quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Domingo,25/02/2018
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NA ESCUTA DA PALAVRA DE DEUS EU ME DESCUBRO E CRESÇO COM OS OUTROS IRMÃOS RUMO À GLÓRIA DE DEUS
II Domingo Da Quaresma Ano B


Primeira Leitura: Gn 22,1-2.9a.10-13.15-18
Naqueles dias, 1 Deus pôs Abraão à prova. Chamando-o, disse: “Abraão!” E ele respondeu: “Aqui estou”. 2 E Deus disse: “Toma teu filho único, Isaac, a quem tanto amas, dirige-te à terra de Moriá e oferece-o aí em holocausto sobre um monte que eu te indicar”. 9ª Chegados ao lugar indicado por Deus, Abraão ergueu um altar, colocou a lenha em cima, amarrou o filho e o pôs sobre a lenha, em cima do altar. 10 Depois, estendeu a mão, empunhando a faca para sacrificar o filho. 11 E eis que o anjo do Senhor gritou do céu, dizendo: “Abraão! Abraão!” Ele respondeu: “Aqui estou!” 12 E o anjo lhe disse: “Não estendas a mão contra teu filho e não lhe faças nenhum mal! Agora sei que temes a Deus, pois não me recusaste teu filho único”. 13 Abraão, erguendo os olhos, viu um carneiro preso num espinheiro pelos chifres; foi buscá-lo e ofereceu-o em holocausto no lugar do seu filho. 15 O anjo do Senhor chamou Abraão, pela segunda vez, do céu, 16 e lhe disse: “Juro por mim mesmo — oráculo do Senhor —, uma vez que agiste deste modo e não me recusaste teu filho único, 17 eu te abençoarei e tornarei tão numerosa tua descendência como as estrelas do céu e como as areias da praia do mar. Teus descendentes conquistarão as cidades dos inimigos. 18 Por tua descendência serão abençoadas todas as nações da terra, porque me obedeceste”.


Segunda Leitura: Rm 8,31b-34
Irmãos: 31b Se Deus é por nós, quem será contra nós? 32 Deus, que não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos daria tudo junto com ele? 33 Quem acusará os escolhidos de Deus? Deus, que os declara justos? 34 Quem condenará? Jesus Cristo, que morreu, mais ainda, que ressuscitou, e está à direita de Deus, intercedendo por nós?


Evangelho: Mc 9,2-10
Naquele tempo, 2Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, e os levou sozinhos a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E transfigurou-se diante deles. 3Suas roupas ficaram brilhantes e tão brancas como nenhuma lavadeira sobre a terra poderia alvejar. 4Apareceram-lhe Elias e Moisés, e estavam conversando com Jesus. 5Então Pedro tomou a palavra e disse a Jesus: “Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”. 6Pedro não sabia o que dizer, pois estavam todos com muito medo. 7Então desceu uma nuvem e os encobriu com sua sombra. E da nuvem saiu uma voz: “Este é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz!” 8E, de repente, olhando em volta, não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus com eles. 9Ao descerem da montanha, Jesus ordenou que não contassem a ninguém o que tinham visto, até que o Filho do Homem tivesse ressuscitado dos mortos. 10Eles observaram esta ordem, mas comentavam entre si o que queria dizer “ressuscitar dos mortos”.
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No segundo Domingo da Quaresma pode se encontrar um elemento que une as distintas linhas das leituras: a cruz no horizonte, o anúncio da morte salvadora de Jesus Cristo.


O sacrifício de Isaac (Primeira Leitura: Gn 22,1-2.9a.10-13.15-18) sempre foi, em vários sentidos, a figura de Jesus Cristo. A fidelidade de Abraão lhe leva a estar disposto a entregar seu filho único, Isaac, porque ele entendia que esse era o caminho que Deus lhe convidava a seguir; como Jesus Cristo, em Getsêmani, se dispõe a seguir o caminho que o Pai lhe pede, apesar de toda a angústia daquele momento. O Salmo Responsorial anuncia que Deus (como fez com Abraão) não quer a morte e sim a vida, e se converte, assim, ao mesmo tempo, em anúncio da vitória definitiva sobre a morte.


Isaac é o filho primogênito. Jesus é o Filho primogênito do Pai. Filho primogênito é nossa maior ilusão, aquele de quem não queremos nos desprender por nada no mundo, fruto de muitos trabalhos e de grandes sacrifícios, o ídolo secreto do coração. O drama do Monte Moriá não terminou sem uma vítima. Um carneiro apareceu lá, como se descesse do céu, para estar no lugar de Isaac. A imagem de Abraão e Isaac é uma sombra. O verdadeiro Abraão, que não poupou o seu único filho, é Deus o Pai (cf. Jo 3,16). O verdadeiro Isaac, obediente e oferecido sobre a lenha ou o madeiro é Jesus. Ou melhor, Jesus é o verdadeiro cordeiro que tira o pecado do mundo para nos resgatar. "E isso ele fez de uma vez por todas, oferecendo-se a si mesmo" (Hb7, 27).


A Segunda Leitura (Rm 8,31b-34) recolhe o tema com outras imagens: como Abraão não duvidou em entregar seu filho único, Deus amou tanto o mundo que tampouco duvidou em entregar seu próprio Filho, Jesus Cristo, por nós todos.


E o Evangelho da transfiguração é um anúncio de que a morte de Jesus Cristo será gloriosa. A cena se situa depois que Pedro confessou (que ele entendeu mal) Jesus Cristo como Messias, e que em seguida Jesus Cristo anunciou a paixão. A transfiguração será, então, uma experiência profunda de Jesus Cristo, compartilhada com o discípulos, de que aquele caminho de morte é o caminho de Deus: aquele que caminha para a morte é o Filho amado de Deus. Seu caminho é o único caminho que precisa ser escutado e seguido.


Além disso, Cristo, no Tabor, faz uma denúncia e um anúncio. Denúncia de qualquer realização humana que se compreenda como definitiva. “Mestre, é bom ficarmos aqui. Vamos fazer três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias” (Mc 9, 5). Anúncio de um futuro que ainda não chegou, mas está presente na esperança, antecipando-se como um motivo para o esforço humano na história. É o Anúncio do mistério pascal: morte e ressurreição. Esta esperança, na qual o futuro é vivido, nos leva a responsabilidade e compromisso no mundo, porque este mundo não é plenamente realizado. O fim chegará, quando acontecer a vitória final de Jesus sobre os poderes deste mundo.


E o prefácio próprio deste domingo interpreta adequadamente este conteúdo, que este ano, em Marcos, apresenta um elemento peculiar: os discípulos não entendem o que poderia significar “ressuscitar dos mortos”.


O caminho pascal, o programa quaresmal, é sério. Passa pela prova e a tentação e o cansaço e a dúvida. A fé é projeto e caminho. E, às vezes, é escândalo. A Quaresma e a Páscoa nos convocam a um seguimento de um Cristo difícil porque tomou a sério a solidariedade com os homens e a fidelidade à vontade do Pai para salvar os homens. Jesus não buscou a Cruz e sim o Reino. Por buscar o Reino encontrou-se com a Cruz que ele carregou. Jesus abraçou com ternura e carinho a causa de Deus: a fraternidade dos homens, o Reino entre nós. Para os discípulos ou para os cristãos que trabalham pelo Reino passam pela mesma experiência: sempre há pessoas que levantam a Cruz para ser carregada que acaba com suas vidas. Uma cruz, uma bala, uma calunia, uma excomunhão, uma perseguição implacável. Mas Deus é quem tem a última palavra. Assim a Cruz nos põe no caminho para chegar à glória. A glória é que dá sentido à Cruz.


Para ser fieis a esta vida nova que Deus nos oferece, teremos que sacrificar algum “filho Isaac” na nossa vida. Qual é este “filho Isaac” que amamos tanto e que preferimos a ser infiéis a Deus a sacrificar aquilo que amamos, mas não nos salva?


É fácil conectar este tema com a Eucaristia que é o Sacramento desta Aliança Nova, participação no sangue do Servo, Jesus, derramado por todos nós, o sangue da Nova Aliança entre Deus e nós. Cada Eucaristia é a renovada aceitação da Palavra de Deus como critério de vida: cumpre-se o “este é meu Filho: escutai-O!”. Se a linha que se segue é o Mistério Pascal, não há momento mais privilegiado que a Eucaristia para nos integrar a esse caminho de Morte e Ressurreição de Cristo: Celebramos o memorial de sua Páscoa em cada Eucaristia. É o mistério do amor incondicional de Deus por nós!


Aprofundemos um pouco mais a cena da transfiguração neste segundo Domingo da Quaresma para dela tirarmos algumas mensagens!


O texto do Evangelho deste Domingo pertence à segunda parte do Evangelho de Marcos que fala do mistério do Filho do Homem: revelação do sofrimento de Jesus. Esta segunda parte é formada por três grandes seções:


1). O Caminho do Filho do Homem (8,31-10,52) na qual Mc enfatiza claramente sua Teologia da Cruz. Fala-se nesta parte três anúncios da paixão de Jesus que sempre termina com o anúncio da ressurreição. Para Marcos imitar Jesus significa seguir seu caminho. A expressão “no caminho” ocorre como refrão nesta seção. Jesus e seus discípulos estão “no caminho” (cf. Mc 8,27), e no fim, quando estão perto de Jerusalém, Bartimeu, depois que voltou a enxergar, segue a Jesus “no caminho” (10,52). “No caminho” os discípulos discutem sobre quem será maior (9,33-34). Jesus continua a “retomar seu caminho” (Mc 10,17) e conduz seus discípulos “no caminhorumo a Jerusalém (Mc 10,52).


2). Na segunda seção Jesus se encontra em Jerusalém (Mc 11,1-13,37). Nesta seção falam-se das discussões mais ou menos polêmicas entre Jesus e os círculos dirigentes de Jerusalém: sumos sacerdotes, escribas, fariseus herodianos, saduceus. Nesta seção Mc quer antecipar as motivações da condenação de Jesus. Esta seção termina com o discurso escatológico (Mc 13,1-37).


3). A terceira seção fala da paixão e ressurreição de Jesus (Mc 14,1-16,8).                                         


 Mistério Da Transfiguração


O evangelho deste dia fala sobre a transfiguração de Jesus. O relato da transfiguração podemos encontrar também em outros dois evangelhos sinóticos (Mt 17,1-13; Lc 9,28-29), e numa versão independente dos evangelhos, mas somente fragmentária, que se encontra em 2Pd 1,16-18.


A transfiguração de Jesus é a resposta de Deus ao escândalo causado nos discípulos, mostrando-lhes antecipadamente, ainda que seja num momento rápido, a glória de Jesus Cristo e a glória futura dos que seguem pelo caminho da cruz por causa de Jesus Cristo.


A transfiguração tem como finalidade animar os discípulos a seguirem Jesus no seu caminho apesar dos sofrimentos, pois a vitória está garantida para os que perseverarem até o fim (cf. Mt 10,22). A transfiguração é, então, a glorificação antecipada de Cristo na presença de seus três mais íntimos (Pedro, Tiago e João). Os discípulos somente superarão o escândalo da “necessidade” da Paixão depois da Páscoa e de Pentecostes: depois de verem Jesus na sua glória de ressuscitado e de serem fortalecidos pelo Espírito Santo (cf. At 2,1-13).


Com a transfiguração os discípulos encontram em Jesus as duas faces do mistério da salvação. De um lado, mostra-se a face que causa medo, pois falam-se do sofrimento, da humilhação e da morte. Ninguém quer sofrer. Todos lutam contra sofrimento, pois o sofrimento sempre significa um prenúncio da morte. Por isso, todos fazem qualquer coisa para ficar longe do sofrimento. Não é de admirar que mais tarde Pedro preferirá negar Jesus a confessar-se discípulo do mesmo por medo de ser morto (cf. Mc 14,66-72).


Do outro lado, mostra-se a face gloriosa de Jesus: a ressurreição e a glória. Por essa razão, em cada um dos três Anúncios da Paixão acrescenta-se o anúncio da ressurreição “ao terceiro dia” (cf. Mc 8,31;9,31;10,34). O Deus de Jesus é Aquele que mostra logo no início o final feliz, e mostra logo a vitória final logo no início da luta. Ele mostra logo a vitória final de Jesus. A vitória garantida anima qualquer um a lutar até o fim sem se cansar. A vitória garantida lheforça para lutar até o fim.


Jesus leva consigo os três discípulos mais íntimos para “uma alta montanha” (v.2). A tradição cristã, desde, mais ou menos, o século III, identifica essa “alta montanhacom o Tabor. Na verdade, Mc não se preocupa com o sentido topográfico da “alta montanha” (de fato, o monte Tabor tem 400 m sobre o nível do Mediterrâneo, e 780 m sobre o lago de Tiberíades). Para Mc “montanha” significa lugar do encontro com Deus. E não precisa de lugar bem alto, no sentido literal da palavra, para alguém se encontrar com Deus, pois Deus está dentro da própria pessoa (cf. Mt 25,40.45; 1Cor 3,16-17). Mas como para escalar uma montanha é difícil, do mesmo modo é difícil também para nós entrarmos dentro de nós mesmos, na profundeza de nosso ser onde Deus habita (cf.1Cor 3,16-17). O homem chegou até a lua. Mas será que ele conseguiu entrar dentro de si para se descobrir quem ele é?


Na “alta montanha” Jesus se transfigurou (metamorfoseado) diante dos três discípulos. Embora seja tirado por alguns momentos o véu e as máscaras que ocultam o esplendor da glória de Jesus, os discípulos podem ver com seus olhos o que constitui a realidade mais profunda da pessoa de Jesus. A narração é rica em alusões ao AT. A “transfiguraçãoera um tema da Literatura Apocalíptica (Dn 12,3; cf. 1Cor 15,40-44;2Cor 3,18). As vestes brancas e resplandecentes eram símbolo da glória dos justos no céu (Dn 7,9). A brancura deslumbrante simboliza a glória da condição divina (cf. Mc 16,5).


Durante a transfiguração entram em cena duas figuras do AT: Moisés e Elias. Moisés representa a Lei do AT. Elias representa os profetas. Em outras palavras, os dois (Moisés e Elias) representam o AT na sua totalidade. Daqui em diante, a validade do AT se julga a partir de Jesus, pois Jesus é o ponto de chegada e a meta de todas as profecias e revelações do AT. Por isto, mais adiante, vai ter uma ordem da nuvem para que Jesus seja escutado.


Diante desta teofania Pedro reage dizendo: “Rabbi, é bom estarmos aqui. Façamos, pois, três tendas...” (v.5). O termo “Rabbi” em Mc somente sai da boca de Pedro (Mc 9,5;11,21), e de Judas (Mc 14,45). Rabbi era o título honorífico dos Mestres da Lei, fiéis à tradição judaica. Isto quer nos dizer que Pedro ainda está apegado à tradição antiga. Além disto, Pedro quer colocar os três no mesmo nível ao querer fazer três tendas para os três (Jesus, Moisés e Elias). Pedro se esquece de que em Jesus realiza-se tudo que foi profetizado no AT e ao mesmo tempo quer mostrar-lhe que Jesus inicia uma nova etapa em que o Reino de Deus entrou definitivamente na história humana e com Jesus o homem deve caminhar para sua realização plena (Mc 1,15).


A vontade de Pedro de querer fazer três tendas é interpretada com frequência como uma nova tentativa de Pedro de deter Jesus em seu caminho rumo à Paixão, quase uma repetição daquilo que Mt relata (cf. Mt 16,22). Quem quer construir uma tenda, porque está cansado de caminhar. E por isso, quer fixar sua morada num lugar e não quer mudar-se dali. Pedro quer perpetuar alegria no monte sozinho com Jesus e outros dois colegas. Jesus, ao contrário, sempre está a caminho e quer que os seus façam a mesma coisa. É preciso caminhar para ver mais apesar das dificuldades da vida, mas sempre com o olhar fixo na esperada vitória. A glória de Jesus é inseparável da cruz, ainda que seja por um instante. É a revelação de um novo gênero de glória e de poder que exige muita renúncia, especialmente renúncia do poder que aterroriza e escraviza os outros.


Cristo é o espelho no qual contemplamos a glória divina. E nós, por nossa vez, devemos ser o espelho que, contemplando Cristo, reflete a glória divina para os outros. Mas não podemos somente refletir o que contemplamos. Precisamos nos transformar naquilo que contemplamos (cf. 2Cor 3,18; Rm 12,2). E todos são chamados a transformar o mundo atual em sua condição primordial onde somente havia a harmonia total. Caminhar com Jesus significa deixar as nossas seguranças, e optar pela vida através da morte.


A vontade de Pedro de querer fazer as três tendas recebe uma resposta que sai da nuvem. ”E da nuvem sai uma voz: ‘Este é o meu Filho, o amado; escutai-O’” (v.7). A nuvem é o sinal da presença de Deus nas teofanias do AT (cf. Ex 16,10;19,9;24,15-16;40,35). A declaração sobre a filiação divina e a amabilidade de Jesus repete a mesma revelação que aconteceu no momento do Batismo de Jesus (cf. Mc 1,11). Mas na transfiguração é acrescentada a exortação “escutai-O” (cf. Dt 18,15). O títuloFilho amado” (cf. Is 42,1; Sl 2,7; Gn 22,2.12.16 como inspiração do título) apresenta Jesus como o Messias esperado. Este título constitui a confirmação divina da confissão de Pedro em Mc 8,29. Daqui em diante Jesus é o único a quem os discípulos devem escutar (cf. Dt 18,15.18). Ao escutar Jesus, o discípulo chegará à vitória final.


Mistério Da Escuta


Queremos aprofundar um pouco mais sobre o mistério da escuta. A voz ressoa da nuvem, dizendo: “Este é o meu Filho, o amado, escutai-O”.


O episódio da transfiguração ilustra bem o papel central da escuta: da escuta da Palavra e, em geral, da escuta de Deus e da escuta do seu Espírito. Escutar significa tornar-se ou estar atento para ouvir ou aplicar o ouvido com atenção para perceber ou ouvir (Dicionário Aurélio).


A escuta é uma palavrachave que caracteriza toda a tradição do povo hebraico.  O piedoso israelita para se compenetrar da vontade de Deus repete dia a dia esta frase: “Escutai, ó Israel” (Dt 6,4; Mc 12,29). Segundo o sentido hebraico da palavra, escutar, acolher a Palavra de Deus não é somente prestar-lhe ouvidos atentos, mas abrir-lhe o coração (At 16,14), pô-la em prática (Mt 7,24ss) e obedecer-lhe (Lc 1,38: “Faça-se em mim segundo a Sua Palavra”). Essa é a obediência da que a pregação ouvida exige. Como diz São Paulo: “A procede da audição e a audição da Palavra de Cristo” (Rm 10,14-17). O drama do homem, na verdade, consiste em não escutar a Deus e a Sua Palavra. Ele diz no livro de Deuteronômio: Eu, Deus, pedirei contas a quem não escutar as palavras de quem pronunciar em meu nome (Dt 18,16.19). Por isso, Jesus declara feliz quem escuta a Palavra de Deus e a observa: “Felizes os que escutam a Palavra de Deus e a observa” (Lc 11,28).


A riqueza, o valor nutritivo da escuta de Jesus, vividos por qualquer um de nós é uma escuta que nos faz tremer, que nos arrebata porque diz respeito a nós, nos explica. Não é uma escuta passiva, um registro aborrecido como uma ata, ou uma aula sem interesse. Escutar significa descobrir o mistério de nós mesmos na escuta da Palavra de Quem é maior do que nós, que é o mesmo que criou o nosso coração, aquele que nele deposita seus segredos. Através da escuta da Palavra divina, a pessoa chega a ter a autocompreensão, a autenticidade, até a clareza do processo cognitivo de si e que ao mesmo tempo o toma por inteiro.


O mistério da escuta é, pois, uma revelação: revelação que nós somos chamados a aceitar, da condição humana. Quando nos abrirmos para o discurso divino, gratuito, cheio de benevolência, aprendemos que nós somos escuta, dom e que nós nos realizamos na gratuidade.


A escuta de Deus é a rocha da nossa certeza (Sl 89,27). A Boa Notícia consiste no fato de que Deus tem uma palavra para mim, para minha família, para meu casamento, para meu trabalho, para meus problemas, para minha angústia etc. e eu posso escutar esta palavra no silêncio e na paz. Eu me alimento desta escuta, eu cresço na e me realizo como pessoa. Eu cresço junto a tantos outros que, como eu, formam a Igreja que caminha, escutando a Palavra de Deus.


Mas para termos a capacidade e uma atitude de escuta, temos que saber primeiro criar o silêncio. O silêncio nos ajuda, de fato, a calarmos em nós a fantasia, o nosso ser, e a limparmos da alma tudo quanto nos possa perturbar. É um silêncio que escuta, que acolhe, que se deixa animar. O silêncio cria ressonância à Palavra de Deus. Depois de se fazer silêncio, escuta-se melhor.


A pessoa que expulsa de seus pensamentos o Deus vivo, Aquele que é o único capaz de encher todos os espaços, o Único capaz de satisfazer seus anseios não consegue suportar o silêncio. Para essa pessoa, o silêncio é a marca terrificante do vazio. Para ela, qualquer palavra até a mais insípida parece ter o dom de libertá-la de uma prisão, de um vazio. Na verdade, cada um de nós é vítima da agressão externa de hordas de palavras, de sons, de clamores que ensurdecem o nosso coração, o nosso dia e até mesmo, às vezes, a nossa própria noite.


Quem quer escutar a Deus deve lutar para assegurar ao céu da sua alma aquele prodígio de um silêncio. depois de amor ao silêncio é que despertará a nossa capacidade de escuta.


Deus tem uma única palavra: Jesus Cristo. Numa única Palavra podem desabrochar outras. Basta cada um de nós escutar, ele vai amadurecendo. A Palavra vai à nossa procura. No silêncio a Palavra de Deus nos encontra.


O imperativo “Escutai-O!” dirige-se a todos os discípulos e para todas as pessoas que querem seguir Jesus. Para viver como comunidade dos eleitos de Deus é necessário escutar a Palavra de Jesus Cristo e viver dela.


Que tenhamos ouvidos atentos e coração aberto para acolher a Palavra de Jesus. “Escutai-O, pois ele é o Meu Filho amado”. De que modo você escuta Jesus Cristo diariamente? Quais são seus momentos de silêncio e de escuta da Palavra de Deus no seu dia a dia?
P. Vitus Gustama,svd

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