Corpus Christi,20/06/2019
SOLENIDADE DO CORPO E SANGUE DE CRISTO
Primeira Leitura: Gn 14,18-20
Naqueles dias, 18 Melquisedec, rei de Salém, trouxe pão e vinho e,
como sacerdote do Deus Altíssimo, 19 abençoou Abrão, dizendo: “Bendito seja
Abrão pelo Deus Altíssimo, criador do céu e da terra! 20 Bendito seja o Deus
Altíssimo, que entregou teus inimigos em tuas mãos!” E Abrão entregou-lhe o
dízimo de tudo.
Segunda Leitura: 1Cor 11,23-26
Irmãos: 23 O que eu recebi do Senhor foi isso que eu vos transmiti: Na
noite em que foi entregue, o Senhor Jesus tomou o pão 24 e, depois de dar
graças, partiu-o e disse: “Isto é o meu corpo que é dado por vós. Fazei isto em
minha memória”. 25 Do mesmo modo, depois da ceia, tomou também o cálice e
disse: “Este cálice é a nova aliança, em meu sangue. Todas as vezes que dele
beberdes, fazei isto em minha memória”. 26 Todas as vezes, de fato, que
comerdes deste pão e beberdes deste cálice, estareis proclamando a morte do
Senhor, até que ele venha.
Evangelho: Lc 9,11b-17
Naquele tempo, 11b Jesus acolheu as multidões, falava-lhes sobre o
Reino de Deus e curava todos os que precisavam. 12 A tarde vinha chegando. Os
doze apóstolos aproximaram-se de Jesus e disseram: “Despede a multidão, para
que possa ir aos povoados e campos vizinhos procurar hospedagem e comida, pois
estamos num lugar deserto”. 13 Mas Jesus disse: “Dai-lhes vós mesmos de comer”.
Eles responderam: “Só temos cinco pães e dois peixes. A não ser que fôssemos
comprar comida para toda essa gente”. 14 Estavam ali mais ou menos cinco mil
homens. Mas Jesus disse aos discípulos: “Mandai o povo sentar-se em grupos de
cinquenta”. 15 Os discípulos assim fizeram, e todos se sentaram. 16 Então Jesus
tomou os cinco pães e os dois peixes, elevou os olhos para o céu, abençoou-os,
partiu-os e os deu aos discípulos para distribuí-los à multidão. 17 Todos
comeram e ficaram satisfeitos. E ainda foram recolhidos doze cestos dos pedaços
que sobraram.
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Somos Chamados a Partilhar O Que Somos e Temos
Com Os Necessitados
Nesta
solenidade de Corpus Christi lemos o texto do evangelho de Lucas que fala da
multiplicação dos pães. O evangelista Lucas liga a multiplicação dos pães com a
volta dos Doze enviados por Jesus a proclamar o Reino de Deus (cf. Lc 9,1-6). A
intenção de Jesus é retirar-se com seus apóstolos para um lugar tranquilo. As
multidões, porém, descobrem a intenção de Jesus e o seguem. Jesus as acolhe e
anuncia-lhes o Reino de Deus e cura os doentes. Jesus é seus apóstolos são tão
humanos a ponto de abandonar o interesse pessoal em função do bem comum, em
função da salvação da multidão carente de tudo.
Quando o dia
começa a escurecer, os apóstolos se preocupam com a sorte da multidão e falam
para Jesus: “Despede a multidão, para que
vão às aldeias e campos vizinhos procurar pousada e alimento, pois estamos em
lugar deserto” (Lc 9,12). Em Lc a preocupação dos apóstolos não é apenas
com o alimento, mas também com o alojamento da multidão. Mas Jesus ordena aos
apóstolos que eles mesmo alimentem as multidão. A resposta dos apóstolos: “Só temos cinco pães e dois peixes. A não ser
que fôssemos comprar comida para toda essa gente”. Sem fazer outra
pergunta, diante das multidões, ”Jesus
tomou os cinco pães e os dois peixes, elevou os olhos para o céu, abençoou-os,
partiu-os e os deu aos discípulos para distribuí-los à multidão”.
O gesto de
Jesus na multiplicação dos pães e dos peixes é o gesto eucarístico que une o
divino ao humano, que leva o humano ao divino, e que traz o divino ao humano. O
céu e a terra, o divino e o humano se encontram no momento de partilha do que
se tem e de que se é. Quando o divino e o humano se encontram, a abundância de
vida se torna realidade e a exclusão e a discriminação são excluídas.
O Evangelho
de Lucas nos ajuda a tomarmos a consciência deste maravilhoso dom, pois a
multiplicação dos pães que se repartem para as multidões é reflexo da
Eucaristia onde a comunidade cristã assume um compromisso solidário no compartir
o pão, a vida e o amor. O pão é repartido aos pobres de Deus e aos necessitados
do mundo, mas com o espirito fraterno.
Não podemos
realizar o milagre de multiplicar os pães, mas podemos repartir o nosso com os
demais com amor e carinho a partir das possibilidades que cada um tem e até de
sua pobreza. Se fizermos isso, haverá entre nós tanto alimento, tanta
habitação, tanto emprego, tanta cultura, tanta dignidade, tanto calor familiar
e tanta mão amiga.
Na comunidade
em que o fraco, o abandonado, o necessitado, o excluído é amparado, o humilde é
amado, o sábio é respeitosamente ouvido e o culpado é perdoado, lá a celebração
da Eucaristia não precisa falar só do homem, mas o próprio Deus pode se revelar
como o dom de vida para todos.
A experiência
da bondade humana parece ser a condição indispensável para nós percebermos a
bondade de Deus. A partir desta afirmação vem a pergunta: Você é revelação de
Deus? Outros lhe revelam Deus?
O evangelista
Lucas quer transmitir algo mais nesta multiplicação. Não somente Cristo
distribui os dons da bondade do Pai do Céu. O próprio Cristo manda seus
discípulos os distribuírem. No plano humano como no plano divino, o mistério do
Cristo é aquele que, fazendo o bem, torna visível a presença de Deus. Por isso,
que coisa mais divina poder ser distribuidor dos dons de Deus, administrador
dos mistérios de Deus, como escreveu São Paulo: “Irmãos: Que todo o mundo nos considere como servidores de Cristo e
administradores dos mistérios de Deus” (1Cor 4,1). Todo discípulos de
Cristo, cada cristão e cristã é distribuidor, distribuidora da própria graça
divina. Não nos esqueçamos disso!!!
A partir
disso, vem a pergunta: O que é que você distribui na convivência com os demais:
ódio, indiferença, crítica, descontentamento? Ou a bondade, o bem, os dons, os
talentos? O que é que você recebeu de Deus? O que você tem: apenas 5 pães e
dois peixes diante de tanta necessidade? Mas você já entregou a Cristo o pouco
que você tem para que ele possa multiplicá-lo em função do bem comum?
O filho de
Deus, Jesus Cristo foi o SIM de Deus para sempre (2Cor 1,19-20). Jesus foi
entregue por nós. Em cada sacramento, de modos diversos, celebramos sempre esta
palavra definitiva da autoentrega de Deus a nós, e da entrega de Cristo por
nós.
Na
Eucaristia, Deus se encontra com nossa vida mortal, tão desejosa da eterna
imortalidade. Na Eucaristia Deus pronuncia sobre nós Sua Palavra de Vida,
reveste-nos da ressurreição de Cristo e deixa a nós estes angustiados pela
morte, comer da sua imortalidade num convívio sagrado partindo e repartindo o
que se tem e o que se é, como Cristo, Pão da Vida é partido e repartido nos
nossos altares. Na Eucaristia, neste Corpo ferido e neste Sangue derramado,
temos perenemente presente sua última palavra: O SIM de Jesus ao Pai, por nós e
o SIM de Deus a nós, por causa de Jesus.
Consequentemente,
comer a carne e beber o sangue de Jesus significa incorporar-se, fusionar. É
entrar em comunhão de amor e de destino de Jesus. Tomar o Corpo e o sangue,
além disso, é reconhecer a vida do Espírito na carne e no sangue da humanidade,
pois a Igreja é o Corpo místico de Jesus (cf. 1Cor 3,16-17). É a humanidade que
sofre, que busca, que dá a luz ao mundo com dor; a humanidade que se alegra,
que canta e dança. É a humanidade de ricos e de pobres, humanidade de pecadores
e de santos. É a humanidade dos rápidos e dos atrasados em descobrir a graça de
Deus. É a humanidade da humanidade.
A eucaristia
proporciona uma comunhão real de vida e de destino com a pessoa de Jesus. Seu
Corpo nos faz participarmos na ressurreição, nos faz vivermos por Cristo que é
vida para sempre, nos faz convivermos como irmãos, nos leva a vivermos na
igualdade e na fraternidade, na partilha e na generosidade.
A celebração eucarística, o mistério mais sagrado
que a Igreja guarda como seu tesouro será cada vez menos compreendida, se esta
celebração não for feita por uma comunidade viva que se preocupa com a bondade
e o bem de todos e para todos. É na convivência fraterna, na experiência da
generosidade de quem estima e me quer bem, que o mistério da Eucaristia tem sua
plena realização. A missa se torna um espetáculo e um mito se a comunidade
cristã não experimenta a beleza humana da bondade divinamente inspirada. Pouco adianta
pregarmos o divino, se negarmos o humano.
A Comunhão Com Cristo, Pão Da Vida, Nos Leva
a Vivermos Na Fraternidade
A eucaristia é uma ceia fraterna na qual
todos são tratados como irmãos e irmãs. A ceia fraterna não pode ser entendida
sem comunhão fraterna, sem convivência com o Senhor e com os demais comensais
ou com as demais pessoas. É certo que a Eucaristia constrói ou edifica a
Igreja, mas a constrói ou edifica como comunidade que compartilha. Compartilhar
é mais do que repartir o que temos, é mudar nossa forma de pensar e de viver
para fazer possível uma convivência fraterna e solidária. Como dizia João Paulo
II: “Nossa união com Cristo na Eucaristia deve manifestar-se, no dia de hoje,
em nossa existência: em nossas atividades, em nossa conduta, em nosso estilo de
vida e na relação com os demais”. Não é possível celebrar ou participar da
Eucaristia sem a vivencia do amor fraterno, da caridade mútua e da
solidariedade. Um escritor francês disse: “Não se pode crer impunemente”, isto
é, não se pode crer sem que tenha consequências em nossa vida. Não se pode
comungar o Corpo de Cristo sem que tenha consequências em nossa vida. Compartir
o pão com os irmãos, especialmente com os necessitados é comungar com Cristo.
Não tomaremos a sério a comunhão se não tomarmos a sério a vida, a justiça, a
fraternidade e a honestidade.
Comer o Corpo e beber o Sangue do Senhor
significa comer e beber o amor à vida e todo o que se refere à vida: liberdade,
justiça, participação, fraternidade, igualdade. Uma Eucaristia que fica
reduzida a um mero ato litúrgico é uma traição à última Ceia de Jesus da qual
nasceu a Igreja. Trata-se de uma Igreja de irmãos, de apóstolos (enviados), de
testemunhas, de mártires. Comer e beber a carne e o sangue de Jesus significa
alimentar-se e alimentar uma humanidade necessitada de Jesus, Pão da Vida, necessitada
do amor fraterno. É uma humanidade que para poder ser chamada de cristã precisa
fazer desaparecer a injustiça, o ódio, a vingança, a discriminação, o racismo e
assim por diante. Comungar com Cristo é comungar com sua causa. Todos somos
chamados a seguir a Jesus Cristo, a ter fé nele, a caminhar pelo seu caminho.
Todos nós sabemos que em Cristo temos o Caminho, a Verdade e a Vida. Na última
Ceia Jesus nos recomendou: “Fazei isto em minha memória”. Toda Eucaristia é
memorial que faz presente a entrega à morte do Mestre. Na Eucaristia, é o amor
no Filho que se entregou para que possamos ter a vida eterna. Quem descobre o
amor de um Deus que amou tanto os homens (cf. Jo 3,16), experimenta a chamada
para difundir entre os homens este mesmo amor. Não se pode comungar com o gesto
supremo de amor e ao mesmo tempo continua odiando, desprezando os outros.
P. Vitus Gustama,svd
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