quarta-feira, 29 de abril de 2015

Domingo 03/05/2015
 
PERMANECER EM CRISTO PARA PRODUZIR BONS FRUTOS

V DOMINGO DA PÁSCOA ANO “B”


Evangelho: Jo 15,1-8

Naquele tempo, Jesus disse a seus discípulos: 1“Eu sou a videira verdadeira e meu Pai é o agricultor. 2Todo ramo que em mim não dá fruto ele o corta; e todo ramo que dá fruto, ele o limpa, para que dê mais frutos ainda. 3Vós já estais limpos por causa da palavra que eu vos falei. 4Permanecei em mim e eu permanecerei em vós. Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós não podereis dar fruto, se não permanecerdes em mim. 5Eu sou a videira e vós os ramos. Aquele que permanece em mim, e eu nele, esse produz muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer. 6Quem não permanecer em mim, será lançado fora como um ramo e secará. Tais ramos são recolhidos, lançados no fogo e queimados. 7Se permanecerdes em mim e minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes e vos será dado. 8Nisto meu Pai é glorificado: que deis muito fruto e vos torneis meus discípulos.

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O texto se encontra no complexo literário de Jo 13-17 que fala da despedida de Jesus de seus discípulos. A última mensagem de Jesus para os seus discípulos se precede com a cena da última ceia com o lava-pés que culmina com o anúncio da traição (Jo 13,1-20).  Em outros capítulos (Jo 14-17) relatam-se os diálogos da despedida de Jesus que termina com a oração de Jesus ao Pai. Na verdade não há mais que um discurso de despedida a não ser somente nos capítulos 13,31-14,31. A continuação lógica de Jo 14,31 é Jo 18,1. Jo 15-17 tem sido introduzido neste espaço pelo evangelista-redator para incluir no evangelho o material precioso que até agora não havia encaixado dentro do esquema do evangelista.


Na presença dos seus amigos íntimos, Jesus começa a transmitir sua mensagem final (Jo 13,31-17,26). Como qualquer grande líder que reúne seus seguidores na véspera de sua morte para dar-lhes instruções quando ele partir, também Jesus, antes de sua morte, faz a mesma coisa. Mas ele lhes garante que sua morte não é um fim, pois ele vai para seu Pai. Aqui, nestes capítulos, Jesus repetidamente promete que ele vai voltar para os discípulos através de sua ressurreição e do dom do Espírito Santo. Esta volta vai trazer-lhes paz e alegria, e que os discípulos vão entrar também na comunhão de sua vida através do Espírito, que é o dom de Jesus ressuscitado.
 

O contexto mais imediato do nosso texto é Jo 15,1-17. A primeira parte (vv.1-8) se concentra em matéria alegórica, a videira e os ramos, com a linguagem direta, que apresenta Jesus como o EU SOU. Nesta parte acentua-se a exigência de permanecer em Jesus para produzir frutos. A segunda parte (vv.9-17) fala do amor como objeto da revelação. Aprofunda-se nesta parte o mistério do amor de Deus em Jesus Cristo e a missão dos cristãos de frutificar na prática do amor fraterno (esta parte falaremos no próximo domingo). Nesta segunda parte, a imagem da videira não aparece mais a não ser apenas a expressão “produzir fruto”. Quando se fala de “produzir fruto” no seu sentido literal, fala-se inevitavelmente do tronco (árvore ou videira neste contexto).


Quando Jesus se autoproclama como a “verdadeira videira”, porque existe outra videira falsa. Quem é que representa essa videira falsa? (mais adiante falaremos). A verdadeira videira é a imagem que evoca vida, seiva, fruto abundante ou ramos cheios de frutos de qualidade. Para entender esta autoproclamação de Jesus, como a verdadeira videira, devemos ter na nossa mente alguns textos do AT que contém a contraposição à afirmação de Jesus.


Para qualquer judeu da Palestina, a videira é muito familiar, pois ela é um dos pilares econômicos do país. Ela é sinônimo de paz e felicidade. No livro dos Cânticos, a vinha pode designar a esposa (cf. Ct 1,14;2,15;6,11;7,9.13;8,12). Mas sobretudo, é símbolo da comunidade.  A vinha é uma imagem do povo de Israel em relação ao Deus da Aliança. Alguns textos vão comprovar esta afirmação.


Oséias, o mais antigo dos profetas, descreve Israel como uma vinha viçosa ou florescentes que produz muito fruto(Os 10,1), mas tem um coração infiel(Oséias compara o povo da aliança como uma esposa infiel e Deus como um marido fiel que vai atrás da esposa para salvá-la). Assim essa vinha que tem muitas folhas,  se torna uma vinha inútil, pois não se encontra nenhum fruto. O profeta Isaías faz um poema ou um cântico sobre Israel onde ele o descreve como uma vinha ingrata(Is 5,1-7). O cântico se transforma, assim, em uma queixa e um julgamento. O profeta Jeremias fala da degeneração da vinha de qualidade: torna-se em vinha bastarda(Jr. 2,21; cf. também Jr 5,10;12,10-11; Sl 80,9-12;Ez 17,5ss). A conduta de Israel se mostra decepcionante seja por seus próprios pecados, seja por causa de seus maus pastores.


O nosso texto deste domingo tem seu pano de fundo nos textos acima citados. Mas o evangelista Jo modifica alguns termos, como em vez de falar de “vinha”(plantação de uvas), fala-se da “videira”(pé de uva) para enfatizar a união profunda entre tronco e ramos e a conseqüência da desunião do tronco é a morte para o ramo. Por isso, a palavra chave para o texto de hoje é “permanecer” que tem como conseqüência  “produzir fruto”.
 
 
Que tipo de ramos somos nós? Será que sabemos produzir uvas de qualidade ou  apenas uvas ácidas, como aconteceu com o povo de Israel?
 
Eu sou a verdadeira videira e vós, os ramos”, diz Jesus. Esta imagem serve para sublinhar a comunicação e circulação de vida divina que existe entre Jesus e aqueles que nele crêem. Meditar estas palavras sobre a videira e os ramos significa encontrar a relação que nos liga, na sua dimensão mais profunda, a Ele. É uma relação mais profunda até do que aquela que existe entre pastor e o rebanho, sobre a qual meditamos no domingo anterior. No evangelho deste domingo descobrimos onde é que reside a força interior de nossa religião (2Tm 3,17). É em Jesus.
 
 
Alguns elementos deste texto sobre os quais precisamos meditar. Está aberta, porém, a possibilidade para outras pessoas verem de outro ângulo. O Evangelho é sempre um tesouro para ser descoberto por todos e de todos os lados.
 
1. Jesus é a verdadeira videira
   
O que Israel não foi capaz de dar a Deus, Jesus lho dá. Jesus é a videira fiel, porque correspondeu aos cuidados e à expectativa de Deus e produziu o vinho bom da fidelidade à aliança.  Por si mesmo, a imagem de “verdadeira videira” evoca vida, seiva, fruto. Jesus é a nova videira, a autêntica, capaz de produzir a vida para quem não a tem; o amor para quem se sente mal amado; a justiça para quem é injustiçado; o otimismo e a esperança para quem se sente frustrado e desesperado; o Caminho para quem se sente perdido; a  Luz para quem se sente desorientado e se encontra na escuridão nesta vida; o alimento para quem é faminto; a água viva para quem está com sede e a vida para quem está desanimado. Em Jesus, então, descobrimos a força sem fim para enfrentar qualquer tipo de situação nesta vida.  Jesus dá seu fruto, dando sua vida, derramando seu sangue, prova suprema de seu amor por nós. E o vinho, fruto da videira, será, no mistério eucarístico, o sinal sacramental deste sangue derramado para a remissão dos pecados e para selar a Nova Aliança e será o meio de comungar do amor de Jesus. Nele encontramos, realmente e somente nele, o sentido de nossa vida e de nossa luta de cada dia. Ele é realmente a videira verdadeira.


 2. Nós somos  os ramos da videira verdadeira
  
Jesus nos diz: “Eu sou a verdadeira videira e vós, os ramos”. O ramo é uma extensão e um prolongamento do tronco (da videira). Do tronco é que vem a seiva (linfa) para o ramo que o nutre, a umidade do solo e tudo aquilo que ele transforma depois em uva sob os raios do sol. Se não é alimentado pela videira, nada pode ele produzir.
  
Onde se situa essa relação, quando aplicada a nós, homens para que possamos produzir frutos ? Quais são condições para produzirmos mais frutos?


a) Para produzirmos frutos necessitamos permanecer no tronco que é Cristo.         


O verbo “permanecer” aparece 118 vezes no NT, principalmente nos escritos joaninos (no evangelho de Jo 40 vezes, 1Jo 24 vezes e 2Jo 3 vezes; em Lc 20 vezes: 13 deles em At; 1Cor 8 vezes; Hb 6 vezes; e em outros escritos neotestamentários o verbo aparece esporadicamente). Neste Evangelho o verbo “permanecer” aparece sete vezes para exprimir a união entre o tronco e os ramos, ou seja, entre Jesus e os fiéis.


A expressão “permanecer” tem em Jo uma conotação do definitivo, do perene no relacionamento com Jesus fundado na fé, um relacionamento de confiança e fidelidade recíproca que existe entre Jesus e seus seguidores. Com esta permanência, os seguidores terão condições de produzir frutos. O sentido é o da mútua união de Deus (ou Jesus, ou o Paráclito) nos seus e deles em Deus. Não se trata de uma mera “união moral” entre os fiéis e Jesus/Deus. Da parte de Deus (em Jesus) trata-se da presença salvífica; e, na medida em que abrimos espaço para a presença de Deus no meio de nós e em nós, também nós “permanecemos” no âmbito dele. E da parte dos fiéis (nós), esse permanecer significa concretamente o continuar na profissão de fé em Jesus e a comunhão do amor fraterno (Evangelho do domingo posterior). Somente em contato com Jesus temos vida e força interior, capacidade e constância para transformar a dura realidade e vencer o mal dentro e fora de nós.


Permanecer em Cristo significa também não abandonar os compromissos assumidos (no batismo, no matrimônio etc.), não se afastar da fonte que é Cristo, como o filho pródigo, entregando-se a uma vida de pecado consciente e intencionado.


Permanecer em Cristo significa também permanecer no seu amor (Jo 15,9): no amor que ele tem por nós, mais que no amor que nós temos por Ele; significa, pois, permitir-Lhe que nos ame, que nos faça passar a sua “seiva” que é o Seu Espírito, evitando pôr entre Ele e nós a insuperável barreira da auto-suficiência e da indiferença.


A intensidade deste “permanecer” recíproca é mostrada no versículo 4b. Aqui Jesus exorta a todos os seguidores: “Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós não podereis dar fruto, se não permanecerdes em mim”(v.4b). Os opostos “produzir frutos” e “ser estéril” exprimem salvação ou perdição final. A separação de Jesus significa esterilidade absoluta. Um cristão que não permanece unido a Cristo, resseca, não dá fruto. Ele pode até ter uma vida brilhante, cheia de saúde, de idéias, exibir energia, negócios, filhos e ser, aos olhos de Deus, lenha seca, sem vida, um coração vazio. Quem pertence aparentemente ao grupo cristão, mas não mantém ligação com Jesus, é um membro morto. Só atrapalha mais do que ajuda. Tudo, quando se afasta do tronco que é Jesus Cristo, tende a morrer. Pessoas afastadas dos outros e de Deus murcha, seca e morre.


Se permanecermos em comunhão com Jesus e “suas palavras permanecerem em nós”, receberemos tudo o que em seu nome convém pedir. O Evangelho de João usa de modo surpreendente o termo “permanecer”(equivalente a “morar”) para expressar a presença das palavras de Jesus em nossa vida(15,4). Suas palavras são equivalentes à sua pessoa. Se quisermos saber se Cristo está em nós, cabe verificar se suas palavras desempenham um papel efetivo(e afetivo) em nossa vida. Segundo Jesus, se nos deixarmos levar por Sua Palavra e pela fé, estaremos limpos e incluídos na produção da videira. Neste caso o permanecer e o produzir frutos são duas coisas inseparáveis. Não existe produção de frutos sem a permanência em Jesus e não existe uma comunidade duradoura de Jesus que fique por todo o tempo sem produzir frutos. Precisamos ser como o ramo unido ao tronco. O ramo não encontra sentido longe de quem o alimenta e sustenta. A unidade é o caminho para superar as crises e as adversidades.


Tudo isto nos faz perguntar: “Que frutos eu tenho produzido? Se tudo está errado, preciso parar urgentemente porque talvez eu esteja desligado do tronco(Jesus), por isso não tenho recebido a seiva suficiente para ser bom seguidor, o que me tornar em ramo seco.


b) Para podermos produzir frutos precisamos ser podados.
  

A videira é uma planta que precisa de muitos cuidados. Todos os anos ela deve ser podada para que a seiva se concentre em poucos ramos, fortes e vivos. Qualquer agricultor bom não tem medo de podar uma videira, porque ele sabe que com isso, a videira vai produzir muito mais frutos. Ele não fica acariciando as folhas verdes da videira.  Uma videira, embora viçosa, se não for podada no tempo certo com muito desvelo, depois de alguns anos, não produz mais nada que preste. Além disso, os ramos secos são tirados.
  

Jesus diz: “Todo ramo que dá fruto, o Pai o limpa, para que dê mais fruto ainda”(v. 2). Ao falar em “dar fruto”, Jesus usa a expressão que nos recorda inevitavelmente o grão de trigo que se morrer, dará muito fruto(Jo 12,24). Mas não é a morte ou a poda o que se assemelha à videira, mas a vida e o fruto abundante que por elas se alcançam.
   

A poda é uma limpeza profunda. E limpo é aquele que encontra a sua identidade no seu vínculo com o Senhor e no serviço aos demais e aquele que fala de acordo com  seu agir e agir como fala. Por meio disso a Palavra nos limpa, nos transforma por dentro e nos torna diferentes: “Vós já estais limpos por causa da palavra que eu vos falei”(v. 3). Acreditar na Palavra é dar fruto. O Evangelho, que é a Palavra de Deus em Jesus Cristo, é então como uma poda. Ele golpeia a cobiça, tudo aquilo que nos dispersa em tantos projetos vãos e desejos terrenos; ao invés, fortifica as energias sadias e espirituais; concentra-nos sobre os valores verdadeiros, colocando em crise os valores falsos. Precisamos fazer várias podas na nossa vida se quisermos crescer como bons cristãos: poda das riquezas armazenadas, do boato e fofoca, da soberba, do poder temporal e influências mundanas, da ganância, da preguiça, do egoísmo, da mentira, da hipocrisia, assim por diante. Sem estas podas sobra-nos lenha seca e falta-nos seiva jovem e vida nova do Espírito.


3. Promessa para quem permanece em Jesus
 

Permanecer em Cristo não só serve para que possamos nos assemelhar à vida de Cristo mas muito mais do que isso. Ele promete: “Se permanecerdes em mim e minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes e vos será dado”(v. 7). Estas palavra nos leva ao cerne do que é rezar. Rezar significa estar em perfeita sintonia com Jesus e seu plano, fazendo-lhe a vontade. Se fizermos assim, nenhuma prece vai ficar sem resposta, receberemos tudo o que em seu nome convém pedir e nenhum esforço será inútil.
    

Vamos nos perguntar: Sou um ramo vivo ou seco? Se eu ficar atrapalhando a vida dos outros em vez de ajudá-los, talvez seja um sinal de que estou virando um ramo seco. Será que ainda não permaneço em Cristo, por isso as minhas orações, aparentemente não são atendidas? Qual parte da minha vida que preciso podar para que eu seja mais feliz e útil para mim mesmo e para os outros ?

P. Vitus Gustama,svd

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