SOMOS PEREGRINOS NESTE MUNDO RUMO À
ETERNIDADE
XXXIII DOMINGO COMUM ANO “C”
Primeira
Leitura: Ml 3,19-20a
19 Eis que virá o dia,
abrasador como fornalha, em que todos os soberbos e ímpios serão como palha; e
esse dia vindouro haverá de queimá-los, diz o
Senhor dos exércitos, tal que não lhes deixará raiz nem ramo. 20ª Para vós, que temeis o meu nome,
nascerá o sol da justiça, trazendo salvação em suas asas.
Segunda
Leitura: 2Ts 3,7-12
Irmãos: 7Bem sabeis como deveis seguir o nosso exemplo, pois não temos
vivido entre vós na ociosidade. 8De ninguém recebemos de graça o pão que
comemos. Pelo contrário, trabalhamos com esforço e cansaço, de dia e de noite,
para não sermos pesados a ninguém. 9Não que não tivéssemos o direito de
fazê-lo, mas queríamos apresentar-nos como exemplo a ser imitado. 10Com efeito,
quando estávamos entre vós, demos esta regra: “Quem não quer
trabalhar, também não deve comer”. 11Ora, ouvimos dizer que entre
vós há alguns que vivem à toa, muito ocupados em não fazer nada. 12Em nome do
Senhor Jesus Cristo, ordenamos e exortamos a estas pessoas que, trabalhando,
comam na tranquilidade o seu próprio pão.
Evangelho:
Lc 21,5-19
Naquele
tempo, 5algumas pessoas comentavam a respeito do Templo que era enfeitado com
belas pedras e com ofertas votivas. Jesus disse: 6“Vós admirais estas
coisas? Dias virão em que não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído”.
7Mas eles perguntaram: “Mestre, quando acontecerá isto? E qual vai ser o sinal
de que estas coisas estão para acontecer?” 8Jesus respondeu: “Cuidado para não
serdes enganados, porque muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Sou eu!’ e ainda:
‘O tempo está próximo’. Não sigais essa gente! 9Quando ouvirdes falar de
guerras e revoluções, não fiqueis apavorados. É preciso que estas coisas
aconteçam primeiro, mas não será logo o fim”. 10E Jesus continuou: “Um povo se
levantará contra outro povo, um país atacará outro país. 11Haverá grandes
terremotos, fomes e pestes em muitos lugares; acontecerão coisas pavorosas e
grandes sinais serão vistos no céu. 12Antes, porém, que estas coisas aconteçam,
sereis presos e perseguidos; sereis entregues às sinagogas e postos na prisão;
sereis levados diante de reis e governadores por causa do meu nome. 13Esta será
a ocasião em que testemunhareis a vossa fé. 14Fazei o firme propósito de não
planejar com antecedência a própria defesa; 15porque eu vos darei palavras tão
acertadas, que nenhum dos inimigos vos poderá resistir ou rebater. 16Sereis
entregues até mesmo pelos próprios pais, irmãos, parentes e amigos. E eles
matarão alguns de vós. 17Todos vos odiarão por causa do meu nome. 18Mas vós não
perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça. 19 É permanecendo
firmes que ireis ganhar a vida! ”.
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I. Tudo o Que É Humano Tem Seu Fim Neste Mundo
“Vós admirais estas coisas? Dias virão em que não ficará pedra sobre
pedra. Tudo será destruído” (Lc 21,6).
Estamos quase no fim do Ano litúrgico, porque depois do domingo que vem,
ó último domingo do tempo comum (XXXIV Domingo) entraremos no Primeiro Domingo
do Advento, o início do Ano Novo na liturgia (Ano Novo civil começa no dia 1 de
Janeiro).
Para os gregos, o tempo tem um caráter cíclico: séculos e anos
parecem girar em círculo, inevitavelmente trazendo de volta os mesmos eventos
ou sucessões das estações. Portanto, substancialmente, nada de novo deve ser
esperado.
O homem bíblico, pelo contrário, considera
a história como uma trajetória horizontal; o tempo se desenrola linearmente, a história progride,
sob a guia de Deus, em direção a um fim bem definido. Portanto, ela
nunca se repete da mesma maneira, como ninguém toma banho duas vezes na mesma
água corrente em um rio, mas está aberta à novidade, ao inesperado, à
esperança.
O presente e o futuro são duas categorias que se destacam de alguma
forma neste penúltimo domingo do ciclo litúrgico. Os "arrogantes e ímpios"
do presente serão arrancados no Dia de Yahweh, enquanto os "adeptos ao meu
nome" (“que temeis o meu nome”)
serão iluminados pelo sol da justiça (Primeira Leitura). As tribulações e as
desgraças ou os infortúnios do presente não devem perturbar a paz dos cristãos,
porque, pela sua perseverança na fé, eles receberão a salvação futura (Evangelho).
São Paulo convida os tessalonicenses a imitá-lo na sua dedicação ao trabalho de
evangelização, durante a presença aqui na terra, para depois receber no mundo futuro
a coroa que não murcha (Segunda Leitura).
Todo homem, goste ou não, está inscrito no registro de dois mundos
diferentes. Um é o mundo presente, a terra sobre a
qual andamos e o ar que respiramos, um mundo passageiro, selado por limites e
expirações. O outro mundo é o mundo em que reinam o sempre e o
infinito, o mundo futuro para o qual o homem e a história se
dirigem. O interessante é que esses dois mundos se seguem cronologicamente, mas
sobretudo se cruzam e se entrelaçam na vida dos homens. Kronos
(tempo medido pelos
segundos) e Kairós (tempo
de Deus, tempo da graça, tempo oportuno) estão juntos. A encarnação de
Deus em Jesus Cristo transforma o Kronos
em Kairós. A encarnação de Deus em
Jesus Cristo torna nosso tempo divino. Consequentemente, no tempo humano
(kronos) habita o divino (Jo 1,14). No mundo presente em que vivemos não
podemos deixar de pensar no futuro, e no mundo futuro não podemos esquecer o
presente em que devemos trabalhar para salvar o mundo, pois “Quem não quer trabalhar, também não deve comer”. As vicissitudes da história,
seus conflitos e suas tristezas nos remetem quase inexoravelmente para o
futuro. A alegria e a plenitude do mundo futuro exigirão nosso interesse porque
todos os homens deste mundo podem alcançá-lo. Como cidadãos do presente devemos
estar ocupados e dedicados à tarefa do progresso, da justiça, do progresso do
humanismo e da solidariedade, do crescimento dos valores. Como cidadãos do
futuro, devemos buscar o estabelecimento do Reino de Cristo e a santidade dos
cristãos. O presente em
que vivemos é uma tarefa de escolha e renúncia para a salvação, pois somente
assim o futuro será um tempo de posse e alegria. O presente é um tempo de
ideais e realizações, o futuro será de encontro e intimidade. O presente é um
tempo de constância na luta, o futuro será de descanso em paz. O presente é um
tempo de esperança na fé e no amor, o futuro será cheio de triunfo do amor
perfeito. Dois mundos diferentes, mas não distantes, pois unidos no coração do
homem. Dois mundos em que o cristão deve viver ao máximo, honrando seu nome
como filho de Deus.
Pensa-se muitas vezes que se deve viver o presente de olho no passado,
para aprender com ele, pois "a história é a mestra da vida". Não se
pode negar que isso seja verdade. É preciso salientar, no entanto, um aspecto
de nossa fé cristã. É preciso viver o presente como quem já percorreu o caminho
da vida e com os olhos postos no mundo futuro. É viver o presente com uma visão
do futuro. A vida é sempre para a frente. É claro que as perspectivas e a forma
de viver o presente seriam muito diversas. Isso é verdade na vida do homem: se
fosse possível viver vinte anos na perspectiva dos sessenta, sem dúvida seria
vivido de forma diferente. Perguntemo-nos: Desde a eternidade, como você
gostaria de viver hoje, essa situação familiar, esse momento pessoal de crise,
esse relacionamento afetivo, esse ambiente de trabalho? Esse futuro cria uma
distância entre nós e nosso presente e, ao criar distância, nos permite ver as
coisas com maior paz e objetividade. Esse futuro nos coloca no mundo de Deus e
assim nos dá o poder de pensar nas várias situações do presente e da vida com a
mesma maneira de pensar de Deus. Do futuro conhecemos melhor e sabemos aplicar
com maior precisão e coerência ao presente a regra da nossa fé e a medida da
nossa conduta. Não é necessário cair na utopia, mas basta uma centelha de
futuro em nosso presente para acender a alma com novo ardor e entusiasmo. É
preciso olharmos com carinho e verdade para aquilo que estamos fazendo no
presente e projetemos para o futuro a fim de perceber logo o que vamos nos
tornar a partir disto tudo. Se plantamos milho, o milho será colhido. Não se
colherão uvas se plantarmos arroz. Se vivermos esperando que a água vai se
transformar em leite, só encontraremos decepção. Muitos de nossos problemas no
futuro têm origem naquilo que fazemos no presente. No futuro seremos aquilo que
somos no presente, inevitavelmente. O maravilhoso sobre o ser humano é que
podemos escolher como agir em qualquer dado momento e ao mesmo tempos nós
mesmos somos responsáveis pelas consequencias deste agir. Somos tão bons agora
mesmo, como poderemos ser. Se não temos como modificar nossa conduta ou nosso
agir, mudemos, então, de padrão. Se nos surpreendemos agindo de uma maneira que
não nos agrada, podemos optar por mudar sem medo em função de nossa felicidade
e salvação. Deus nos ama,
mas também exige fidelidade ao seu amor até as últimas consequências. E devemos
estar cientes de que essa fidelidade pode nos trazer problemas e até
perseguições.
II. Nesta Vida Tudo É Caduco: Somos Chamados A
Abraçar Aquilo Que É Eterno Para Sermos Eternos
“Vós admirais estas coisas?
Dias virão em
que não
ficará pedra sobre
pedra. Tudo
será destruído”, diz o Senhor (Lc 21,6).
Para um judeu, o Templo era o compêndio de sua
fé e a razão
mais clara
de sua existência
como povo,
é a materialização da aliança entre esse povo e o Deus que o escolheu para ser o depositário de Sua vontade. O Templo de Jerusalém era
para um judeu a segurança. O sentimento de segurança é um dos mais
estimados pelo homem.
E concretamente em
suas relações
com Deus.
Enquanto o Templo
estivesse ai, o judeu saberia como teria que viver.
A admiração da beleza
do Templo por
parte de alguns
(Lc 21,5) provoca a chamada de atenção de Jesus a cerca
do futuro do Templo:
“Vós admirais estas coisas? Dias
virão em que
não ficará pedra
sobre pedra.
Tudo será destruído”, diz o Senhor (Lc 21,6). Jesus adverte aos cristãos
que tudo que
é humano, nesta terra,
mesmo o fruto do fervor religioso, como o templo, é caduco.
Tudo perecerá. A recordação da caducidade tem como
finalidade de nos
chamar à urgência
da conversão. Se tudo é caduco,
se tudo tem seu
fim, nós
somos chamados, então, a amar
aquilo que
é eterno. Talvez possamos expressar
isto nas palavras
de Santo Agostinho: “Cada homem
é aquilo que
ama. Se tu
amas as coisas
da terra, és terra. Se amas a Deus, não tenhas medo de dizer és Deus. Pois amando a Deus nos tornamos divinos;
amando ao mundo nos
tornamos mundanos. O amor ao mundo
corrompe a alma; o amor
ao Criador do mundo
a purifica” (cf. Serm.
121,1;142,3,3; In epist. Joan. 2,2,14).
O evangelho deste dia quer nos dizer que se o mundo
tem um fim
é porque o mundo
não é Deus.
Nada do que
há no mundo é Deus.
A fé no Deus
eterno nos
liberta dos ídolos.
Porém, o anúncio
sobre o fim
de tudo não
é uma notícia para
intimidar os cristãos.
Este anúncio
de Jesus pertence ao Evangelho e por
isso, é Boa Notícia.
Não há notícia
melhor do que
a de saber que
tudo tem o fim
e que o mundo
com seu
sistema e os que
se acham poderosos deste mundo passam, que
não são
“deus”. Se a vida
que é o dom
de Deus, tem um
fim, todo
nosso modo
de viver pesa
para este fim. Por isso, cada cristão e cada homem de boa vontade
são chamados à responsabilidade
pessoal e comunitária.
A nossa vida
não pode ser um ficar de braços cruzados
a olhar para o céu, mas um compromisso sério e empenhado de modo
que possa surgir
o mundo novo
da justiça, do amor
e da paz. Temos que
descobrir na história
a Palavra de Deus
que nos
chama a ir adiante, ao encontro
de Deus de amor.
Se Jesus Cristo venceu a morte,
o cristão não
tem mais nenhuma razão
de ter medo. Se o mal avançar, a confiança em Deus deve avançar também porque Deus sempre
terá a última palavra
e não o mundo.
Ele convida os cristãos
a olharem para a história
para decifrar seus sinais, e reconhecer a presença de Deus, pois tudo que
acontece neste mundo está sempre sob o olhar de Deus. O que importa para uma comunidade cristã é a vivacidade
de esperança. É a esperança
que arranca o homem
de uma existência sem
futuro e sem
expectativas. A tristeza
e o desânimo são
um sinal
da ausência de uma verdadeira esperança cristã que
no fundo provém de uma falta de fé.
A caducidade de tudo
nesta vida abre, então,
para os cristãos
a perspectiva que
tem sua origem
na realidade de Deus.
O homem que
acredita em Deus
prefere sempre cumprir
a vontade de Deus
a viver numa vida
tranqüila. O homem
que acredita em
Deus é um
homem perseverante, isto
é, aquele que
é capaz de resistir
diante de cada
dificuldade por
causa de um objetivo que ele quer alcançar: a felicidade
eterna. O homem que acredita em Deus é um
homem de esperança. A esperança está sempre diante do homem que faz o homem sempre
anda para o futuro. A capacidade de resistir precisa
haurir a confiança em Deus, confiança que tem que ser sempre renovada na oração.
Temos que a aprender
a renunciar a nossas próprias idéias
para deixar lugar à vontade
de Deus. Como
cristãos rezamos sem
cessar, pedindo a graça
da perseverança final. Estamos, todavia, conscientes
de que isto
leva consigo
a disponibilidade para
mudar ou para se converter, porque estamos conscientes
de que a nossa
fidelidade é continuamente posta à prova e de que está exposta
a contínuas tentações. Podemos ser tentados tanto do
exterior (escândalo)
como do interior.
É precisamente no momento
da tentação que
entra em ação
a capacidade de resistir.
A fé no amor
de Deus faz com
que cada
cristão seja capaz
de resistir em
momentos de provação
e de luta contra
os sintomas do cansaço
humano. Aquele
que estiver aberto
à capacidade de resistir
e rezar com
perseverança para a alcançar,
poderá dizer com
o Apóstolo Paulo: “Tudo
posso n´Aquele que me
dá força” (Fl 4,13).
III. No Tempo Curto De Sua Presença Terrena O Homem É Chamado A Servir
Por Amor Para Alcançar A Felicidade Plena
O homem da Bíblia,
como foi dito anteriormente, considera a história
como uma trajetória
horizontal; o tempo
tem um desenvolvimento
linear, a história
caminha, progride, sob
a guia de Deus
até a um
término bem definido. Por isso é que não se repete jamais,
da mesma maneira,
sem que
esteja aberto à novidade,
ao inesperado, à esperança. O evangelista
Lucas, especialmente, faz uma leitura da história
a partir do futuro,
a partir do fim,
a partir do encontro
derradeiro com
Deus. Para
Lucas há um ponto
final ao que
converge a história e todas as coisas sob a providência divina: “Vós não
perdereis um só
fio de cabelo
da vossa cabeça”
(Lc 21,18). A história é uma representação
sob o atento
olhar de Deus.
Consequentemente, o homem bíblico é o homem
esperançoso, homem
que, acreditando em
Deus, Criador
do Universo, anda
com muita
certeza rumo
ao seu destino
bem definido:
a comunhão plena
e eterna com
Deus. Por
causa desta certeza
o homem bíblico serve a Deus através do
bem praticado alegremente,
pois servindo a Deus
no próximo (cf. Mt 25,40.45) ele alcança
a felicidade completa,
como rezamos na Coleta
deste dia: “Fazei, Senhor nosso
Deus, que
a nossa alegria
consiste em Vos
servir de todo
o coração, pois
só teremos felicidade
completa, servindo a Vós,
o Criador de todas as coisas”.
Portanto todos são
chamados a descobri Deus presente
com atuação
salvadora na história acima das guerras
que continuamente destroem o ser humano, acima dos terremotos
e fome que
acompanham a vida do homem, acima
das perseguições que o cristão suporta por
causa da fé
no amor de Deus
que salva.
Não são
os cataclismos e desastres
cósmicos do final, como
descrevem as leituras deste dia, que fazem mudar nossa conduta para superar
a tibieza espiritual,
mas cada
dia é momento
oportuno para
a mudança, pois
sempre é o dia
propício, o tempo
apto para honrar o nome
do Senhor, nosso
Criador vivendo aquilo
que é essencial
para a nossa
salvação: o amor fraterno:
“Não devais nada
a ninguém, a não
ser o amor mútuo, pois quem ama o outro cumpriu a Lei.
... A caridade não
pratica o mal contra
o próximo. Portanto,
a caridade é a plenitude
da Lei” (Rm 13,8-10; Cf. 1Cor 13,1-13; 1Jo 4,7-21).
A partir das palavras
de São Paulo acima
citadas não podemos nos esquecer
que a autenticidade
de nossa fé
se mede pela nossa
doação aos irmãos
no amor, com amor e por amor. Este
é o teste para cada cristão.
Uma comunidade
cristã introvertida e narcisista que só pensa em si, já não seria a Igreja
de Jesus e sim um
círculo de homens
que coincidem em
seus egoísmos.
Constituir-se em Igreja
é comprometer-se a servir. Ser
Igreja não
é ser sócio de uma entidade religiosa
na qual nos
é oferecida a segurança para
o tempo e a eternidade,
prévio pago
de certas imposições.
Ser Igreja é construir com outros cristãos
e outros homens
de boa vontade uma fraternidade
em que
todos comunguem com
a mesma esperança
e estão dinamizados pela mesma força que os potencia para dar-se
aos demais.
IV. Somos Testemunhas De Cristo Neste Mundo
“Sereis presos
e perseguidos por causa
do meu nome.
Esta será a ocasião em
que testemunhareis a vossa fé. É
permanecendo firmes que
ireis ganhar a vida”,
diz o Senhor (Lc 21,12-13.19).
Apesar de ser inspirado sobre
Mc 13, Lucas aproveita o discurso para projetar sua própria visão
da história da salvação em três momentos:
a destruição de Jerusalém, o tempo da missão
da Igreja e a vinda do Filho
do Homem (Parusia) que trará a plenitude
do Reino de Deus.
Entre
Pentecostes e o fim da história reside, então, o tempo da Igreja. Esta Igreja, agora com mais de vinte séculos de existência, vive no
presente esforçando-se por ser fiel aoss ensinamentos de Cristo e olha para o
futuro com esperança. Jesus Cristo não poupou esta Igreja de tribulações. Mas
também não foi mesquinho com as consolações. Em sua história passada e
presente, vemos inúmeros homens e mulheres fiéis ao seu Senhor e, ao mesmo
tempo, deserções, falsos mestres, apostasia e traição. Ao longo dos séculos, em muitos lugares onde não havia
paz, cristãos santos semearam paz e harmonia entre os povos. Mas também houve cristãos, nesses mesmos
séculos, que espalharam discórdia, guerra, revolução e discórdia dentro das
famílias, entre os grupos humanos e entre as nações. Ao longo da longa
história do cristianismo, houve reis e governantes cristãos, extremamente
santos, que governaram muito bem do ponto de vista cristão. Porém, ao lado
deles, houve, e continua a
haver, reis e governantes que perseguiram seus irmãos e irmãs na fé por razões
políticas ou ideológicas. Durante três séculos, com diferentes graus de
intensidade, perseguiram o cristianismo como uma religião ilícita e
consideraram os cristãos ateus por não adorarem os deuses do Império. O tempo
da Igreja tem sido, e continuará a ser, assim até o fim: um tempo de tribulação
e um tempo de consolação e paz. Esta é a Igreja em que vivemos, que amamos e na
qual trabalhamos pelo Reino de Deus!
“Sereis presos e perseguidos por causa do meu nome. Esta
será a ocasião em
que testemunhareis a vossa fé. É
permanecendo firmes que
ireis ganhar a vida”.
A palavra “testemunhar/testemunho/testemunha”
é uma das palavras preferidas por Lucas, especialmente
nos Atos
dos Apóstolos. Na parte
central dos grandes
discursos que
dão ritmo a Atos,
Pedro repete: “Nós somos testemunhas” (cf. At 2,32;3,15;10,41). Ser
testemunha era
a identidade dos discípulos
de Jesus. O anúncio da palavra de Deus
e o testemunho de vida
são palavras-chaves e inseparáveis na obra
de Lucas, de modo especial
na segunda obra
(Atos dos Apóstolos).
Testemunhar significa provar
com a própria
vida aquilo
que se fala
e se professa e no que
se acredita, assumindo todas as conseqüências.
Mas não se trata de
testemunhar uma idéia,
um conjunto
de verdades; o conteúdo
do anúncio não
é teoria nem
sistema, mas
trata-se de testemunhar o próprio
Jesus Cristo Ressuscitado. Por isso, o anúncio pode ser feito por todos e para todos, porque não pressupõe nem
culturas nem
diplomas. Sendo o próprio
Jesus Cristo, é suficiente
tê-Lo encontrado como aquele que dá sentido a toda
a vida. Para anunciar Jesus Cristo
Ressuscitado não se requerem qualidades específicas, mas
uma fidelidade. Testemunhar Jesus é provar
com a própria
vida que
é ele o sentido
profundo de nossa
vida e da vida
do mundo. Cada
cristão, através
da vivência dos valores
ensinados por Cristo,
deve ser uma resposta
de Deus na história
humana para aqueles que
perguntam sobre Deus.
Se Jesus é a última palavra
do Pai, o cristão
deve ser a expressão
ou palavra
de Jesus para os outros,
como na criação
do universo, o homem
é a última palavra
de Deus, palavra
que a tudo
completou (cf. Gn 1,26-30). Somente assim acontecerá na história
humana o surgimento
de um mundo
novo.
V. Trabalhar Pela Dignidade Humana Também É A Expressão De Nossa
Vigilância
“Quem não
quer trabalhar,
também não
deve comer” (2Ts 3,10).
O homem trabalha
para viver e não vive somente para trabalhar, sendo escravo da própria
atividade ou
fazendo os outros escravos
da mesma. O trabalho enobrece o homem
por mais
simples que
ele seja. Com
ou pelo trabalho, o homem toca Deus e reproduz
a imagem de Deus
que trabalha
seis dias (cf. Gn 2,1ss). Para a Bíblia,
o trabalho tem uma função
sagrada porque
mantém a vida do homem.
Por isso,
a Bíblia não
tem uma única palavra
de louvor para
o preguiçoso, e a pobreza,
quando é conseqüência
da preguiça, pois
a preguiça nunca
é considerada como virtude. Mas um
mundo que
valoriza segundo o critério
de desempenho não
pode ser considerado um
mundo humano,
mas um
mundo mecanizado. O trabalho
pode embotar a mente
e oprimir o espírito,
fazendo o homem colocar
sua confiança
nas obras de suas
mãos, convertendo assim
o trabalho numa espécie
de ídolo. É o homem
que dá valor
ao seu trabalho
ou à função
que desempenha,
e não o contrário.
Ninguém pode colocar
o ouro e a prata
acima de Quem
os criou: Deus. O trabalho
perderá seu potencial
enobrecedor quando
ameaçar escravizar o homem. Todos
condenam a preguiça, mas nem todos se conscientizam dos perigos
do excesso de trabalho.
Como seres
criados por
Deus que
confiamos na vinda do Senhor,
a melhor maneira
de nos mantermos vigilantes
na nossa cotidiana
é através de nosso
trabalho que não é somente fonte da realização pessoal, mas também com o fruto de nosso trabalho somos chamados a ser solidários com
os outros que
são carentes
de tudo, partilhando o que temos. Quando
nos aproximarmos do homem
carente, viveremos uma ocasião privilegiada de relação
pessoal com
Jesus Cristo (cf. Mt 25,36ss).
Na celebração eucarística oferecemos a Deus para Ele “transformar” (transubstanciar) em Corpo e Sangue
do Senhor, o pão e o vinho, fruto do
trabalho do homem
recebidos da generosidade do
Deus-Criador. E que por
nossa vez
devemos nos transformar
em pessoas
generosas ao partilharmos tudo que temos para os que nada têm para a sobrevivência.
Pe. Vitus Gustama,SVD
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