sábado, 31 de dezembro de 2022

Domingo Da Epifania,08/01/2023

EPIFANIA DO SENHOR

Primeira Leitura: Is 60,1-6

1Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor. 2Eis que está a terra envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem os povos; mas sobre ti apareceu o Senhor, e sua glória já se manifesta sobre ti. 3Os povos caminham à tua luz e os reis ao clarão de tua aurora. 4Levanta os olhos ao redor e vê: todos se reuniram e vieram a ti; teus filhos vêm chegando de longe com tuas filhas, carregadas nos braços. 5Ao vê-los, ficarás radiante, com o coração vibrando e batendo forte, pois com eles virão as riquezas de além-mar e mostrarão o poderio de suas nações; 6será uma inundação de camelos e dromedários de Madiã e Efa a te cobrir; virão todos os de Sabá, trazendo ouro e incenso e proclamando a glória do Senhor.

Segunda Leitura: Ef 3,2-3ª

Irmãos: 2Se ao menos soubésseis da graça que Deus me concedeu para realizar o seu plano a vosso respeito, 3ae como, por revelação, tive conhecimento do mistério. 5Este mistério, Deus não o fez conhecer aos homens das gerações passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: 6os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho.

Evangelho: Mt 2,1-12

1 Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na Judeia, no tempo do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém, 2 perguntando: “Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo”. 3 Ao saber disso, o rei Herodes ficou perturbado, assim como toda a cidade de Jerusalém. 4 Reunindo todos os sumos sacerdotes e os mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias deveria nascer. 5 Eles responderam: “Em Belém, na Judeia, pois assim foi escrito pelo profeta: 6 ‘E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá um chefe que vai ser o pastor de Israel, o meu povo’”. 7 Então Herodes chamou em segredo os magos e procurou saber deles cuidadosamente quando a estrela tinha aparecido. 8 Depois os enviou a Belém, dizendo: “Ide e procurai obter informações exatas sobre o menino. E, quando o encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-lo”. 9 Depois que ouviram o rei, eles partiram. E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino. 10 Ao verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande. 11 Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele, e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. 12 Avisados em sonho para não voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho.

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Epifania- Natal : Buscar Onde Nasce o Rei

Neste Domingo celebramos a festa de Epifania. O Natal e a Epifania são festa complementares e mutuamente enriquecedoras. Ambas celebram, de perspectivas diferentes, o mistério da Encarnação, a vinda e a manifestação de Cristo ao mundo. O Natal enfatiza a vinda. A Epifania enfatiza a manifestação. A Epifania é a solenidade da manifestação do Messias, o Deus feito homem, aos povos pagãos, significados nos personagens vindos do Oriente. Importa muito não desligar a Epifania do Natal. O mistério, no fundo, é o mesmo, varia a perspectiva da amplitude e da universalidade da manifestação. Epifania é manifestação do Deus-Conosco aos povos pagãos. 

Epifania aprofunda e estende o mistério celebrado no Natal. Este mistério se explica no prefácio: “Quando Cristo se manifestou em nossa carne mortal, vós nos recriastes na luz eterna de sua divindade”. Aqui reside a profundidade do mistério: Cristo Jesus é o Deus que assume toda a realidade do homem, exceto o pecado. Assim, ele nos enriquece com a glória de sua realidade divina. É a “admirável intercâmbio” daquilo que São Leão Magno fala: Damos a Ele nossa pobreza (humanidade) e Ele nos comunica sua riqueza (divindade). 

Mas a Epifania estende este mistério a todos os povos. São Paulo na Segunda Leitura (Ef 3,2-3ª): “Este mistério, Deus não o fez conhecer aos homens das gerações passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho”. Este é o núcleo da celebração de Epifania. 

A antífona de entrada da missa, que abre a celebração nos introduz no clima do mistério da Epifania. A antífona da entrada é um texto composto, inspirado livremente em Malaquias (Mal 3,1) e em 1Crônicos 19,11-12. A antífona de entrada canta poeticamente a grandeza e a solenidade do mistério: “Chegou o Senhor nosso Rei: em suas mãos está o reino, o poder e a glória”. Esse Senhor é o Menino pobre que nasceu em Belém. Deus nos revela que este Menino é o Filho unigênito do Pai. Jesus nascido em Belém é a Luz de todos os povos, como enfatiza a Primeira Leitura (Is 60,1-6). Por isso, os povos caminhão para esta Luz representados pelos magos. Epifania é, portanto, uma solenidade evangelizadora e missionária.

 A própria palavra, do grego “Epiphaneia” (”manifestação”) ressalta o significado original da festa. No uso secular a palavra Epifania podia referir-se a chegada. A chegada de um rei era registrada como Epifania. A vinda de Cristo para este mundo, segundo são Paulo é uma Epifania (Cf. 2Tm 1,9-10). No uso religioso, a palavra Epifania denotava toda e qualquer manifestação de poder divino em favor do homem. Dentro do contexto do Natal, através da Encarnação, Deus manifestou o seu poder benevolente e misericordioso para nós homens. Deu, na sua Encarnação, vem para nos amar e perdoar. 

Em outras palavras, Natal e Epifania são festas complementares que se enriquecem mutuamente ou festas irmãs. Ambas celebram, de diferentes perspectivas, o mistério da encarnação, a vinda e a manifestação de Cristo ao mundo. Natal acentua mais a vinda (embora o próprio Natal seja uma manifestação do amor de Deus pela humanidade), enquanto que epifania enfatiza a manifestação. 

Uma das questões levantadas no texto do Evangelho deste dia é esta: “Onde está o recém-nascido, rei dos judeus?”. A primeira palavra que Deus disse a Adão foi: “Onde estás tu?” (Gn 3,9) para que também ele lhe perguntasse, por sua vez, “Onde estás Tu, meu Deus?”, e assim os dois pudessem se encontrar. O onde do homem é Deus, e o onde do Deus conosco é o ser humano. 

José, esposo de Maria, com a ajuda da palavra do Anjo, sabe onde está o Messias: o próprio José reconhece e acolhe o dom. Por sua vez, os pagãos representados pelos Magos devem trilhar um caminho, guiados pela estrela para chegar a Jerusalém onde nasceu o Senhor. Em José vemos a fé dos israelitas; nos Magos, vemos aquele caminho dos pagãos e de todos nós. 

O Salvador está antecipadamente presente na Estrela, que prefigura a sabedoria, princípio de toda a procura. O caminho se conclui na descoberta do lugar onde nasceu o rei, e o rei nasce onde se realiza esse caminho.

Os Magos são verdadeiramente nossos pais e nossos mestres na fé. O caminho dos Magos em busca de um Salvador é uma história de fé. 

Somos peregrinos nesta terra. Mas para onde caminhamos? Saibamo-lo ou não, caminhamos para Deus. Consciente ou inconscientemente, no fundo todos procuram Deus. O destino do homem é, certamente, a união plena com Deus. E na espera desse destino, o homem vive sobre a Terra com fé. A fé é ter confiança em Deus apesar das próprias dúvidas, perguntas e interrogações, queixas e murmurações; é ter a coragem de agir apesar dos próprios medos; é esperar no amanhã apesar do sofrimento e dificuldades de hoje. Porque Deus veio antes ao nosso encontro e semeou no nosso coração a fome e a sede da justiça e da paz, da felicidade e da comunhão, enfim, da salvação que só podemos encontrar nele. 

Para chegar ao encontro de Deus é necessário pôr-se a caminho e atravessar, como os magos, desertos escaldantes e noites escuras, desinstalar-se e romper com o convencional, vencer novos obstáculos e refutar argumentos velhos e novos. Quem quer encontrar a Deus, não pode ficar preso ao passado. Precisa partir sempre de novo, com o coração cada vez mais leve e livre, porque na nossa vida costumam acontecer fatos carregados de sentido, que exigem a nossa atenção e o nosso êxodo. Mas se a pessoa não se põe a investigar e a tentar perceber o que Deus lhe quer dizer, com certeza vive mais tranquilo, não se interroga, não levanta problemas. Consequentemente, não avança, move-se num horizonte estreito, mesquinho, sem dimensões, e priva-se do que as suas capacidades lhe proporcionam para progredir. E Deus, quando queremos encontrá-lo de verdade, vem em nossa ajuda, indica-nos o caminho, às vezes, através de meios menos aptos. Mas, com certeza, Deus não se encontra na soberba que nos separa dele, nem na falta de caridade que nos isola.          

Os magos iniciaram uma longa caminhada, desejando encontrar Deus guiando apenas pela estrela. Na vida, é preciso seguir uma estrela. Um ideal. Um modelo de santidade. Essa é a estrela que brilha para nós no azul do nosso céu. E tem que se seguir, apesar de todos os sacrifícios. Jesus, no fim, está à nossa espera.

Destaquemos alguns ensinamentos dos Magos:

Primeiro, a capacidade para ver a estrela, abertos para a chamada de Deus, vigilantes, homens de oração. Eles sabem distinguir os sinais dos tempos. Não são homens distraídos nem sonolentos nem fechados. Eles escutam a voz do céu e a voz de seu próprio coração. Eles escutam seu Eu profundo. Somente aquele que está aberto a Deus tem capacidade de captar os sinais de Deus na vida.

Segundo, sua disponibilidade para deixar tudo e pôr-se em caminho. Os Magos não são homens instalados nem apegados a coisas e lugares, porque vivem de esperança. Eles fazem parte daqueles que buscam a terra prometida. São homens livres de toda atadura e livres para toda aventura, famintos de luz e de Deus. Somente quem é livre de tudo pode libertar os outros. Quem vive instalado e isolado não pode ver a novidade da caminhada e as novidades da vida. 

Terceiro, sua constância no seguimento da estrela. Não lhes faltaram dúvidas e provações no caminho. Às vezes a estrela desapareceu e sentiram a tentação de voltar ao conhecido, como os hebreus no deserto que queriam voltar para a escravidão no Egito. Os Magos passaram pela experiência da escuridão na vida, quando não se vê nada nem se entende nada. Mas na sua dúvida os Magos não têm vergonha de perguntar a quem sabe melhor como se deve viver a vida de melhor maneira. Assim pode acontecer também na nossa vida. Às vezes perdemos o guia de nossa vida ou alguma referência para nossa caminhada. Os Magos nos ensinaram a ter humildade em pedir socorro aos que tem mais conhecimento e experiência na vida para que possamos continuar com nossa missão neste mundo. 

Quarto, sua responsabilidade na busca. A fé é dom de Deus, mas exige nossa colaboração continuada. A fé não está renhida com a reflexão, o diálogo e a oração. Até dos incrédulos se pode receber alguma luz.

Quinto, a generosidade dos Magos na oferta ou na oferenda. Eles compreenderam a necessidade de compartilhar. Escolheram presentes significativos, porque esperavam encontrar um Rei dos reis. 

Sexto, sua capacidade da leitura dos fatos. Quando a estrela pára diante da casa pobre, onde se encontra o Menino Jesus, os Magos não se escandalizam. Ao contrário, eles O reconheceram como Messias. A maioria do povo eleito não tinha capacidade de fazer este tipo de leitura. Deus é sempre surpreendente: se veste de simplicidade e somente se manifesta aos humildes e aos pequenos. 

Sétimo, diante do Messias os Magos se ajoelharam e O adoraram. Não basta ver. A fé é entrega e amor. Eles, mais que o ouro, o incenso e a mirra, ofereceram seu coração. Creram e adoraram: esse é o melhor perfume. Adoraram: essa será nossa definitiva vocação. 

Oitavo, a capacidade de mudança dos magos. Eles foram capazes de voltar por outro caminho, pois foram avisados por Deus para fazer isso. É coisa segura que Deus muda sempre nossos planos. Crer é viver confiados na insegurança, é estar dispostos a iniciar sempre um novo caminho, é ter capacidade de renovação constante. No final, essa capacidade de renovação produz sempre uma imensa alegria. 

Por fim, a transformação na vida dos Magos. Na viagem de volta já não necessitavam mais de estrela porque eles levavam a estrela dentro de seu coração. Era tal a luz e a alegria que receberam, que eles mesmos se converteram em estrelas. Voltaram com o rosto resplandecente, como Moisés depois que falou com Deus, como Jesus que foi transfigurado no monte Tabor. Por isso, os Magos se tornaram missionários de alegria e de amor. Desde então, as estrelas já não se encontraram no céu e sim entre nós, entre todos aqueles que de uma ou de outra maneira se encontraram profundamente com Deus. Quem contempla Deus profundamente se torna reflexo de Deus para os demais.        

Cada um tem sua luz própria. Por isso, não precisa nem deve apagar a luz dos outros. Juntar duas ou mais estrelas só resulta na claridade maior. Por isso, tem toda a razão aquilo que o ditado popular diz: “Para que a sua estrela brilhe, não é preciso apagar a minha”. Cada um tem sua luz dentro de si e é preciso que brilhe para iluminar a vida dos outros. Isto se chama amor na unidade, amor fraterno. Se realmente somos crentes, não podemos continuar dissimulando nossa fé.  

Estendamos um pouco mais nossa meditação sobre outros pontos da festa da Epifania!   

1. A Epifania Do Senhor Na Nossa Vida        

O termoepifania” vem do grego “epiphaneia” (manifestação). No grego clássico este termo podia expressar duas ideias: uma, secular e outra, religiosa.          

No uso secular, epifania podia referir-se a uma chegada. Por ex., quando um rei visitava uma cidade com uma entrada solene, esse acontecimento se considerava como epifania. São Paulo utiliza este termo para falar da vinda de Cristo. Para São Paulo, a vinda de Cristo ao mundo é uma epifania: “Essa graça, que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos, foi manifestada agora pela aparição (epiphaneia) de nosso Salvador, o Cristo Jesus” (2Tm 1,10). Com o uso neotestamentário do termo epifania entendemos facilmente que o nascimento de Jesus se entende também como epifania, porque celebram-se a vinda, a chegada e a presença da Palavra encarnada entre nós.       

No uso religioso, o termo epifania se usa para denotar alguma manifestação do poder divino em benefício dos homens. Dentro do uso religioso do termo estamos próximos do uso litúrgico da epifania, pois através da encarnação de Jesus, o Verbo divino, Deus manifesta seu poder benevolente para os homens. Por isso, a vinda de Cristo à terra é uma epifania em si mesma. Dentro do significado do termo, na verdade, a epifania não se limita na celebração da vinda histórica de nosso Senhor, Jesus Cristo, ao mundo, mas também dos diversossinaispelos quais durante sua vida, ele revela seu poder e sua glória.        

A partir do significado do termo, a epifania é uma festa de cada dia porque nãomomento nem acontecimento que não tragam uma revelação do Senhor. Para poder captar a manifestação divina em cada momento e acontecimento necessitamos ser pobres no espírito e estar abertos à novidade. Não podemos ter medo da novidade de Deus que se manifesta diariamente. Os ricos, Herodes, os sumos sacerdotes, os escribas e os fariseus temem a novidade e criam a guerra. A novidade é sempre uma ameaça para quem tem algo a perder. Para defender-se da novidade eles se refugiam nos costumes humanos. A epifania, que é a revelação de Deus que engloba tudo, nos abre para horizontes infinitos, fonte permanente da novidade e da surpresa de Deus. Uma grande novidade que aprendemos da encarnação de Deus em Jesus Cristo é o reconhecimento de Deus em cada homem para respeitar sua dignidade, porque Deus se fez homem. Santo Tomás de Aquino ao comentar o Pai-Nosso disse: “Devemos amar nossos semelhantes porque são nossos irmãos, pelo fato de serem filhos de Deus (leia 1Jo 4,20). Devemos reverenciá-los, tratando-os como filhos de Deus (leia Ml 2,10)” [In Orationem Dominicam: Pater Noster, Expositio]. 

2. Os Magos e a Universalidade Do Amor De Deus        

Os grandes Padres latinos como Santo Agostinho, São Leão, São Gregório e outros, nas suas reflexões sobre Mt 2,1-12 chegaram à mesma conclusão de que os Sábios do oriente (os magos) representavam as nações do mundo. Eles simbolizavam a vocação de todos os homens à única Igreja de Cristo.        

Com esta interpretação, a festa de epifania toma um caráter mais universal. Deus deixa de se manifestar somente a um povo privilegiado, a uma raça humana para se dar conhecer a todos, sem exceção. A boa nova da salvação é oferecida a todos os homens. Com a vinda de Deus feito carne, a humanidade forma uma família porque o amor de Deus abraça a todos. Isto significa que Deus jamais abandona seus fiéis. Este amor imenso de Deus por nós deve aquecer o nosso coração e animar nossa vida para levarmos adiante os nossos compromissos como filhos e filhas de Deus. São Paulo fala (na segunda leitura) com muita admiração sobre a grandiosidade deste mistério, que estava oculto nas gerações passadas, mas se revela agora através do Espírito, queos pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho” (Ef 3,6). Da mesma forma São Pedro recordava aos pagãos convertidos: “Vós que outrora não éreis povo, mas agora sois o Povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas agora alcançastes misericórdia” (1Pd 2,10). Todos podem alcançar a misericórdia de Deus desde que tenham a vontade de alcançá-la, vivendo os ensinamentos de Cristo. E todos os que aceitarem Cristo e seus ensinamentos serão herdeiros das promessas de Cristo. Consequentemente todos devem ser servidores desta graça para todos que ainda não têm consciência da grandiosidade do amor de Deus que liberta e salva. 

3. Os Magos e A Busca De Deus      

Os magos puseram-se a caminho e deixaram sua terra em busca do Rei recém-nascido. Guiados pela estrela e com uma grande esperança no coração, os magos puseram-se a caminho. São João Crisóstomo comentou: “Não se puseram a caminho porque viram a estrela, mas viram a estrela porque se tinham posto a caminho”. Põem-se a caminho porque têm perguntas e inquietações no coração. Os magos são o símbolo dos que buscam Deus, como diz Santo Agostinho: “Anunciam e perguntam, creem e buscam; simbolizando aqueles que caminham na fé e desejam a realidade”.          

Somos peregrinos nesta terra. Mas para onde caminhamos? Consciente ou inconscientemente, no fundo todos procuram Deus. “A busca de Deus é a busca da felicidade. O encontro com Deus é a própria felicidade, pois Deus é o bem perfeito, o sumo bem” (Santo Agostinho). O destino do homem é, certamente, a união plena com Deus. E na espera desse destino, o homem vive sobre a Terra com fé. A fé é ter confiança em Deus apesar das próprias dúvidas, perguntas e interrogações, queixas e murmurações; a fé é ter a coragem de agir apesar dos próprios medos; é esperar no amanhã apesar dos sofrimentos e dificuldades de hoje, porque Deus é fiel às suas promessas.  Deus veio antes ao nosso encontro e semeou no nosso coração a fome e a sede da justiça e da paz, da felicidade e da comunhão, enfim, da salvação que só podemos encontrar nele.    

Para chegar ao encontro de Deus é necessário pôr-se a caminho e encarar os desafios e vencer novos obstáculos e refutar argumentos velhos e novos a fim de chegar à meta desejada, isto é, encontrar o sentido da vida na união plena com Deus. Quem quer encontrar Deus, não pode ficar preso ao passado. Precisa partir sempre de novo, com o coração cada vez mais leve e livre, porque na nossa vida costumam acontecer fatos carregados de sentido, que exigem a nossa atenção e o nosso êxodo. Mas se a pessoa não se põe a investigar e a tentar perceber o que Deus lhe quer dizer, com certeza vive mais tranquilo, não se interroga, não levanta problemas. Consequentemente, não avança, move-se num horizonte estreito, mesquinho, sem dimensões, e priva-se do que as suas capacidades lhe proporcionam para progredir. E Deus, quando queremos encontrá-lo de verdade, vem em nossa ajuda, indica-nos o caminho, às vezes, através de meios menos aptos. Mas, com certeza, Deus não se encontra na soberba que nos separa dele, nem na falta de caridade que nos isola.          

Os magos iniciaram uma longa caminhada, desejando encontrar Deus guiando apenas pela estrela. Na vida, é preciso seguir uma estrela, um ideal, um modelo de santidade.  E tem que se seguir, apesar de todos os sacrifícios. Jesus, no fim, está à nossa espera. 

4. Os Magos e A Estrela          

Vimos sua estrela no Oriente”, dizem os magos. A estrela é um elemento indispensável na narração de Mateus. Mas o que a estrela representa?        

A estrela é a metáfora do rei messias, como pode-se ler em Nm 24,17: “Surgirá uma estrela de Jacó e surgirá um cetro de Israel”. Em Mt, porém, a estrela não é apenas uma metáfora ou imagem do Messias, porque ela guia os magos. Pela sua função de guia, ela é sinal de Deus. A estrela é a Providência divina que guia o homem no caminho de sua realização como homem e filho de Deus. A estrela também é símbolo da fé. A fé é a estrela que nos guia. A fé é a luz pela qual conhecemos Deus. A fé é um dom de Deus, é uma iluminação para nossa vida. Não se pode chegar à luz da verdade revelada através do recurso exclusivo da razão humana. Deus é quem revela; é Ele “mesmo quem reluziu em nossos corações, para fazer brilhar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo” (2Cor 4,6). Mediante a fé conhecemos realmente Deus, ainda que este conhecimento seja escuro. É um conhecimento que nos une a Deus e leva consigo a “garantia” e a substância das coisas esperadas: “A fé é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11,1).        

A fé nos situa na nossa rota e nos mostra o caminho que temos que percorrer. De vez em quando perdemos nossa direção. Mas isto não quer dizer que estejamos perdidos. Esta obscuridade é momentânea e serve de prova para nossa fé. Temos que aprender dos magos. Eles não ficaram desanimados quando perderam a estrela. Ao contrário, eles pediram conselhos aos homens capazes de dizer-lhes onde nasceria Cristo. Nós também podemos pedir conselhos de quem tem mais fé do que nós ou nós mesmos podemos dar conselhos aos outros caso tenhamos fé profunda. A luz da fé é algo que pode e deve ser compartido, especialmente através do testemunho de nossa vida, pois o testemunho de uma vida correta, de uma fé viva é muito mais eficaz do que qualquer discurso bonito.        

Se a epifania é uma festa de cada dia porque não há momento nem acontecimento que não tragam uma revelação do Senhor, será que, algumas vezes, você parou para procurar perceber nos sinais de cada dia a vontade ou algum recado de Deus para você?

P. Vitus Gustama,SVD

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

07/01/2023-Tempo De Natal

SER VINHO NOVO PARA A CONVIVÊNCIA A EXEMPLO DE JESUS

07 de Janeiro

Primeira Leitura: 1Jo 5,14-21

Caríssimos, 14esta é a confiança que temos em Deus: se lhe pedimos alguma coisa de acordo com a sua vontade, ele nos ouve. 15E se sabemos que ele nos ouve em tudo o que lhe pedimos, sabemos que possuímos o que havíamos pedido.16Se alguém vê seu irmão cometer um pecado que não conduz à morte, que ele reze, e Deus lhe dará a vida; isto, se, de fato, o pecado cometido não conduz à morte. Existe um pecado que conduz à morte, mas não é a respeito deste que eu digo que se deve rezar. 17Toda iniquidade é pecado, mas existe pecado que não conduz à morte. 18Sabemos que todo aquele que nasceu de Deus não peca. Aquele que é gerado por Deus o guarda, e o Maligno não o pode atingir. 19Nós sabemos que somos de Deus, ao passo que o mundo inteiro está sob o poder do Maligno. 20Nós sabemos que veio o Filho de Deus e nos deu inteligência para conhecermos aquele que é o Verdadeiro. E nós estamos com o verdadeiro, no seu Filho Jesus Cristo. Este é o Deus verdadeiro e a Vida eterna. 21Filhinhos, guardai-vos dos ídolos. 

Evangelho: Jo 2,1-11

Naquele tempo, 1houve um casamento em Caná da Galileia. A mãe de Jesus estava presente. 2Também Jesus e seus discípulos tinham sido convidados para o casamento. 3Como o vinho veio a faltar, a mãe de Jesus lhe disse: “Eles não têm mais vinho”. 4Jesus respondeu-lhe: “Mulher, por que dizes isto a mim? Minha hora ainda não chegou”. 5Sua mãe disse aos que estavam servindo: “Fazei o que ele vos disser”. 6Estavam seis talhas de pedra colocadas aí para a purificação que os judeus costumam fazer. Em cada uma delas cabiam mais ou menos cem litros. 7Jesus disse aos que estavam servindo: “Enchei as talhas de água”. Encheram-nas até a boca. 8Jesus disse: “Agora tirai e levai ao mestre-sala”. E eles levaram. 9O mestre-sala experimentou a água, que se tinha transformado em vinho. Ele não sabia de onde vinha, mas os que estavam servindo sabiam, pois eram eles que tinham tirado a água. 10O mestre-sala chamou então o noivo e lhe disse: “Todo mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho bom até agora!”11Este foi o início dos sinais de Jesus. Ele o realizou em Caná da Galileia e manifestou a sua glória, e seus discípulos creram nele.

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Oração, Comunhão Com Deus e Pecado 

A seção conclusiva da Primeira Carta de são João, que serve como a Primeira Leitura deste dia, volta a falar de dois temas já tratados em outra parte de sua Carta: o tema sobre a confiança na oração (1Jo 5,14-15) e o tema sobre a condição do crente: a impecabilidade (1Jo 5,18-21).

Segundo são João, a oração é como o sinal de nossa “comunhão” com Deus. É o testemunho de que estamos em “unidade” com Deus, de que “vivemos em conformidade com a vontade de Deus”. Este é o convite de Jesus no Pai Nosso: “Seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu” (Mt 6,10b). 

No seguimento de Jesus a oração sustenta a caminhada cristã. Por isso, empobrecer a oração significa empobrecer toda a teologia, toda liturgia e toda espiritualidade. Na medida em que o cristão reza, sua vida se transforma de acordo com a vontade de Deus, pois rezar significa estar em sintonia com Deus e Sua vontade. Podemos dizer que a oração nos faz familiares de Deus. Dentro de uma família um conhece bem o outro membro por causa de uma convivência permanente. 

Segundo são João, o cristão não basta rezar pelas próprias necessidades. O cristão deve aprender a sair de si para olhar para as necessidades alheias, especialmente para os pecadores: “Se alguém vê seu irmão cometer um pecado que não conduz à morte, que ele reze, e Deus lhe dará a vida; isto, se, de fato, o pecado cometido não conduz à morte”. 

A vida de união com Deus não nos tapa os olhos nem ouvidos, muito menos o coração. Pelo contrário, deve nos fazer ficar mais atentos a certas coisas da vida em seu conjunto. Adotar o ponto de vista de Deus significa estar lúcido para ver o "mal"; detectar onde há egoísmo, onde há falta de amor; sentir pena no fundo de si mesmo por tudo o que se opõe a Deus. O exercício espiritual chamado "revisão de vida" envolve essa busca em um acontecimento, em um fato da vida, para descobrir o pecado que está escondido, os contravalores, misturados ali... é uma tentação sempre ressurgente - mas contemplar a obra salvadora de Deus e orar para que a salvação de Deus progrida. Onde há pecado, também há abundânia da graça de Deus (cf. Rm 5,20-21). Temos experiência de que muitos de nossos pecados, ao invés de nos afastar de Deus, nos conduzem a Ele, desde que sejamos leais e lúcidos convertidos.

Para o cristão, o pecado desperta a oração e não a condena. Adotar o ponto de vista de Deus é tornar-se salvador com Ele. Jesus nos repetiu que "Deus ama os pecadores", que é essencialmente bom, que "faz o sol brilhar sobre bons e maus" (Mt 5,44-45). Sabemos que Jesus veio "não para os que têm saúde, mas para os que precisam de médico". 

Por isso, o segundo tema é o do pecado. Para o autor da Carta, o homem que vive com Deus, que o autor usa a expressão “nascido de Deus” (1Jo 5,18), não conhece o pecado (Cf. 1Jo 3,6-9). Mas isto não quer dizer que o seguidor de Cristo vive, automaticamente, em um estado de impecabilidade. O homem em si é uma possibilidade para cada momento: possibilidade para o bem ou para o mal, dependendo da decisão tomada por ele. Para o autor da Carta, considerar-se sem pecado é uma mentira e um desmentido feito a Deus (1Jo 2,8-10; 5,16). Mas o autor enfatiza que aquele que vive em comunhão com Deus recebe auxílio eficaz do Filho que o separa do mundo e do maligno 

No texto há também afirmações que fazem referência ao “pecado que leva à morte” e que se contrapõe ao “pecado que não leva à morte”. Não se trata de o pecado venial e de o pecado mortal. 

Dentro do pensamento joanino, o pecado que verdadeiramente leva à morte é pecado de homicídio: “Quem odeia seu irmão é assassino. E sabeis que a vida eterna não permanece em nenhum assassino” (1Jo 3,15). Quem odeia “permanece na morte”, não “passa da morte para a vida”. Da mesma forma que o amor leva à vida, o ódio leva à morte (cf. 1Jo 3,11-12.14-15). Para o homem da Bíblia, pecado e morte estão sempre juntos ou unidos (os primeiros capítulos do Genesis nos recordam, entre outras coisas, a união entre pecado e morte). A morte que está ligada ao pecado é a morte espiritual. A morte espiritual é a separação de Deus ou da comunhão com Deus. Portanto, da salvação. 

O mal não tem rosto porque ele pode tomar o ser de qualquer um de nós. Ninguém está isento da possibilidade do mal. O mal é tudo que serve à morte; tudo que sufoca a vida, estreita-a, e corta-a em pedaços. Por isso, a realidade do mal exige vigilância. 

As principais ameaças à nossa sobrevivência já não vêm da natureza externa e sim de nossa natureza humana interna. São nossas hostilidades, nosso descaso, o egoísmo, o orgulho/a arrogância, prepotência e a ignorância deliberada que põem o mundo em perigo. Se não conseguirmos domar e transmutar o potencial da alma humana para o mal, nós estaremos perdidos e faremos perdida até nossa própria família. 

Dentro do pensamento de são João surge a seguinte pergunta: Será que temos plena consciência da grave consciência do ódio que é a separação de Deus que significa a exclusão da salvação? Ainda somos teimosos em permanecer no ódio? Não nos pede o Senhor para que haja sempre o espaço para o perdão sem limite: setenta vezes sete? (cf. Mt 18,21-22). Ser verdadeiro cristão é difícil, de fato!

Quem odeia seu irmão é assassino. E sabeis que a vida eterna não permanece em nenhum assassino”. O pecado é um dos acontecimentos diários que todos nós temos em comum, algo com que todos nós podemos nos identificar. É uma batalha para vencer ou perder.

Precisamos sondar mais profundamente e com maior senso de comunidade quem somos como espécie: nossas forças e nossas fraquezas, nosso poder e o mau uso que fazemos dele, nossas riquezas e o mau uso que fazemos delas. Devemos prestar atenção também à nossa capacidade de destruição e de ódio por nós mesmos, ao nosso ressentimento e avareza, à nossa inveja e indiferença, à nossa arrogância e maldade; em suma, aos nossos pecados. Eles são capazes de criar o inferno para nossa convivência, isto é, uma total ausência do amor e por isso, uma total ausência de Deus, pois “Deus é Amor” (1Jo 4,8.16).

Mas, acima de tudo, devemos estar conscientes de que a graça de Deus não somente está na origem, mas também está no caminho e no instante final de nossa vida. Esta graça continua a ser oferecida para nós em Jesus Cristo depois de nossa queda em pecado. O bom ladrão, no último minuto de sua vida, se arrependeu e pediu a Jesus crucificado ao seu lado: “Jesus, lembra-te de mim quando entrares no Teu Reino”. Jesus, prontamente, perdoou o criminoso dizendo: “Hoje mesmo tu estarás comigo no paraíso” (Lc 23,42-43). Isso nos mostra que a graça de Deus é maior do qualquer pecado, pois “Onde se multiplica o pecado, a graça transbordou” (Rm 5,20). Não há pecado, por maior ou grave que seja, que não possa ser perdoado por Deus desde que o home se converta.

Jesus Cristo É a Fonte de Nossa Alegria 

A transformação da água em vinho é o primeiro sinal operado por Jesus no evangelho de João. O evangelista João jamais emprega a palavra “milagre” (dýnamis, grego, como ato de poder e de força) que aparece com muita freqüência nos sinóticos. Em vez disso, ele usa o termo “sinal” (seméion, grego). Este termo pertence ao vocabulário técnico do quarto evangelho, onde aparece 17 vezes, sobretudo na primeira metade. Em João, “sinal” é ação/obra realizada por Jesus que, sendo visível, leva por si ao conhecimento de realidade superior. O “sinal” remete a outra coisa. Os “sinais joaninos”, porém, não somente apontam para uma realidade que está além da coisa ou acontecimento visível, mas contém já em si mesmos a realidade significada. Eles são, de certo modo, uma manifestação da “glória” de Jesus. Enquanto o milagre, pelo poder surpreendente que ele força a constatar, tem por função orientar em direção à pessoa e à dignidade do seu autor. O “sinal” visa a outra realidade além de si mesmo. Este termo joanino inclui sempre dois aspectos: demonstrativo, o sinal suscita a fé dos discípulos em Jesus; expressivo, ele manifesta a glória daquele que o opera. Encontram-se no Evangelho de João sete sinais de Jesus (2,1-11: bodas de Caná; 4,46-54: a cura do filho do funcionário real; 5,1-9: a cura do paralítico; 6,1-15: a partilha dos pães; 6,16-21: Jesus caminha sobre as águas; 9,1-41: a cura do cego de nascença; 11,1-44: a reanimação de Lázaro). Por isso, a primeira parte do Evangelho de João (1,19-12,50) chama-se o livro dos sinais. Enquanto a segunda parte (13,1-20,29) chama-se o Grande Sinal que fala da paixão, morte e ressurreição de Jesus.          

O objetivo principal de todos os sinais relatados no Quarto Evangelho é a fé, como João deixa claro no final: os sinais feitos por Jesus foram escritos “para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida eterna em seu nome” (Jo 20,31). Isto quer nos dizer que diante dos sinais operados por Jesus é necessário tomar uma decisão (Jo 7,31;9,16;11,47). Sem tomar uma decisão positiva (crer em Jesus), os sinais se tornarão juízo de acusação contra os que se mostram incrédulos (cf. Jo 12,37ss).                     

O episódio de Caná, isto é, o primeiro sinal de Jesus, acontece num casamento/bodas. Na linguagem bíblica/teológico-simbólica, o casamento/bodas é símbolo da aliança com Deus, sublinhando a relação de amor e fidelidade entre Deus e o povo (Is 49,14-26;54,48;62,4-5;Jr 2;Ez 16). A eleição do povo e a aliança foram expressão do amor de Deus por ele (Dt 4,37;7,7s;10,15).  Os profetas usaram muitas vezes a imagem de casamento para falar do amor mútuo entre Deus e Israel (Is 62,4-5;Os 2,18-22). Portanto, o casamento em Caná é simbólico. O verdadeiro esposo da humanidade é Jesus (3,29), pois foi assim que João Batista o anunciou (cf. 1,15.27.30). E toda a Igreja é uma esposa.                    

A mãe de Jesus estava nas bodas de Cana. No evangelho de João a mãe de Jesus (Maria) aparece somente duas vezes, mas nos momentos mais importantes. Maria, em primeiro lugar, atua na realização do primeiro sinal de Jesus, no momento em que Jesus inaugura sua missão pública (Jo 2,1-11). Em segundo lugar, Maria permanece ao pé da cruz, no momento da morte de Jesus, no final de sua missão nesse mundo (cf. Jo 19,25-27). O evangelista João quer nos dizer que Maria tem um lugar especial no seu evangelho, pois ela se faz presente nos momentos mais importantes da vida e da missão de Jesus. Tudo que se prefigura no primeiro sinal se cumpre na cena da mãe de Jesus ao lado da cruz.          

Nas núpcias de Caná “estava ali a mãe de Jesus”. Para o evangelista João, a figura da mãe de Jesus também é central, pois a partir dela é que a atenção se projetará sobre Jesus. A manifestação da glória de Cristo passa através da mãe.          

Na festa de casamento em Caná, ou seja, na antiga aliança faltou vinho. O vinho, na Bíblia, simboliza/representa o amor (cf. Ct 1,2;7,10;8,2). A antiga aliança, portanto, não tem mais sentido, pois o amor foi substituído pela Lei. Os seis enormes potes de pedra que serviam para os ritos de purificação dos judeus (v.6), representam a falta de amor na relação com Deus e com o próximo. Além disso, estão vazios, ou seja, não têm mais nada a dar.          

A mãe de Jesus reconhece isso, pois em vez de se dirigir ao organizador da festa, vai diretamente a Jesus e lhe diz: “Eles não têm mais vinho” (v.3). A expressão é semelhante à usada pelos apóstolos antes do milagre da multiplicação dos pães: “Eles não têm mais nada para comer” (cf. Mc 8,2;Mt 15,32). Maria vê o conjunto, ou seja ela tem a visão do conjunto e compreende aquilo que é essencial. Este é o espírito contemplativo de Maria, o seu dom de síntese, a capacidade de dar atenção às coisas particulares. Maria consegue ver o ponto central com a inteligência do coração e não através do raciocínio ou da análise imediata de todos os elementos. Quando o coração superar as razões, a caridade começará a agir, pois a caridade sempre parte do coração. Quando negarmos o que o coração pedir, começaremos a criar muitas desculpas, mas depois cairemos num remorso, pois razão nenhuma pode negar o que o coração pede. “Eis o meu segredo, disse a raposa ao Pequeno Príncipe. É muito simples: Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos” (Antoine De Saint-Exupéry, em: O Pequeno Príncipe). Maria percebe o gemido mudo da humanidade e simplesmente o exprime: “Eles não têm mais vinho”. Maria se identifica com as pessoas numa situação sufocante, e por isso pede com naturalidade uma solução para o seu Filho, Jesus Cristo, o Salvador da humanidade. 

A missão de Maria é muito explicita: “Fazei tudo o que Ele vos disser”. Maria se define por completo em relação ao seu Filho. Maria dispõe nossos corações para acolhermos as palavras de Jesus, mesmo que sejam pesadas, mas sempre libertadoras. Esta é seguramente uma dimensão importantíssima de sua função maternal na Igreja. 

A partir de Maria precisamos descobrir o que falta na nossa vida, na nossa vida religiosa, na nossa convivência, na nossa comunidade, no casamento, na família com o intuito de sofrer e amar juntos e não para acusar ou recriminar ninguém. O que falta em mim? Talvez sejam pequenas ou grandes coisas que me faltam; talvez faltem perdão e renúncia ou tensões a cobrir ou pequenas palavras a frear. Ou de modo geral, talvez falte muita coisa para que eu possa ser “o bom vinho” para mim, para os outros, e para Deus. Maria é uma mãe preocupada com aquilo que não tenho. É uma mãe que se dá conta daquilo que não sou. Eu preciso voltar a fazer aquilo que Jesus ensina para que eu possa voltar a ser o que devo ser. Falamos muito de Deus até demasiadamente, mas falamos menos com Deus. É preciso que falemos mais com Deus e precisamos deixá-Lo falar sobre nós para que possamos passar do falar para o fazer: “Fazei tudo o que ele vos disser”.

P. Vitus Gustama,SVD

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

06/01/2023-Tempo De Natal

CRER EM JESUS, FILHO DE DEUS, SIGNIFICA TER VIDA ETERNA

06 de Janeiro

Primeira Leitura: 1Jo 5,5-13

Caríssimos, 5quem é o vencedor do mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus? 6Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo. (Não veio somente com a água, mas com a água e o sangue). E o Espírito é que dá testemunho, porque o Espírito é a Verdade. 7Assim, são três que dão testemunho: 8o Espírito, a água e o sangue; e os três são unânimes. 9Se aceitamos o testemunho dos homens, o testemunho de Deus é maior. Este é o testemunho de Deus, pois ele deu testemunho a respeito de seu Filho. Aquele que crê no Filho de Deus tem este testemunho dentro de si. 10Aquele que não crê em Deus faz dele um mentiroso, porque não crê no testemunho que Deus deu a respeito de seu Filho. 11E o testemunho é este: Deus nos deu a vida eterna, e esta vida está em seu Filho. 12Quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho não tem a vida. 13Eu vos escrevo estas coisas a vós que acreditastes no nome do Filho de Deus, para que saibais que possuís a vida eterna. 

Evangelho: Mc 1,7-11

Naquele tempo, 7João pregava, dizendo: “Depois de mim virá alguém mais forte do que eu. Eu nem sou digno de me abaixar para desamarrar suas sandálias. 8Eu vos batizei com água, mas ele vos batizará com o Espírito Santo”. 9Naqueles dias, Jesus veio de Nazaré da Galileia, e foi batizado por João no rio Jordão. 10E logo, ao sair da água, viu o céu se abrindo, e o Espírito, como pomba, descer sobre ele. 11E do céu veio uma voz: “Tu és o meu Filho amado, em ti ponho meu bem-querer”.

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A Fé Em Jesus Tem Poder De Vencer o Mundo

Caríssimos, quem é o vencedor do mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus? ... são três que dão testemunho (sobre Jesus): o Espírito, a água e o sangue. ...  Quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho não tem a vida.” (1Jo 5,5.8.12).

Como se sabe que no vocabulário de são João, o termo “mundo”, neste contexto, significa “o homem encerrado em si mesmo e tentado de construir-se e salvar-se por suas próprias forças”. Mas ninguém se salva. O homem precisa de Salvador que é Jesus Cristo. O verdadeiro cristão venceu esta tentação, pois ele não vive fechado em si mesmo e sim aberto para Deus; venceu a ridícula e vã tentativa de querer “divinizar-se” por conta própria e deixa o êxito de toda sua vida nas mãos de Deus. 

Por crer em Jesus Cristo o cristão se torna vencedor do mundo. A verdadeira fé nos faz vencedores da tentação de autodivinização. Na Primeira Leitura do dia anterior lemos: “Esta é a vitória que venceu o mundo: a nossa fé” (1Jo 5,4b). 

Se quisermos vencer o mundo com suas armadilhas, temos que crer em Jesus Cristo, Filho de Deus que provou seu amor incondicional para nos salvar ao derramar seu sangue na Cruz. O preço de nossa vida é o sangue de Jesus derramado na Cruz. "A força mais potente do universo? - A fé." (Madre Teresa de Calcutá). "Uma pequena fé levará tua alma ao céu; uma grande fé trará o céu para sua alma." (Charles Spurgeon) Porém, "Os católicos devem estar atentos e vigilantes, porque existem forças e grupos que querem destruir a fé." (Benedicto XVI). A fé (“creio”) e a vida (“não pratico”) não podem estar assim separadas. Por sua própria natureza, devem estar unidas. Uma fé sem obras é morta (Tg 2,26); obras, mesmo que piedosas, sem fé tornam-se vazias. 

Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo” (1Jo 5,6). 

A água e o sangue” tem um duplo significado simbólico em são João. Em primeiro lugar, “a água e o sangue” simbolizam a obediência filial de Jesus até a morte, por amor a todos os homens (Cf. Jo 13,1; 3,16). João viu isto, estava ao pé da Cruz. O afirma. Jesus deu tudo. O Coração aberto do qual emana “a água e o sangue” é o símbolo mais forte e expressivo do amor. 

Em segundo lugar, “a água e o sanguesimbolizam também a sacramentalidade eclesial: a presença do Ressuscitado é perpetuada por seu Corpo que é a Igreja e que se expressa em uns ritos visíveis, os sacramentos. Através dos sacramentos, o Senhor está conosco desde criança até a morte, e até a vida eterna. Em particular o Batismo e a Eucaristia, “a água e o sangue”, o mais forte testemunho, hoje, do dom de Deus para os homens. 

Quando mantivermos nossa fé de que Jesus está conosco todos os dias (Cf. Mt 28,20), jamais perderemos a esperança, jamais cairemos no desespero, jamais nossas forças esgotarão. Nunca andamos sozinhos. Somos acompanhados pelos Senhor. 

Em resumo, são João nos esclarece que são três os que dão testemunho de Cristo como prova de seu amor por nós e por isso devemos crer n´Ele: a água, o sangue e o Espírito. A água que jorra do lado de Cristo na Cruz testemunha o Batismo que nos imerge ou mergulha na vida de Cristo e tem poder de nos purificar. O Sangue derramado do peito de Cristo na Cruz testemuna a Eucaristia que nos une a Jesus Cristo. Com efeito, em cada Eucaristia não celebramos o fato passado e sim uma presença: Jesus Cristo. Aquele que nasceu da Virgem Maria no primeiro Natal é feito Pão e Vinho para nós em cada Eucaristia, para nos fortalecer no nosso caminho rumo à eternidade. Se Ele é feito Pão e Vinho na Eucaristia, isto significa que não estamos comemorando uma data, nem um aniversário, nem uma doutrina. Estamos celebrando uma Pessoa que vive, que está presente: o Filho, o Irmão, o Salvador. É o Deus que se fez homem para nos tornar participantes da vida de Deus. Ele é o Filho que se fez homem para dar aos homens a alegria de saber que Deus os aceita como filhos e os ama incondicionalmente. Do mesmo modo como na Eucaristia, Jesus Cristo continua a estar presente nos outros Sacramentos da Igreja. O Espírito que Jesus entregou ao Pai na Cruz (Lc 23,46) é para ser derramado nos nossos corações a fim de nos santificar para que sejamos capazes de amar como Jesus nos amou (Jo 13,34-35). “Com o dom do Espírito, todo homem atinge, na fé, a contemplação e o gosto do mistério do plano da salvação (Gaudium et Spes/GS,15”. Se estivermos unidos a Cristo, venceremos também o mundo com suas ciladas como Jesus o venceu (Jo 16,33). Por isso, São João escreveu e afirmou: “Quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho não tem a vida”.

Caríssimos, quem é o vencedor do mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus? Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo” (1Jo 5,5-6)). “A fé nasce no encontro com o Deus vivo, que nos chama e revela o seu amor: um amor que nos precede e sobre o qual podemos apoiar-nos para construir solidamente a vida. Transformados por este amor, recebemos olhos novos e experimentamos que há nele uma grande promessa de plenitude e nos é aberta a visão do futuro. A fé, que recebemos de Deus como dom sobrenatural, aparece-nos como luz para a estrada orientando os nossos passos no tempo” (Papa Francisco em Carta Encíclica Lumen Fidei,4)

João Batista Na Sua Missão Como Precursor Do Messias

O texto do evangelho lido neste dia fala da missão de João Batista e do Batismo de Jesus.                   

No horizonte teológico da comunidade de Mc, a missão principal de João Batista é preparar a vinda daquele que é “mais forte” que ele. A imagem do “mais forte” evoca as antigas esperanças messiânicas do herói divino que de maneira eficaz e corajosa intervém na história para libertar os oprimidos (cf. Is 9,5;49,24s). Na tradição cristã primitiva, Jesus será apresentado como o “mais forte”, que vence o adversário e liberta os oprimidos (cf. Mc 3,27; Lc 11,22; At 10,38). Esse “mais forte” é quem vai realizar todas as promessas do AT.          

Perante esse “mais forte”, João Batista reconhece a sua indignidade total. Até para desamarrar as correias das sandálias, que era uma tarefa exclusivamente dos escravos e que era tido como gesto de extrema humilhação, sente-se indigno.  Só tem que desaparecer para dar lugar a quem “mais forte” que ele: “É necessário que ele cresça e eu diminua” (Jo 3,30).

Sentir-se indigno, pequeno e humilde é a atitude normal de quem se encontra perante uma divindade. Consciente ou inconscientemente, em cada comunhão, perante Jesus Cristo presente na hóstia consagrada, também nos sentimos indignos de recebê-lo ao rezarmos: “Senhor eu não sou digno de que entreis em minha morada. Mas dizei uma só palavra, serei salvo!” Mas Jesus quer entrar na nossa vida para que voltemos a ser dignos de ser filhos de Deus (salvos). Mas depois disto temos uma missão de preparar os outros para a vinda de Jesus na vida deles, como João Batista preparava o povo para a chegada do Messias prometido.

O segundo momento é o da chegada. Jesus está no meio de nós. O tempo de espera terminou. O anseio se consumou. O céu, fechado até agora, se abre para dar passo ao Espírito. E Deus, calado muito tempo, entra em diálogo com Jesus. Por isso, é o momento de contemplação, de assombro, de alegria contida. Céu e Terra deixam de estar incomunicados pela incompreensão, pela maldade e a hostilidade. Chegou um novo modo e distinto de gerar história. Com sua chegada, Jesus nos introduz em uma atmosfera limpa, pura, maculada e respirável. Com Jesus sempre ganhamos novo fôlego. Esta é sua força. 

Neste segundo momento relata-se o batismo de Jesus. Com o batismo de Jesus, Deus mergulha totalmente na vida do ser humano para que o ser humano possa mergulhar na vida de Deus. Jesus se manifesta um de nós, igual a todos, menos no pecado, mas assumindo os pecados dos seres humanos (cf. Mt 8,17). Deus torna-se um de nós em Cristo para que nós nos tornemos divinos. Ele morreu não para pagar os próprios pecados, mas os nossos: “Nossos pecados ele os carregou em seu corpo no madeiro, a fim de que, mortos para o pecado, vivamos para a justiça” (1Pd 2,24). Ao receber esse batismo, Jesus assume a ansiedade dos homens de receber a salvação e ao mesmo tempo assume o desejo do seu Pai de conduzir os homens à comunhão de irmãos. 

A abertura dos céus, na hora do batismo de Jesus, que se rasgam significa a abertura de novas relações entre Deus e os homens, um início de um novo diálogo de Deus com os homens, um novo tempo de graça, de novos dons dados por Deus aos homens. Jesus é o lugar do novo, definitivo e pleno encontro de Deus com os homens, dos homens com Deus e, conseqüentemente, dos homens entre si. Neste sentido Jesus se torna para seus seguidores, ao mesmo tempo o ponto de encontro e o ponto de partida no sentido de viver aquilo que Jesus ensinou e viveu. 

O batismo de Jesus é o momento de teofania (manifestação divina). A “voz vinda do céu” revela quem é Jesus, sua verdadeira identidade: “Tu és o meu Filho, o amado. Em ti me comprazo” (v.11; cf. Is 42,1). Esta voz é uma indicação a Jesus como ele é amado pelo Pai. Depois de um longo tempo de silêncio de Deus, de vazio do Espírito, os céus se rasgam e Deus atua novamente na história e fala com os homens de maneira definitiva a partir de Jesus. Doravante em Jesus, como o Filho de Deus, vai agir o poder salvífico de Deus.               

Durante a nossa curta vida, a questão que guia muitos dos nossos comportamentos é a seguinte: “Quem somos nós?” Raramente nos fazemos esta pergunta de maneira formal; contudo, a vivemos muito concretamente nas decisões do nosso dia-a-dia. 

O Batismo de Jesus nos relembra o nosso Batismo. O batismo nos vincula a Cristo, a sua obra de salvação. Por isso, no batismo, morremos para o homem velho para dar passo ao homem novo criado por Jesus ressuscitado. No batismo entramos no Reino da liberdade de filhos e filhas de Deus. E o batismo é a porta de entrada para a comunidade eclesial. Por ele nos incorporamos ao Corpo místico de Jesus Cristo que é a Igreja cuja cabeça é o próprio Jesus Cristo. 

No Batismo nos doamos a Cristo e ele nos assume em si, para que depois não vivamos mais para nós mesmos, mas graças a ele, com ele e nele. No Batismo abandonamos a nós mesmos e colocamos nossa vida nas mãos de Cristo para poder dizer com São Paulo: “Não sou eu quem vive, mas Cristo que vive em mim” (Gl 2,20). Esta é a novidade do Batismo: nossa vida pertence a Cristo, não mais a nós mesmos. Eu sou de Cristo. Eu não sou do mundo. A minha vida tem um dono: Jesus Cristo. Precisamente, por isso, não estamos mais sós nem mesmo na morte (Mt 28,20), mas estamos com Cristo que vive para sempre. Cristo é a vida de nossa vida. 

O Batismo não é um simples rito nem uma ação meramente individual ou isolada e sim um acontecimento da salvação. E que Deus continua com suas ações salvadoras na história também através do batismo. Trata-se de um momento privilegiado em que Deus atualiza Seu amor gratuito e soberano para quem é batizado e os que participam deste acontecimento.  Portanto, o batismo é um verdadeiro acontecimento salvífico, pois por ele participamos da história da salvação que Deus continua oferecendo a todos os homens através de Jesus Cristo em todos os tempos e lugares

P. Vitus Gustama,SVD

V Domingo Da Páscoa, 28/04/2024

PERMANECER EM CRISTO PARA PRODUZIR BONS FRUTO, POIS ELE É A VERDADEIRA VIDEIRA V DOMINGO DA PÁSCOA ANO “B” Primeira Leitura: At 9,26-31...