SER VOZ E REFLEXO DE JESUS NA VIDA
DIÁRIA
(2 de Janeiro)
Primeira
Leitura: 1Jo 2,22-28
Caríssimos: 22Quem é
mentiroso, senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? O Anticristo é aquele
que nega o Pai e o Filho. 23Todo aquele
que nega o Filho também não possui o Pai. Quem confessa o Filho possui também o
Pai. 24Permaneça dentro de vós aquilo que
ouvistes desde o princípio. Se o que ouvistes desde o princípio permanecer em
vós, permanecereis com o Filho e com o Pai. 25E
esta é a promessa que ele nos fez: a vida eterna. 26Escrevo
isto a respeito dos que procuram desencaminhar-vos. 27Quanto
a vós mesmos, a unção que recebestes da parte de Jesus permanece convosco, e
não tendes necessidade de que alguém vos ensine. A sua unção vos ensina tudo, e
ela é verdadeira e não mentirosa. Por isso, conforme a unção de Jesus vos
ensinou, permanecei nele. 28Então, agora,
filhinhos, permanecei nele. Assim poderemos ter plena confiança, quando ele se
manifestar, e não seremos vergonhosamente afastados dele, quando da sua vinda.
Evangelho:
Jo 1,19-28
19Este
foi o testemunho de João, quando os judeus enviaram de Jerusalém sacerdotes e
levitas para perguntar: “Quem és tu?” 20João
confessou e não negou. Confessou: “Eu não sou o Messias”. 21Eles perguntaram: “Quem és, então? És Elias?”
João respondeu: “Não sou”. Eles perguntaram: “És o Profeta?” Ele respondeu:
“Não”. 22Perguntaram então: “Quem és,
afinal? Temos de levar uma resposta àqueles que nos enviaram. Que dizes de ti
mesmo?” 23João declarou: “Eu sou a voz
que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor’” — conforme disse o
profeta Isaías. 24Ora, os que tinham sido
enviados pertenciam aos fariseus 25e
perguntaram: “Por que então andas batizando, se não és o Messias, nem Elias,
nem o Profeta?” 26João respondeu: “Eu
batizo com água; mas no meio de vós está aquele que vós não conheceis, 27e que vem depois de mim. Eu não mereço
desamarrar a correia de suas sandálias”. 28Isso
aconteceu em Betânia além do Jordão, onde João estava batizando.
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A Primeira Leitura, tirada da
Primeira Carta de são João, se encontra na parte que fala da heresia ou do anticristo
(1Jo
2,18-27). João chama anticristo
aqueles que não acreditam em Jesus como o Messias, o Ungido enviado por Deus,
que assumiu verdadeiramente a nossa carne humana. E se eles não acreditam em
Cristo, eles também não acreditam em Deus Pai. E vice-versa, aquele que
confessa sua fé em Cristo também crê no Pai. O anticristo é aquele que não tem
a suficiente fé em admitir a verdadeira encarnação do Filho de Deus; é o negador
do Cristo verdadeiro. Para o autor da Primeira Carta de são João aquele
que nega a qualidade divina do Filho de Deus, Jesus Cristo separa-se do Pai
(1Jo
2,23) e
portanto, da vida eterna da qual é a fonte (1Jo 2,25). Ao contrário, aquele
que “confessa” o Filho (1Jo 2,23) não é apenas aquele que reconhece
especulativamente a divindade de Jesus, mas também adere a seu mandamento de
amor. Não basta confessar que Jesus é Deus, mas tem que mostrar esta confissão
com a vivência do amor fraterno.
Para aquele nega a
divindade de Jesus, o autor da Carta usa os termos “sedutores”,
“pseudoprofetas” e “anticristos”. A palavra no singular e no plural
(anticristo/anticristos) designa todos aqueles que se opõem a Cristo; eles
negam que Cristo seja homem verdadeiro. Eles não admitem que o mundo de Deus (o
mundo de cima) possa manchar-se tocando o mundo de baixo. Este tipo de crença
se espalha dentro da comunidade para a qual a Carta foi dirigida (1Jo 2,19).
O ato de ser anticristo
é uma heresia. Heresia é confundir Cristo com o nosso pensar e o nosso querer; é fabricar um Cristo a nossa imagem e semelhança. Este Cristo
manipulado e tantas vezes mudado é claro que não pode ser o Cristo Salvador.
A final, “Todo aquele que nega o Filho
também não possui o Pai. Quem confessa o Filho possui também o Pai” (1Jo
2,23).
O fragmento
da primeira leitura
revela as linhas essenciais
da falsa doutrina
divulgada pelo “anticristo”
em uma época
atormentada do final do século primeiro. Para essa falsa doutrina, Jesus não
era considerado como
o Messias nem
como o Filho de Deus.
Essa heresia cristológica considerava impossível que
o Verbo Divino
se fizesse carne à maneira
humana. Mas
para o apostolo João, testemunha
ocular do Verbo
Divino, o Verbo
da vida (cf. 1Jo 1,1-4), negar a divindade de Jesus significa não
ter comunhão
com o Pai
e não ter a
verdadeira vida (1Jo 2,22-23; cf. Jo 20,30-31); negar
a união do divino e do humano em Jesus
significa ser “anticristo”
porque o humano
em Jesus é o reflexo
perfeito do divino,
é o reflexo do Pai:
“Aquele que
me viu, viu o Pai”
(cf. Jo 14,9). E em
outra ocasião
Jesus disse: “Eu e o Pai somos um”
(Jo 10,30).
São João nessa Primeira
Carta quer
orientar nossa
sensibilidade. Não
se trata de fazer
de Jesus um ídolo
e sim de abrir
nossos ouvidos
à sua Palavra,
pois Sua Palavra é vida
e luz para nós todos: “No
Verbo havia vida,
e a vida era
a luz dos homens”
(Jo
1,4) e por isso nos orienta (cf. Jo 8,12). Um Jesus que não nos servir como caminho ao
Pai (cf. Jo 14,6) é um
Jesus que não
nos interessa do ponto
de vista da fé.
Muitos querem um Jesus milagroso para ter uma vida confortável aqui neste mundo
e esqueceram-se de um Jesus que os leva para a vida eterna. Jesus é o
misterioso laço de união
entre a humanidade
caída e o Pai
pronta para nos salvar: “Todo aquele que nega o Filho também não
possui o Pai. Confessa o Filho possui também
o Pai” (1Jo 2,23).
Como cristãos
somos essencialmente ouvintes da Palavra
da Salvação, aceitadores do Filho, e
escutando-O nos realizamos como filhos do Pai celeste e irmãos dos demais
homens. A Igreja é formada pela escuta
da e pela vivência da Palavra de Deus. O que
nos é pedido
não é essencialmente
nosso conhecimento ou nosso saber, e sim nossa fidelidade. Fidelidade
é guardar ou
observar o que
é ouvido da Palavra
de Deus (cf.
Mt 7,24; Jo 14,23). Por isso,
o verbo que
mais vezes
se repete na primeira leitura, é “permanecer”. É um verbo que fala de fidelidade, de perseverança, de manter
na verdadeira fé sem
deixar-se enganar. Permanecer em
Jesus significa ter fé
nele. Há várias maneiras de ser fiel: com o pensamento e o coração,
com as palavras
de testemunho que
damos diante dos demais
e com as ações,
com os compromissos, com as obras e com as decisões
da vida diariamente, de acordo com o mandamento do Senhor resumido no amor
fraterno.
De nós não será pedido
conta de nossos conhecimentos e sim de nossa fidelidade. Seremos cristãos e
seremos salvos, se aceitarmos Jesus, o Enviado do Pai e nos identificarmos com
Ele. É contemplar Jesus para contemplar Deus. Jesus é a única e verdadeira
revelação de Deus. Há certas afirmações típicas de são João sobre esta
revelação: “Ninguém vai ai Pai senão por mim” (Jo 14,6); “Quem conhece o Filho,
conhece também o Pai” (Jo 8,19); “o Filho é o único
capaz de revelar o Pai” (Jo 14,7).
E lemos no texto do Evangelho de hoje o testemunho de João Batista
acerca de Cristo.
Para a pergunta “Quem és tu?”, João Batista
confessa, evitando qualquer mal-entendido acerca
de sua pessoa
e de sua própria
missão, que
não é o Cristo,
o Salvador esperado. Este
testemunho em
forma de afirmação negativa
que sai da boca
de João Batista é uma autêntica confissão de fé
no messianismo de Jesus. João Batista se
define apenas com
as palavras do profeta
Isaias: “Voz que
clama no deserto:
‘Aplainai o caminho do Senhor’” para preparas vinda
de Cristo. Ser voz é ser uma mensagem, é ser uma chamada aos
demais para o bem, para a Luz que ilumina. A voz é feita para proclamar, para
anunciar e para denunciar. É preciso nivelar as relações humanas, pois todos os
seres humanos têm a mesma substancia humana. Não há super-criatura. É preciso aplainar.
Onde houver estrada plana, haverá facilidade para caminhar. Quando um reconhece
no outro como ser humano, a convivência se torna mais fácil. Ninguém tratará a
outro desumanamente. Eu sou ser humano. O outro é ser humano. Deus se fez
humano para salvar o ser humano.
João Batista não é a luz. Ele é apenas
uma lâmpada que
tem tempo limitado de duração. Ele é apenas aquele que dá testemunha
da verdadeira Luz que
é o próprio Jesus Cristo
(cf. Jo 8,12). Ele não
é a Palavra Encarnada,
mas somente a
voz que
prepara o caminho
com a purificação
dos pecados através
de seu batismo:
“Eu batizo com
água; mas
no meio de vós
está aquele que
vós não
conheceis”.
O testemunho
de João Batista pretende suscitar
a fé em
todo mundo
para o grande
desconhecido, o Portador
da salvação, que vive entre os homens
(Jo
1,14). Por isso, a
fé de João Batista
está orientada ao anúncio de Jesus e não é apenas para o consumo próprio. João Batista
é aquele que
chama atenção,
não para si mesmo e sim para Aquele é o verdadeiro
Salvador. João Batista
nos ensina
que a fé
deve ser transformada em
anúncio, o fiel
deve se tornar em
anunciador da Boa Nova. Todo cristão é um propagador
da Palavra de Deus
na aridez espiritual
de nosso mundo, um propagador
que chama
os outros ao encontro
de Jesus Cristo que
é “o Caminho, a Verdade
e a Vida” (Jo 14,6).
João Batista testemunha
Jesus Cristo com
fidelidade e valentia. Não quer falar de si mesmo, nem contar seus méritos nem suas façanhas.
João Batista somente
quer que
os outros o considerem como “a voz que clama no deserto”,
a voz que
prepara os caminhos
de Deus, a voz
que chama
todos a preparar
o lugar de Deus
no mundo, especialmente
no coração de cada
um. A voz
desaparece, mas a mensagem
fica.
O cristão é chamado a
ser anunciador da Boa Nova, a ser a voz que grita, com a própria vida, a
verdade de Cristo apesar da pobreza que experimenta e da fragilidade de suas
palavras humanas. O cristão é o homem que se define em função de Cristo, d’Aquele
que vem sempre aos seus para comunicar salvação e vida.
Como cristãos
e como pessoas
do bem devemos ser a voz de Deus sobre o amor
neste mundo. Podemos desaparecer,
mas a marca
de amor que
testemunhamos e transmitimos deve ficar para sempre entre as pessoas.
Além disso, nós,
como João Batista,
deveríamos falar menos
de nós mesmos,
acreditar menos
em nós
mesmos e nos
converter em
“a voz” que
dá testemunho de Deus,
de seu amor
presente em
Jesus Cristo. Santo Agostinho comenta: “João era voz, mas o Senhor é a Palavra que no princípio já
existia. João era uma voz provisional;
Cristo, do princípio, é a Palavra eterna.
Ao tirar a palavra,
o que será a voz?
Se não houver conceito,
tudo será nada
mais do que
ruído vazio.
A voz sem
palavra chega
ao ouvido, mas
não edifica o coração.
João é a voz que
grita no deserto,
a voz que
rompe o silêncio...”.
“Eu sou a voz que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho
do Senhor’”. Somos chamados a ser voz do Senhor neste mundo. Ser
voz é uma vocação
muito humilde,
mas é maior
de todas. Ser voz
é ser uma mensagem,
é ser uma chamada
aos demais para
o bem, para a Luz que
ilumina. A voz é feita
para proclamar, para anunciar e para
denunciar. A voz
deixará de ser voz,
se não gritar,
se não proclamar,
anunciar e denunciar. A voz se condenará, se deixar
de anunciar a mensagem
sobre o bem.
Uma voz do bem
é capaz de renovar
o mundo. Se faltarem as vozes do bem para
anunciar e denunciar, o mundo perderá sua
consciência. Por
esta razão, como
vale e quanto
vale sua voz! Como vale e quanto vale sua palavra! Como vale e quanto vale sua mensagem! Como vale e quanto vale seu grito que rompe o
comodismo, que rompe o modo de viver sem vida.
“Quem és tu?”. João Batista, nesta passagem, não nos
indica o que devemos fazer e sim o que devemos e podemos ser. Trata-se da
transparência de um homem.
João Batista era um personagem realmente raro: vivia no deserto, mal
alimentado. Mas ele se converteu em um homem perigoso, criador de um movimento
popular que alarmou às autoridades supremas religioso-políticas de Jerusalém
que lhe enviam uma comissão para investigar com o intuito de detê-lo se
pretender ser o Messias cuja iminente chegada se esperava naquele ambiente
tenso da Palestina de mediados do século I, a causa principal da miséria e da
dominação romana.
A interrogação começa autoritariamente, sem fórmulas de cortesia: “Quem
és tu?”. Os enviados vindos de Jerusalém querem que o próprio João Batista
declare suas intenções. De maneira tão simples e direta, João responde-lhes:
“Eu não sou o Messias!”. Para os judeus declarar-se Messias significava opor-se
às autoridades existentes, que se sentiam inseguras diante dos movimentos
populares. Porque, segundo uma opinião muito estendida na época, um dos
principais objetivos do Messias haveria de ser a reforma das instituições e a
destituição da hierarquia existente. Não é estranho, por isso, o alarme dos
dirigentes diante da atividade de João Batista e ficam desorientados.
O evangelista João põe em boca de João Batista a triple negação, porque
as três figuras vão ser apresentadas por Jesus. O Messias, Elias e o Profeta
encarnavam diversos aspectos da salvação esperada com instrumentos do Espírito.
“Quem és tu?”. As autoridades pedem que João Batista
se defina. As autoridades querem uma resposta clara para julgar se João Batista
representa um perigo. Querem saber o que pretende com sua atividade. João
Batista se define como “a voz que clama no
deserto”. É alguém que deve ocultar-se para não fazer sombra para
Aquele que vem. João é “a voz”, Jesus é “a Palavra”. A pergunta “Quem és tu?” também é dirigida a cada um de nós.
Por acaso, cada um de nós, do ponto de vista cristão, pode se definir? Se
soubermos quem somos, saberemos também o que devemos fazer e o que não devemos
fazer.
Para que possamos nos definir é preciso fazer o encontro pessoa com Jesus
e contemplar Jesus Cristo, Luz do mundo para que sejamos reflexos de sua luz
para os outros, iluminado suas vidas embora o reflexo dure apenas em pouco
tempo. Ser reflexo de
Cristo é levar um raio de esperança aos corações entristecidos. Ser reflexo de
Cristo é levar um sorriso gratuito numa sociedade violenta. Ser reflexo de
Cristo é saber apreciar o lado bom das coisas e das pessoas e entender que nem
tudo é relativo, pois existe o Absoluto: Deus. Ser reflexo de Cristo é
encontrar o sentido da vida a partir da luz da Palavra de Deus. Sejamos como
vela. Ela se consome iluminando a circunstância. A vida de uma vela dura pouco
tempo, mas é suficiente para espantar a escuridão e mostrar o caminho a seguir.
Neste mundo todos os cristãos são vozes vivas de Cristo para os outros e são
luzes para apontar o caminho certo a ser trilhado.
P. Vitus Gustama,svd
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