O PARAÍSO
COMEÇA A PARTIR
DA CONVERSÃO POR
AMOR AO REI DO UNIVERSO
Primeira Leitura: 2Sm 5,1-3
Naqueles dias, 1todas as tribos de Israel
vieram encontrar-se com Davi em Hebron e disseram-lhe: “Aqui estamos. Somos
teus ossos e tua carne. 2Tempos atrás, quando Saul era nosso rei, eras tu que
dirigias os negócios de Israel. E o Senhor te disse: ‘Tu apascentarás o meu
povo Israel e serás o seu chefe’”. 3Vieram, pois, todos os anciãos de Israel
até ao rei em Hebron. O rei Davi fez com eles uma aliança em Hebron, na
presença do Senhor, e eles o ungiram rei de Israel.
Segunda Leitura: Cl 1,12-20
Irmãos: 12Com alegria dai graças ao Pai, que
vos tornou capazes de participar da luz, que é a herança dos santos. 13Ele nos
libertou do poder das trevas e nos recebeu no reino de seu Filho amado, 14por
quem temos a redenção, o perdão dos pecados. 15Ele é a imagem do Deus
invisível, o primogênito de toda a criação, 16pois por causa dele foram criadas
todas as coisas no céu e na terra, as visíveis e as invisíveis, tronos e
dominações, soberanias e poderes. Tudo foi criado por meio dele e para ele.
17Ele existe antes de todas as coisas e todas têm nele a sua consistência.
18Ele é a Cabeça do Corpo, isto é, da Igreja. Ele é o princípio, o Primogênito
dentre os mortos; de sorte que em tudo ele tem a primazia, 19porque Deus quis
habitar nele com toda a sua plenitude 20e por ele reconciliar consigo todos os
seres, os que estão na terra e no céu, realizando a paz pelo sangue da sua cruz.
Evangelho: Lc 23,35-43
Naquele tempo, 35os chefes
zombavam de Jesus dizendo: “A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de
fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!” 36Os soldados também caçoavam dele;
aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre, 37e diziam: “Se és o rei dos judeus,
salva-te a ti mesmo!” 38Acima dele havia um letreiro: “Este é o Rei dos
Judeus”. 39Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: “Tu não és o
Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!” 40Mas o outro o repreendeu, dizendo: “Nem
sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação? 41Para nós, é justo,
porque estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal”. 42E
acrescentou: “Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado”. 43Jesus
lhe respondeu: “Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso”.
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O texto do evangelho
deste dia pertence
ao relato lucano da paixão de Jesus (Lc
21,1-23,56). O texto lido neste
domingo nos apresenta a realeza de Jesus, princípio de salvação. Do alto do seu
trono que é a Cruz, o Senhor cumpre o julgamento de Deus sobre os inimigos:
perdoa e doa o Reino também aos malfeitores arrependidos. É um Rei que exercita
a sua liberdade no servir por amor até a morte. O Senhor mostra até o fim, até
a morte na Cruz, que seu único poder é amar e perdoar misericordiosamente. A
realeza do Senhor revela a graça e a misericórdia de Deus que não julga nem
condena, mas perdoa e doa a vida pelos irmãos (cf. Jo
15,13). A sua Cruz é
revelação e proximidade de um Deus que é amor gratuito, que em sua misericórdia
se torna próximo para o homem pecador. Com sua morte, Jesus é Cristo e Filho de
Deus, Messias e Senhor, Salvador de todos. Na verdade, Ele está próximo de todo
perdido. Exatamente lá onde tememos a solidão absoluta, descobrimos um Deus que
nos oferece a sua solidariedade e a comunhão com Ele que é a vida: “Jesus,
lembra-te de mim quando entrares no Teu Reino”, disse um dos
malfeitores crucificados ao lado de Jesus. A solidão é o único mal do qual
ninguém pode se salvar por si mesmo.
“Salva-te
a ti mesmo” é o refrão repetido no Gólgota. Esta expressão
representa a suprema aspiração do homem que, movido pelo medo da morte, procura
se salvar desta a todo custo, utilizando a estratégia do ter, do poder e de
fama que são as tres tentações iniciais do deserto (Lc 4,1-11). Mas exatamente
esta “Salva-te a
ti mesmo” com sua ânsia de vida sem freio gera o egoismo, verdadeira
morte do homem como filho de Deus. Trata-se do falso modo de entender a vida e
a morte. Por isso, o nosso
mal radical é o querer salvar a nos mesmos. Jesus, perdendo-se por nós a
fim de nos salvar, o vence. É preciso sair da armadilha da própria expectativa,
que pode terminar na frustração, para colher a perspectiva de Deus a exemplo do
bom ladrão que foi salvo no último minuto de sua vida. O bom ladrão é um malfeitor agraciado pela Cruz de
Jesus.
De modo muito
simples e com
algumas peculiaridades em comparação com
os outros evangelhos,
Lucas relata a crucificação de Jesus, o sacrifício supremo
para a salvação da humanidade.
Através do seu
relato Lucas quer nos
dizer que
Jesus é o mártir, o justo
perseguido iniquamente e Aquele que se mostra misericordioso até o fim. Por isso, Lucas
sublinha bastante a inocência
de Jesus no processo de sua
condenação, no contexto
do processo romano,
para dizer que a responsabilidade
pela condenação
de Jesus recai sobre os ombros dos dirigentes.
Por esta razão
no relato de Lucas quatro vezes Pilatos declara publicamente a inocência de Jesus (Lc 23,4.14.20.22), como também o centurião faz ao pé
da cruz: “Realmente
este homem
era um
justo! ” (Lc 23,47). Apesar disso, por causa de sua bondade, por ser justo, Jesus se oferece como
fonte de salvação para todos aqueles que O encontram no caminho
da cruz. A sua
inocência leva
um dos malfeitores
à conversão total:
“Jesus lembra-te de mim quando entrares
no teu reinado”
(Lc 23,42).
Quantos inocentes,
quantas famílias, quantas pessoas são vítimas de uma calúnia, de um poder, de um interesse político e econômico!
Jesus continua sendo crucificado nestas pessoas.
A cruz de Jesus é uma lembrança permanente
de nossa crueldade
contra todos
os inocentes da sociedade.
Ao relatar a inocência
de Jesus com o reconhecimento
oficial da não-culpabilidade de Jesus,
Lucas quer eliminar
as suspeitas que
haviam contra as comunidades
cristãs que viviam dispersas no Império romano.
Além disto, com
a firmeza de Jesus na prática
da bondade até
o fim e aceita a morte
como justo
sem pactuar com a maldade,
Lucas pretende animar os cristãos
e todos os leitores
a fazerem o mesmo no seguimento
de Cristo. Lucas pretende educar
os cristãos e seus
leitores a serem testemunhas
valorosas de sua fé
a exemplo do supremo
Justo, Jesus Cristo.
Os cristãos devem estar
conscientes de que
a força para levar a cabo sua missão de testemunha começou a habitar
dentro dele a partir
do momento em
que aceitou Cristo
no Batismo.
No relato da Paixão e morte de Jesus havia também
dois outros
crucificados naquela ocasião. Lucas diz apenas que eram
malfeitores, enquanto
Mateus e Marcos
dizem que eram ladrões.
Todos os quatro
evangelistas nos
dizem que Jesus foi crucificado entre outros dois, evidentemente seu modo de ressaltar o fato de que ele foi
crucificado como se fosse um criminoso
(cf. Lc 22,37).
Lucas relata o povo em geral simplesmente
observando. Execuções eram funções
populares e sem
dúvida havia muitas pessoas
presentes nesta. Mas,
nesse relato, eram as autoridades e não o povo, que zombavam de Jesus (cf. Sl 22,6-8). Elas empregam dois epítetos: O Cristo
de Deus e o Eleito/Escolhido. Essas duas
expressões indicam o favor
especial de Deus
e sem dúvida
estas pessoas estavam contrastando palavras que
falavam de favor com
a triste situação
real de Jesus ali
na cruz. Por
isso, a inscrição
“Este é o Rei
dos Judeus” que
foi colocada no alto da cruz era como um insulto final.
No entanto, há ironia
aqui, porque
embora Jesus não
fosse rei nos
termos da expectativa
popular, ele
era, apesar
de tudo, Rei
de Israel (leia o pedido de um dos crucificados no v. 42: ele
usa a expressão
“com teu
reino/
no teu reinado”). A existência do reinado
supõe a existência de um rei. Também é irônico
que essa inscrição
tenha sido o primeiro enunciado
que se escreveu a respeito
de Jesus e, provavelmente, a única coisa que se escreveu
a respeito de Jesus, em toda a sua vida terrena.
De acordo com
Mc 15,32, os criminosos que foram crucificados com
Jesus também o ridicularizaram. A versão de Lucas, entretanto,
é singular pelo
fato de apresentar
a conversa entre
Jesus e um dos malfeitores
e o insulto do outro.
Para esse outro malfeitor,
um Messias que morre na cruz
e não salva
a si mesmo
nem aqueles
que lutaram pela
sua causa,
representa uma insanável contradição. Merece tão-somente ironia
e desprezo. O verbo
escolhido pelo evangelista
é “insultar”, que
tem simultaneamente o sentido do escárnio e da irreverência. Como
sempre, diante
do escárnio, Jesus não
profere nenhuma palavra. Ao contrário, o malfeitor
que vai fazer
algum pedido
a Jesus (conhecido popularmente
como Dimas ou
“bom ladrão”
embora nenhum
ladrão seja bom)
repreendeu o outro pelo
fato de este
aderir aos insultos
a Jesus e diz a seu colega
que suas
sentenças eram justas,
mas a de Jesus, não.
Assim, outra
vez o leitor
recebe a informação de que Jesus é inocente.
“Nem sequer temes a Deus? ”, disse o “bom ladrão” (Lc
23,40). Para a Bíblia,
“não temer
a Deus” é a atitude
do estulto e do ímpio.
“Nem sequer”
parece introduzir um
agravante em
relação aos escárnios
dos chefes e dos soldados.
Diferentemente do primeiro malfeitor, esse
“bom ladrão”
confessa, sem atenuantes,
a sua culpa,
reconhece a inocência de Jesus e a ele faz uma oração
sincera: “Jesus, lembra-te
de mim, quando
entrares no teu
reinando” (Lc 23,42). “Lembra-te de mim”
é uma oração
que, na tradição
religiosa bíblica e judaica,
os moribundos e os homens
perseguidos pela desgraça
dirigem a Deus.
Portanto, através das leituras
deste dia somos convidados
a refletir sobre
a realeza de Cristo.
O Reino de Cristo
não é constituído sobre
a força, a violência,
e a imposição. A realeza
de Cristo se exerce no amor, no serviço,
no perdão e no dom
da vida, mesmo
que sofra injustamente
por causa de tudo isto.
É o Reino de amor.
Onde há amor,
há a paz, a alegria,
a fraternidade, o respeito
mútuo, o perdão
mútuo, enfim,
há o paraíso. Por isso, quando o homem ama, vai ouvir a afirmação
de Jesus: “Hoje tu estarás comigo
no Paraíso”. O Paraíso
é o estado em
que todos
se amam como irmãos,
pois Deus é o
Pai (Mt 6,9-13) e Amor (1Jo 4,8.16).
Lucas quer,
certamente, nos
relatar uma vida
gasta de Jesus, até
o fim de sua
“Caminhada” terrena,
ao serviço do bem
de todos, ao serviço
da construção do Reino
de amor.
Estendamos nossa meditação sobre
algumas mensagens do texto do evangelho
lido neste dia.
1. Jesus Cristo É O Nosso Amigo
Em Qualquer Situação; É Aquele Que Nos Compreende E Nos Perdoa
“Jesus, lembra-te de mim,
quando vieres com
teu Reino”
(Lc 23,42)
O “bom ladrão” chama Jesus pelo nome: “Jesus”. Ele
sabe que com
Jesus pode usar esta intimidade;
sente-o como amigo,
pois chamar alguém pelo nome significa intimidade,
amizade e confiança.
Diante do amigo,
ele se sente seguro
apesar de seu
sofrimento. Tão grande
é a humildade do bom
ladrão arrependido que
nem tem coragem
de pedir de Jesus a salvação. Ele
já se confessou culpado dos atos pelos quais estava sendo crucificado. O que
agora quer
é ser lembrado por
Jesus. Ele não
sabe orar bonito
com palavras
poéticas. Ele
pede a Jesus apenas para
ser lembrado: “Lembra-Te de mim quando vieres no Teu
Reino”. Ele
considera Jesus como amigo que
compreende seu sofrimento. A única
pessoa que
reconhece em Jesus o Rei esperado é este
bom ladrão.
Ele sabia que
sua condenação
pela Corte Romana não
seria seu último
julgamento. Pois ele reconhecia que
teria que prestar
contas a Deus
por seus
atos (cf. 1Cor
5,10). Por isso, ele chamou a atenção
do seu colega
ao lado: ”Nem ao menos temes a Deus?
Recebemos o castigo merecido. E este, nenhum mal fez”. Aqui,
através de sua
honesta confissão
de culpa é que
ele deu seu
primeiro passo
em direção à
salvação. Foi este o ponto
de partida para
a vida eterna.
Com uma solenidade Jesus abriu a boca somente para
o bom ladrão:
“Em verdade, eu te digo, hoje estarás comigo
no Paraíso” (Lc 23,43). O
bom ladrão
foi praticamente o único que Jesus canonizou nesta terra.
Com este
gesto de solidariedade,
Jesus dá a salvação a quem crê e se
converte. Sofrendo e morrendo como homem, sentindo a dor
dos pregos e a humilhação
da nudez, na qualidade
de Filho de Deus,
Ele dirige uma promessa
solene ao ladrão
arrependido: em verdade.
Depois desta expressão
“em verdade”
Jesus sempre diz algo
muito importante.
Jesus também dá segurança
a esse ladrão
arrependido: “Eu te digo”. Aqui,
Jesus não reza, não
pede a Deus, ele
garante: “Eu te
digo”. Já que
o ladrão arrependido confia em Jesus prontamente:
“Jesus, lembra-te de mim”, Jesus também
responde com a sua
pessoa, assegurando-lhe uma vida
de comunhão com
ele: estarás comigo, e logo: “hoje”.
A um pedido
que remetia ao futuro:
“quando entrares
no teu reino”,
Jesus responde, remetendo ao presente: “hoje”. Tudo isto quer nos dizer que não há situação
humana de miséria
e de pecado que
exclua alguém da salvação; também para o malfeitor que
morre por causa
de seus delitos
há esperança de futuro.
O Paraíso começa
a partir do momento
em que
alguém se converter.
Seu passado
se torna, assim,
como as letras
na areia: “Não
relembreis coisas passadas,
não olheis para
fatos antigos.
Eis que
eu farei coisas
novas, e que
estão surgindo; acaso não as reconheceis? ” (Is 42,18-19b). Jesus na cruz não salva a si mesmo, mas os pecadores que
se convertem e confiam nele. Lucas quer nos revelar que Jesus é o Deus misericordioso.
2. Contemplar A Realeza De Cristo É Contemplar O Amor Vivido Até As Suas
Últimas Conseqüências
“Jesus lembra-te de mim
quando entrares
no teu reinado”
(Lc 23,42).
O Reino de Deus é
um serviço
divino ao homem.
A bondade de Deus
tem como objetivo
a libertação total
do homem. Quem
entra neste Reino conhece o que é a liberdade.
E por isso,
este Reino
pede a mudança de coração
e que por
ela desemboca na libertação.
Este Reino
nos oferece a liberdade
do orgulho, da mentira
e do ódio; nos
ensina o caminho
do amor e da verdade;
nos convida para
a luta gozosa
a favor dos irmãos.
Neste Reino nos
é dado o Espírito
Santo que
muda as coisas
impossíveis. Entrar
no Reino de Deus,
que Jesus nos
trouxe, significa entrar no movimento
do amor de Cristo.
Onde há o amor,
reinam a justiça, a paz
e a alegria: “O Reino
de Deus não
consiste em comida
e bebida, mas
é justiça, paz
e alegria no Espírito
Santo” (Rm 14,17).
O evangelista Lucas quer dirigir um apelo aos cristãos das suas
e das nossas comunidades para
contemplarmos o nosso Rei pregado na cruz.
Diante d’Ele
torna-se ridículo qualquer
ambição de glória
de nossa parte,
qualquer vontade
de domínio, qualquer
desejo de alcançar
os primeiros lugares,
de receber aplausos,
elogios e títulos
honoríficos. Do alto
da cruz Jesus indica a todos que quem é o rei que Deus
escolhe: é aquele que
sabe que a única
maneira de dar
glória a Deus
é descendo ao último lugar
para servir o pobre, o excluído,
o abandonado; rei é aquele
que ama
a todos, inclusive
aqueles que
o combatem; rei é aquele
que perdoa sempre,
que salva
e que se deixa
derrotar por amor; rei é aquele serve ao bem e não ao interesse
próprio. A onipotência de Deus
não é a de domínio.
Ele é onipotente
porque ele
ama a todos
imensamente e se coloca sem limites e sem condições a
serviço do homem.
E vimos isso em
Jesus Cristo que
se inclina para lavar os pés dos discípulos
(Jo 13,1-20). Este é o autêntico semblante
do Deus onipotente,
o Rei do Universo.
Por isso,
religião e política
são chamadas
a dialogar, porque
a vida é única
e o homem, religioso
e político, é o mesmo.
É preciso resgatar
o homem de uma vida
sem futuro,
de uma vida sem
amor. Frente
às estruturas que
intentam reduzir o homem
a um produto
em série,
Jesus deixa bem
claro que
leis e estruturas
estão a serviço do homem
e não o contrário.
Diante da escravidão
de buscar o êxito
fácil, tão
freqüente em
nosso tempo,
Jesus propõe buscar o único
êxito que
merece a pena: o do Reino
de Deus; diante
da possibilidade de converter pedras
em pão, Jesus
recorda que não
somente de pão vive o homem, mas também da Palavra
de Deus (Mt 4,3ss).
“Lembra-te de mim” é uma oração que, na
tradição religiosa bíblica e judaica, os moribundos e os homens perseguidos
pela desgraça dirigem a Deus. A única pessoa que reconhece em
Jesus o Rei esperado é este bom ladrão. Ele sabia que sua condenação pela Corte
Romana não seria seu último julgamento. Pois ele reconhecia que teria que
prestar contas a Deus por seus atos (cf. 1Cor
5,10). Por isso, ele chamou a atenção do seu colega ao
lado: ”Nem ao menos temes a Deus? Recebemos o castigo merecido. E este, nenhum
mal fez”. Aqui, através de sua honesta confissão de culpa é que ele deu seu
primeiro passo em direção à salvação. Foi este o ponto de partida para a vida
eterna.
3. Somos
Alertados Sobre A Outra Face Da Misericórdia Divina
“Em
verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo
no Paraíso” (Lc 23,43). “’Hoje’,
que rapidez!;
‘comigo’,
que companhia!;
‘no Paraíso’,
que descanso!”
(Bossuet).
Diante da gozação
feita por um dos malfeitores
Jesus ficou calado. Mas
diante do pedido
de salvação do outro malfeitor: “Jesus lembra-te de mim
quando entrares
no teu reinado”,
Jesus abriu a boca e disse: “Em verdade eu te digo: ainda hoje tu estarás comigo
no Paraíso”. É em
Jesus em quem
se realiza o Hoje definitivo,
o dia da salvação. É verdadeiramente Boa
Notícia, a da salvação. É
verdadeiramente o anúncio da salvação por meio da cruz e da promessa que faz um Rei crucificado. O ministério
de Jesus está em função
do Reino de Deus
desde o início:
“O Reino de Deus
está próximo” (Lc 10,9) até
o final: “Hoje
mesmo tu
estarás comigo no Paraíso”
(Lc 23,43). O diálogo de Jesus na cruz com os dois malfeitores mostra que o arrependimento humano
e o perdão de Deus
são condições
fundamentais do Reino
de Deus. O bom
ladrão foi o último
em reconhecer
o senhorio de Jesus e o primeiro
a entrar no Reino.
Seu reconhecimento
da condição messiânica de Jesus é uma autêntica profissão
de fé.
Porém a partir deste fato,
estaríamos equivocados se, no episódio
dos dois malfeitores,
realçássemos somente a misericórdia
de Deus. Na verdade,
está fortemente presente
também o juízo,
que é a outra
face da misericórdia.
Um pecador
olha para
Jesus na cruz, pede perdão
e é acolhido no Seu reino.
Um outro
pecador olha
o mesmo Jesus na cruz
e o insulta. Por
que um
sim e o outro
não? Este
é o mistério do amor
de Deus e da liberdade
do homem, que
importa sempre recordar,
mas que
não se pode sondar,
a não ser cada um no interior de si mesmo. Diante
da cruz, como
de qualquer outro
gesto de Deus,
os êxitos possíveis
são dois: com o primeiro, para recordar que a misericórdia
de Deus está sempre
disponível; e com
o segundo, para
não esquecer
jamais aquele
santo temor
que nos
torna humildes
e vigilantes permanentemente.
“Em verdade
te digo, hoje
tu estarás comigo
no Paraíso”. Quando
começa o Paraíso?
Onde está ele?
O Paraíso começa
no dia, no momento
em que
o homem se arrepender
e receber o perdão
dos seus pecados.
Não pense que
o paraíso existe tão-somente após a morte. O Paraíso é a promessa que Deus faz a quem confessa Jesus Cristo
como seu
Senhor e a quem
se converte. Onde está este Paraíso? Em qualquer lugar onde
Jesus está, oferecendo seu perdão a quem o
pede.
Ouçamos esta palavra de Jesus na cruz: “Hoje
estarás comigo no paraíso”.
O novo nascimento é o início
de uma vida nova.
É necessário nascer de novo pela fé em Jesus Cristo como nosso Senhor e Salvador. Jesus é a nova
esperança para
quem perdeu a esperança.
Veja a condição do ladrão
arrependido: morrendo por causa
de seus pecados,
e sem ninguém
para ajudá-lo a sair de sua angústia. Ninguém, a não ser Jesus Cristo, o Senhor, o Único é capaz de socorrer o
condenado.
“Jesus, lembra-te de mim, quando entrares
no teu reino”.
É uma oração
simples, mas
profunda porque
sai do fundo do coração.
Muitas vezes nos
preocupamos demais com
a forma de orarmos, como
se pelo fato
de usarmos uma linguagem mais burilada é que
seremos ouvidos por
Deus. Deus
ouve é o coração, não
as palavras. Quando
o pobre publicano orou dizendo: ”Senhor Deus, tem piedade de mim,
pecador”, suas
palavras comoveram o Senhor.
A história do ladrão arrependido é a mesma
de cada um
de nós: quem
de nós não
foi malfeitor algumas vezes? Quem,
alguma vez, não
truncou a vida de algum
irmão: com
o ódio, as calúnias,
as maledicências, as injustiças, as fofocas,
os comentários maldosos?
Quem de nós
não provocou pequenos
ou grandes
desastres na sociedade,
na comunidade e na família,
na Igreja? Se estivéssemos sozinhos, o nosso
caminho nos
conduziria ao desespero. Mas está presente Jesus Cristo que nos acompanha e, por
isso, o nosso
caminho terminará com
certeza no paraíso.
E feliz qualquer
um de nós
que confessa que
Jesus Cristo é o seu
Senhor, o seu
Rei. Ele
está no Paraíso.
4. O Bom Ladrão Nos Ensina A Olharmos Para Cristo Com Esperança
O ladrão arrependido é um bom modelo na conversão. Ele nos ensina a não perdermos a esperança
em Deus apesar de nossos pecados, de nossas limitações, de nossas falhas na vida.
Ele nos
ensina a olharmos
para o Cristo
com olhos
profundos, inspirados pelo
Espírito de Deus,
com a convicção
de que esse
Cristo Jesus nos
está abrindo o caminho do Reino e todos nós que nos incorporamos a Ele
somos chamados a seu mesmo destino de vida e de realeza.
No Pai-nosso podemos dizer
hoje com
maior expressividade as palavras que
tantas vezes repetimos: “Venha a nós o Vosso Reino!
”.
Olhando para a Cruz
entendemos o que quer
dizer que ele nos
precedeu, que ele
é nosso Caminho
e nossa Vida.
Deixemo-nos invadir pelo amor de Jesus para podermos
passar de nossa
pequena vida
ao Paraíso. Viveremos no paraíso quando mantivermos
nossa fé em Jesus Cristo e fixarmos nosso olhar para Ele.
Somos chamados a crer profundamente
nesse Rei crucificado. Porém,
crer não
consiste unicamente em afirmar
que Deus
existe. Crer significa seguir
a Jesus como Senhor,
comunicar e edificar seu Reino,
acompanhá-lo nos sofrimentos,
reconhecê-lo como crucificado entre malfeitores
e ressuscitado no Paraíso definitivo. O poder, o ter e o prazer são ídolos de todos os tempos.
Mas o Rei crucificado nos convida a transformarmos o poder
em vocação
de serviço, o ter
em uma convocatória à solidariedade, e o prazer em uma chamada
ao amor gratuito,
preferencialmente aos mais necessitados. Se o Reino
de Deus estiver dentro
de nós e nos
deixarmos inspirar por
ele, sem
dúvida nenhuma, nossos
pés, nossas mãos,
nosso pensar
e sentir serão
atraídos pelos gritos
e silêncios da humanidade.
P. Vitus
Gustama,SVD
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