EPIFANIA
DO SENHOR
Primeira Leitura: Is 60,1-6
1Levanta-te,
acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória
do Senhor. 2Eis que está a terra envolvida em trevas, e nuvens escuras cobrem
os povos; mas sobre ti apareceu o Senhor, e sua glória já se manifesta sobre
ti. 3Os povos caminham à tua luz e os reis ao clarão de tua aurora. 4Levanta os
olhos ao redor e vê: todos se reuniram e vieram a ti; teus filhos vêm chegando
de longe com tuas filhas, carregadas nos braços. 5Ao vê-los, ficarás radiante,
com o coração vibrando e batendo forte, pois com eles virão as riquezas de
além-mar e mostrarão o poderio de suas nações; 6será uma inundação de camelos e
dromedários de Madiã e Efa a te cobrir; virão todos os de Sabá, trazendo ouro e
incenso e proclamando a glória do Senhor.
Segunda Leitura: Ef 3,2-3ª
Irmãos:
2Se ao menos soubésseis da graça que Deus me concedeu para realizar o seu plano
a vosso respeito, 3ae como, por revelação, tive conhecimento do mistério. 5Este
mistério, Deus não o fez conhecer aos homens das gerações passadas, mas acaba
de o revelar agora, pelo Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: 6os
pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são
associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho.
Evangelho: Mt 2,1-12
1 Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na
Judeia, no tempo do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a
Jerusalém, 2 perguntando: “Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós
vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo”. 3 Ao saber disso, o rei
Herodes ficou perturbado, assim como toda a cidade de Jerusalém. 4 Reunindo
todos os sumos sacerdotes e os mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias
deveria nascer. 5 Eles responderam: “Em Belém, na Judeia, pois assim foi
escrito pelo profeta: 6 ‘E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor
entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá um chefe que vai ser o
pastor de Israel, o meu povo’”. 7 Então Herodes chamou em segredo os magos e
procurou saber deles cuidadosamente quando a estrela tinha aparecido. 8 Depois
os enviou a Belém, dizendo: “Ide e procurai obter informações exatas sobre o
menino. E, quando o encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-lo”. 9
Depois que ouviram o rei, eles partiram. E a estrela, que tinham visto no
Oriente, ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino. 10 Ao
verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande. 11 Quando
entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele,
e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro,
incenso e mirra. 12 Avisados em sonho para não voltarem a Herodes, retornaram
para a sua terra, seguindo outro caminho.
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Epifania- Natal
Neste Domingo celebramos a festa
de Epifania. É uma das festas mais importantes do
ano cristão, e celebra a manifestação ou as manifestações de Jesus Cristo. Epifania
é uma palavra grega que deriva de epi
e faino (brilhar,
maifestar-se).
Em outras palavras,
a própria palavra, do grego “Epiphaneia”
(manifestação”) ressalta o significado original da festa. No uso secular a palavra Epifania podia referir-se a
chegada. A chegada de um rei era registrada como Epifania. A vinda de Cristo
para este mundo, segundo são Paulo é uma Epifania (Cf. 2Tm 1,9-10). No uso religioso, a palavra
Epifania denotava toda e qualquer manifestação do poder divino em favor do
homem. Dentro do contexto do Natal, através da Encarnação, Deus
manifestou o seu poder benevolente e misericordioso para nós homens. Deus, na
sua Encarnação, vem para nos amar e perdoar a fim de nos salvar.
A celebração da
Epifania teve a sua origem nas Igrejas do Oriente. No século III aparece no
Egito, para dali passar facilmente a Jerusalém e à Síria no século IV, como
festa celebrativa da manifestação do Senhor, entendida como Seu Nascimento. E
rapidamente, passou atmbém a Roma e ao Ocidente, apesar de ali, nessa mesma
época, ter surgido a festa da Natividade, do nascimento do Salvador.
No dia da Epifania
existe também o antigo costume de proclamar, depois do Evangelho, o calendário das festas móveis de todo o ano, sobretudo, a
data da Páscoa. Pode ser usada a seguinte fórmula: “Amados irmãos e irmãs, a glória do Senhor se manifestou e sempre se
manifestará em nosso meio, até o seu retorno. Nos ritmos e vicissitudes do
tempo, recordamos e vivemos os mistérios da salvação. Centro de todo o ano
litúrgico é o Tríduo do Senhor crucificado, sepultado e ressuscitado, que
culminará no Domingo
de Páscoa.....(data e
mês em que se comemero). Todos os domingos, Páscoa da
semana, a santa Igreja torna presente este grande acontecimento, no qual Cristo
venceu o pecado e a morte. Na Quarta-feira de Cinzas, início da Quaresma, no
dia.....; na Ascensão
do Senhor, no dia....; no Pentecostes, no dia....; no Primeiro Domingo do Advento, no
dia....; também nas festas da Santa Mãe de Deus, dos Apóstolos, dos santos e na
comemoração dos fiéis defuntos, a Igreja, peregrina na terra, proclama a Páscoa
do Senhor. A Cristo que era, que é, e que vem, Senhor do tempo e da história,
seja dado louvor perene pelos séculos dos séculos. Amém”.
O Natal e a
Epifania são festas complementares e mutuamente
enriquecedoras. Ambas celebram, de perspectivas diferentes, o mistério da
Encarnação, a vinda e a manifestação de Cristo ao mundo. O Natal enfatiza a
vinda. A Epifania enfatiza a manifestação. A Epifania é a solenidade
da manifestação do Messias, o Deus feito homem, aos povos pagãos, significados
nos personagens vindos do Oriente. Importa muito não desligar a Epifania do
Natal. O mistério, no fundo, é o mesmo, varia a perspectiva da amplitude e da universalidade
da manifestação. Epifania é manifestação do Deus-Conosco aos povos pagãos.
Epifania aprofunda e
estende o mistério celebrado no Natal. Este mistério se explica no prefácio: “Quando
Cristo se manifestou em nossa carne mortal, vós nos recriastes na luz eterna de
sua divindade”. Aqui reside a profundidade do mistério: Cristo Jesus é o Deus que assume
toda a realidade do homem, exceto o pecado. Assim, ele nos enriquece com a
glória de sua realidade divina. É a “admirável intercâmbio” daquilo que São
Leão Magno fala: Damos a Ele nossa pobreza (humanidade) e Ele nos comunica sua
riqueza (divindade).
Mas a Epifania
estende este mistério a todos os povos. São Paulo na Segunda Leitura (Ef
3,2-3ª): “Este mistério, Deus não o fez
conhecer aos homens das gerações passadas, mas acaba de o revelar agora, pelo
Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: os pagãos são admitidos à mesma
herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus
Cristo, por meio do Evangelho”. Este é o núcleo da celebração de Epifania.
Em outras palavras,
Natal e Epifania são festas complementares que se enriquecem mutuamente ou
festas irmãs. Ambas celebram, de diferentes perspectivas, o mistério da
encarnação, a vinda e a manifestação de Cristo ao mundo. Natal acentua mais a
vinda (embora o próprio Natal seja uma manifestação do amor de Deus pela humanidade),
enquanto que epifania enfatiza a manifestação.
Os Textos Bíblicos Da Festa da Epifania
A antífona de entrada da missa, que abre a celebração nos introduz no clima do mistério da
Epifania. A antífona da entrada é um texto composto, inspirado livremente em
Malaquias (Mal 3,1) e em 1Crônicos 19,11-12. A antífona de entrada canta
poeticamente a grandeza e a solenidade do mistério: “Chegou o Senhor nosso Rei: em suas mãos está o reino, o poder e a
glória”. Esse Senhor é o Menino
pobre que nasceu em Belém. Deus nos revela que este Menino é o Filho
unigênito do Pai. Jesus nascido em Belém é a Luz de todos os povos, como
enfatiza a Primeira Leitura (Is 60,1-6). Por isso, os povos caminharão para
esta Luz representados pelos magos. Epifania é, portanto, uma solenidade
evangelizadora e missionária.
Na Primeira
Leitura, o profeta Isaías contempla o espetáculo da cidade de
Jerusalém. Jerusalém está revestida de
luz porque o Senhor chegou, e sobre ela aparece a sua glória. Ela é o sinal da
presença de Deus. Levando como presentes ouro e incenso destinados ao
sacrifício de perfumes, os povos caminharão em direção à cidade santa, pois ela é o lugar da
teofania e está iluminada pela presença de Deus. Onde Deus estiver presente
pela abertura do coração do homem a Deus, a vida fica iluminada pela luz
divina. A visão é dominada por um universalismo
centrípeto, isto é, que cresce da periferia ao centro, do mundo inteiro
para Jerusalém: a unidade do mundo em torno de Jerusalém, sinal visível da
unidade de Israel.
A Igreja lê este
texto com outra profundidade, isto é, em sentido cristológico e eclesiológico,
oferecido também pela atual passagem do Evangelho: Cristo é a Luz das nações (cf. Jo
8,12), e essa Luz brilha no rosto da Igreja, difundida por
toda a terra (c.Lumen Gentium n.1). Onde quer que a Igreja se reuna em torno do altar da Eucaristia, ela é
sinal da presença do Senhor ressuscitado e da convocação universal dos povos
que acolhem a salvação de Deus em Jesus Cristo.
Na Segunda
Leitura, são Paulo afirma que o mistério “que não foi manifestado para as gerações passadas da mesma forma com
que o revelou agora, pelo Espírito, aos seus santos apóstolos e profetas: em
Jesus Cristo e por meio do Evangelho, os pagãos são chamados a participar da
mesma herança, a formar o mesmo corpo e
a participar da mesma promessa” (Ef 3,2-3). São Paulo quer nos anunciar que
com a vinda de Jesus, não há mais nenhuma discriminação. Todos são chamados a
ser membros da única Igreja. A igualdade provém inteiramente do fato de que
somos partícipes do mistério de Cristo. O verdadeiro herdeiro da promessa feita
a Abraão é Jesus (Gl 3,16), e todos participarão dessa promessa enquanto são
incorporados em Cristo.
No Evangelho
(Mt 2,1-12) fala-se da narrativa da ida dos Magos a Belém para adorar o Messias
nascido. A narrativa não é somente o centro desta liturgia da palavra, mas
também de todo o mistério proclamado pelas duas leituras precedentes.
Em todo o Evangelho
de Mateus sublinha-se a preocupação apologética de explicar a recusa de Cristo
(Messias) pelos judeus e o acesso dos pagãos à fé. (por exemplo cf. Mt
18,11-20).
Através da narrativa
da ida dos Magos em busca do Messias recém-nascido, o evangelista tem também uma
mensagem essencial para transmitir: o Menino adorado pelos Magos em Belém
inaugura um reino universal, e Jesus é o Rei do universo. Por isso, o
evangelista Mateus sublinha mais a importância de apresentar o conteúdo da
catolicidade do Reino messiânico do que em descrever-nos o nascimento de Jesus.
Por outro lado,
Herodes e sua corte representam o mundo dos poderosos que não tem piedade em
elimar seu rival. Para ele s tudo vale desde que assegure o próprio poder: a
crueldade, o terror, o desprezo, homicídio, destruição de inocentes..... Os
magos representam, ao contrário, o caminho de fé a ser seguido por aqueles que
escutam e buscam os anseios mais nobres do coração humano. Para descobrir o
divino no humano é preciso percorrer um caminho da fraternidade universal em
que o sagrado é adorado e protegido, caminho oposto seguido por Herodes e sua
corte.
O texto do Evangelho
não diz que os Magos eram três nem quer eram reis. O primeiro testemunho sobre
o número de três é de Orígenes, no
século III, provavelmente por causa dos três presentes: Ouro, Incenso e
Mirra. Os presentes são simbólicso: OURO para significar a realeza de Jesus; INCENSO
para significar a divindade de Jesus; MIRRA, uma resina cheirosa, em pó ou líquido,
usada para perfurmar e compor óleos sagrados, porque Cristo quer dizer
“Ungido”. Ele é o Ungido de Deus e antes de sua morte Ele será ungido (Mt
26,6-7; Mc 14,3-). Também não sabemos como os Magos se chamavam. Os nomes hoje
usuais: MELCHIOR,
GASPAR
e BALTHASAR,
aparecem num manuscrito parisiense do século VI.
Ao lado dos Magos
são relatados também no texto do Evangelho Herodes e sua corte que representam
o mundo dos que se consideram poderosos. Sabemos muito bem que no mundo dos
poderosos, no mundo dos gananciosos, no mundo dos soberbos tudo vale desde que
assegura o próprio poder e o próprio interesse egoísta. Por isso, neste tipo de
mundo entram o cálculo, a estratégia e a mentira. Entram, inclusive, a
crueldade, o terror, o desprezo ao ser humano e a destruição de inocentes.
Além disso, Os Magos vindos do Oriente irrompem neste mundo de trevas.
Alguns exegetas interpretam a lenda evangélica recorrendo à psicologia do
profundo. Os MAGOS
representam o caminho seguido por aqueles que escutam os anseios mais nobres do
coração humano. A ESTRELA que os guia é a nostalgia do divino. O CAMINHO que percorrem é o desejo. Para descobrir o divino
no humano, para adorar o Menino em vez de buscar sua morte, para reconhecer a
dignidade do ser humano em vez de destruí-la, é preciso percorrer um caminho
oposto ao seguido por Herodes.
Mais Lições Dos Magos Para Nós
Os Magos são verdadeiramente nossos pais e
nossos mestres na fé. O caminho dos Magos em busca de um Salvador é uma
história de fé. Destaquemos alguns ensinamentos dos Magos:
Primeiro, a capacidade para ver
a estrela, abertos para a chamada de Deus, vigilantes, homens de oração. Eles
sabem distinguir os sinais dos tempos. Não são homens distraídos nem sonolentos
nem fechados. Eles escutam a voz do céu e a voz de seu próprio coração. Eles
escutam seu Eu profundo. Somente aquele que está aberto a Deus tem capacidade
de captar os sinais de Deus na vida.
Segundo, sua disponibilidade
para deixar tudo e pôr-se em caminho. Os Magos não são homens instalados nem
apegados a coisas e lugares, porque vivem de esperança. Eles fazem parte
daqueles que buscam a terra prometida. São homens livres de toda atadura e
livres para toda aventura, famintos de luz e de Deus. Somente quem é livre de
tudo pode libertar os outros. Quem vive instalado e isolado não pode ver a
novidade da caminhada e as novidades da vida.
Terceiro, sua constância no
seguimento da estrela. Não lhes faltaram dúvidas e provações no caminho. Às
vezes a estrela desapareceu e sentiram a tentação de voltar ao conhecido, como
os hebreus no deserto que queriam voltar para a escravidão no Egito. Os Magos
passaram pela experiência da escuridão na vida, quando não se vê nada nem se
entende nada. Mas na sua dúvida os Magos não têm vergonha de perguntar a quem
sabe melhor como se deve viver a vida de melhor maneira. Assim pode acontecer
também na nossa vida. Às vezes perdemos o guia de nossa vida ou alguma
referência para nossa caminhada. Os Magos nos ensinaram a ter humildade em
pedir socorro aos que tem mais conhecimento e experiência na vida para que
possamos continuar com nossa missão neste mundo.
Quarto, sua responsabilidade
na busca. A fé é dom de Deus, mas exige nossa colaboração continuada. A fé não
está renhida com a reflexão, o diálogo e a oração. Até dos incrédulos se pode
receber alguma luz.
Quinto, a generosidade dos
Magos na oferta ou na oferenda. Eles compreenderam a necessidade de
compartilhar. Escolheram presentes significativos, porque esperavam encontrar
um Rei dos reis.
Sexto, sua capacidade da
leitura dos fatos. Quando a estrela pára diante da casa pobre, onde se encontra
o Menino Jesus, os Magos não se escandalizam. Ao contrário, eles O reconheceram
como Messias. A maioria do povo eleito não tinha capacidade de fazer este tipo
de leitura. Deus é sempre surpreendente: se veste de simplicidade e somente se
manifesta aos humildes e aos pequenos.
Sétimo, diante do Messias os
Magos se ajoelharam e O adoraram. Não basta ver. A fé é entrega e amor. Eles,
mais que o ouro, o incenso e a mirra, ofereceram seu coração. Creram e
adoraram: esse é o melhor perfume. Adoraram: essa será nossa definitiva
vocação.
Oitavo, a capacidade de
mudança dos magos. Eles foram capazes de voltar por outro caminho, pois foram
avisados por Deus para fazer isso. É coisa segura que Deus muda sempre nossos
planos. Crer é viver confiados na insegurança, é estar dispostos a iniciar
sempre um novo caminho, é ter capacidade de renovação constante. No final, essa
capacidade de renovação produz sempre uma imensa alegria.
Por fim, a transformação na
vida dos Magos. Na viagem de volta já não necessitavam mais de estrela porque
eles levavam a estrela dentro de seu coração. Era tal a luz e a alegria que
receberam, que eles mesmos se converteram em estrelas. Voltaram com o rosto
resplandecente, como Moisés depois que falou com Deus, como Jesus que foi
transfigurado no monte Tabor. Por isso, os Magos se tornaram missionários de
alegria e de amor. Desde então, as estrelas já não se encontraram no céu e sim
entre nós, entre todos aqueles que de uma ou de outra maneira se encontraram
profundamente com Deus. Quem contempla Deus profundamente se torna reflexo de
Deus para os demais.
Cada um tem sua luz própria. Por isso, não
precisa nem deve apagar a luz dos outros. Juntar duas ou mais estrelas só
resulta na claridade maior. Por isso, tem toda a razão aquilo que o ditado
popular diz: “Para que a sua estrela brilhe, não é preciso apagar a minha”.
Cada um tem sua luz dentro de si e é preciso que brilhe para iluminar a vida
dos outros. Isto se chama amor na unidade, amor fraterno. Se realmente somos
crentes, não podemos continuar dissimulando nossa fé.
Estendamos um pouco mais nossa meditação sobre outros pontos da festa da
Epifania!
1.
A Epifania Do Senhor Na Nossa Vida
O termo “epifania” vem do grego “epiphaneia” (manifestação).
No grego clássico
este termo
podia expressar duas ideias: uma, secular
e outra, religiosa.
No uso secular, epifania
podia referir-se a uma chegada. Por ex., quando
um rei
visitava uma cidade com
uma entrada solene,
esse acontecimento
se considerava como epifania.
São Paulo utiliza este
termo para falar da vinda de Cristo. Para São Paulo, a vinda
de Cristo ao mundo
é uma epifania: “Essa graça,
que nos
foi dada em
Cristo Jesus, antes
dos tempos eternos,
foi manifestada agora pela aparição
(epiphaneia) de nosso Salvador, o Cristo
Jesus” (2Tm 1,10). Com o uso neotestamentário do termo
epifania entendemos facilmente que
o nascimento de Jesus se entende também como epifania, porque celebram-se a vinda,
a chegada e a presença
da Palavra encarnada
entre nós.
No uso religioso,
o termo epifania
se usa para denotar alguma manifestação
do poder divino em benefício
dos homens. Dentro
do uso religioso
do termo estamos próximos
do uso litúrgico
da epifania, pois através da encarnação
de Jesus, o Verbo divino,
Deus manifesta
seu poder
benevolente para os homens.
Por isso,
a vinda de Cristo
à terra é uma epifania em si mesma. Dentro
do significado do termo,
na verdade, a epifania não se limita na celebração
da vinda histórica
de nosso Senhor,
Jesus Cristo, ao mundo,
mas também
dos diversos “sinais”
pelos quais
durante sua
vida, ele
revela seu poder
e sua glória.
A partir
do significado do termo,
a epifania é uma festa
de cada dia
porque não
há momento nem
acontecimento que
não tragam uma revelação
do Senhor. Para poder captar a manifestação divina
em cada
momento e acontecimento
necessitamos ser pobres
no espírito e estar
abertos à novidade.
Não podemos ter
medo da novidade
de Deus que
se manifesta diariamente. Os ricos, Herodes, os sumos
sacerdotes, os escribas
e os fariseus temem a novidade e criam a guerra.
A novidade é sempre
uma ameaça para quem tem algo a
perder. Para defender-se
da novidade eles
se refugiam nos costumes
humanos. A epifania,
que é a revelação
de Deus que
engloba tudo, nos
abre para horizontes
infinitos, fonte
permanente da novidade
e da surpresa de Deus.
Uma grande novidade
que aprendemos da encarnação
de Deus em
Jesus Cristo é o reconhecimento
de Deus em
cada homem
para respeitar sua dignidade, porque Deus se
fez homem. Santo
Tomás de Aquino ao comentar o Pai-Nosso
disse: “Devemos amar nossos
semelhantes porque
são nossos
irmãos, pelo fato de serem filhos
de Deus (leia 1Jo 4,20). Devemos reverenciá-los, tratando-os como filhos de
Deus (leia Ml 2,10)” [In Orationem Dominicam: Pater Noster, Expositio].
2.
Os Magos e a Universalidade Do Amor De Deus
Os grandes Padres latinos como Santo Agostinho, São
Leão, São
Gregório e outros, nas suas reflexões sobre Mt 2,1-12 chegaram à mesma
conclusão de que
os Sábios do oriente
(os magos) representavam as nações do mundo.
Eles simbolizavam a vocação
de todos os homens
à única Igreja
de Cristo.
Com esta interpretação,
a festa de epifania
toma um
caráter mais
universal. Deus
deixa de se manifestar
somente a um povo privilegiado, a uma raça
humana para
se dar conhecer a todos, sem exceção. A boa nova
da salvação é oferecida a todos os homens. Com a vinda de Deus feito carne, a humanidade forma uma só família porque o amor
de Deus abraça
a todos. Isto
significa que Deus
jamais abandona
seus fiéis. Este
amor imenso
de Deus por
nós deve aquecer
o nosso coração
e animar nossa
vida para
levarmos adiante os nossos
compromissos como
filhos e filhas de Deus.
São Paulo fala (na segunda
leitura) com
muita admiração
sobre a grandiosidade
deste mistério, que
estava oculto nas gerações
passadas, mas
se revela agora através
do Espírito, que
“os pagãos são
admitidos à mesma herança,
são membros
do mesmo corpo,
são associados
à mesma promessa
em Jesus Cristo,
por meio
do Evangelho” (Ef 3,6). Da mesma forma São Pedro recordava aos pagãos
convertidos: “Vós que outrora não éreis povo,
mas agora
sois o Povo de Deus,
que não
tínheis alcançado misericórdia, mas agora
alcançastes misericórdia” (1Pd
2,10). Todos podem alcançar
a misericórdia de Deus
desde que tenham a vontade
de alcançá-la, vivendo os ensinamentos
de Cristo. E todos
os que aceitarem Cristo
e seus ensinamentos
serão herdeiros
das promessas de Cristo.
Consequentemente todos devem ser servidores desta graça para todos que ainda não têm consciência da grandiosidade
do amor de Deus
que liberta
e salva.
3.
Os Magos e A Busca De Deus
Os magos puseram-se a caminho
e deixaram sua terra
em busca
do Rei recém-nascido.
Guiados pela estrela
e com uma grande
esperança no coração,
os magos puseram-se a caminho. São João Crisóstomo comentou: “Não se
puseram a caminho porque viram a estrela, mas viram a estrela porque se tinham
posto a caminho”. Põem-se a caminho porque têm perguntas e inquietações no
coração. Os magos são o símbolo dos que buscam Deus, como diz Santo Agostinho:
“Anunciam e perguntam, creem e buscam; simbolizando aqueles que caminham na
fé e desejam a realidade”.
Somos peregrinos
nesta terra. Mas para onde caminhamos? Consciente ou inconscientemente, no
fundo todos procuram Deus. “A busca de Deus é a busca da felicidade. O encontro
com Deus é a própria felicidade, pois Deus é o bem perfeito, o sumo bem” (Santo
Agostinho). O destino do homem é, certamente, a união plena com Deus. E na
espera desse destino, o homem vive sobre a Terra com fé. A fé é ter confiança
em Deus apesar das próprias dúvidas, perguntas e interrogações, queixas e
murmurações; a fé é ter a coragem de agir apesar dos próprios medos; é esperar
no amanhã apesar dos sofrimentos e dificuldades de hoje, porque Deus é fiel às
suas promessas. Deus veio antes ao nosso
encontro e semeou no nosso coração a fome e a sede da justiça e da paz, da
felicidade e da comunhão, enfim, da salvação que só podemos encontrar nele.
Para chegar ao
encontro de Deus é necessário pôr-se a caminho e encarar os desafios e vencer
novos obstáculos e refutar argumentos velhos e novos a fim de chegar à meta
desejada, isto é, encontrar o sentido da vida na união plena com Deus. Quem
quer encontrar Deus, não pode ficar preso ao passado. Precisa partir sempre de
novo, com o coração cada vez mais leve e livre, porque na nossa vida costumam
acontecer fatos carregados de sentido, que exigem a nossa atenção e o nosso
êxodo. Mas se a pessoa não se põe a investigar e a tentar perceber o que Deus
lhe quer dizer, com certeza vive mais tranquilo, não se interroga, não levanta
problemas. Consequentemente, não avança, move-se num horizonte estreito,
mesquinho, sem dimensões, e priva-se do que as suas capacidades lhe
proporcionam para progredir. E Deus, quando queremos encontrá-lo de verdade,
vem em nossa ajuda, indica-nos o caminho, às vezes, através de meios menos
aptos. Mas, com certeza, Deus não se encontra na soberba que nos separa dele,
nem na falta de caridade que nos isola.
Os magos iniciaram
uma longa caminhada, desejando encontrar Deus guiando apenas pela estrela. Na
vida, é preciso seguir uma estrela, um ideal, um modelo de santidade. E tem que se seguir, apesar de todos os
sacrifícios. Jesus, no fim, está à nossa espera.
4.
Os Magos e A Estrela
“Vimos sua estrela
no Oriente”, dizem os magos. A estrela é um elemento indispensável na narração
de Mateus. Mas o que a estrela representa?
A estrela é a
metáfora do rei messias, como pode-se ler em Nm 24,17: “Surgirá uma estrela
de Jacó e surgirá um cetro de Israel”. Em Mt, porém, a estrela não é apenas
uma metáfora ou imagem do Messias, porque ela guia os magos. Pela sua função de
guia, ela é sinal de Deus. A estrela é a Providência divina que guia o homem no
caminho de sua realização como homem e filho de Deus. A estrela também é
símbolo da fé. A fé é a estrela que nos guia. A fé é a luz pela qual conhecemos
Deus. A fé é um dom de Deus, é uma iluminação para nossa vida. Não se pode
chegar à luz da verdade revelada através do recurso exclusivo da razão humana.
Deus é quem revela; é Ele “mesmo quem reluziu em nossos corações, para fazer
brilhar o conhecimento da glória de Deus, que resplandece na face de Cristo”
(2Cor 4,6). Mediante a fé conhecemos realmente Deus, ainda que este
conhecimento seja escuro. É um conhecimento que nos une a Deus e leva consigo a
“garantia” e a substância das coisas esperadas: “A fé é o fundamento da
esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11,1).
A fé nos situa na
nossa rota e nos mostra o caminho que temos que percorrer. De vez em quando
perdemos nossa direção. Mas isto não quer dizer que estejamos perdidos. Esta
obscuridade é momentânea e serve de prova para nossa fé. Temos que aprender dos
magos. Eles não ficaram desanimados quando perderam a estrela. Ao contrário,
eles pediram conselhos aos homens capazes de dizer-lhes onde nasceria Cristo.
Nós também podemos pedir conselhos de quem tem mais fé do que nós ou nós mesmos
podemos dar conselhos aos outros caso tenhamos fé profunda. A luz da fé é algo
que pode e deve ser compartido, especialmente através do testemunho de nossa
vida, pois o testemunho de uma vida correta, de uma fé viva é muito mais eficaz
do que qualquer discurso bonito.
Se a epifania é uma
festa de cada dia porque não há momento nem acontecimento que não tragam uma
revelação do Senhor, será que, algumas vezes, você parou para procurar perceber
nos sinais de cada dia a vontade ou algum recado de Deus para você? Este relato
levanta perguntas decisivas a todos nós e a cada um de nós particularmente. Diante de quem ou diante de que
nós nos ajoelhemos? Como se chama o “deus” a quem adoramos no fundo do nosso
ser? Será que, realmente, adoramos o Menino de Belém, Jesus Cristo? colocamos a
seus pés nossas riquezas, nosso bem-estar, nossas capacidades para o bem comum?
Quais são valores que guiam nossa vida de cada dia?
P. Vitus Gustama,SVD