Domingo, 02/07/2017
Observação inicial: Nesta página são encontradas duas reflexões:
1. Solenidade de São Pedro e São Paulo (para os lugares onde esta solenidade é celebrada neste domingo).
2. XIII Domingo do Tempo Comum "A" (para os lugares onde a Solenidade de São Pedro e São Paulo foi celebrada no dia 29 de Junho).
SOLENIDADE
DE SÃO PEDRO E SÃO PAULO
Primeira
Leitura: At 12,1-11
Naqueles
dias, 1 o rei Herodes prendeu alguns membros da Igreja, para torturá-los. 2
Mandou matar à espada Tiago, irmão de João. 3 E, vendo que isso agradava aos
judeus, mandou também prender a Pedro. Eram os dias dos Pães ázimos. 4 Depois
de prender Pedro, Herodes colocou-o na prisão, guardado por quatro grupos de
soldados, com quatro soldados cada um. Herodes tinha intenção de apresentá-lo
ao povo, depois da festa da Páscoa. 5 Enquanto Pedro era mantido na prisão, a
Igreja rezava continuamente a Deus por ele. 6 Herodes estava para apresentá-lo.
Naquela mesma noite, Pedro dormia entre dois soldados, preso com duas
correntes; e os guardas vigiavam a porta da prisão. 7 Eis que apareceu o anjo
do Senhor e uma luz iluminou a cela. O anjo tocou o ombro de Pedro, acordou-o e
disse: “Levanta-te depressa!” As correntes caíram-lhe das mãos. 8 O anjo
continuou: “Coloca o cinto e calça tuas sandálias!” Pedro obedeceu e o anjo lhe
disse: “Põe tua capa e vem comigo!” 9 Pedro acompanhou-o, e não sabia que era
realidade o que estava acontecendo por meio do anjo, pois pensava que aquilo
era uma visão. 10 Depois de passarem pela primeira e segunda guarda, chegaram
ao portão de ferro que dava para a cidade. O portão abriu-se sozinho. Eles
saíram, caminharam por uma rua e logo depois o anjo o deixou. 11 Então Pedro
caiu em si e disse: “Agora sei, de fato, que o Senhor enviou o seu anjo para me
libertar do poder de Herodes e de tudo o que o povo judeu esperava!”.
Segunda
Leitura: 2Tm 4,6-8.17-18
Caríssimo:
6 Quanto a mim, eu já estou para ser derramado em sacrifício; aproxima-se o
momento de minha partida. 7 Combati o bom combate, completei a corrida, guardei
a fé. 8Agora está reservada para mim a coroa da justiça, que o Senhor, justo
juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que
esperam com amor a sua manifestação gloriosa. 17 Mas o Senhor esteve a meu lado
e me deu forças, ele fez com que a mensagem fosse anunciada por mim
integralmente, e ouvida por todas as nações; e eu fui libertado da boca do
leão. 18 O Senhor me libertará de todo mal e me salvará para o seu Reino
celeste. A ele a glória, pelos séculos dos séculos! Amém.
Evangelho:
Mt 16,13-19
Naquele
tempo, 13 Jesus foi à região de Cesareia de Filipe e ali perguntou aos seus
discípulos: “Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?” 14 Eles responderam:
“Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; outros ainda, que é Jeremias
ou algum dos profetas”. 15 Então Jesus lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que
eu sou?” 16 Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”. 17
Respondendo, Jesus lhe disse: “Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não
foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu. 18 Por
isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja,
e o poder do inferno nunca poderá vencê-la. 19 Eu te darei as chaves do Reino
dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que
desligares na terra será desligado nos céus”.
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Celebramos neste
domingo a solenidade de duas colunas principais da Igreja: São Pedro e São
Paulo. Os dois servem o mesmo Cristo embora de maneira diferente. Não há uma
maneira só para servir Cristo e sua Igreja. Cada um dos dois tem suas
qualidades. Mas como seres humanos eles também têm suas debilidades ou
fraquezas. No entanto essas debilidades jamais deixam os dois de servir o
Senhor e Sua Igreja.
1.
Quando sou fraco, então é que sou forte
Estas palavras foram
ditas pelo próprio Paulo na sua Segunda Carta aos Coríntios (2Cor 12,10). O
“Quando sou fraco, então é que sou forte” reflete a vida destes dois grandes
santos: Pedro e Paulo.
Pedro foi chamado de
homem de pouca fé (Mt 14,31), de Satanás (Mt 16,23). Ele falhou em vigiar e
orar junto com Jesus apesar do aviso de Jesus (cf. Mt 26,37-44; Mc 14,33-41).
No momento da prisão de Jesus, numa atitude impetuosa, cortou a orelha de
Malco, empregado do sumo sacerdote (Jo 18,10). No pátio de Caifás, a
determinação de Pedro (cf. Mt 26,33-35) entrou em colapso, não diante de um
tribunal, mas diante da pergunta de uma jovem empregada. Ele negou ser
discípulo de Jesus (Mt 26,58.69-75). Mas apesar de tudo, ele reconhece que
somente Jesus tem palavras de vida eterna (Jo 6,69). Ele sempre encabeça a
lista dos discípulos (cf. Mt 10,2; Mc 3,16; Lc 6,14). Faz parte do círculo mais
íntimo dos discípulos (Mc 5,37;9,2;13,3; Lc 8,51), e é o primeiro entre os
discípulos (Mt 16,23; Jo 21,19). Ele admite sua ignorância (Mt 15,15; Lc 12,41;
cf. também Jo 13,6-10 sobre o lava-pés) e a própria pecaminosidade (Lc 5,8).
Ele questiona sobre o perdão e é advertido sobre as consequências do não-
perdão (Mt 18,21-35).
Uma piedosa tradição
conta que, durante a perseguição cruel de Nero, Pedro saía de Roma, abandonando
a própria comunidade cristã em busca de um lugar mais seguro. Junto às portas
da cidade, cruzou-se com Jesus que carregava a Cruz. Quando Pedro lhe
perguntou: “Aonde vais, Senhor (Quo vadis, Domine)?” ouviu a resposta do
Mestre: “Vou a Roma para deixar-me crucificar novamente”. Pedro entendeu a
lição e voltou para a cidade onde o esperava a sua cruz. Um historiador antigo
refere que Pedro pediu para ser crucificado de cabeça para baixo, por sentir-se
indigno de morrer como o seu Mestre, de cabeça para o alto. Apesar das suas
fraquezas, Pedro foi fiel a Cristo, até dar a vida por Ele.
Ficamos perguntando,
por que Pedro, homem que demonstra um pouco de volubilidade e que tem tantos
defeitos, foi eleito por Jesus para ser rocha sobre a qual edifica sua Igreja e
para apascentar as ovelhas de Jesus? (Cf. Jo 21,5-17). Até o próprio Pedro
questiona Jesus sobre essa eleição (cf. Jo 21,21). Será que, ao reconhecer os
próprios defeitos e fraquezas, Pedro terá condições de compreender os defeitos
e fraquezas dos outros sem condená-los, mas ajudá-los a saírem destes? Pois
aquele que já passou por uma experiência de miséria, normalmente, sabe repartir
o que tem para quem não tem nada para viver. Nunca podemos compreender
completamente os mistérios de Deus. Talvez o profeta Isaías tenha razão quando
coloca estas palavras na boca de Deus: “Pois meus pensamentos não são os
vossos, e o vosso modo de agir não é meu... meus pensamentos ultrapassam os
vossos” (Is 55,8.9b). Por isso, junto com o salmista podemos rezar:
“Ensina-me, Senhor, vosso caminho...!” (Sl 26,11), pois “os caminhos de Deus
são perfeitos” (2Sm 22,31).
Paulo também passou
por uma experiência dolorosa antes de conhecer Jesus Cristo. A queda de Paulo
na estrada de Damasco foi a linha divisória para sua vida entre antes e depois
(At 9,1ss). Essa queda é a chave geral para entender Paulo e toda a sua luta
incansável.
Paulo sempre foi um homem
profundamente religioso, judeu praticante, irrepreensível na mais estrita
observância da Lei (Fl 3,6;At 22,3) cheio de zelo pelas tradições paternas(Gl
1,14). Para defender essas tradições, chegou a perseguir os cristãos e isso com
o apoio do Sinédrio.
Mas na estrada de
Damasco Paulo, em vez de perseguir, ele foi perseguido por Cristo. A entrada de
Jesus na vida de Paulo não foi pacífica, mas sim de uma maneira violenta.
Deus não pediu
licença a Paulo. Ele entrou e o derrubou (At 9,4;22,7;26,14). Caído no chão,
Paulo se entregou. Lucas não diz que Paulo caiu do cavalo, mas “cai por terra”,
porque essa é a fraseologia usada em alguns textos bíblicos para descrever a
reação humana diante da manifestação divina. Paulo é interpelado duas vezes
pelo seu nome hebraico, transcrito em grego: “Saoúl, Saoúl” (v.4). A repetição
do nome corresponde ao esquema de diálogos de revelação aos patriarcas
bíblicos: Abraão, Jacó, Moisés (Gn 22,1;46,2; Ex 3,4). A novidade na
experiência de Paulo é a pergunta: “Por que você me persegue?” (v.4). Ela
revela uma situação singular. Aquele que fala com Paulo, no contexto de uma luz
divina, se identifica com aqueles que Paulo está perseguindo (v.5 ). A
identificação de Jesus com os seus discípulos perseguidos coloca Paulo diante
de uma escolha sem alternativas (cf. Mt 25,40.45). Ele precisa mudar
radicalmente os seus projetos.
Uma luz o envolveu
(v.3) e era tão forte que Paulo ficou cego. Ele começou a enxergar até que
Ananias interveio para dar-lhe o sentido da sua aceitação na Igreja e da
certeza de caminhar na via que leva a Deus. Paulo ressuscitou no exato momento
em que foi acolhido na comunidade como irmão(v.18).
Paulo ganhou novos
olhos. Ele via as mesmas coisas de sempre: a vida, as pessoas, a Bíblia, o
povo, a sinagoga, o trabalho e tudo que pertencia ao seu mundo. Mas a nova
experiência do amor de Deus em Jesus (Rm 8,39) mudou os olhos, e o ajudou a
descobrir novos valores que antes não via. A visão de Deus é luz, mas para a carnalidade
do homem é motivo de espanto e faz com que o homem perceba toda a escuridão em
que se encontra. Em contato com Deus que é luz, o homem se reconhece que é
trevas.
O nascimento de
Paulo, segundo 1Cor 15,8, para Cristo não foi normal. Deus o fez nascer de
maneira forçada. Paulo foi arrancado de dentro de seu mundo, como se arranca
uma criança do seio da mãe por meio de uma operação.
A partir da
experiência de Damasco, Paulo não consegue confiar naquilo que ele faz por
Deus, mas só naquilo que Deus fez por ele. Já não coloca sua segurança na
observância da Lei, mas sim no amor de Deus por ele (Gl 2,20s; Rm 3,21-26).
Essa experiência chama-se Gratuidade. Essa foi a marca de experiência de Paulo
na estrada de Damasco que renova por dentro todo o seu relacionamento com Deus.
Essa experiência da gratuidade do amor de Deus vai dar rumo à vida de Paulo e
vai sustentá-lo nas coisas que virão. Essa experiência é a nova fonte da sua
espiritualidade que faz brotar nele uma “poderosa energia” (Cl 1,29), energia
muito mais forte e muito mais exigente do que a sua vontade anterior de
praticar a Lei e de conquistar a justificação. Essa experiência levou Paulo a
desocupar o barraco da sua vida para deixar Jesus entrar nela. Ele cresce tanto no amor de Cristo, a ponto
de dizer: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20).
Essa “desapropriação” de si mesmo, porém, não lhe tira a liberdade. Pelo
contrário, ele diz: “É para a liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5,1;2,4).
A experiência da gratuidade do amor de Deus faz Paulo suportar lutas e
perseguições, viagens e canseira, o peso do dia-a-dia (2Cor 11,23-27); sofrer
com aqueles que sofrem (2Cor 11,29). Essa experiência mudou os olhos de Paulo e
o ajudou a descobrir novos valores que antes não via.
Pálido, doente e
acabado, Paulo foi levado a um vale solitário chamado Aquae Salviae em Roma. Seu corpo foi açoitado pela última vez.
Inclinou a cabeça à espera da espada que o conduziria ao martírio. O lugar onde
ele foi martirizado, hoje chama-se Tre
Fontane como recordação de Cabeça de Paulo que por três vezes bateu no chão
antes de parar no instante dramático da morte. Realizou, assim, o único desejo
de sua vida: estar com seu Senhor e Mestre Jesus Cristo: “Eu vivo, mas já não
sou eu; é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20).
O Deus do Evangelho e
da misericórdia é Aquele que no instante em que me faz compreender que errei
completamente com relação a Ele, porque me coloquei em seu lugar, demonstra-me
a sua misericórdia ao perdoar-me e me dá confiança ao chamar-me ao seu serviço,
confiando-me a sua própria Palavra.
Este instante resume
para Paulo tudo o que ele sabia de Deus de maneira errada. O escuro se torna
claro, o violento se torna misericordioso.
O evento de Damasco é
algo tão rico que devemos aproximar-nos com muita humildade e reverência,
convencidos de que compreendemos pouco, que sabemos pouco com relação a isto,
mas que poderemos conhecer muito mais pela graça de Deus. Então, compreenderemos
melhor a nós mesmos, o caminho da nossa vida e as nossas conversões.
A experiência de
Paulo nos faz perguntar: “Quando foi que me converti? Existe em minha vida um
“quando” da conversão ao qual posso referir-me como momento histórico? Mesmo
que não tenha havido um “quando” temporal, certamente aconteceram momentos de
mudança, de transformação, de crise que nos levaram a uma nova compreensão do
mistério de Deus.
Se nunca realizamos a
fundo esta mudança de mentalidade que é essencial para a vida cristã, ainda não
chegamos a compreender o que é a novidade do caminho cristão. Se não compreendo
bem as coisas ditas sobre Paulo, provavelmente é difícil que compreenda o que
aconteceu em mim.
2. Pedro e Paulo revelam face institucional e
carismática da Igreja
Pedro e Paulo são
chamados as duas colunas da Igreja. Os dois revelam, de maneira expressiva, as
duas faces da Igreja: a institucional e a carismática. Por um lado, a Igreja é
um dom que recebemos de Cristo e da Tradição. Aqui não se inventa nem se
acrescenta; acolhe-se com gratidão. Entretanto ela pode conter perigos;
favorece a acomodação, facilmente se incorre no legalismo, no moralismo e na
rigidez dogmática que impede ou suspeita de toda novidade. Pedro corporifica a
face institucional da Igreja.
Mas estes limites são
superados ou equilibrados por outra face: a face carismática. Porque, a Igreja
é resposta humana, criatividade face aos desafios de cada geração, adaptação
aos valores das culturas, inovação nos modos de pensar a fé, de rezar a Deus e
de viver o Evangelho. Mas esta face tem também seus limites: a invenção não
pode adulterar a substância da fé apostólica; cumpre guardar uma fidelidade
essencial ao espírito de Jesus e dos Apóstolos. Paulo corporifica a face
carismática da Igreja. A Igreja que hoje possuímos é fruto desta síntese feliz.
A festa de Pedro e Paulo nos quer recordar os bons frutos que nos vêm desta
tensão conservando a unidade dentro da pluralidade.
3. Pedro e Paulo Nos Trazem a Mensagem da
Esperança
“Eis por que
sinto alegria nas fraquezas, nas afrontas, nas necessidades, nas perseguições,
no profundo desgosto sofrido por amor de Cristo. Porque quando me sinto fraco,
então é que sou forte”, contou-nos São Paulo sua experiência (2Cor
12,10).
As duas figuras,
Pedro e Paulo, nos trazem uma mensagem de esperança. Na vida podemos ter muitos
defeitos e fraquezas a ponto de não conseguirmos sair deles, mas ninguém pode
escapar do amor de Deus desde que acolhamos este amor com muita humildade. Pedro
e Paulo são testemunhas de tudo isto. Como se os dois quisessem nos dizer: “Não
desista! Tudo tem seu tempo e sua solução, pois Deus te ama”.
Deus conta com o
tempo para formar cada um de nós, seus instrumentos, como conta também com a
nossa boa vontade. Se tivermos a boa vontade de Pedro e de Paulo, se formos
dóceis à graça de Deus, iremos convertendo-nos em instrumentos idôneos para
servir o Mestre e para levar a cabo a missão que nos confiou. Até os
acontecimentos que parecem mais adversos, os nossos próprios erros e
vacilações, se recomeçarmos uma vez e outra, se abrirmos o coração ao Senhor e
às pessoas capacitadas na direção espiritual, haverão de ajudar-nos a estar
mais perto do Senhor que não se cansa de suavizar os nossos modos rudes e
toscos. É provável que, em momentos difíceis de nossa vida, cheguemos a ouvir
como Pedro: “Homem de pouca fé, por que duvidaste?” (Mt 14,31). E veremos Jesus
ao nosso lado, estendendo-nos a mão para nos ajudar.
Todos nós recebemos,
de diversas maneiras, uma chamada concreta para servir o Senhor. E ao longo da
vida chegam-nos novos convites para segui-lo, e temos de ser generosos com Ele
em cada novo encontro. Temos de saber perguntar a Jesus na intimidade da
oração, como São Paulo: “Que devo fazer, Senhor? Que queres que eu deixe por
Ti? Em que desejas que eu melhore? Neste momento da minha vida, que posso fazer
por Ti?
Pedimos hoje a São
Pedro e ao Apóstolo dos pagãos, Paulo, um coração como o deles, para sabermos
passar por cima das pequenas humilhações ou dos aparentes fracassos que
acompanham necessariamente a ação apostólica, ou a nossa vida em geral. E
dizemos a Jesus que estamos dispostos a conviver com todos, a oferecer a todos
a possibilidade de conhecê-lo e amá-lo, sem nos importarmos com os sacrifícios
nem pretendermos êxitos imediatos. Assim seja!
P.
Vitus Gustama,svd
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AS EXIGÊNCIAS E AS RECOMPENSAS DO SEGUIMENTO
XIII Domingo Comum “A”
I Leitura: 2 Re 4,8-11.14-16ª
Certo dia, o profeta Eliseu passou por Sunam. Vivia lá uma distinta
senhora, que o convidou com insistência a comer em sua casa. A partir de então,
sempre que por ali passava, era em sua casa que ia tomar a refeição. A senhora
disse ao marido: “Estou convencida de que este homem, que passa frequentemente
pela nossa casa, é um santo homem de Deus. Mandemos-lhe fazer no terraço um
pequeno quarto com paredes de tijolo, com uma cama, uma mesa, uma cadeira e uma
lâmpada. Quando ele vier a nossa casa, poderá lá ficar”. Um dia, chegou Eliseu
e recolheu-se ao quarto para descansar. Depois perguntou ao seu servo Giezi: “Que
podemos fazer por esta senhora?” Giezi respondeu: “Na verdade, ela não tem
filhos e o seu marido é de idade avançada”. “Chama-a” – disse Eliseu. O servo
foi chamá-la e ela apareceu à porta. Disse-lhe o profeta: “No próximo ano, por
esta época, terás um filho nos braços”.
II Leitura: Rom 6,3-4. 8-11
Irmãos: Todos nós que fomos baptizados em Jesus Cristo fomos baptizados
na sua morte. Fomos sepultados com Ele na sua morte, para que, assim como
Cristo ressuscitou dos mortos, para glória do Pai, também nós vivamos uma vida
nova. Se morremos com Cristo, acreditamos que também com Ele viveremos, sabendo
que, uma vez ressuscitado dos mortos, Cristo já não pode morrer; a morte já não
tem domínio sobre Ele. Porque na morte que sofreu, Cristo morreu para o pecado
de uma vez para sempre; mas a sua vida, é uma vida para Deus. Assim, vós
também, considerai-vos mortos para o pecado e vivos para Deus, em Cristo Jesus.
Evangelho: Mt 10,37-42
Naquele tempo, disse Jesus aos seus apóstolos: “Quem ama o pai ou a mãe
mais do que a Mim, não é digno de Mim; e quem ama o filho ou a filha mais do
que a Mim, não é digno de Mim. Quem não toma a sua cruz para Me seguir, não é digno
de Mim. Quem encontrar a sua vida há-de perdê-la; e quem perder a sua vida por minha
causa, há-de encontrá-la. Quem vos recebe, a Mim recebe; e quem Me recebe,
recebe Aquele que Me enviou. Quem recebe um profeta por ele ser profeta,
receberá a recompensa de profeta; e quem recebe um justo por ele ser justo, receberá
a recompensa de justo. E se alguém der de beber, nem que seja um copo de água
fresca, a um destes pequeninos, por ele ser meu discípulo, em verdade vos digo:
não perderá a sua recompensa”.
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O evangelho de hoje
é a parte final do discurso de Jesus sobre a missão. Mt colocou aqui diversos
elementos que ele tomou de diferentes contextos. Dividimos o texto em duas
partes. A primeira parte(vv.37-39) apresenta as exigências que Jesus propõe
para quem quer segui-lo. Na segunda parte (vv.40-42) Jesus promete recompensar
todos aqueles que acolherem os seus enviados.
I. AS EXIGÊNCIAS DE JESUS (vv.37-49)
Jesus é
terrivelmente exigente. Ele exige renúncia de uma radicalidade inaudita e
conclui cada exigência com o mesmo refrão: “não é digno de mim!” Ele pede uma
adesão total e indivisível à sua pessoa.
1. A primeira exigência: Jesus deve ser preferido aos vínculos humanos
mais sagrados
“Aquele que ama pai e mãe mais do que a mim,
não é digno de mim. Aquele que ama o filho ou filha mais do que a mim, não é
digno de mim” (v.37).
Jesus usa aqui a
palavra mais sagrada: “amar”. Certamente a primeira das renúncias se refere ao
que há de mais caro a Deus e aos homens: o amor. O mundo inteiro é fruto do
amor de Deus. O amor é o porquê da encarnação de Jesus Cristo. A redenção
encontra sua resposta no amor de Deus pela humanidade. Todo o NT se fundamenta
no amor. E todos nós reconhecemos que nascemos de um momento fecundo do amor.
Nenhum preceito que fira o amor tem legitimidade para Jesus e para os cristãos.
No entanto, o primeiro e maior amor se deve a Deus (Mt 22,38), porque de Deus
provêm todas as expressões do amor e a Deus retornam todos os nossos gestos de
amor. Portanto, Jesus não manda não amar pai e mãe e filhos, mas deve amá-los
dentro do grande amor que devemos a Deus e devemos renunciá-los sempre que
forem empecilho. Trata-se, então, de estruturar a vida inteira a partir desse
amor maior que dá sentido a todos os outros. A partir desse amor maior todos os
outros amores se enriquecem. Se amarmos os pais e irmãos com o coração cheio do
amor de Deus, esse amor se torna digno de confiança. Por isso, embora Jesus
insista nas obrigações de seus seguidores aos pais (Mt 15,3ss) e à família (cf.
Mt 5,27ss;19,1ss), contudo esse relacionamento não pode, de modo algum, impedir
ou prejudicar a obediência do homem diante das exigências de Deus, o Bem Absoluto,
o Maior Amor (cf. Mt 8,21s). Todos devem ser dispostos a qualquer sacrifício
quando está em jogo a causa de Deus e a própria salvação. Precisamos estar
conscientes de que há amores familiares que matam, principalmente do ponto de
vista espiritual. Portanto, vivemos em contínua renúncia e permanente abertura
às manifestações do amor de Deus.
Mas cada um de nós,
a partir desta exigência, precisa se perguntar: Que lugar ocupa Jesus na sua
vida? Ele ocupa o primeiro lugar ou em segundo lugar na sua vida?
2. A segunda exigência é carregar a cruz e renunciar à própria vida
“Quem
não toma a sua cruz e não me segue, não é digno de mim” (v.38).
“Tomar sua cruz” é
uma expressão metafórica para a prontidão para a morte, para o movimento de
partida de si mesmo em direção a Deus. Cada partida em direção a Deus sempre
representa uma morte de si mesmo. A vida que se entrega a Deus tem algo desse
morrer em si e será uma nota característica de nossas mais sinceras intenções
em seguir a Jesus. Não se ama a cruz em si mesmo, mas ao seguir a Jesus
incondicionalmente encontra-se a cruz.
Cada história tem
sua própria cruz e cada cruz tem sua própria história. Todos nós, de alguma
forma, carregamos alguma cruz na nossa vida. Mas existe cruz com Cristo, como
também existe cruz sem Cristo. Para alguns, a cruz pode ser vivida como
tribulação, para os outros ela pode ser vivida como libertação. A cruz sem
Cristo é a cruz-condenação. É a cruz de quem deseja ser um deus. É a cruz que
não tem finalidade em si mesmo. É a cruz sem fé, sem amor, sem sentido da vida,
sem renúncia por amor. É a cruz de quem deseja viver numa liberdade sem
responsabilidade. Jesus Cristo, que foi crucificado, transformou a cruz de
castigo em bênção. Por isso, se procuramos Cristo sem sua cruz acabamos
encontrando a cruz sem Cristo. Mas se procuramos Cristo com sua cruz acabamos
encontrando a salvação. Que tipo de cruz que você carrega: com Cristo ou sem
Cristo?
E Jesus acrescenta:
“Quem procura conservar a sua vida, vai perde-la. E quem perde a sua vida por
causa de mim, vai encontrá-la” (v.39). Buscar a vida era o ideal dos sábios do
Antigo Testamento. Mas Jesus convida a mudar esta sabedoria por outra mais
profunda que consiste em imitar sua entrega a fim de alcançar a vida em
plenitude: a vida sem fim com Deus. A vida vem de Deus e somente ele é capaz de
dar a vida. Se a vida é totalmente de Deus e para Deus, então, todas as vezes
que o homem se fecha em si mesmo, ele se desliga da sua fonte, da sua razão de
ser e da sua única meta possível. Só salva sua vida quem não confia na sua
mortalidade, mas se inclui na imortalidade de Deus; mas isto significa morrer
para viver eternamente. Certamente, aqui é que está a grandeza maior do homem.
A proposta de Jesus é levar a vida a sério, enfrentar com dignidade os
desafios, mas sempre se abrir à fonte da vida: Deus. É preciso sair de si
mesmo, ultrapassar-se a si mesmo em direção à vida por excelência: Deus. Se
renunciarmos aos nossos interesses pessoais, acolheremos os interesses de Deus.
Se renunciarmos às falsas propostas da vida, acolheremos a cruz redentora de
cada dia, que nos traz consigo o Cristo Salvador.
II. A PROMESSA DE JESUS A QUEM ACOLHE SEUS ENVIADOS/MISSIONÁRIOS (vv.40-42)
“Quem
recebe um profeta, por ser profeta, receberá a recompensa de profeta. E quem
recebe um justo, por ser justo, receberá a recompensa de justo... até um copo
de água fresca dada a um dos pequeninos não perderá a sua recompensa” (vv.41-42).
Encontramos aqui,
pelo menos, três grupos na comunidade de Mateus. Os profetas exerciam um
ministério itinerante que consistia, sobretudo, na pregação; eram homens
suscitados por Deus. Os justos eram homens de virtude comprovada na comunidade,
quer pela sua vida exemplar, quer pela fé praticada na caridade. Eram homens
fiéis aos mandamentos de Deus. Os pequeninos eram os simples discípulos de
Jesus, não ocupavam nenhuma posição destacada na comunidade.
Qual será a
recompensa prometida por Jesus? O texto não especifica a recompensa. Mas se
olharmos para o cap. 25 de Mateus, saberemos que uma obra boa feita para os
mais insignificantes, mesmo sem consideração de quem ele é ou sem saber se está
servindo a Cristo nele, a recompensa será grande: a alegria eterna (Mt
25,31-46). Na atitude adotada diante de um pobre, mostramos a verdadeira
generosidade de nosso coração. Partilhar o que temos para os mais pobres é uma
forma de prolongar a generosidade do Deus-Criador que criou tudo gratuitamente
para os homens. Nós que acreditamos no Deus-Criador devemos manter viva esta
generosidade através da partilha daquilo que temos e somos.
Que as pessoas
percebam a marca do amor de Deus nos nossos gestos, palavras e obras para que
possam acreditar que Deus existe e que esse Deus é Amor. Assim seja.
P. Vitus Gustama,SVD
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