele era tímido e fraco na fé (Cf. Jo 14,8-11), imediatemente testemunhou de Jesus quando falou sobre Ele para Natanael. Esse tema do testemunho sobre Cristo que é um mandamento dirigido a todos os cristãos, é desenvolvido extensivamente no Evangelho de João (Cf. Por exemplo Jo 5,31-36). Terceiro, o conteúdo desse testemunho se torna evidente quando Filipe testemunhou não somente sobre um homem surpreendente e sim sobre o que estava escrito na Lei de Moisés a respeito de Jesus (Cf. Jo 1,45). 

Senhor, mostra-nos o Pai, isso nos basta!”, disse Filipe a Jesus. “Há tanto tempo estou convosco, e não me conheces, Filipe? Quem me viu, viu o Pai”, respondeu Jesus. O mistério de Deus somente pode entrar na mente humana através da fé: “Acreditai-me: eu estou no Pai e o Pai está em mim. Acre­ditai, ao menos, por causa destas mesmas obras”. 

Para nós cristaos, seguidores de Cristo é incompreensível não termos fé em Deus. É realmente maravilhoso o constatar como as portas do mal não prevalecem contra a Igreja de Cristo (Cf. Mt 16,18). 

Se formos generosos ao chamamento do Senhor que nos sussurra: “Vem e segue-me”, seremos também, como Tiago e Filipe, instrumentos e reflexos do Senhor neste mundo para levar mais pessoas ao encontro do Senhor. Muitos continuam esperando palavras de esperança de cada um de nós. Esperar é crer que algo novo e melhor é possível através de cada um de nós e torcer para que aconteça. O Senhor não quer saber de nossas fraquezas nem de nossos limites. Os outros estão ai. Depende de você que se aproxime ou não para torná-los seus irmãos. 

Graças aos apóstolos chegou até nós a mensagem de Deus, a mensagem de salvação, a mensagem que nos garante que temos um futuro vitorioso com Deus. Por nossa vez, nós não devemos deixar morrer na nossa mão a semente da Palavra de Deus. Precisamos passar adiante todo bem que sabemos fazer e que devemos fazer. 

Jesus: Caminho, Verdade e Vida

Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim”, disse Jesus no Evangelho deste dia. 

Para o Evangelho de João e para todos nós cristãos, o caminho não é mais a Lei como no AT, mas é uma Pessoa. Esta pessoa é Jesus Cristo. Jesus é o único Caminho, porque Sua vida e sua prática conduzem a humanidade ao encontro definitivo com Deus. Ele é o Caminho para o Pai porque na sua pessoa nos revela Deus, e no exemplo da sua vida e na luz da sua palavra nos mostra o itinerário a seguir para a nossa realização definitiva como filhos de Deus e irmãos dos homens.          

Ele é a Verdade em virtude de nele residir plenamente a realidade divina e que realizou nele a plenitude da realidade humana. Com sua atividade em favor do homem (Jo 10,37s), que manifesta o amor de Deus, revela ao mesmo tempo a verdade sobre Deus e sobre o homem. A verdade é, por isso, a lealdade absoluta de Deus frente aos homens, de maneira que o homem pode confiar cegamente na sua palavra, na sua promessa, na sua lealdade. Jesus é a Verdade no meio da mentira do mundo, porque ele é a revelação exata do Pai.  

Eu sou a Vida. No evangelho de João este termo “Vida” tem um significado inesgotável. 

·       Jesus, que recebe a plenitude do Espírito (Jo 1,32s), possui a plenitude da vida divina e dispõe dela, como o Pai (Jo 5,21.26;17,2).

·       A missão de Jesus é comunicar vida ao homem e vida em abundância (Jo 10,10), vida definitiva e indestrutível (Jo 10,28;17,2).

·       Por isso, Jesus é a Vida porque a possui em plenitude e pode comunicá-la para quem acredita nele. Ele é a Vida em plenitude e sem fim num mundo de morte e autodestruição, e, por isso, podemos entrar em comunhão com o Deus vivo através dele.        

A adesão a Jesus e à sua prática em favor da vida faz com que as pessoas se tornem filhas de Deus, formando só uma família com Jesus e o Pai. Para conhecer o Pai e para chegar até Ele faz-se necessário comprometer-se com a prática do Filho e viver de acoedo com seus ensinamentos

P. Vitus Gustama,svd

Segunda-feira Da III Semana Da Páscoa,02/05/2022

SOMENTE EM DEUS SE ENCONTRA O SENTIDO DE NOSSA EXISTÊNCIA

Segunda-Feira da III Semana da Páscoa

Primeira Leitura: At 6,8-15

Naqueles dias, 8 Estêvão, cheio de graça e poder, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo. 9 Mas alguns membros da chamada Sinagoga de Libertos, junto com cirenenses e alexandrinos, e alguns da Cilícia e da Ásia, começaram a discutir com Estêvão. 10 Porém, não conseguiam resistir à sabedoria e ao Espírito com que ele falava. 11 Então subornaram alguns indivíduos, que disseram: “Ouvimos este homem dizendo blasfêmias contra Moisés e contra Deus”. 12 Desse modo, incitaram o povo, os anciãos e os doutores da Lei, que prenderam Estêvão e o conduziram ao Sinédrio. 13 Aí apresentaram falsas testemunhas, que diziam: “Este homem não cessa de falar contra este lugar santo e contra a Lei. 14 E nós o ouvimos afirmar que Jesus Nazareno ia destruir este lugar e ia mudar os costumes que Moisés nos transmitiu”. 15 Todos os que estavam sentados no Sinédrio tinham os olhos fixos sobre Estêvão, e viram seu rosto como o rosto de um anjo.

Evangelho: 6,22-29

Depois que Jesus saciara os cinco mil homens, seus discípulos o viram andando sobre o mar. 22No dia seguinte, a multidão que tinha ficado do outro lado do mar constatou que havia só uma barca e que Jesus não tinha subido para ela com os discípulos, mas que eles tinham partido sozinhos. 23Entretanto, tinham chegado outras barcas de Tiberíades, perto do lugar onde tinham comido o pão depois de o Senhor ter dado graças. 24Quando a multidão viu que Jesus não estava ali, nem os seus discípulos, subiram às barcas e foram à procura de Jesus, em Cafarnaum. 25Quando o encontraram no outro lado do mar, perguntaram-lhe: “Rabi, quando chegaste aqui?” 26Jesus respondeu: “Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos. 27Esforçai-vos não pelo alimento que se perde, mas pelo alimento que permanece até a vida eterna, e que o Filho do homem vos dará. Pois este é quem o Pai marcou com seu selo”. 28Então perguntaram: “Que devemos fazer para realizar as obras de Deus?” 29Jesus respondeu: “A obra de Deus é que acrediteis naquele que ele enviou”.

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Diácono Estêvão é O Homem Que Se Deixa Guiar Pelo Espírito Do Senhor Ressuscitado 

Estêvão, cheio de graça e poder, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo” (At 6,8). Estêvão é um dos sete primeiros diáconos, eleitos pelos Apóstolos para o serviço da mesa (Cf. At 6,1-6).

 

Em grego, “Diácono” significa “servidor”. A palavra grega que a Bíblia geralmente traduz como “servir” é DIAKONEIN, que significa o serviço à mesa. Isto significa que quem serve à mesa serve à vida, nutre o outro com vida. Isto significa que quem serve à mesa serve à vida, nutre o outro com vida, atrai vida para o outro. É despertar vida. É atrair vida nas pessoas. Servir é, portanto, algo vital, isto é, algo que tem a ver com a vida. 

O Concílio Vaticano II restabeleceu essa tradição que se havia perdido: o diaconato é, de novo, um sacramento permanente dado a cristãos para significar que a Igreja inteira é “serviço” (cf. SC 86; LG 20, 28, 29, 41; OE 17; CD 15; DV 25; AG 15, 16). 

O serviço não é somente um conjunto de pequenas boas obras de ajuda aos demais. Para Jesus e, portanto, para a Igreja, Servir é um estilo de vida, e não é apenas uma atividade em determinado momento da vida diante dos demais: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate para muitos” (Mc 10,45). Ao servir o outro, o cristão estará participando da vida e da missão de Jesus. Cristo-Servo deseja viver e estar em meio de uma comunidade de servos/servidores. 

O texto da Primeira Leitura destaca a figura e obra do diácono Estêvão no desenvolvimento do cristianismo primitivo. “Graça e fortaleza” são as virtudes que ornam Estêvão. Estêvão é um homem fogoso e enfrenta seus adversários. Por conhecer bem o mundo grego, cuja língua fala, ele sabe que o universo não se reduz a Jerusalém (Lei e Templo): em toda parte há homens que esperam a salvação. Ele entende que a Igreja não deve ser reduzida a um gueto no meio do mundo judaico.

Em outras palavras, não só os apóstolos foram protagonistas na primeira comunidade: hoje aparece um dos diáconos recém-ordenados, Esteban, dando testemunho de Cristo perante o povo e as autoridades, com a mesma coragem e lucidez de Pedro e dos outros apóstolos. O livro de Atos dos Apóstolos dá grande importância a este diácono: dedica-lhe os capítulos 6 e 7. Estevão foi o primeiro mártir cristão, e celebramos sua festa no dia 26 de dezembro, em clima de Natal. 

Sua maneira de pensar e falar excitava os espíritos até mesmo dos judeus "libertados", que eram assim chamados porque, depois de serem levados como escravos para fora da Palestina, haviam sido libertados e devolvidos, e que originalmente deveriam ser de Israel. disposição mais aberta do que os judeus de Jerusalém. É por isso que eles tinham sua própria sinagoga. Mas mesmo para eles é inadmissível que Estêvão, cheio do Espírito, lhes mostre com sua eloquência como Jesus, o Ressuscitado, venceu a lei e o Templo, e que somente nele está a salvação. Por isso o acusam: «fala contra o Templo e contra as tradições que recebemos de Moisés». Mais uma vez se cumpre o anúncio que Jesus fez aos seus discípulos: quando fossem levados perante os tribunais, o Espírito sugeria o que eles tinham a dizer. 

Sem a necessidade de sermos apóstolos ou diáconos na comunidade cristã, todos somos convidados a dar testemunho de Cristo. Às vezes acontecerá também a nós, como Esteban, que nos encontremos no meio de um mundo hostil à mensagem cristã. E não é estranho que sejamos assaltados pela tentação de esconder nosso testemunho, para não ter dificuldades. Faremos bem em rezar com convicção o Salmo de hoje: "Bem-aventurado aquele que anda com vida irrepreensível". O cristão deve seguir os caminhos do Evangelho, e não os deste mundo, que muitas vezes são opostos: "Ainda que os nobres se sentam a murmurar de mim, o teu servo medita nas tuas leis... dá-me a graça da tua vontade."

Provavelmente não teremos ocasião de fazer discursos eloquentes perante autoridades ou multidões. A nossa vida é o melhor testemunho e o discurso mais eloquente, se estiver em conformidade com Cristo Jesus; se verdadeiramente "rejeitarmos o que é indigno do nome cristão e cumprirmos o que se entende por ele" (oração do dia). 

Podemos dizer que o discurso de Estêvão diante do Sinédrio é um resumo da história da salvação. Mais que discurso é uma oração, uma confissão gozosa, um canto de ação de graças quase extático: “Todos os que estavam sentados no Sinédrio tinham os olhos fixos sobre Estêvão, e viram seu rosto como o rosto de um anjo” (At 6,15). 

Convém dizer, antes de tudo, que dentro da dinâmica redacional dos Atos dos Apóstolos, o diácono Estêvão surge aqui como o iniciador formal da ruptura e da libertação da Igreja dos moldes do judaísmo. Alguns judeus de diáspora, convertidos ao cristianismo, queriam viver um cristianismo dentro do marco da Lei e do Templo (que é o pano de fundo do discurso de Estêvão). Estêvão toma, ao contrário, atitudes mais liberais a respeito da Lei e do Templo. Por isso, os judeus da diáspora helenista, que seria a área normal da missão de Estêvão, reagem com fanática hostilidade contra Estêvão: “Aí apresentaram falsas testemunhas, que diziam: ‘Este homem não cessa de falar contra este lugar santo e contra a Lei’” (At 6,13). É sempre assim a atitude das pessoas fracas na argumentação ou pessoas que têm interesses pessoais para serem defendidos/protegidos: atacam as pessoas que argumentam com fundamentos, em vez de aceitar a verdade, com humildade. Temos que aprender a distinguir quem fala e do que se fala. Podemos não gostar de uma pessoa, mas temos que aceitar a verdade da qual ela fala (cf. Mt 23,3). Um pouco de humildade nunca faz mal a ninguém! 

Para Estêvão, o cristianismo é um “vinho novo” que deve ser colocado em “odres novos” (Mc 2,22). Para Estêvão o que salva não é a Lei de Moisés ou o Templo e sim a fé em Jesus Ressuscitado. Na ruptura do cristianismo do judaísmo, uma atitude que deve ser levada em conta, uma segunda característica seria traçar um paralelo entre Jesus e Estêvão: Lucas silencia no processo da condenação de Jesus a acusação de querer destruir e reconstruir o templo (Mc 14, 57-58 e par.) e movê-lo para Estêvão (At 6,14). Lucas é o único que na hora da morte apresenta Jesus e Estêvão com palavras de perdão para os inimigos (Lc 23,34 e At 7,60). Um recurso literário para colocar um junto ao outro, o Mestre e o discípulo, também a liturgia faz no ciclo de Natal, em 25 (Nascimento de Jesus) e 26 de Dezembro (martírio de Estêvão): colocar um junto ao outro. Estêvão é o primeiro a selar com o sangue a mudança libertadora que Jesus introduz no mundo. 

O mundo continua mudando, a tecnologia continua avançando, o tempo continua fluindo ou fugindo e a idade continua subindo. Temos que ter coragem de fazer determinadas rupturas com determinadas coisas que nos impedem de avançar e de crescer para não infantilizarmos nossa vida. É preciso ter muito discernimento do Espírito, isto é, a capacidade de descobrir o que vale a pena e o que não vale a pena segurar. Não vale a pena o esforço de segurar o tempo e o vento, pois escapam de nosso controle. Quem não tem coragem de renunciar a muita coisa, atrasa o crescimento a ponto de se tornar estéril (cf. Jo 15,1-5). 

Procuramos Jesus Porque Ele É Nosso Salvador 

Continuamos a acompanhar a consequência ou a reação da multidão diante da multiplicação dos pães e peixes. A multidão saciada pelos pães multiplicados quer fazer Jesus de rei. Mas Jesus se afastou da multidão. Jesus não se deixa cair nas garras do poder mundano. Ele quer manter ser Filho de Deus até o fim. 

No Evangelho vimos como as pessoas procuram Jesus, no dia seguinte à multiplicação dos pães. Mas Jesus deve recriminá-los pelo fato de que a motivação dessa busca é superficial: “Vocês me procuram, não porque viram sinais, mas porque comeram o pão a fartura”. Eles permanecem no fato, mas não chegam à mensagem. Como a mulher samaritana que ansiava por água do poço, quando Jesus lhe falou sobre outra água que é o próprio Jesus que satisfaz todos os anseios da humanidade.

Com os seus milagres, Jesus quer que as pessoas compreendam a sua pessoa, o seu mistério, a sua missão. “A obra de Deus é que acrediteis naquele que ele enviou”. 

É admirável, ao longo do Evangelho, ver como Jesus, apesar do pouco conhecimento dos seus ouvintes, pacientemente os conduz à verdadeira fé: “Eu sou a luz”, “Eu sou a vida”, “Eu sou o Pastor”. Aqui, a partir do pão que comeram com prazer, ele os ajudará a acreditar em sua afirmação: “Eu sou o pão que dá a vida eterna”. 

Procurar Jesus porque ele multiplica o pão humano é um ponto de partida apenas. É preciso procurar Aquele que criou o trigo: Deus. Nós, que frequentemente celebramos a Eucaristia, já sabemos distinguir entre o pão humano e o pão eucarístico que é a carne salvífica de Cristo. Esta consciência deve levar-nos a um caminho vivido de forma muito mais decisiva no seguimento daquele Cristo Jesus que é ao mesmo tempo o nosso alimento e o nosso Mestre de vida. 

O texto do evangelho deste dia quer enfatizar, precisamente, o problema da pessoa de Jesus e da capacidade da fé para descobrir o mistério que está por trás dos sinais operados por Jesus. João convida os ouvintes a estarem sempre em estado de busca autêntica da pessoa de Jesus para entender suas palavras e obras. 

Quando revela sua própria pessoa Jesus emprega uma fórmula nova: Pão da vida, que era algo desconhecido no AT. Assim como outras fórmulas tais como “Luz da vida” (Jo 8,12), “Palavra de vida” (1Jo 1,1), “água de vida” (Ap 21,6;22,1), Bom Pastor (Jo 10), Videira (Jo 15) e assim por diante. A expressão “Pão da vida” quer nos transmitir que Jesus é a verdadeira vida imortal. Quem crê em Jesus, no sentido de viver de acordo com seus ensinamentos já está com a vida imortal porque está com Jesus e Jesus está nele. 

“Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos”. Jesus alerta à multidão que o que ela busca é apenas algum benefício imediato, um puro consumismo. No imediatismo, na superficialidade, no consumismo procura-se um Deus utilizável; um Deus que sirva para nossos pequenos interesses e caprichos; um Deus comerciante que distribua seus benefícios para os homens; um Deus padeiro que multiplica os pães de maneira mágica sem nenhum esforço da parte do homem; um Deus à nossa pequena medida para satisfazer nossos pequenos desejos e prazeres. O Deus que nos tira do comodismo e da passividade afastamos imediatamente. O imediatismo, o consumismo nos deixa vazios por dentro. O consumismo nos leva a buscarmos o nosso próprio bem-estar e abandonarmos o bem que deveríamos fazer. O consumismo nos leva a corrermos atrás de nossos próprios interesses para, depois, cairmos na indiferença e sermos alheios para o apelo de quem necessita do básico para viver. O consumismo nos faz esquecermo-nos do amor. Quem se alimenta só do efêmero vive sem raiz profunda e fácil de ser derrubado em qualquer momento por um pequeno sopro do vento da vida.

“Em verdade, em verdade, eu vos digo: estais me procurando não porque vistes sinais, mas porque comestes pão e ficastes satisfeitos”. “Eu gostaria de falar de Deus não nos limites e sim no centro; não na debilidade e sim na força; não a propósito da morte e da carência e sim da vida e da bondade do homem” (Bonhoeffer). Somente Deus fala bem do próprio Deus e somente Cristo é o verdadeiro interprete do Pai, pois Ele é a própria Palavra de Deus feita carne e por isso, devemos acreditar n’Ele: “A obra de Deus é que acrediteis naquele que ele enviou”. Ninguém pode manejar Deus.

Esforçai-vos, não pelo alimento que perece, mas pelo que dura até a vida eterna, que o Filho do Homem vos dará (Jo 6,27).  Não somos somente animais de necessidades: comer, beber, dormir, respirar, vestir-nos e assim por diante. Não somos homens unidimensionais que sacrificamos nossa vida aos imperativos de ídolo do consumismo. Somente com o pão, o homem não se satisfaz. Somos homens multidimensionais. Somos homens de sentido. Somente encontrando o sentido de sua vida, o porquê e o para quê da vida é que o homem alcançará sua verdadeira felicidade, paz e serenidade. Sem o alimento interior o homem cairá no vazio. Necessitamos cuidar do Eterno dentro de nós.

O homem de hoje, ainda que não conscientemente, busca felicidade, segurança, vida, verdade e o sentido da vida. Há boa vontade em muita gente. O que essas pessoas necessitam é que alguém lhes ajude. Às vezes tem uma concepção pobre da fé cristã por temor ou por um sentido meramente de preceito ou por interesse. Alguns procuram Deus pelos favores que d’Ele esperam, sem buscar o próprio Deus. Se nós cristãos ajudarmos as pessoas que buscam Deus, com nossas palavras e obras, se formos sinais de Deus nesta terra, creio que muitas pessoas vão procurar não somente alimento que se perde, mas principalmente alimento que perdura para sempre que é Cristo que dá valor para o resto. A partir de Cristo tudo ganha seu próprio valor. 

É importante recordar que nem tudo que você quer é o que você necessita e nem tudo que você necessita você vai conseguir no momento em que desejar. Mas apesar de tudo, nunca renuncie a suas metas e por isso, continue em frente! Não permita que as desilusões da vida abortem seu potencial e o afastem de seus sonhos de dignidade. Procure fazer as coisas e estar com as pessoas que acrescentam valor à sua vida. Não basta encontrar solução para a necessidade material; há que aspirar para a plenitude humana e isso requer a colaboração do homem: “Esforçai-vos”. O alimento que se acaba (o pão) dá somente uma vida que perece. O que não se acaba, que é o amor, dá vida definitiva. O pão há de ser expressão do amor. Precisamos ser sinais de amor para os demais. Na ausência desse amor, perdermos nossa autoridade de cristãos e não teremos nada para oferecer para as pessoas que buscam o sentido da vida. 

A obra de Deus é que acrediteis naquele que ele enviou”, disse Jesus à multidão que o procurou. É curiosa a escolha dos termos laborais (termos que tem a ver com o trabalho) no texto de hoje: a obra, o trabalho. Crer em Jesus para o evangelista João é considerado como trabalho, como esforço. Por que crer em Jesus é considerado como trabalho ou esforço? Porque a tradição, a mentalidade herdada, as ideias que se tem são algo complexo. O mundo em que vivemos pode nos dificultar muito a crer em Jesus Cristo. Em todos os momentos temos que renovar nossa fé em Deus com muita oração, muita reflexão e muita atenção ao que acontece ao nosso redor e no mundo. O que Deus quer de nós diante de tudo isso? O que Deus quer que façamos diante dos acontecimentos. Em cada acontecimento há sempre algum recado de Deus e há, ao mesmo tempo, uma chamada da parte de Deus para que façamos algo. 

Esforçai-vos, não pelo alimento que perece, mas pelo que dura até a vida eterna, que o Filho do Homem vos dará” (Jo 6,27). Meditemos e reflitamos bem sobre esta frase! Necessitamos reconhecer nossa necessidade de Deus onde se encontra o sentido de nossa vida. Não deixemos que essa necessidade seja coberta por algo efêmero.

Portanto, que Deus abra nosso coração, ilumine nossa mente e aviva nosso amor para que possamos sentir ou experimentar Sua presença indispensável para nossa vida e salvação.

P. Vitus Gustama,svd

quarta-feira, 27 de abril de 2022

III Domingo Da Páscoa, 01/05/2022

AMOR: BASE E ALMA DE TODA ATIVIDADE EVANGELIZADORA NA IGREJA

III DOMINGO DA PÁSCOA ANO “C”

Primeira Leitura: At 5,27b-32.40b-41

Naqueles dias, os guardas levaram os apóstolos e os apresentaram ao Sinédrio. 27b O sumo sacerdote começou a interrogá-los, dizendo: 28 “Nós tínhamos proibido expressamente que vós ensinásseis em nome de Jesus. Apesar disso, enchestes a cidade de Jerusalém com a vossa doutrina. E ainda nos quereis tornar responsáveis pela morte desse homem!” 29 Então Pedro e os outros apóstolos responderam: “É preciso obedecer a Deus, antes que aos homens. 30 O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus, a quem vós matastes, pregando-o numa cruz. 31 Deus, por seu poder, o exaltou, tornando-o Guia Supremo e Salvador, para dar ao povo de Israel a conversão e o perdão dos seus pecados. 32 E disso somos testemunhas, nós e o Espírito Santo, que Deus concedeu àqueles que lhe obedecem”. 40b Então mandaram açoitar os apóstolos e proibiram que eles falassem em nome de Jesus, e depois os soltaram. 41 Os apóstolos saíram do Conselho, muito contentes, por terem sido considerados dignos de injúrias, por causa do nome de Jesus.

Segunda Leitura: Ap 5,11-14

Eu, João, vi 11 e ouvi a voz de numerosos anjos, que estavam em volta do trono, e dos Seres vivos e dos Anciãos. Eram milhares de milhares, milhões de milhões, 12 e proclamavam em alta voz: “O Cordeiro imolado é digno de receber o poder, a riqueza, a sabedoria e a força, a honra, a glória, e o louvor”. 13 Ouvi também todas as criaturas que estão no céu, na terra, debaixo da terra e no mar, e tudo o que neles existe, e diziam: “Ao que está sentado no trono e ao Cordeiro, o louvor e a honra, a glória e o poder para sempre”. 14 Os quatro Seres vivos respondiam: “Amém”, e os Anciãos se prostraram em adoração daquele que vive para sempre.

Evangelho: Jo 21,1-19

Naquele tempo, 1 Jesus apareceu de novo aos discípulos, à beira do mar de Tiberíades. A aparição foi assim: 2 Estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael de Caná da Galileia, os filhos de Zebedeu e outros dois discípulos de Jesus. 3 Simão Pedro disse a eles: “Eu vou pescar”. Eles disseram: “Também vamos contigo”. Saíram e entraram na barca, mas não pescaram nada naquela noite. 4 Já tinha amanhecido, e Jesus estava de pé na margem. Mas os discípulos não sabiam que era Jesus. 5 Então Jesus disse: “Moços, tendes alguma coisa para comer?” Responderam: “Não”. 6 Jesus disse-lhes: “Lançai a rede à direita da barca, e achareis”. Lançaram pois a rede e não conseguiam puxá-la para fora, por causa da quantidade de peixes. 7 Então, o discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: “É o Senhor!” Simão Pedro, ouvindo dizer que era o Senhor, vestiu sua roupa, pois estava nu, e atirou-se ao mar. 8 Os outros discípulos vieram com a barca, arrastando a rede com os peixes. Na verdade, não estavam longe da terra, mas somente a cerca de cem metros. 9 Logo que pisaram a terra, viram brasas acesas, com peixe em cima, e pão.10 Jesus disse-lhes: “Trazei alguns dos peixes que apanhastes”. 11 Então Simão Pedro subiu ao barco e arrastou a rede para a terra. Estava cheia de cento e cinquenta e três grandes peixes; e apesar de tantos peixes, a rede não se rompeu. 12 Jesus disse-lhes: “Vinde comer”. Nenhum dos discípulos se atrevia a perguntar quem era ele, pois sabiam que era o Senhor. 13 Jesus aproximou-se, tomou o pão e distribuiu-o por eles. E fez a mesma coisa com o peixe. 14 Esta foi a terceira vez que Jesus, ressuscitado dos mortos, apareceu aos discípulos. 15 Depois de comerem, Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?” Pedro respondeu: “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”. Jesus disse: “Apascenta os meus cordeiros”. 16 E disse de novo a Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas?” Pedro disse: “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”. Jesus lhe disse: “Apascenta as minhas ovelhas”. 17 Pela terceira vez, perguntou a Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas?” Pedro ficou triste, porque Jesus perguntou três vezes se ele o amava. Respondeu: “Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que eu te amo”. Jesus disse-lhe: “Apascenta as minhas ovelhas.18 Em verdade, em verdade te digo: quando eras jovem, tu te cingias e ias para onde querias. Quando fores velho, estenderás as mãos e outro te cingirá e te levará para onde não queres ir”. 19 Jesus disse isso, significando com que morte Pedro iria glorificar a Deus. E acrescentou: “Segue-me”.

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Unanimemente atestado pela tradição manuscrita, Jo 21 pertence ao Quarto Evangelho, mas foi acrescentado mais tarde ao evangelho. O evangelho se encerra no capítulo 20 (Jo 20,30-31). Alguns veem nele um ”apêndice” pois ele é um acréscimo ao evangelho. Os outros o caracterizam como “epílogo”, de alguma maneira correspondente ao “prólogo” do evangelho. Segundo a maioria dos exegetas, o autor de Jo 21 é membro da escola joanina. Ele é um bom conhecedor do Quarto Evangelho e talvez seu primeiro editor (R.E.Brown, R. Schnackenburg, M.Hengel) porque por um lado, o vocabulário, estilo e temas típicos de Jo plenamente estão conformes ao resto do evangelho. Ele é acréscimo porque se encontram neste texto, vocabulário, estilo e temas dificilmente atribuíveis ao autor do evangelho.  Quanto a data, diversos estudiosos concordam que seria posterior à Primeira Carta de João, escrita por volta de 90 d.C.

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Um Olhar Geral Sobre As Leituras Deste Domingo

O Cristo ressuscitado diz três vezes a Pedro qual deve ser a sua missão: "Apascenta as minhas ovelhas" (Evangelho). Depois de Pentecostes os discípulos começaram a colocar em prática a missão que haviam recebido, pregando a Boa Nova de Jesus Cristo (Primeira Leitura). Faz parte da missão que os homens não só conheçam a Cristo, mas também o adorem como Deus e Senhor (Segunda Leitura).

O texto do evangelho nos enfatiza que os apóstolos não se deixam dominar pela tentação de tristeza, desânimo e de dispersão, mas permanecem juntos e trabalham juntos. Em Jo 21,2 é mencionado que sete deles estão de novo juntos, na Galileia. “Sete”, como “Doze”, é o número simbólico da totalidade determinada. Neste caso, o número simboliza a Igreja. O número cento e cinquenta e três (153) peixes milagrosamente capturados simboliza o caráter pleno e universal da missão dos discípulos e da Igreja. O relato acentua, então, três dimensões essenciais da natureza da Igreja: a vida comunitária, a missão e o serviço. 

A pesca acontece à noite é outro símbolo.  A noite é o tempo da ausência de Jesus, luz do mundo (cf. Jo 8,12). Os exegetas observam que a luz da manhã coincide simbolicamente com a presença de Jesus. À noite (sem contar com Jesus), a missão foi infrutífera; eles não conseguiram pescar nenhum peixe. Mas a ausência de Jesus não significa que ele irá substituí-los na pescaria. O mar representa o mundo em que a missão é realizada. Jesus permanece em terra firme. A missão ficará nas mãos dos discípulos. Que sim, entre o mar e a “costa” existe uma corrente de proximidade e encorajamento, embora os trabalhadores do mar, em pleno trabalho, não identifiquem a origem desta corrente. 

Falam-se do fogo e da comida. Lá, como o evangelista Marcos comenta lindamente, a comida que Jesus preparou (Jesus é o Pão da Vida) e a comida que eles trazem (oferta) são misturadas. A missão no mundo termina na Eucaristia da comunidade. Nela se faz presente o dom de Jesus aos seus, como o Pão da Vida, e o dom que trazemos uns aos outros (nossa oferta). Jesus quer que levemos o pão, fruto do nosso esforço, para uni-lo indissoluvelmente ao dom que Cristo nos dá de Si Mesmo. E na mesa eucarística, na “margem” do mar da vida, não será mais possível separar o dom de Jesus e o nosso próprio dom.

Jesus e a comunidade dos discípulos. Existem os dois pólos de referência na missão e na Eucaristia. Mas vemos que a narrativa destaca duas pessoas. Simão Pedro e o discípulo amado têm um papel especial, que os exegetas pensam não ser acidental, mas intencional. O discípulo predileto está à frente de Simão Pedro quando se trata de reconhecimento e de confissão de Jesus. E, no entanto, o nome discípilo amado permanece anônimo. Simón Pedro toma a iniciativa da ação e também mantém um coloquio pessoal com Jesus depois, no qual é interrogado e comprometido para uma missão dentro da comunidade. 

Os exegetas pensam que nessa cena culmina a linha que tanto o discípulo amado quanto Pedro mantiveram ao longo do Evangelho. E que se torna uma lição simbólica. 

A comunidade de Jesus é composta por aqueles que anonimamente conservam a sensibilidade de reconhecê-Lo e confessá-Lo no meio do mar do mundo. A Igreja não se baseia na autoridade, mas na enorme capacidade de fé da comunidade anônima. Sem a fé da comunidade, o encargo de Pedro não seria possível. Por isso, sua autoridade é exercida na modestia e no serviço àquela comunidade, que capta Jesus no mar do mundo. E, no entanto, Pedro recebeu do Senhor uma missão dentro dessa comunidade que todos devemos reconhecer e agradecer. Muito possivelmente nos livros de história teremos os nomes dos Papas como o de Pedro nesta cena evangélica. Os crentes, sem dúvida, continuarão a ser os discípulos anônimos a quem Jesus amou. O Evangelho já nos anuncia hoje. 

Cada evangelista, a seu modo, mostra, como parte fundamental da mensagem de Jesus, a missão universal da Igreja. São João no Evangelho de hoje recorre, seguindo seu próprio estilo, aos símbolos. O mar como imagem do mundo, de todos os homens, era comum nos tempos de Jesus e do evangelista e por isso, o mar simboliza  o lugar da missão. Há outro símbolo que é exclusivo de João. É referente ao número de peixes pescados: 153 peixes. Sabe-se que, na cultura contemporânea de Jesus, o símbolo numérico tinha grande valor e era usado com frequência. Cento e cinquenta e três indica integridade e completude. Geralmente é explicado de duas maneiras: 1 + 3 + 5 é igual a 9, que sendo um múltiplo de 3 sublinha a plenitude ao mais alto grau. Outra forma de explicar o valor total e total desse número é a seguinte: o múltiplo de 12 é 144; se somarmos 9 a 144 obtemos 153. É uma forma de enfatizar ainda mais a totalidade. Em suma, a missão da Igreja, no mar do mundo, não é outra senão a de ser a pescadora (Igreja como pescadora) de todos os homens sem exceção e conduzi-los ao porto seguro da fé e da eternidade. Esta imagem do navio e do peixe é seguida por outra: a do pastor e das ovelhas. Jesus Cristo, Bom Pastor, confia a Pedro: "Apascenta as minhas ovelhas". Ezequiel havia falado de Deus como o Pastor de Israel; agora Jesus usa a mesma imagem para falar de si mesmo como Pastor da Igreja, e dá a Pedro sua mesma missão de pastor. Bom Pastor é aquele que cuida, ama, protege, alimenta suas ovelhas e as defende dos lobos a ponto de dar a vida por elas (Fala-se especificamente do Bom Pastor no IV Domingo da Páscoa). A missão de Pedro e dos pastores na Igreja é garantir que todas as ovelhas alcancem a salvação de Deus. As ovelhas são do Senhor. A Pedro e aos demais pastores da Igreja (sucessores dos Apóstolos) é pedido e é encarregado para APASCENTAR as ovelhas do Senhor. Tratar mal a uma das ovelhas significa tratar mal ao Propretário das ovelhas que é o próprio Senhor.

A experiência pascal dos discípulos os transforma e os converte à esperança. Sua primeira reação foi de surpresa,entusiasmo e louvor. A Segunda Leitura de hoje nos coloca nessa atitude, pois reconhecemos com espanto o senhorio de Jesus dos quatro ventos (Senhor do Universo). O tempo pascal deve servir aos cristãos para que recuperem sua capacidade de admiração e de contemplação. Que Jesus, o Senhor, receba o louvor, a honra, a glória e o poderpelos séculos dos séculos. 

Anunciar o Cristo ressuscitado, como nos narra a Primeira Leitura, é reconhecer como Senhor Aquele que foi condenado e eliminado pelo sistema de poder, e que, no entanto, Deus ressuscitou e fez o "Chefe e Salvador" da história . 

O testemunho é perigoso, porque não se trata de fornecer argumentos científicos, objetivos, neutros. Só é possível implicar a própria vida. A verdade do testemunho procede da coerência da vida, que não aceita submeter-se a um sistema que condena Jesus e seus valores do Reino. 

Mas a experiência pascal não só provoca a dinâmica do louvor surprendido e do testemunho corajoso da própria vida, mas também significa assumir a mesma missão salvífica de Jesus na comunidade, na Igreja. O texto pascal mais antigo que temos no Novo Testamento, recolhido em 1Cor 15, não é apenas uma catequese pascal, mas também uma legitimação da missão dos principais representantes das comunidades cristãs. O que é proposto teologicamente ali é lindamente encenado na narração de hoje. 

Um Olhar Espeífico Sobre O Evangelgo Deste Domingo 

I. A Aparição De Jesus E A Pesca Milagrosa      

Simão Pedro toma isoladamente sua decisão para pescar. Mas a iniciativa de Pedro arrasta o grupo, pois o grupo logo o segue. Pescar é a profissão deles, mas também o símbolo da sua missão entre os homens. E na Bíblia, a pesca é muitas vezes sinônimo de missão. Sob a imagem da pesca está representada a missão da comunidade (aqui se mencionam sete discípulos. O número sete representa totalidade). Trata-se aqui, portanto, do trabalho apostólico/missionário da Igreja. Mas este trabalho só recebe eficácia se obedecer-se ou aceita-se a Palavra e a presença daquele que envia. Isto não quer dizer que a iniciativa de Pedro seja inútil, mas o resultado, que é nulo, os faz perceber que, na Igreja, uma obra, seja qual for a generosidade da intenção, só dá resultado com a graça do Espírito. Para que o trabalho seja frutífero, Jesus deve estar presente. Jesus deve ser sempre o agente principal. Em nenhum momento nenhum discípulo fica na frente de Jesus, o discípulo é apenas um seguidor. Seguir quer dizer ficar atrás de uma pessoa que está na frente. E quem está na frente deve ser sempre Jesus.        

O detalhe temporal “naquela noite” é importante para entender a cena: “...naquela noite nada apanharam” (v.3). Os discípulos juntos perseveram no trabalho a noite inteira. Quer dizer que eles trabalham sem parar com a maior vontade. “Naquela noite” é um detalhe simbólico. Não se trata da noite física mas do resultado de uma atitude. A noite significa, portanto, a ausência de Jesus, luz do mundo (cf. Jo 9,4s; 8,12). O trabalho sem estar vinculado a Jesus, não rende. Sem Jesus o trabalho da comunidade não dá frutos. Na atividade dos discípulos falta a presença e a ação de Jesus. Na ausência de Jesus, não podem realizar o desígnio do Pai. Jesus é luz do mundo. Sua presença é o dia que possibilita trabalhar com eficácia. Tudo isto quer nos dizer que para que a missão confiada a nós possa produzir frutos, não basta estar juntos, não basta a boa vontade, a dedicação ao trabalho e a colaboração. Tudo isto é insuficiente. O Senhor que nos envia deve estar sempre presente em todas as nossas atividades: trabalho e decisões etc., pois sem a sua presença, sem a escuta de suas palavras e sem a obediência a elas, a missão da Igreja será totalmente estéril.

1.1. Reconhecimento Do Ressuscitado   

Maria Madalena reconheceu Jesus pela voz quando Jesus pronunciou seu nome (Jo 20,14). Os discípulos de Emaús reconheceram Jesus Ressuscitado na fração do pão (Lc 24,16). No relato do Evangelho de hoje, Jesus não se dá a conhecer de imediato. Embora Jesus esteja tão próximo deles, “mas os discípulos não sabiam que era Jesus” (v.4; cf. Jo 20,14; Lc 24,15s).

Diante da pesca abundante, em vez de um grito de espanto (cf. Lc 5,8-10) que poderia ser a reação dos pescadores aqui, o narrador orienta a atenção para a reação do Discípulo amado e a do Pedro. João, cujo carisma é descobrir o invisível no visível, através dos gestos, da voz, da maravilha, reconhece a presença de Jesus: “É o Senhor!” Eis o seu privilégio: reconhecer o Senhor. Ele enxerga para além das causas ordinárias que poderiam explicar o fenômeno. Somente quem tem a experiência do amor de Jesus e está em sintonia permanente com o Senhor é que sabe ler os sinais da presença de Deus e captar o seu significado. 

Quando tivermos consciência de que o Senhor nos ama incondicionalmente e amamos o Senhor, descobriremos facilmente sua presença na nossa vida e nos acontecimentos diários; discerniremos os sinais da presença do Senhor nos acontecimentos aparentemente muito insignificantes. No amor de Deus não há dia que não tenha algum apelo do Senhor para nós. Se amarmos o Senhor através da vivência de Sua Palavra, o mesmo amor nos manterá atentos para todos os sinais diariamente, pois neles há algum recado do Senhor para nós. 

Certamente, Jesus dá o prêmio à constância de quem segue com confiança as suas indicações. Ainda que num primeiro momento pareçam indicações de um estranho e não sejam compreendidas, de fato um senso profundo de confiança move instintivamente os discípulos em direção à voz de Jesus e faz com que eles a escutem. Quando acolhemos a palavra do Senhor, cumprimos seus mandamentos e seguimos suas orientações, os frutos da missão são sempre abundantes, mesmo nas circunstâncias mais adversas. Sem Jesus “nada podemos fazer” (Jo 15,5). Sem a presença de Jesus, sem a obediência à sua palavra, sem a comunhão e a intimidade com ele, a nossa missão se torna estéril. A mensagem é dirigida a todos, individual e comunitariamente, que o Senhor existe e que está próximo. Por isso, é preciso abrir os olhos e perceber as suas indicações providenciais. É preciso obedecer à vontade de Deus para que nossa vida não seja um fracasso. Obedecer à vontade de Deus significa renunciar ao nosso projeto pessoal em função do projeto maior de Jesus. 

Jesus ressuscitado, na verdade, continua acompanhando nosso trabalho e se manifestando a nós embora não notemos sua presença. Ele vai ao encontro dos discípulos quando estão trabalhando. O texto diz que “Ao amanhecer, Jesus estava de pé na praia” (v.4b). Ele está olhando para os discípulos cansados e frustrados depois de um trabalho sem sucesso. “Jesus estava de pé na praia” nos mostra que Jesus continua acompanhando com seu olhar amoroso o trabalho dos discípulos. 

1.2. O Senhor é o Nosso Amanhecer Que Ilumina Nosso Dia a Dia          

O texto diz “ao amanhecer Jesus estava de pé na praia”. A presença de Jesus, que autorevelou como “a luz do mundo” e “a luz da vida” (Jo 8,12; cf. 9,5;12,35s) é incompatível com a “noite”, momento em que os discípulos pescaram. Jesus que é a luz traz consigo o fim da noite, pois a luz expulsa a escuridão, e todas as noites, as nossas noites escuras. Jesus é o nosso amanhecer. Com ele tudo é iluminado.          

Jesus, o Nosso Amanhecer, vai ao encontro dos discípulos e faz uma pergunta retórica aos discípulos: “Filhos (moços), tendes algo para comer?” (v.4). Quando Jesus vem ao nosso encontro, a nossa noite escura, as noites de impotência e as de desolação se transformam no amanhecer. O caminho se torna, assim, iluminado pela presença da Luz. Agora é o momento de escutar a voz daquele que é a fonte de todo o sucesso na missão. É necessário ouvi-la e escutar bem sua pergunta. Mas estar com os “companheiros” (palavra que etimologicamente significa “os que partilham do mesmo pão”, neste sentido “o pão da missão”) é condição necessária para ouvir a voz do Senhor, para fazer a experiência do encontro com ele. A pergunta retórica de Jesus, formulada em vista de uma resposta negativa, é dirigida a pessoas que não conseguiram fruto de seu trabalho. Aqui o “mar” simboliza as dificuldades, as ameaças e os perigos.          

Para a pergunta de Jesus, eles responderam secamente: “Não!”. Jesus sabe que seus discípulos não pescaram nada e quer renovar a relação com eles. Ele indica-lhes como superar a crise: “Lançai a rede à direita do barco e achareis!” A ordem é seguida da execução e tem efeito. Os discípulos entregam-se à palavra do desconhecido e a rede se enche de peixes: 153 peixes. É o número simbólico que significa a totalidade e a multidão dos homens de todos os tempos capturados pela pregação de Pedro e dos outros discípulos. Apesar do seu grande número, a rede não se rompe. Jesus guarda sua Igreja na unidade mas sob condição de que se mantenha a sua presença. Sem ele, os homens se dispersam. Sobrevindo ele, todos são reunidos nele acima de toda a esperança. 

1.3. É Preciso Trabalhar No Espírito De Serviço a Exemplo de Jesus Cristo          

Quanto a Pedro não tinha percebido a causa da pesca abundante mas ao ouvir o que lhe diz o Discípulo amado, compreende. Aqui, nessa cena, acontece uma mudança na atitude de Pedro numa linguagem simbólica sumamente densa. Em primeiro lugar, há o jogo de veste- desnudez; em segundo lugar, o ato de lançar-se na água. A nudez de Pedro indica que carece da veste própria do discípulo. A expressão que se usa aqui (“se atou...à cintura), foi usada na Ceia quando Jesus amarrou-se à cintura um pano que significa o seu serviço até a morte. Era essa a desnudez de Pedro: não ter aceitado a morte de Jesus como expressão suprema do amor nem tê-la tomado por norma; não responder ao impulso do Espírito que o teria levado a se identificar com Jesus. Por isso, ele se lança na água. Ele é o único que se atira à água, separando-se por ser o único que deve corrigir sua atitude anterior. Seu gesto é individual e simboliza sua nova atitude. Lança-se na água aqui significa mergulhar na missão com as disposições de Jesus: servir até dar a vida por amor. Assim como atirar-se à água expressa sua aceitação do serviço até a morte, subir/sair da água é sinal da nova atitude de Pedro, o qual lhe permite arrastar a rede com a força dobrada. 

1.4. Missão-Eucaristia-Missão        

A missão cumprida tem um fim diferente de si mesma: “Vinde comer!” diz Jesus. O pão, o peixe, os outros símbolos e toda a atmosfera da cena são claramente eucarísticos. É a refeição após a pescaria. Jesus mesmo preparou o almoço. Isto quer nos dizer que todo o trabalho efetuado na Igreja tem seu termo na comunhão, na eucaristia. Esta é o sinal supremo da presença. Esta presença é o fator da unidade da Igreja e explica toda a atividade que nela se exerce.          

A Igreja eucarística, que reúne os homens em torno da mesa do Senhor, é indispensável da Igreja missionária. Ao celebrar a Eucaristia a Igreja se torna mais missionária e por isso é sempre enviada de novo para levar adiante sua missão no mundo. Todo verdadeiro encontro com o Senhor se prolonga na missão. Nela, nada substitui os momentos de silêncio e comunhão. A Igreja eucarística se traduz na atividade missionária e a Igreja missionária tem como força a Igreja eucarística. Mas aqui não se trata de duas Igrejas. É uma só Igreja. Podemos dizer em outros termos: nossa vida na ação e na contemplação simultaneamente. Uma não substitui outra, pois a ausência de uma provoca a carência na outra. A comunidade/Igreja vive de Jesus, do seu amor, mas também da missão, do amor ao homem, que realiza e expressa o amor a Jesus (Jo 14,21). 

II. Tríplice confissão de Pedro (Jo 21,15-19)           

A sequência do relato concerne não à missão dos discípulos em seu conjunto, como na aparição em Jerusalém (Jo 20,21), mas à de Pedro e também se fala do destino do Discípulo amado. Mas num diálogo o Senhor somente confia a Pedro o encargo de Pastor de rebanho e lhe anuncia seu martírio.        

O diálogo acontece após a refeição convival. Por três vezes, Jesus pergunta a Pedro: “Tu me amas mais do que estes?” e por três vezes Pedro responde (na tradução portuguesa): “Eu te amo”.        

Tentemos aprofundar um pouco mais sobre quatro palavras/verbos sobre  “amor” em grego que se traduzem simplesmente em uma só palavra em português: amor/amar. 

O verbo ERAO (de onde deriva a palavra “eros” e o adjetivo “erótico”). Erao significa amar mas em sentido sexual. Emprega-se para significar o afeto passional, a atração mútua do homem e da mulher, no seu aspecto espontâneo e instintivo; o amor romântico e físico; alude ao amor-prazer. Mas o eros não é simplesmente a captação no sentido negativo do termo, mas é a fascinação pelo que é grande e pelo que é belo. Eros é um amor de desejo, o desejo de alguém que falta, em direção a alguém que possui. 

Outro verbo é STERGO. Ele indica o amor familiar, o carinho dos pais pelos filhos e o dos filhos pelos pais. Stergo alude ao amor do lar, da família; àquele amor que não se merece porque brota naturalmente dos laços do parentesco. São Paulo usa este termo na sua carta aos romanos (Rm 12,9-10) para dizer que os cristãos devem sentir-se membros de uma só família. 

O terceiro verbo grego é FILÉO/PHILEO: exprime o amor de amizade, o afeto caloroso e terno de dois amigos, um amor de troca, um amor de igual para igual. Espera-se que o outro nos dê como nós lhe damos (do ut des). É um amor de amizade que de algum modo pressupõe uma resposta ou uma retribuição. 

O quarto verbo é AGAPAÓ (deste verbo deriva a palavra “Ágape”): é o amor de caridade, de benevolência, de bem querer; o amor capaz de se dar e de perseverar na dádiva sem nada esperar em troca. É o amor totalmente desinteressado, completamente abnegado, o amor até ao sacrifício (cf. Jo 13,1). Segundo este amor, não importa o que uma pessoa faça ou nos possamos fazer; não importa a forma como nos trate, se nos injuria ou nos ofende. Nós teremos sempre a possibilidade de “amá-la”, que não consiste em “ter por ela algum sentimento”, mas em fazer “alguma coisa por ela”, prestar-lhe um serviço, oferecer-lhe ajuda, mesmo que afetivamente não se sinta. É um amor total. Este amor consiste não na afeição mas na ação. É um amor efetivo e não afetivo.        

Na tríplice pergunta de Jesus e na tríplice confissão de Pedro encontra-se o jogo de palavra. Nas duas primeiras perguntas Jesus pergunta a Pedro se ele O ama com o amor –ágape, o amor total, o amor de entrega e de serviço incondicional, o amor que compromete a vida até o fim sem esperar recompensa: “Símon, agapas me?” (vv.15-16). Nas suas respostas Pedro usa o verbo “phileo” (amor de amizade): “philo se” (vv.15-16). Pedro que dias antes negou Jesus (Jo 18,25-27) e se sabia fraco e imaturo, responde humildemente com o amor de amizade. Ele não se sente capaz do amor supremo de ágape. Jesus, então, que nunca exige nada a ninguém superior às suas possibilidades e que sabe aguardar com paciência o processo de maturação de cada um, pergunta pela terceira vez (a última), mas agora nos termos em que Pedro é capaz de responder: com o amor de amizade: “Símon, phileis me...?” (v.17). Pedro, embora triste, sente-se identificado com a pergunta e responde nos mesmos termos: “philo se” (v.17). E Jesus o aceita. Mas ele prediz-lhe que o seu amor não ficará por aí, que há de crescer, amadurecer e que alcançará ágape, pois um dia chegará a dar a vida pelo Mestre.        

Pela atitude de Jesus no diálogo com Pedro, podemos entender claramente que o amor tem de ser refletido, mas não silenciado; tem de ser proclamado, não apenas pensado; e tem de sair a descoberto e ficar conhecido por todo o mundo, não ficar estacionado no segredo do coração. O amor que Jesus exige de nós é a doação de nós mesmos que é feita de forma refletida e consciente; assumida mesmo sabendo que comporta cruzes, agonias e cálices amargos de todos os tipos.        

Desde o primeiro diálogo, Jesus confia a Pedro uma missão que concerne o conjunto dos fiéis: “Apascenta minhas ovelhas”. O autor se inspira no Discurso do Bom Pastor (Jo 10,1-10), do qual ele retoma não apenas a metáfora, mas também os acentos. As ovelhas confiadas a Pedro não lhe pertencem, são as de Jesus, que diz cada vez: “minhas ovelhas”. Por isso, Santo Agostinho comenta: “Se me amas, não penses que tu és pastor; mas apascenta minhas ovelhas como as minhas, não como as tuas; busca nelas minha glória, não a tua; meu bem, não o teu; meu proveito, não o teu”. É sob o signo do amor a Jesus que é dado a Pedro o encargo de cuidar do conjunto do rebanho.        

Os vv. 18-19 falam do futuro de Pedro. Aqui, de maneira solene, Jesus prediz-lhe o que vai significar concretamente sua aceitação: dará a vida na cruz como Jesus a deu: “...quando, porém, fores velhos, estenderás as mãos, e outro te cingirá e te levará para onde não querias” (v.18). Historicamente é certo que Pedro foi martirizado em Roma sob Nero no ano 64 e, muito provavelmente, crucificado. “Estender as mãos” poderia logo evocar a crucificação, pois na antiguidade tinha o costume de que os que iam ser crucificados levassem aos ombros o travessão da cruz; o cinturão seria a corda atada à cintura, com que eram conduzidos.        

Os que pretendem ser pastores do povo só têm uma alternativa: jamais crer serem donos do povo, pois “as ovelhas” continuam sendo de Jesus e nunca se afastar da prática de vida de Jesus. Por isso, a condição para realizar devidamente a tarefa pastoral é amar o Senhor. Ela deve ser feita igualmente com amor pelas “ovelhas” através de respeito por elas, interesse por suas próprias preocupações e necessidades. De outra forma não revelaremos o Deus que nos ama e que quer ser amado. 

Por isso, a condição para realizar devidamente a tarefa pastoral é amar o Senhor. Ela deve ser feita igualmente com amor pelas “ovelhas” através de respeito por elas, interesse por suas próprias preocupações e necessidades. De outra forma não revelaremos o Deus que nos ama e que quer ser amado. “Seja um compromisso do amor apascentar o rebanho do Senhor, assim como foi um sinal de temor negar o pastor” (Sto. Agostinho). 

Devemos estar conscientes de que para apascentar ou cuidar de suas ovelhas, tão frágeis, Jesus não escolheu nem super-homem nem anjos e sim pastores que também são frágeis. Por isso, nosso pastoreio não saciará a necessidade das ovelhas (povo de Deus) que o Senhor nos confiou, se ele não estiver enraizado no amor pessoal a Jesus Cristo, no amor com que ele nos ama e no amor com que nós o amamos e tem que ser continuamente alimentado e movido por um amor humilde e perseverante, por um amor que serve até a morte. Mas o amor pessoal a Jesus Cristo não é uma meta que pode ser alcançada pela prática do voluntarismo nem uma conquista do esforço pessoal. O amor a Jesus Cristo só pode nascer e ser cultivado como resposta ao amor daquele que “nos amou primeiro”.         

As perguntas de Jesus dirigidas a Pedro, são as mais essenciais e as mais existenciais de todas as perguntas, pois tocam a essência do cristianismo: amor. Diante de Deus somente conta o amor vivido ao longo da vida, seja ela longa ou curta. O amor é a única realidade consistente, a única realidade que permanece para sempre e dá consistência a tudo o mais.

          

Por isso, as perguntas feitas a Pedro são dirigidas a toda a Igreja, a todos os cristãos, e portanto também a mim. “Quando é lida esta leitura, cada cristão sofre o interrogatório no coração”, dizia Santo Agostinho ao comentar este texto. Não podemos esquecer que aquele que nos pergunta é o Senhor ressuscitado, aquele que nos amou até a morte. Nossa resposta deve ser humilde; uma resposta que remete à confiança no Senhor, que conhece o nosso coração, conhece a verdade do nosso amor. É melhor respondermos, como Pedro respondeu: “Senhor, tu que sabes tudo, sabes que sou teu amigo”.

P. Vitus Gustama,SVD

V Domingo Da Páscoa, 28/04/2024

PERMANECER EM CRISTO PARA PRODUZIR BONS FRUTO, POIS ELE É A VERDADEIRA VIDEIRA V DOMINGO DA PÁSCOA ANO “B” Primeira Leitura: At 9,26-31...