quinta-feira, 31 de julho de 2025

02/08/2025- Sábado Da XVII Semana Comum, Ano Ímpar

SER CRISTÃO É SER PROFETA E MÁRTIR

Sábado da XVII Semana Comum

Primeira Leitura: Lv 25,1.8-17

1 O Senhor falou a Moisés no monte Sinai, dizendo: 8 “Contarás sete semanas de anos, ou seja, sete vezes sete anos, o que dará quarenta e nove anos. 9 Então farás soar a trombeta no décimo dia do sétimo mês. No dia da Expiação fareis soar a trombeta por todo o país. 10 Declarareis santo o quinquagésimo ano e proclamareis a libertação para todos os habitantes do país: será para vós um jubileu. Cada um de vós poderá retornar à sua propriedade e voltar para a sua família. 11 O quinquagésimo ano será para vós um ano de jubileu: não semeareis, nem colhereis o que a terra produzir espontaneamente, nem colhereis as uvas da vinha não podada; 12 pois é um ano do jubileu, sagrado para vós, mas podereis comer o que produziram os campos não cultivados. 13 Nesse ano de jubileu cada um poderá retornar à sua propriedade. 14 Se venderes ao teu conterrâneo, ou dele comprares alguma coisa, que ninguém explore o seu irmão; 15 de acordo com o número de anos decorridos após o jubileu, o teu conterrâneo fixará para ti o preço de compra, e de acordo com os anos de colheita, ele fixará o preço de venda. 16 Quanto maior o número de anos que restarem após o jubileu, tanto maior será o preço da terra; quanto menor o número de anos, tanto menor será o seu preço, pois ele te vende de acordo com o número de colheitas. 17 Não vos leseis uns aos outros entre irmãos, mas temei o vosso Deus. Eu sou o Senhor, vosso Deus”.

Evangelho: Mt 14,1-12

1 Naquele tempo, a fama de Jesus chegou aos ouvidos do governador Herodes. 2 Ele disse a seus servidores: “É João Batista, que ressuscitou dos mortos; e, por isso, os poderes mira­culosos atuam nele”. 3 De fato, Herodes tinha mandado prender João, amarrá-lo e colocá-lo na prisão, por causa de Herodíades, a mulher de seu irmão Filipe. 4 Pois João tinha dito a Herodes: “Não te é permitido tê-la como esposa”. 5 Herodes queria matar João, mas tinha medo do povo, que o considerava como profeta. 6 Por ocasião do aniversário de Herodes, a filha de Herodíades dançou diante de todos, e agradou tanto a He­ro­des 7 que ele prometeu, com juramento, dar a ela tudo o que pedisse. 8 Instigada pela mãe, ela disse: “Dá-me aqui, num prato, a cabeça de João Batista”. 9 O rei ficou triste, mas, por causa do juramento diante dos convidados, ordenou que atendessem o pedido dela. 10 E mandou cortar a cabeça de João, no cárcere. 11 Depois a cabeça foi trazida num prato, entregue à moça e esta a levou a sua mãe. 12 Os discípulos de João foram buscar o corpo e o enterraram. Depois foram contar tudo a Jesus.

_____________________

É Preciso Descansar Para Estar Com o Senhor Do Céu e do Universo

O Senhor falou a Moisés no monte Sinai, dizendo: ´Contarás sete semanas de anos, ou seja, sete vezes sete anos, o que dará quarenta e nove anos. Então farás soar a trombeta no décimo dia do sétimo mês. Declarareis santo o quinquagésimo ano e proclamareis a libertação para todos os habitantes do país: será para vós um jubileu’”. São as primeiras frases da Primeira Leitura do livro de Levítico.

A lei prescrevia cada sete anos um ano sabático, cuja origem não foi outra que a necessidade de deixar de alqueivar uma terra que era bastante pobre: “Durante seis anos, semearás a terra e recolherás o produto. Mas, no sétimo ano, a deixarás repousar em alqueive; os pobres de teu povo comerão o seu produto, e os animais selvagens comerão o resto. Farás o mesmo com a tua vinha e o teu olival. Durante seis dias, farás o teu trabalho, mas no sétimo descansarás, para que descansem o teu boi e o teu jumento, e respirem o filho de tua escrava e o estrangeiro” (Ex 23,10-12). E que se converteu em ocasião de dar a liberdade aos escravos (Ex 21,2-6).

Esta prescrição foi considerada utópica, pois em seguida a legislação sacerdotal a substituiu pela criação de um ano jubilar (Ex 25,11).

A trombeta com que se anunciava esse ano particular era um chifre de carneiro, que se chama “yobel”, em hebraico. Daí surgiu a palavra “Jubileu”. A celebração do ano jubilar levava consigo, entre outras coisas, a restituição das terras a seus antigos proprietários, a remissão das dívidas, a libertação de escravos e o repouso da terra.

Mas para além deste contexto económico e social, os israelitas começam a manifestar algumas ideias religiosas que têm interesse para o desenvolvimento futuro do ano jubilar. Em primeiro lugar, a concepção segundo a qual a terra pertence a Deus. Esta é a razão fundamental pela qual não pode ser descartada definitivamente.

A exploração sem limite da terra pode causar dano para o próprio homem. Na falta de água e de comida, de animais, de peixes etc., todos vão entender que o ouro e a prata não podem ser comidos. A terra precisa de respiração e de cuidados. Esta irmã (Terra) clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou.... Por isso, entre os pobres mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada, que ‘geme e sofre as dores do parto´ (Rm 8, 22). Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2, 7)” (Papa Francisco: Carta Encíclica Laudato Si n.2).

Em segundo lugar, a ideia do “resgate”, subjacente às prescrições do jubileu e que exige uma propriedade familiar seja resgatada preferentemente por um parente (o “goel”) para que não se perca o direito à herança. E por fim, a ideia da remissão, não somente das dívidas, mas também dos pecados.

Tomando essas três ideias como base, os profetas salvarão a instituição da decadência a fim de o povo eleito voltar a alcançar um futuro escatológico onde as perspectivas tomarão uma densidade mais espiritual. O profeta Isaías tem muito mérito para esta perspectiva escatológica (Is 61,1-3). Então, não será mais necessário tocar a trombeta para anunciar o ano jubilar, pois basta a palavra do profeta que ressoa como trombeta. A palavra “evangelho” nasceu nesse contexto: a boa nova do ano da graça do Senhor.

O primeiro discurso pronunciado por Jesus ao iniciar sua vida pública será precisamente um comentário do texto de Isaías no qual anuncia o ano jubilar espiritual (Lc 4,21). Jesus Cristo enfoca seu ministério como um verdadeiro ano jubilar. Ele usará seu poder messiânico para perdoar os pecados que escandalizará os fariseus (Mt 9,6). O ministério público de Cristo será, com efeito, uma série ininterrupta de libertações, de curas, de remissões de dívidas e de pecados. Quando sobe ao Pai, confiará este poder aos apóstolos em sua primeira aparição pelo dom do Espirito messiânico (Jo 20,22-23).

Quem Vive Na Mentira É Capaz de Reagir Violentamente Diante Da Verdade Revelada

Na passagem do Evangelho deste dia fala-se da identidade de Jesus, relacionada à de João Batista. O motivo dessa colocação é sempre o mesmo: para entender Jesus há que entender antes quem é João Batista, pois João Batista é o Precursor de Jesus. O destino de João Batista preanuncia o de Jesus.

O evangelho nos relatou que a fama de Jesus estava cada vez mais espalhada ao seu redor. Por isso chegou também aos ouvidos de Herodes que já tinha mandado decapitar João Batista. A presença e a fama de Jesus incomodam a consciência de Herodes: “É João Batista, que ressuscitou dos mortos; e, por isso, os poderes miraculosos atuam nele”, pensou Herodes. Herodes que já tinha mandado decapitar João Batista, por instigação de Herodíades, ficou sem a consciência tranquila.

A partir da reação de Herodes é que se conta o drama da vida de João Batista que denunciou Herodes por ter se casada com Herodíades, ex-mulher de seu irmão, pois era proibido pela Lei (cf. Lv 18,16).

A adúltera Herodíades não gostou da denúncia de João Batista em nome de seu prazer e interesse pessoal, e esperava momento certo para vingar-se. Quando chegou o momento oportuno ela pediu, através de sua filha, a cabeça de João Batista.

João Batista é o último profeta do Antigo testamento. Ele enfrenta abertamente os governantes da nação para chamá-los à mudança e para exigir um comportamento ético. O deserto, lugar de sua pregação, é símbolo de sua oposição à cidade e ao templo. Ele quer reviver a experiência do êxodo e recordar seu povo que o destino depende completamente da fidelidade a Deus. No entanto, como qualquer profeta, João Batista pagou o preço alto de sua denúncia: a própria vida. Herodes, ainda que tivesse respeito pelo João Batista, se submeteu diante das pressões da adúltera Herodíades que pediu a cabeça de João Batista.

A morte de João Batista antecipa a morte de Jesus como mártir. Ambos são encarcerados injustamente, ambos rubricam com seu sangue a verdade de Deus. Jesus espera o mesmo destino de João Batista. Um profeta autêntico não é somente recusado em sua própria pátria (cf. Mt 13,57), mas também essa recusa termina, muitas vezes, com sua morte.

A denúncia de João Batista nos mostra que o Evangelho não é neutro. Diante de certos grandes problemas, o Evangelho toma posição com o risco de conduzir os crentes para o martírio pelo fato de defender a verdade, a justiça, a honestidade e assim por diante.

A figura de João Batista é admirável em sua coerência, na lucidez de sua pregação e de suas denúncias. João Batista é valente e comprometido. Diz a verdade ainda que desagrade.

É figura também de tantos cristãos que morreram vitimas da intolerância pelo testemunho que davam contra situações injustas e insuportáveis do ponto de vista da justiça e da honestidade. Os “profetas mudos” prosperam, mas os autênticos terminam pagando tudo com a própria vida.

Toda vez que celebramos o martírio de um discípulo de Cristo tocamos o próprio núcleo de nossa fé. A Igreja de Cristo é a Igreja dos mártires. Mas o que acontece é que estamos tão acostumados com o comodismo. Muitas vezes nos sentimos instalados comodamente no acampamento capitalista ou nas avenidas do hedonismo. Ninguém vai nos perseguir se não vivermos nosso martírio, nosso verdadeiro testemunho dos valores ensinados por Jesus Cristo. A vida iluminada pela verdade ameaça quem está na sombra da desonestidade e da falsidade, e este reage violentamente diante da verdade em nome da defesa dos seus interesses e prazeres. Toda vez que os cristãos se arriscarem para adentrar-se nos territórios obscuros, eles vão pagar o preço com sua própria vida, como João Batista. Toda vez que a Igreja abrir a boca contra a injustiça, a desonestidade, a corrupção, a exploração do ser humano, ela será perseguida. Mas dar a vida é a única maneira de dar vida. Ser verdadeira Igreja de Cristo não dá para parar de sofrer enquanto ela viver seu verdadeiro martírio, seu profundo testemunho de valores. A verdadeira Igreja de Cristo é a Igreja dos mártires, das testemunhas de Cristo.

Jesus nos diz que devemos ser luz, sal e fermento deste mundo. Ou seja, profetas. Ser cristão é estar disposto a tudo. Profetas são os que interpretam e vivem as realidades deste mundo a partir da perspectiva de Deus e denunciam quando há injustiça ou desonestidade nelas.

Geralmente não gostamos de escutar as críticas que nos recordam o lado escuro de nossa vida. Sempre temos dificuldade para escutar um profeta. Mas mesmo que não gostamos de ouvir o profeta, suas palavras continuam a conter a verdade. Mesmo que eliminemos o profeta, mas suas palavras continuam a ressoar ou a incomodar nossa consciência, como aconteceu com Herodes. Viver na verdade ou de acordo com a verdade, com a justiça, com a desonestidade, etc. é viver na serenidade.

LIÇÃO DE VIDA A PARTIR DO RELATO DA MORTE DE JOÃO BATISTA CAUSADA PELO COVARDIA DE HERODES:

1.    Nunca prometa nada, quando você estiver alegre e feliz, pois a promessa pode ser fatal. A promessa de Herodes custa a cabeça de João Batista (cf. Mc 6,21-29).

2.    Não responda quando você estiver com raiva, pois a raiva permite a expressão, mas raramente permite a compreensão. Na raiva, quanto mais fortes as palavras forem, mais fechados ficarão os ouvidos.

3.    Não decida nada, quando você estiver triste. Dizem que as lágrimas vêm do coração e não do cérebro. Em toda decisão tomada deve levar em conta o coração e o cérebro. O elemento mais importante para cada decisão é a forma como devemos avaliar nossa vida em cada situação. Não mergulhe demais na sua dor ou tristeza. Um dia sua tristeza ou dor vai ser uma cura para sua vida e a vida das pessoas que necessitam de seu conselho.

P. Vitus Gustama,svd

quarta-feira, 30 de julho de 2025

01/08/2025-Sextaf Da XVII Semana Comum- Ano Ímpar

É PRECISO FICAR ATENTO, POIS DEUS SE MANIFESTA NO COTIDIANO

Sexta-Feira da XVII Semana Comum

Primeira Leitura: Lv 23,1.4-11.15-16.27.34b-37

1 O Senhor falou a Moisés, dizendo: 4 “São estas as solenidades do Senhor em que convocareis santas assembleias no devido tempo: 5 No dia catorze do primeiro mês, ao entardecer, é a Páscoa do Senhor. 6 No dia quinze do mesmo mês é a festa dos Ázimos, em honra do Senhor. Durante sete dias comereis pães ázimos. 7 No primeiro dia tereis uma santa assembleia, não fareis nenhum trabalho servil; 8 oferecereis ao Senhor sacrifícios pelo fogo durante sete dias. No sétimo dia haverá uma santa assembleia e não fareis também nenhum trabalho servil”. 9 O Senhor falou a Moisés, dizendo: 10 “Fala aos filhos de Israel e dize-lhes: Quando tiverdes entrado na terra que vos darei, e tiverdes feito a colheita, levareis ao sacerdote um feixe de espigas como primeiros frutos da vossa colheita. 11 O sacerdote elevará este feixe de espigas diante do Senhor, para que ele vos seja favorável: e fará isto no dia seguinte ao sábado. 15 A partir do dia seguinte ao sábado, desde o dia em que tiverdes trazido o feixe de espigas para ser apresentado, contareis sete semanas completas. 16 Contareis cinquenta dias até ao dia seguinte ao sétimo sábado, e apresentareis ao Senhor uma nova oferta. 27 O décimo dia do sétimo mês é o dia da Expiação. Nele tereis uma santa assembleia, jejuareis e oferecereis ao Senhor um sacrifício pelo fogo. 34b No dia quinze deste sétimo mês, começa a festa das Tendas, que dura sete dias, em honra do Senhor. 35 No primeiro dia haverá uma santa assembleia e não fareis nenhum trabalho servil. 36 Durante sete dias oferecereis ao Senhor sacrifícios pelo fogo. No oitavo dia tereis uma santa assembleia, e oferecereis ao Senhor um sacrifício pelo fogo. É dia de reunião festiva: não fareis nenhum trabalho servil. 37Estas são as solenidades do Senhor, nas quais convocareis santas assembleias para oferecer ao Senhor sacrifícios pelo fogo, holocaustos e oblações, vítimas e libações, cada qual no dia prescrito.

Evangelho: Mt 13, 54-58

Naquele tempo, 54 dirigindo-se para a sua terra, Jesus ensinava na sinagoga, de modo que ficavam admirados. E diziam: “De onde lhe vem essa sabedoria e esses milagres? 55 Não é ele o filho do carpinteiro? Sua mãe não se chama Maria, e seus irmãos não são Tiago, José, Simão e Judas? 56 E suas irmãs não moram conosco? Então, de onde lhe vem tudo isso?” 57 E ficaram escandalizados por causa dele. Jesus, porém, disse: “Um profeta só não é estimado em sua própria pátria e em sua família!” 58 E Jesus não fez ali muitos milagres, porque eles não tinham fé.

______________

Festas Litúrgicas e Seu Sentido Para Nossa Existência Humana

Hoje e amanhã a Primeira Leitura é tirada do livro de Levítico que faz parte do Pentateuco (cinco primeiros livros da Bíblia) ou da Torá. Depois, seguiremos com o livro dos Números, o Deuteronômio, Josué, os Juízes e Rute.

Nas Bíblias hebraicas este livro se chama “Wayyiqra’”, (“E Ele chamou”), palavra que figura o começo do livro. Como outros livros do Pentateuco são chamados de acordo com a primeira palavra no início do livro.

Os cristãos adotaram uma forma latinizada da palavra gregaLeveitikon” (Leviticus) que é o título dado pela Septuaginta (LXX). O título hebraico alude a uma vocação-chamado na instrução da Torá. Este livro é chamado “Levítico” porque a grande parte do livro trata do culto que era tarefa dos sacerdotes e da santidade dos próprios sacerdotes que eram considerados descendentes de Levi, um dos filhos de Jacó. Consequentemente, o que se exige também é a santidade do povo em geral para poder participar do culto. Por isso, o Levítico contém muitas prescrições relativas ao culto e à santidade da vida do povo de Israel: os sacrifícios (Lv 1-7); os sacerdotes (Lv 8-10); as regras da pureza (Lv 11-16); as normas de santidade (Lv 17-26; dentro dessas normas, encontram-se as festas do ano e do ano jubilar em Lv 23-25 onde se encontra a Primeira Leitura de hoje).

Etimologicamente, a palavra “culto” se deriva do latim “cultum” cujo verbo é “colere”, verbo que é rico em significados: “cultivar”, “cuidar”, “servir”, etc. Por culto se entende, pois, o serviço prestado pelo homem a forças superiores ou à divindade em que crê. Segundo a ciência da Religião, culto significa o exercício ou forma com que o homem ou uma comunidade expressa interno ou externamente suas relações com forças superiores, divindade ou Deus. A religião adquire sua forma concreta no culto que tende a expressar-se num conjunto de normas fixas ou ritos. O culto e seus ritos tendem à santificação do homem e da comunidade. A prática do culto externo exige lugares sagrados, como templos, e determinados tempos relevantes, como festas, peregrinações, etc. Para tomar parte no culto validamente são necessários um ato de iniciação e a observância de determinadas normas de pureza de culto. É uma forma de santificar-se para poder se aproximar da divindade.

Santidade, por sua vez, também se entende, no contexto do livro de Levítico, como integridade, e não apenas o mistério de Deus. A palavra “integridade” supõe a existência das partes ou componentes. Quando as partes ou os componentes estiverem bem ordenados o resultado será a santidade. A integridade e a unicidade resultam na santidade. A santidade é a resposta do homem a Deus que é santo, por excelência: “Sede santos, pois eu sou santo, eu, o Senhor, vosso Deus” (Lv 11,44-45; 19,2; 20,7.26).

No texto de hoje nos são apresentadas (na versão Sacerdotal) as principais festas de Israel nas quais são unidos os elementos mais antigos do mundo rural e a recordação das intervenções de Deus na história da salvação:

·      Páscoa, no primeiro mês do ano, o mês de Nisan, na qual se juntam as antigas festas agrícolas dos ázimos e dos cordeiros com a recordação da libertação da Escravidão do Egito.

·      Pentecostes, aos cinquenta dias, quando, junto à festa das feixes e dos primeiros frutos da colheita, se celebra a Aliança selada no Sinai.

·      A festa da Expiação (Yom-Kippur), no sétimo mês, já no outono, com ritos de penitencia e oferenda de sacrifícios.

·      A festa das Tendas ou Tabernáculos, também no sétimo mês, por ocasião da colheita quando se recorda a marcha pelo deserto, construindo para uns dias umas cabanas no campo.

Em cada uma destas festas é convocada uma assembleia litúrgica, oferecendo sacrifícios a Javé e ao mesmo tempo se abstém do trabalho.

O salmo Responsorial (Sl 80) ressalta, sobretudo, a parte litúrgica: “Cantai salmos, tocai tamborim, harpa e lira suaves tocai! Em teu meio não exista um deus estranho nem adores a um deus desconhecido! Porque eu sou o teu Deus e teu Senhor, que da terra do Egito te arranquei”.

Em todas as culturas e religiões, a festa é um elemento valioso na dinâmica da vida de fé comunitária. Também nós cristãos damos importância à celebração de nossas festas, algumas das quais são herança das festas de Israel, mas com conteúdo cristão. Celebramos o domingo cada semana, que uma vez ao ano se converte na Páscoa do Senhor, com sua morte e ressurreição, preparada pela Quaresma e prolongada durante cinquenta dias festivos que termina com Pentecostes. Ao longo do ano celebramos outras festas do Senhor, da Virgem Maria e dos Santos.

Qual é a função destas festas para nós cristãos?

As festas litúrgicas nos ajudam no nosso caminho de fé:

·      Para despertar nossa memória de povo redimido por Deus em Jesus Cristo.

·      Para alimentar nossa identidade e nosso sentido de pertença à Igreja do Senhor.

·      Para dar à nossa existência uma dimensão de alegria rompendo a rotina da vida cotidiana.

·      Para nos ajudar a nos libertar da escravidão do tempo e do trabalho.

·      Para atualizar e fazer presente o acontecimento que celebramos: o Deus, em outro tempo, se mostrou Salvador, continua oferecendo a salvação para todos nós, seu povo. A Páscoa de Jesus não terminou. Ela é comunicada também a nós hoje, em sua celebração anual e na Eucaristia diária.

·      A festa é memória e presença e, ao mesmo tempo, anúncio do futuro, porque Cristo nos prometeu que estará conosco todos os dias até o fim dos tempos (Mt 28,20).

·      Também em nossas celebrações humanas: aniversário, bodas de prata e ouro, celebrar um festa é celebrar o passado, o presente e o futuro, o que dá a nosso caminho pela vida um sentido e uma força especiais.

Nossa festa é uma Pessoa: Jesus, o Senhor Ressuscitado. Em torno d’Ele nos reunimos para celebrar a Eucaristia diária, o domingo semanal e as festas anuais. Com isso vamos participando da vida do Senhor e encontramos o sentido de nosso caminho até a festa eterna do céu.

Deus Está No Nosso Cotidiano: Prestemos bem a Atenção Sobre Esta Presença Misteriosa

“‘Não é ele o filho do carpinteiro? Sua mãe não se chama Maria... Então, de onde lhe vem tudo isso?’. E ficaram escandalizados por causa dele”.

Os conterrâneos de Jesus, os nazarenos, acham conhecer Jesus, mas na verdade eles não O conhecem na sua profundidade. Não há nada que seja tão perigoso do que a pretensão de saber de tudo. Uma pessoa que tem essa pretensão se fecha em si mesma e deixa de aprender. A humildade sempre nos move a aprender mais para poder partilhar com os demais. “Você sabe? Então, ensine. Você não sabe, então, aprenda”, dizia Confúcio que viver quinhentos anos antes de Cristo. Para ter resultados extraordinários precisamos ter humildade para aprender. A falta da humildade impede alguém de aprender mais e de continuar a crescer e impede alguém de ser irmão do outro. A pessoa que se fecha em si se torna conservadora. Todo conservador não tem futuro, pois não aceita qualquer novidade. Ela acha que não tenha mais nada para aprender. Certamente essas pessoas são os familiares de Jesus; são os mais próximos de Jesus.

Tenho medo de que essas pessoas sejamos nós também. Nós que achamos seguidores de Jesus, frequentadores de cultos ou celebrações, mas não queremos andar ou caminhar atrás de Jesus para segui-Lo. A palavra “seguirsupõe movimento, dinâmica, peregrinação. O verdadeiro seguidor é aquele que sempre olha para aquilo que seu Mestre faz, e escuta aquilo que o Mestre diz e ensina. O verdadeiro seguidor é aquele que mantém a mente e coração abertos, disponíveis, e prestes a renunciar tudo para aprender além do que já sabe ou supostamente sabe. Só seguindo atrás de Jesus é que poderemos ver muito mais coisas na vida e entenderemos o significado de cada coisa e acontecimento. Quem vive dentro de quatro paredes vê sempre as mesmas coisas e por isso, não há surpresa nem novidade. Ao sair do quatro para ir à rua, começam as surpresas para sua vida.

Não é ele o filho do carpinteiro?”.

Os nazarenos reprovam a origem humilde de Jesus. Para eles, Jesus é nada mais do que um simples filho de um carpinteiro. Por ser filho de um carpinteiro, as palavras de Jesus não valem para eles embora nelas se encontrem toda a verdade. É preciso sabermos distinguir quem fala e o que se fala. Se na fala de alguém, mesmo que não gostamos dele, contém verdade, temos que aceitar essa verdade. Jesus nos deu o seguinte critério: “Observai e fazei tudo o que eles dizem, mas não façais como eles, pois dizem e não fazem” (Mt 23,3). Não podemos estar do lado de ninguém e sim do lado da verdade e do amor. Os nazarenos esperam um Messias cheio de glória e poder; um messias misterioso, celestial e transcendente. Mas Deus não encaixa em nossas ideias estereotipadas. Deus cabe no nosso coração, mas não cabe na nossa cabeça, pois o coração sente aquilo que os olhos não veem. O coração compreende quando a mente se tranquiliza. Além disso, é preciso que ouçamos aquilo que alguém diz e não para aquele que o diz.

Os nazarenos preferem a imagem de Deus que eles têm na cabeça ao próprio Deus. Para eles, Jesus é cotidiano demais para ser Deus. Este é o maior perigo para qualquer adepto de qualquer religião ou Igreja: identificar a imagem que tem de Deus com o próprio Deus. Por isso, vale a pena cada um fazer esta pergunta: “A imagem de Deus que você tem será que é o próprio Deus?”. Muitas vezes abandonamos o próprio Deus para ficar com a imagem que achamos que seja Deus. Muitas vezes condenamos os outros a partir da imagem de Deus que temos. Quem sabe que os que se acham crédulos são muito mais incrédulos como os próprios conterrâneos de Jesus.

Um profeta só não é estimado em sua própria pátria e em sua família!”.  E Jesus não fez ali muitos milagres, porque eles não tinham fé. As pessoas da cidade de Jesus (vilarejo de Nazaré), do lugar de seu trabalho não se dispõem de tempo para meditar se ali há um Profeta ou mais que um Profeta. Basta-lhes a vida rotineira. Falta-lhes a fome da verdade. Falta-lhes o discernimento. Falta-lhes a reflexão sobre a realidade. Deus se manifesta no nosso cotidiano sem espetáculo, como o vento que ao vemos, mas sentimos o efeito de sua presença ou de sua passagem. E a novidade do Reino trazida por Jesus suscita neles apenas dúvidas, suspeitas e gozação. É o grande desafio da própria encarnação. É o grande mistério da fé. A fé somente floresce em campos fecundos que se deixam regar com chuva do céu. Os mistérios de Deus somente são compreendidos com coração, pois o coração sente aquilo que a inteligência desconhece.

Ao longo da história tem tido muitas pessoas inspiradas por Deus para denunciar situações injustas e más condutas. Algumas são conhecidas. Mas há muitíssimos profetas anônimos, gente que se atreve a denunciar o que é injusto e desonesto. Muitos desses profetas pagam com a própria vida pela denúncia feita, pois os que defendem os próprios interesses, e não os interesses comuns não têm piedade de eliminar quem os denuncia.

Uma das funções como batizados é a função profética: anunciar o bem e denunciar o mal. Um batizado não pode ficar em silêncio diante da desonestidade e da injustiça. O silêncio nos faz cúmplices. Somos chamados a ser profetas na nossa atualidade.

Não somente somos chamados a denunciar, mas também a ouvir os que denunciam. Quem sabe que dentro dessa denúncia estamos nós também, pois muitas vezes nos sentimos tão cômodos em nossa vidinha tão perfeitamente organizada, em nossas próprias ideias tão formadas e preestabelecidas, em nossa maneira inflexível de entender as coisas, em nossa imagem estática de Deus que nos fazem surdos diante do apelo do Espírito de Deus para fazer e seguir o bem. Se há verdade na denúncia, temos que agradecer a Deus, pois é um chamado para voltarmos a trilhar o caminho do bem. Fé é caminhada. Quando ficamos incomodados, paramos de ter fé. É mais cômodo crer em um Deus todo-poderoso que controla tudo o que ocorre do que em um Deus que sofre com seus filhos, que é crucificado para salvar os outros filhos de Deus, e em um Deus que nos criou para que resolvamos as injustiças do mundo. No ritmo da velocidade do avanço tecnológico precisamos estar atentos para ver e ouvir o que Deus quer nisto tudo. Não tapemos nossos ouvidos nem fechemos nossos olhos nem paralisemos nossa mente. Precisamos tempo todo estar atentos ao que ocorre para que possamos nos posicionar como filhos e filhas de Deus, luz do mundo e sal da terra. Precisamos ter muita flexibilidade e disponibilidade para acolher aquilo que Deus nos quer dizer, inclusive através de quem menos esperamos, pois o Espírito de Deus sopra para onde quer e por quem quer.

Pare e verifique, Deus se manifesta na nossa vida cotidiana. Pergunte-se: “De que maneira Deus se manifesta a mim hoje? O que Ele quer me manifestar? Para que Ele se manifesta?”. Estejamos todos atentos. Em cada momento Deus se manifesta a nós.

P. Vitus Gustama,svd

segunda-feira, 28 de julho de 2025

31/07/2025- Quintaf Da XVII Semana Comum - Ano Ímpar

ESFORÇAR-SE PARA SER SELECIONADO POR DEUS NO FIM DA CAMINHADA

Quinta-Feira da XVII Semana Comum

Primeira Leitura: Ex 40,16-21.34-38

Naqueles dias, 16 Moisés fez tudo o que o Senhor lhe havia ordenado. 17 No primeiro mês do segundo ano, no primeiro dia do mês, o santuário foi levantado. 18 Moisés levantou o santuário, colocou as bases e as tábuas, assentou as vigas e ergueu as colunas. 19 Estendeu a tenda sobre o santuário, pondo em cima a cobertura da tenda, como o Senhor lhe havia mandado. 20 Depois, tomando o documento da aliança, depositou-o dentro da arca e colocou sobre ela o propiciatório. 21 E, introduzindo a arca no santuário, pendurou diante dela o véu de proteção, como o Senhor tinha prescrito a Moisés. 34 Então a nuvem cobriu a Tenda da Reunião e a glória do Senhor encheu o santuário. 35 Moisés não podia entrar na Tenda da Reunião, porque a nuvem permanecia sobre ela, e a glória do Senhor tomava todo o santuário. 36 Em todas as etapas da viagem, sempre que a nuvem se elevava de cima do santuário, os filhos de Israel punham-se a caminho; 37 e nunca partiam antes que a nuvem se levantasse. 38 Pois, de dia, a nuvem do Senhor repousava sobre o santuário, e de noite aparecia sobre ela um fogo, que todos os filhos de Israel viam, em todas as suas etapas.

Evangelho: Mt 13, 47-53

Naquele tempo, disse Jesus à multidão: 47 “O Reino dos Céus é ainda como uma rede lançada ao mar e que apanha peixes de todo tipo. 48 Quando está cheia, os pescadores puxam a rede para a praia, sentam-se e recolhem os peixes bons em cestos e jogam fora os que não prestam. 49 Assim acontecerá no fim dos tempos: os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, 50 e lançarão os maus na fornalha de fogo. E aí, haverá choro e ranger de dentes. 51 Compreendestes tudo isso? ” Eles responderam: “Sim”. 52 Então Jesus acrescentou: “Assim, pois, todo mestre da Lei, que se torna discípulo do Reino dos Céus, é como um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas”. 53 Quando Jesus terminou de contar essas parábolas, partiu dali.

_________________

Deus Caminho Conosco Para a Terra De Liberdade

Em todas as etapas da viagem, sempre que a nuvem se elevava de cima do santuário, os filhos de Israel punham-se a caminho; e nunca partiam antes que a nuvem se levantasse. Pois, de dia, a nuvem do Senhor repousava sobre o santuário, e de noite aparecia sobre ela um fogo, que todos os filhos de Israel viam, em todas as suas etapas”.

Estamos no último capítulo do livro de Êxodo. Começamos o livro de Êxodo com a imagem da opressão pelas mãos de Faraó, símbolo dos poderosos. Agora terminamos o livro com a visão de um povo livre, que marcha, e é protegido e guiado por Javé (Deus) até a terra prometida. Quando caminharmos com Deus e contar com Ele, nossa vida sempre termina na libertação e na liberdade.

Livre” é o conceito contraposto a “escravo”. A liberdade se opõe à escravidão. O homem livre se contrapõe ao escravo. Deus é Libertador do homem. Deus liberta seu povo da escravidão do Egito (Ex 9,5). Esta libertação do povo coincide com sua constituição como povo de Deus e como povo independente. Todos os demais atos libertadores de Deus narrados na Bíblia não são mais que atos continuadores deste grande ato libertador. Os profetas, mais tarde, se convertem nos grandes proclamadores da liberdade e em grandes defensores dos direitos dos pobres, dos débeis, dos explorados. Jesus Cristo aparece como o grande Libertador de todos os homens (Lc 4,19.21: Jo 8,31-39). A atuação do Espirito Santo leva consigo a liberdade (Rm 8,2; 2Cor 3,17; Gl 5,1). Porque somos filhos de Deus, então somos homens livres (Rm 8,21). Se assim é, então temos que lutar para que nada nem ninguém nos escravize. “É para que sejamos homens livres que Cristo nos libertou(Gl 5,1).

A Primeira leitura nos diz que o povo de Israel cumpriu a ordem de Javé. O autor sacerdotal desta narração tem muito presente o Templo de Salomão. Olhando para este modelo nos diz como Moisés edificou o tabernáculo/santuário do deserto e o santificou depositando nele os objetos sagrados da comunidade: a arca com o testemunho da aliança, os pães sagrados, o candelabro, o altar dos perfumes. É a ordem habitual nos templos semitas.

O santuário era o sinal da presença de Javé no meio de seu povo. Por isso, Moisés, o mediador, não terá necessidade de entrar nele. Javé está ali como um a mais que habita e marcha com o povo e compartilha sua luta e sua vida.

Apesar desse cumprimento histórico, nosso relato não deixa de ser uma imagem da plena realização da presença de Deus em Jesus Cristo, a própria Palavra de Deus que se fez homem e plantou sua tenda entre nós e nos permitiu vermos sua glória.

Além disso, no texto da Primeira Leitura fala-se da tenda. Tenda é um abrigo frágil e transportável, que se desmonta para cada partida e se remonta para cada nova etapa, na nova parada. Nesta desmontagem e remontagem Deus sempre faz presente: “Em todas as etapas da viagem, sempre que a nuvem se elevava de cima do santuário, os filhos de Israel punham-se a caminho; e nunca partiam antes que a nuvem se levantasse”. Estas frases querem nos dizer que o Deus de Israel é um Deus que “faz caminho” com seu povo. Ele é invisível, mas está presente. E Ele aceita que os homens materializem um lugar, como santuário, que simbolize Sua Presença. Deus não abandona seu povo por seu infinito amor. Na nossa caminhada diária sempre está presente misteriosamente Deus que nos acompanha. Jamais estamos sozinhos. Estamos bem acompanhados (Cf. Mt 28,20). É sempre bom termos consciência disso. O reconhecimento da presença misteriosa de Deus na nossa caminhada diária nos potencia para encararmos qualquer dificuldade para alcançar nossa liberdade de filhos de Deus. A fé na presença permanente de Deus nos faz crermos no incrível e impossível e nos faz vermos o Invisível no nosso cotidiano e, consequentemente, nos faz realizarmos o impossível. O Corpo de Cristo é a verdadeira presença de Deus entre nós, em todas as etapas da vida, em todos os lugares da terra: “Tomai todos e comei, isto é o Meu Corpo. Tomai todos e bebei. Isto é o meu sangue!”.

O aspecto misterioso da presença de Deus se enfatiza com a presença de “nuvem” e de “fogo”. Deus não se vê. Vê-se somente uma “nuvem”. Deus é misterioso. Na transfiguração, Jesus e seus apóstolos foram também envoltos por uma nuvem luminosa, evocação da divindade. E “... de noite aparecia sobre ela um fogo”. Aqui o “fogo” também é símbolo de Deus. Sabemos que esse “fogo” veio ao coração dos homens: no dia de Pentecostes o fogo encheu a Igreja.

Em todas as etapas da viagem, sempre que a nuvem se elevava de cima do santuário, os filhos de Israel punham-se a caminho; e nunca partiam antes que a nuvem se levantasse”.

A Igreja de Cristo é um povo peregrino, em marcha. Nesta peregrinação Jesus é o Caminho (Jo 14,6). Somos uma Igreja sinodal, pois andamos juntos com Jesus Cristo. Por isso, neste caminho nós nos sentimos acompanhados por Deus em Jesus Cristo. Ele nos enviou Seu Filho, o Deus-Conosco, que “plantou sua tenda entre nós” (Jo 1,14). Pensando na Igreja a que pertencemos, podemos fazer nosso o Salmo 83: “Felizes os que habitam em vossa casa; para sempre haverão de vos louvar! Felizes os que em vós têm sua força, caminharão com um ardor sempre crescente”. Somos povo nômada, mas caminha ao nosso lado o Deus da Aliança, o Deus de Jesus. Mas será que sentimos a presença misteriosa de Deus, mas real na nossa vida diária? Será que captamos os apelos de Deus diariamente?

Esforçar-se Para Ser Contado Entre Os Escolhidos

No fim dos tempos os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, e lançarão os maus na fornalha de fogo”.

Estamos ainda no discurso de Jesus sobre o Reino de Deus em parábolas (Mt 13). Desta vez Jesus conta uma parábola sobre a rede na pescaria em que no fim haverá a seleção entre os peixes bons e os peixes que não prestam: “Quando está cheia, os pescadores puxam a rede para a praia, sentam-se e recolhem os peixes bons em cestos e jogam fora os que não prestam”.

Na vida cotidiana sempre selecionamos e escolhemos o que é bom ou o que é melhor.  Selecionamos boas amizades. Selecionamos algo de bom ou de melhor para comprar, para comer, para morar, selecionamos roupa melhor, e assim por diante. Vivemos selecionando o que é bom ou o que é melhor. O bom ou o melhor é sempre o objeto do apetite ou do desejo do homem, qualquer que seja esse objeto. O ruim é, ao contrário, o objeto de ódio ou de aversão do homem. Mas nem tudo o que desejamos é bom, mas tudo o que é bom sempre desejamos. A bondade atrai, pois ela agrada e edifica. A bondade é a própria perfeição possuída por um ser. Por possuir a bondade, um ser que a tem é capaz de dar a outro a perfeição que lhe falta.

Quando Jesus compara o Reino de Deus a uma rede que é lançada sobre todos, mas que só os peixes bons são selecionados, ele está dizendo que se trata de uma coisa seletiva, em que a bondade é que tem valor e permanece para sempre. A bondade é sinal de amabilidade. Quem ama porque é bom. Quem é bom, ama.  A bondade é algo que em si tem algo divino, pois Deus é a Bondade por excelência. Por isso, a bondade tem uma marca de eternidade.

Os maus, ao contrário, vão fazer parte de outro reino, onde as pessoas somente vão odiar-se, segundo Jesus. A expressão: “Chorar e ranger os dentesmostra bem como é a pessoa que odeia: vive como que rangendo os dentes. Eternamente infeliz. A frustração definitiva do homem (pranto e ranger de dentes) é perder a vida para sempre, perder a salvação eterna. A grande frustração do homem é sua incapacidade de viver na bondade, no bem, na compaixão, na simplicidade, na solidariedade. A bondade atrai. A simplicidade atrai. A arrogância, a prepotência, o orgulho, o complexo de superioridade afasta as pessoas e mata a caridade e a igualdade, elimina a comunhão fraterna e afasta os demais. Qualquer arrogante, prepotente, orgulhoso, ambicioso vive na tremenda solidão. Viver é conviver. Através da convivência saudável é que podemos crescer como seres humanos. Até a própria vulnerabilidade da convivência nos ajuda a crescermos como pessoas saudáveis.

A parábola da rede lida neste dia se refere ao julgamento final. A imagem da pesca ilustra a dinâmica do Reino de Deus feita de perdas e ganhos. Uma vez a rede lançada ao mar, a pescaria já não depende da vontade do pescador. Cada lançada de rede é uma surpresa. A seleção será feita somente no final da pescaria, quando os peixes bons são colocados em cestas, enquanto os maus são jogados fora.

A parábola propõe a todos nós a sorte final, para orientar-nos na decisão presente. Quando soubermos para onde vamos, saberemos também escolher por onde devemos caminhar (saber escolher o caminho). Os únicos que chegam à vida em plenitude, pela misericórdia de Deus, são os que produzem fruto bom nesta vida; os bons; são os que em si tem a marca de eternidade como a bondade, o amor, a compaixão, a solidariedade e assim por diante. Tudo que tem algo divino em mim e na minha vivência será reconhecido por Deus (cf. Mt 25,31-46). A sabedoria cristã consiste no discernimento dos verdadeiros valores do Evangelho como amor, partilha, solidariedade, compaixão, perdão, honestidade, justiça, paz etc., e em sua aplicação para as circunstâncias atuais. Há que estabelecer uma escala de valores para que cada cristão possa orientar sua maneira de viver no presente. Os outros valores devem estar subordinados em função dos valores superiores do Reino de Deus.

Mas ao mesmo tempo, esta parábola quer nos recordar que somente Deus tem a competência na seleção entre os bons e os maus no fim de cada história. Cristão nenhum tem condições para classificar quem vai para o céu e quem não vai para lá, pois sua própria salvação ainda não está garantida, pois ele continua sendo pessoa capaz de pecar em qualquer momento. É preciso olharmos para cada ser humano como filho(a) de Deus e nosso irmão. Como dizia Santo Agostinho: “Amando ao próximo tu limpas os olhos para ver a Deus” (In Joan. 17,8). Quanto mais santo for o homem, mais se reconhecerá como pecador. A conversão não é uma carreira acabada. A conversão é diária, pois somos capazes de optar por outros valores em nome de algum interesse não-cristão. Deixemos Deus determinar a qualidade de cada um e não nos arroguemos pelas qualidades que temos, pois tudo de bom em nós tem sua origem no Supremo Bem que é Deus. Tudo de bom em nós deve ser partilhado para com os outros. Fazemos tudo de bom, porque Deus da bondade faz isso. “Faze o que deves fazer. E faze-o bem. Esta é a única norma para alcançar a perfeição”, dizia Santo Agostinho (In ps. 34,2,16). Somos prolongamento da generosidade do Deus-Criador que criou tudo para o bem da humanidade gratuitamente. Temos apenas o direito de usufruto. Esse direito cessará neste mundo cessará quando terminar nossa caminhada na história.

Deus tem paciência para esperar os frutos bons de cada um de nós. a história é o tempo para crescermos no bem e na bondade e para nos amadurecermos como filhos e filhas de Deus.  Primordialmente, somos bons porque tudo o que Deus criou era bom (cf. Gn 1,1ss). Deus aguarda a colheita, não diminuída por prematuras intervenções de escolha. Só então, no fim, haverá a colheita, com base na realidade de ser grão ou joio/cizânia, peixe bom ou mau, de ser caridoso ou egoísta. É uma advertência eficaz, embora tácita: Deus é paciente com todos e deixa aos pecadores, cada um de nós, tempo para amadurecer sua conversão; Deus sabe esperar a livre decisão do homem, cabe a cada um escolher ser bom grão e bom peixe e não peixe imprestável.

Deus não é bom somente para si mesmo. Deus transborda infinitamente sua bondade para fora de si mesmo, às criaturas. Somos chamados a viver a bondade na nossa caminhada diária. Bondosa é a pessoa que tem boa intenção em relação a nós. Bondosos somos nós quando temos boa intenção em relação aos outros. De uma pessoa bondosa irradia calor e ternura, amor e bondade, caridade e fraternidade. Em seu olhar bondoso e em suas palavras bondosas, sente-se que seu coração é bondoso, que o bem prevaleceu nela.

Se Jesus Cristo passou a vida fazendo o bem, logo cada seguidor/a, cada cristão/cristã deve passar a vida neste mundo fazendo o bem e ser bom para todos.

Portanto, é prudente premunir-se, pensar enquanto é tempo, decidir-se a fazer o bem, ser útil aos outros, ser peixe bom, ser selecionado por Deus no fim de nossa história, pois “No fim dos tempos os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, e lançarão os maus na fornalha de fogo”.

P. Vitus Gustama, SVD

30/07/2025 - Quartaf. Da XVII Semana Comum, Ano Ímpar

DEUS E SUA PALAVRA SÃO NOSSOS TESOUROS QUE RESPLANDECEM NOSSA VIDA COTIDIANA

Quarta-Feira da XVII Semana Comum 

Primeira Leitura: Ex 34,29-35

29 Quando Moisés desceu da montanha do Sinai, trazendo nas mãos as duas tábuas da aliança, não sabia que a pele de seu rosto resplandecia por ter falado com o Senhor. 30 Aarão e os filhos de Israel, vendo o rosto de Moisés resplandecente, tiveram medo de se aproximar. 31 Então Moisés os chamou, e tanto Aarão como os chefes da Comunidade foram para junto dele. E, depois que lhes falou, 32 todos os filhos de Israel também se aproximaram dele, e Moisés transmitiu-lhes todas as ordens que tinha recebido do Senhor no monte Sinai. 33 Quando Moisés acabou de lhes falar, cobriu o rosto com um véu. 34 Todas as vezes que Moisés se apresentava ao Senhor, para falar com ele, retirava o véu, até a hora de sair; depois saía e dizia aos filhos de Israel tudo o que lhe tinha sido ordenado. 35 E eles viam a pele do rosto de Moisés resplandecer; mas ele voltava a cobrir o rosto com o véu, até o momento que entrava para falar com o Senhor.

Evangelho: Mt 13,44-46

Naquele tempo, disse Jesus à multidão: 44 “O Reino do Céus é como um tesouro escondido no campo. Um homem o encontra e o mantém escondido. Cheio de alegria, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquele campo. 45 O Reino dos Céus também é como um comprador que procura pérolas preciosas. 46 Quando encontra uma pérola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela pérola”.

_____________

Quem se Aproxima De Deus Se Torna Próximo Dos Homens

Outra vez Moisés subiu ao monte Sinai para se encontrar com Deus a fim de pedir o perdão pela infidelidade do povo e lá ficou durante quarenta dias e quarenta noites em jejum (Ex 34,28). Durante a conversa com Deus a pele do rosto de Moisés se tornou brilhante, e o povo percebeu isso quando desceu do monte com duas novas tábuas da lei.

Mais uma vez o livro de Êxodo quer ressaltar que Moisés atua de mediador que intercede diante de Deus pelo seu povo e a este ele comunica a Palavra de Deus. Isto quer nos dizer que Moisés é um homem de Deus e um homem do povo, simultaneamente. Ele é próximo dos dois: de Deus e dos homens. Ele é tão próximo de Deus a ponto de ser tão próximo dos homens. Por isso, o Salmo diz dele: “Eis Moisés e Aarão entre os seus sacerdotes... Da coluna de nuvem falava com eles. E guardavam a lei e os preceitos divinos, que o Senhor nosso Deus tinha dado” (Sl 98).

Hoje em dia, ironicamente, com a tecnologia “aproximamos” quem está distante e distanciamos quem está próximo. Com isso deixamos de ser próximos dos outros. A consequência de ser próximo de Deus é ser próximo dos homens. Nunca podemos procurar Deus para fugir dos homens. O próximo é o caminho obrigatório para chegar até Deus.

Quem Contempla Deus Se Torna Reflexo Divino Para Os Outros

Quando Moisés desceu da montanha do Sinai, trazendo nas mãos as duas tábuas da aliança, não sabia que a pele de seu rosto resplandecia por ter falado com o Senhor. Aarão e os filhos de Israel, vendo o rosto de Moisés resplandecente, tiveram medo de se aproximar”, assim relatou o autor sagrado.

No monte Sinai Moisés ficou quarenta dias e quarenta noites em oração, solidão e experiência religiosa. E quando Moisés desceu do monte, com duas tábuas da lei na mão, todos notaram que seu rosto ficou brilhante, resultado da luz de Deus. Isto quer nos dizer que viver com Deus, de modo mais profundo e explícito, durante um tempo prolongado não pode deixar de transformar um homem.

O resto resplandecente de Moisés merece uma contemplação. O melhor que podemos fazer para iluminar os outros é ter um rosto resplandecente. O rosto é a janela que dispomos para revelar aquilo que temos dentro do coração. Podemos esconde algo dentro de nosso coração, mas o nosso rosto vai falar por nós daquilo que sentimos e com algo que nos deixa preocupados. Um rosto iluminado é como um discreto brilho de Deus em meio da noite de nossas palavras. Os rostos resplandecentes nos ajudam a caminhar nas trevas da descrença. Os melhores planos de evangelização são aqueles que ajudam as pessoas a tem um rosto brilhante a fim de iluminar os outros, são os que têm um rosto sereno, alegre e iluminado. Uma das melhores maneiras para comunicar uma Boa Nova é dispor de um rosto iluminado, de um rosto sereno e alegre.

Para que tudo se concretize temos que consagrar também tempo não só para a ação, mas também para a oração e contemplação de maneira pouco prolongada, sem pressa. É preciso mantermos o essencial em nossa vida, gerimos bem nosso tempo para evitar a síndrome do desgaste. Paradoxalmente, a velocidade necessita também de lentidão, pois não é questão de correr com velocidade e sim de saber para onde se vai. Se você sempre faz o que sempre fez, vai sempre conseguir o que sempre conseguiu”, dizia Abraham Lincoln (If you always do what you always did, you will always get what you always got).

Moisés tirou o véu para falar com Deus, isto é, falar com o coração e a alma bem abertos. Como também na sarça ardente, ele se aproximou de Deus sem sandálias, pois o terreno onde ele estava pisando era sagrado. Diante de outras coisas se pode esconder o rosto, mas diante de Deus não. O rosto em oração se transfigura, como aconteceu com Moisés.

Mas Moisés não é somente um homem de oração. Ele também é um homem de ação. Por isso, ele desceu do monte de solidão, de solidão e de experiência religiosa ao encontro dos irmãos. Ele leva a experiência da conversa com Deus para seus irmãos. A maioria dos grandes místicos foram também homens e mulheres sumamente ativos.

Não fiquemos na montanha da oração. Desçamos para o vale da missão e do trabalho. Sejamos ao mesmo tempo pessoas de oração e de ação. Pessoas de Deus são pessoas que se entregam à missão e ao trabalho de evangelização. Um evangelizador é um homem ponte entre Deus e a humanidade. De Deus ele aprende algo sagrado para consagrar a humanidade para Deus, como Moisés que sempre leva o povo para se encontrar com Deus e obedecer às Suas leis.

Nós que entramos em comunhão com o Senhor pela oração e sobretudo, pela Eucaristia logo devemos ser reflexos do Senhor para os outros em nosso modo de atuar na vida.

Deus e Sua Palavra São Nossos Tesouros Incalculáveis

O Reino de Deus é como um tesouro escondido, como uma pérola de incalculável valor”, assim Jesus diz no discurso sobre o Reino de Deus em parábolas no texto do evangelho deste dia. 

As inúmeras guerras, que aconteceram em Palestina, levavam muitas pessoas a enterrar seus tesouros valiosos por motivo de segurança contra os ladrões. E o homem assalariado que trabalha no campo alheio, ao encontrar o tesouro, o enterrou novamente e guardou o segredo. E vende tudo para comprar o campo por esse tesouro valioso. A mesma reação aconteceu com o comprador da pérola: vende tudo para possuí-la. Mas acentua-se a alegria dos dois em fazer isso.

Lemos no dicionário que tesouro é o conjunto de riquezas de qualquer tipo (p.ex., dinheiro, joias, pedras e metais preciosos, bens valiosos) guardadas ou escondidas. E pérola é a concreção densa e de coloração levemente prateada, que se forma nas conchas de diversos moluscos, a partir da deposição de material nacarado sobre uma partícula qualquer, como um grão de areia ou um parasita. As pérolas cultivadas são produzidas por ostras. Pérola é um material valioso. Também nós chamamos uma pessoa de sólidas qualidades morais e éticas de pérola ou de tesouro. “Você é minha pérola. Você é meu tesouro”, assim ouvimos alguém falar para o outro.

Venderam tudo que possuíam para comprar o campo onde o tesouro está escondido e para comprar a pérola preciosa”, assim relatou Mateus no evangelho de hoje. Aqueles homens venderam tudo tão espontaneamente só para ficar com o tesouro ou a pérola preciosa sem sentir nenhum sacrifício, mas com uma decisão alegre por causa de uma coisa valiosa. Tudo o que é bom, belo, digno, ético, puro sempre nos atrai e para nossos passos para contemplá-lo. Uma pessoa com sólidas qualidades éticas e morais atrai a simpatia de qualquer pessoa e atrai a bênção de Deus, pois Deus é o supremo Bem. Ninguém resiste diante da bondade, diante de uma boa educação, diante de uma gentileza e assim por diante. Tudo o que é ruim nos afasta e afasta até a bênção do Senhor toda vez que essa bênção se aproximar da pessoa.

É assim também a fé. A fé é um enamoramento de Deus, é uma sedução: “Você me seduziu, Senhor; e eu me deixei seduzir” (Jr 20,7). Tudo o que é divino e que nos salva sempre nos atrai e nos convida a nos aproximarmos dele. O Reino arrebata quem o encontrou, gera a grande alegria e orienta toda a vida da pessoa até a comunhão plena com Deus. A partir deste tesouro que é O Reino de Deus, todo o resto se ordena e adquire o seu valor próprio. O Reino de Deus começa, então, a orientar a vida de quem o descobriu. A verdadeira fé orienta nossa maneira de viver.

Venderam tudo que possuíam…”. Tanto o tesouro escondido como a pérola preciosa expressam o que o Reino de Deus deve ser ou deve representar para o discípulo/cristão: algo absoluto. O “absoluto” é aquilo que tem em si sua razão de ser, não supõe outro e não se refere a nenhum outro; é aquilo que se basta a si mesmo e não se define por nenhum outro; é aquilo que não admite nem limite nem restrições nem comparação. Por isso, o absoluto é somente Deus e seu Reino. Fora dele é relativo. A partir do “absoluto”, a exigência se torna radical, pois tudo o mais deve ser colocado em relação ao Reino. Em outras palavras, pode-se dizer que a experiência do amor de Deus relativizam todo valor até então conhecido. A partir de então, o valor do Reino serve de ponto de referência e de avaliação para resto. Uma vez que tiver sido descoberto o Reino de Deus em todo o seu valor, o resto se torna relativo no seu valor.

Nesta parábola, nem o homem que encontrou o tesouro nem aquele que descobriu a pérola sentem falta do que antes possuíam e que venderam. A riqueza do que acharam é de tal ordem que compensa tudo o que tinham. A mesma coisa acontece com os que descobrem ou encontram o seu caminho pessoal para Deus: abandonam tudo e encontram tudo, porque Deus é tudo. Quem, pela mensagem de Cristo, encontra Deus renuncia jubilosamente a tudo. Tal verdade somente pode ser experimentada pela própria vida. Por isso, eles podem renovar tudo, acabar com a rotina de sua vida e começam a olhar mais longe e mais alto. E quem encontra Cristo expande a alegria e o otimismo para todos.

A vida cristã se apresenta muitas vezes como um constante exercício de renúncia: renunciar aos bens materiais para não ser possuídos por eles a fim de manter-se livre como seguidor de Cristo; renunciar aos prazeres desenfreados da vida, pois quem vive somente em função do prazer é porque não tem prazer de viver, e quem só sabe se satisfazer é incapaz de satisfazer os outros; renunciar às comodidades, pois a vida continua nos empurrando por dentro; renunciar à ambição. Renunciar, renunciar, renunciar...

Não se deve confundir com o que se chama um caminho de perfeição, um método para chegar a ser santo. O projeto de Jesus não é um projeto dirigido unicamente ao indivíduo e sim orientado para a transformação da maneira de viver de toda a humanidade.

Por isso, quando Jesus apresenta as bem-aventuranças que constituem o núcleo de seu programa não diz àqueles que o escutam que serão mais santos se fizerem tudo que ele fala, e sim que serão felizes. É a felicidade dos homens, de todos os homens e de cada um deles em particular o que preocupa Jesus, porque essa é a principal preocupação do Pai. O projeto de Jesus é a felicidade. A santidade é o projeto pessoal. Por isso, o ideal cristão é a felicidade. Consequentemente, a felicidade é a razão pela qual um cristão atua: um cristão se comporta como cristão porque tal comportamento é causa de alegria para ele e para seus próximos. Em outras palavras, uma ação é boa se produz felicidade em quem a realiza e contribui à felicidade dos demais.

P. Vitus Gustama, SVD

Marta, Maria e Lázaro- Santos, 29 de Julho

SANTOS MARTA, MARIA E LÁZARO

JESUS É A RESSURREIÇÃO E A VIDA          

29 de Julho

Primeira Leitura: 1Jo 4,7-16

7Caríssimos, amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus e todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece Deus. 8Quem não ama, não chegou a conhecer Deus, pois Deus é amor. 9Foi assim que o amor de Deus se manifestou entre nós: Deus enviou o seu Filho único ao mundo, para que tenhamos vida por meio dele. 10Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele que nos amou e enviou o seu Filho como vítima de reparação pelos nossos pecados. 11Caríssimos, se Deus nos amou assim, nós também devemos amar-nos uns aos outros. 12Ninguém jamais viu a Deus. Se nos amamos uns aos outros, Deus permanece conosco e seu amor é plenamente realizado entre nós. 13A prova de que permanecemos com ele, e ele conosco, é que ele nos deu o seu Espírito. 14E nós vimos, e damos testemunho, que o Pai enviou o seu Filho como Salvador do mundo. 15Todo aquele que proclama que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece com ele, e ele com Deus. 16E nós conhecemos o amor que Deus tem para conosco, e acreditamos nele. Deus é amor: quem permanece no amor, permanece com Deus, e Deus permanece com ele.

Evangelho: Jo 11,19-27

Naquele tempo, 19 muitos judeus tinham vindo à casa de Marta e Maria para as consolar por causa do irmão. 20 Quando Marta soube que Jesus tinha chegado, foi ao encontro dele. Maria ficou sentada em casa. 21 Então Marta disse a Jesus: “Senhor, se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido. 22 Mas mesmo assim, eu sei que o que pedires a Deus, ele te concederá”. 23 Respondeu-lhe Jesus: “Teu irmão ressuscitará”. 24 Disse Marta: “Eu sei que ele ressuscitará na ressurreição, no último dia”. 25 Então Jesus disse: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá. 26 E todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá jamais. Crês isto?” 27 Respondeu ela: “Sim, Senhor, eu creio firmemente que tu és o Messias, o Filho de Deus, que devia vir ao mundo”.

___________________

Celebramos hoje a festa de Santa Marta, Maria e Lázaro. Eles é mencionada nos evangelhos de Lucas e de João.

Marta era irmã de Maria e de Lázaro, de Betânia. Ela era uma discípula e seguidora de Jesus Cristo, muito estimada por Ele (Jo 11,5). Marta vivia com seus dois irmãso, Maria e Lázaro, na pequena vila chamada Betânia (Jo 11,1), localizada nas encostas ao leste do monte das Oliveiras. Jesus os visitava frequentemente, quando estava em Jerusalém (Lc 10,38). Jesus estava com eles na semana antes de ser preso e crucificado (Mt 21,17). Marta é conhecida como aquela que estava sempre envolvida e sobrecarregada com os afazeres diários (Lc 10,39-42). Quando seu irmão, Lázaro, ficou gravemente enfermo, enviaram uma mensagem a Jesus para que viesse à casa deles com urgência (Jo 11,3). Marta foi honesta com Jesus ao dizer-lhe que se tivesse vindo imediatamente, seu irmão estaria vivo. Mas exercitou uma fé extraordinária ao identificar Jesus como o Filho de Deus e crer que Ele tinha grande poder (Jo 11,21-27). Jesus honrou sua fé e ressuscotou Lázaro, a fim de manifestar desta maneira a glória de Deus (Jo 11,38-44).

O evangelho nos relatou alguns encontros de Marta com Jesus. O primeiro encontro aconteceu quando Jesus estava indo para Jerusalém e hospedou na casa de Marta (Lc 10,38-42). Nesse encontro Jesus disse a Marta que estava muito ocupada com a preparação de refeição em vez de escutar as palavras de Jesus: “Marta, Marta, tu te inquietas e te agitas por muitas coisas; no entanto, pouca coisa é necessária, até mesmo uma só. Maria, com efeito, escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada” (Lc 10,41-42). Nesse primeiro encontro, Maria, a irmã de Marta, escutava Aquele que era a própria Palavra de Deus (cf. Jo 1,1-3).

A comunidade cristã é fundamentalmente uma comunidade que escuta. Deixaria de ser uma comunidade cristã, se parasse de escutar a Palavra de Deus. Escutar é a primeira forma de fé e de oração, antes que dizer palavras ou entoar cantos. Escuta é a atitude mais cristã.

Silêncio e escuta são duas coisas inseparáveis. Uma não pode existir sem outra. Para escutar bem é preciso ter ou criar o silêncio. Para captar o sentido daquilo que está sendo escutado é indispensável o silêncio. O silêncio fomenta a sinceridade. Tenho que encontrar dentro de mim a verdade sobre a minha vida. O silêncio chega quando as minhas energias começam a descansar. A vida nunca é o que se consegue, pois não se pode ignorar que tudo quanto se alcança, se perde. A vida é o que se é. E só o que se é, permanece.

Outro encontro de Marta com Jesus aconteceu por ocasião da morte de Lázaro, seu irmão, como lemos no evangelho neste dia (Jo 11,19-27). A reflexão sobre esse encontro vamos ver mais adiante.

O último encontro de Marta com Jesus que o evangelho nos relatou aconteceu “Seis dias antes da Páscoa quando Jesus foi para Betânia” (cf. Jo 12,1-8). Nesse encontro Maria, a irmã de Marta, demonstrou seu amor por Jesus de modo peculiar. Enquanto Marta servia a refeição, Maria “ungiu os pés de Jesus e os enxugou com seus cabelos; e a casa inteira ficou cheia do perfume do balsamo” (Jo 12,3). Maria era uma pessoa que amava Jesus acima de tudo e de todos. Ela escolheu um perfume mais caro que tinha. O verdadeiro amor não tem preço. O verdadeiro amor dá tudo que se tem (cf. Jo 13,1). O gesto Maria antecipa a morte de Jesus cujo corpo será ungido (cf. Mc 16,1).

Depois desse três encontros Marta desapareceu dos relatos dos evangelhos. Nenhum documento antigo nos informa sobre seu comportamento durante os dias da Paixão de Jesus e do tempo que seguiu a ressurreição do Senhor até Sua ascensão ao céu.

Lázaro do Evangelho de hoje era o irmão de Marta e Maria (Jo 11,1-12,19), os quais viviam em Betânia. Jesus muitas vezes se hospedou na casa deles (Lc 10,38-41). E tinha uma profunda afeição pelos três irmãos (Jo 11,3.5.33.35). Lázaro, um dia, ficou gravemente enfermo, e suas irmãs enviaram uma mensagem a Jesus a fim de que Ele viesse curá-lo. Ao receber a notícia, Jesus falou que aquela enfermidade não resultaria na morte de Lázaro, e sim resulta na revelação da glória de Deus. “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11,25). Com uma palavra de comando, dirigida para dentro do túmulo onde Lazáro foi enterrado (faz quatro dias no túmulo), Lázaro retornou à vida e saiu do túmulo. No ressurgimento de Lázaro, Jesus denonstrou seu poder divino de dar a vida e prefigurou sua autoridade sobre a promessa geral da ressurreição: “Quem crêm mim ainda que esteja morto viverá”.

Maria, de Betância, era outra irmã de Marta e de Lázaro (Jo 11,1). Como foi dito, os três irmãos estavam entre os amigos mais próximos de Jesus. Maria é descrita na Bíblia como uma mulher muito dedicada ao ministério de Jesus. Ela era uma discípulo com uma profunda fé no Senhor. Ela é vista como uma ouvinte atenta dos ensinamentos de Jesus Cristo.

A Bíblia descreve três eventos nos quais Maria esteve envolvida. O primeiro, encontra-se em Lc 10,38-42. Maria e Marta receberam Jesus em sua casa e a Bíblia diz que Maria “estava sentada aos pés de Jesus e ouvia a sua palavra” (Lc 10,39). “Sentar-se aos pés” aqui significa ser discípulo de um mestre. Logo, Maria era uma das discípulos de Jesus. O segundo evento é narrado em João 11,1-47. Neste texto se relata a enfermidade e a morte de Lázaro, mas que com o poder de Jesus Lázaro voltou a viver apesar de ter estado quatro dias no túmulo. Para Jesus, que é a Vida e Ressurreição, não há nenhuma impossibilidade. O terceiro evento que envolveu Maria de Betânia foi um jantar oferecido em homenagem a Jesus Cristo, ocasião em que Marta o servia. “Seis dias antes da Páscoa, foi Jesus a Betânia, onde vivia Lázaro, que ele ressuscitara. Deram ali uma ceia em sua honra. Marta servia e Lázaro era um dos convivas.Tomando Maria uma libra de bálsamo de nardo puro, de grande preço, ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. A casa encheu-se do perfume do bálsamo” (Jo 12,1-3). Esta unção é o gesto de bondade de Maria para Jesus e o identificou como um sinal da morte iminente de Jesus na cruz, quando seu corpo será ungido com perfumes e colocado no túmulo.

---------------

O episódio da ressurreição de Lázaro, narrado no texto do Evangelho de hoje, começa mostrando a sintonia que reina entre Jesus e a comunidade dos que nele acreditam, representada por Lázaro, Marta e Maria. De fato, esses três representam a comunidade do Discípulo Amado que crescem na fé em Jesus, e as comunidades que aderem a Jesus em todos os tempos.        

Marta representa o tipo de discípulo de Jesus que precisa superar o preconceito da morte enquanto desfecho fatal. Ela crê na ressurreição do último dia, como a maioria dos judeus. Mas Jesus é a Ressurreição e a Vida aqui e agora. Esse é o desafio feito às duas irmãs e a todos nós: Jesus não é a Vida somente depois da morte, mas ele é a Vida em abundância para esta vida e para além dela.

Superado o preconceito diante da morte, Marta se torna missionária porque ela vai chamar sua irmã Maria, que está sentada em casa, recebendo os pêsames da sociedade que nada faz diante das pessoas senão tentar consolar com palavras. “Maria ficou sentada em casa” esta expressão quer dizer que para Maria a morte de seu irmão significa o termino de sua vida. A ideia da morte como fim paralisa a comunidade e a faz permanecer no ambiente da dor, cercada pelos que não tem fé em Jesus. Maria tem de sair dessa casa para se encontrar com Jesus, a Ressurreição e a Vida. Também Maria, abandonando a “casa do desespero”, torna-se missionária porque ela conduz os judeus a Jesus que após o sinal (ressurreição) passam a acreditar em Jesus (v.31).        

Jesus não veio para dar pêsames, e sim para comunicar vida. Após ter agradecido ao Pai, fonte da vida que comunica vida por meio da ação libertadora do Filho, Jesus chama Lázaro à vida. Jesus não veio para prolongar a vida física que o homem possui. Ele veio para comunicar a vida que ele mesmo possui e da qual dispõe: “Assim como o Pai tem a vida em si mesmo, também concedeu ao Filho ter a vida em si mesmo” (Jo 5,26). Esta vida é seu próprio Espírito, a presença Sua e do Pai naquele que o aceita e vive sua mensagem, e esta vida despoja à morte de seu caráter de extinção. Na frase de Jesus “Eu sou a ressurreição e a vida” o primeiro termo depende do segundo: ele é a ressurreição por ser a vida: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (Jo 14,6). A vida que ele comunica, ao encontra-se com a morte, a supera; isto se chama ressurreição.

A ressurreição de Jesus e a nossa ressurreição pela fé em Jesus ressuscitado é a chave de nossa vida cristã. Crer na ressurreição não é somente crer em uma doutrina. Temos que crer na ressurreição com a vida; não somente com a cabeça. Temos que fazer nossa a ressurreição fazendo nosso o juízo de Deus contra o mal. Temos que crer na ressurreição com nossa atitude e nossas obras. Se nós acreditamos realmente na ressurreição, devemos respeitar a vida, a nossa própria e a dignidade da vida dos outros no seu início, na sua duração e no seu fim na história. Quem desrespeita a própria vida e a vida dos outros, nega a ressurreição. Se realmente acreditamos na ressurreição temos que ter certeza de que a vida não termina aqui, pois a vida é de Deus (cf. Jo 11,25; 14,6). Se acreditamos realmente na ressurreição devemos ter certeza de que os que nos precederam estão em comunhão conosco e intercedem por nós como nossos irmãos. Se realmente acreditamos na ressurreição não devemos prolongar nossa tristeza pelo falecimento de nosso irmão/ nossa irmã, nosso pai/nossa mãe, marido/esposa, filho/filha, pois eles apenas voltaram para a casa do Pai (cf. Jo 14,1-6). Se acreditamos realmente na ressurreição, devemos ter certeza de que o amor dos que nos precederam para a eternidade não morre, pois o amor é o nome próprio de Deus: “Deus é amor”, disse são João (1Jo 4,8.16). Em outras palavras, temos que fazer de nossa vida uma ressurreição permanente.

Além disso, crer na ressurreição de Cristo é muito mais que afirmar que Jesus foi tirado por Deus do túmulo; é reconhecer que o projeto de Deus se realiza em cada homem para a vida e não para a morte. Crer na ressurreição é crer no Deus da vida. E não somente isso; é crer em nós mesmos como a verdadeira possibilidade que temos de ser algo de Deus. A ressurreição de Jesus é a primícia de que na morte se nasce já para sempre.

Lázaro voltou à vida por ação de Jesus. Mas sua ação libertadora quer comprometer todos os que o seguem. A ação libertadora de Jesus implica nossa prática de libertação: desamarrar todas as pessoas de todos os laços que as prendem a uma situação de morte. Somos chamados a respeitar e a proteger a vida desde seu início, na sua duração e no seu término, pois a vida é sagrada. Por ser sagrada, a vida não pode ser sacrificada em nome de ninguém. Assim agindo, estaremos continuando o que Jesus fez, a fim de que todos tenham vida em abundância (cf. Jo 10,10).

Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra, viverá”.  A partir da ressurreição do Senhor não vivemos mais para morrer e sim morremos para viver. A vida não pertence mais à morte e sim a morte pertence à vida. 

Para que nossa vida se torne uma ressurreição permanente temos que ter algo divino dentro de nós: amor, pois “Deus é amor” (1Jo 4,8.16). Amar a alguém, do ponto de vista cristão, é equivale a lhe dizer: Tu nunca morrerás. Tu viverás para sempre. Tu estarás em comunhão conosco mesmo de pois de terminar a passagem nesta terra. Com efeito, o homem morre não quando deixa de viver e sim quando deixa de amar. “Ama e faze o que quiseres!”, dizia Santo Agostinho (In epist. Joan. 7,8).  O amor é a vida do espírito. O ódio, portanto, é sua morte”, acrescentou Santo Agostinho (In ps. 54,7). A amabilidade e a bondade estão sempre unidas. “Bons amores fazem boas condutas” (Santo Agostinho: Serm. 311,11,11). 

Quais são as amarras que nos prendem a uma situação de morte? E como nos livrar dessas amarras? Quantas vezes nos comportamos como Maria que consideramos a morte como o fim de tudo (acabou tudo) e esta crença, consequentemente, paralisa nossa vida. Precisamos ouvir e viver sempre aquilo que Jesus nos diz: “Eu sou a Ressurreição e a Vida. Quem crê em mim ainda que esteja morto viverá”. É preciso que voltemos a ser verdadeiros cristãos vivendo na profundidade o que Jesus nos ensinou. Por este caminho superaremos muitas coisas na vida. Com Jesus ressuscitado, a vida não acaba, mas continua. Para chegar a esta verdade nós precisamos recuperar nossa fé em Jesus que é a ressurreição e a vida. É preciso que tenhamos consciência de que a fé na ressurreição é a razão de todas as celebrações e de todos os sacramentos e de todas as atividades evangelizadoras na Igreja. No Credo professamos: “Creio na comunhão dos santos; na remissão dos pecados; na ressurreição da carne e na vida eterna”.

P. Vitus Gustama,svd

16/12/2025- Terçaf Da III Semana Do Advento

O DIZER E O FAZER DO CRISTÃO DEVEM ESTAR EM SINTONIA Terça-feira da III Semana do Advento   Primeira Leitura: Sf 3,1-2.9-13 Ass...