sábado, 3 de março de 2018

06/03/2018
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PARA APRENDER A AMAR VERDADEIRAMENTE TEMOS QUE APRENDER A PERDOAR
Terça-Feira da III Semana da Quaresma


I Leitura: Dn 3,25.34-43
Naqueles dias: 25 Azarias, parou e, de pé, começou a rezar; abrindo a boca no meio do fogo, disse: 34 'Oh! não nos desampares nunca, nós te pedimos, por teu nome, não desfaças tua aliança 35 nem retires de nós tua benevolência, por Abraão, teu amigo, por Isaac, teu servo, e por Israel, teu Santo, 36 aos quais prometeste multiplicar a descendência como estrelas do céu e como areia que está na beira do mar; 37 Senhor, estamos hoje reduzidos ao menor de todos os povos, somos hoje o mais humilde em toda a terra, por causa de nossos pecados; 38 neste tempo estamos sem chefes, sem profetas, sem guia, não há holocausto nem sacrifício, não há oblação nem incenso, não há um lugar para oferecermos em tua presença as primícias, e encontrarmos benevolência; 39 mas, de alma contrita e em espírito de humildade, sejamos acolhidos, e como nos holocaustos de carneiros e touros 40 e como nos sacrifícios de milhares de cordeiros gordos, assim se efetue hoje nosso sacrifício em tua presença, e tu faças que nós te sigamos até ao fim; não se sentirá frustrado quem põe em ti sua confiança. 41 De agora em diante, queremos, de todo o coração, seguir-te, temer-te, buscar tua face; 42 não nos deixes confundidos, mas trata-nos segundo a tua clemência e segundo a tua imensa misericórdia; 43 liberta-nos com o poder de tuas maravilhas e torna teu nome glorificado, Senhor'.


Evangelho: Mt 18,20-35
Naquele tempo, 21Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou: “Senhor, quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim? Até sete vezes?” 22Jesus respondeu: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. 23Porque o Reino dos Céus é como um rei que resolveu acertar as contas com seus empregados. 24Quando começou o acerto, trouxeram-lhe um que lhe devia uma enorme fortuna. 25Como o empregado não tivesse com que pagar, o patrão mandou que fosse vendido como escravo, junto com a mulher e seus filhos e tudo o que possuía, para que pagasse a dívida. 26O empregado, porém, caiu aos pés do patrão, e prostrado, suplicava: ‘Dá-me um prazo! e eu te pagarei tudo’. 27Diante disso, o patrão teve compaixão, soltou o empregado e perdoou-lhe a dívida. 28Ao sair dali, aquele empregado encontrou um de seus companheiros que lhe devia apenas cem moedas. Ele o agarrou e começou a sufocá-lo, dizendo: ‘Paga o que me deves’. 29O companheiro, caindo aos seus pés, suplicava: ‘Dá-me um prazo! e eu te pagarei’. 30Mas o empregado não quis saber disso. Saiu e mandou jogá-lo na prisão, até que ele pagasse o que devia. 31Vendo o que havia acontecido, os outros empregados ficaram muito tristes, procuraram o patrão e lhe contaram tudo. 32Então o patrão mandou chamá-lo e lhe disse: ‘Empregado perverso, eu te perdoei toda a tua dívida, porque tu me suplicaste. 33Não devias tu também, ter compaixão do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?’ 34O patrão indignou-se e mandou entregar aquele empregado aos torturadores, até que pagasse toda a sua dívida. 35É assim que meu Pai que está nos céus fará convosco, se cada um não perdoar de coração ao seu irmão”.
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Arrepender-Se De Verdade Dos Pecados Deve Ser Seguido Pelos Sinceros Propósitos De Uma Vida Nova Em Deus


Senhor, estamos hoje reduzidos ao menor de todos os povos, somos hoje o mais humilde em toda a terra, por causa de nossos pecados; neste tempo estamos sem chefes, sem profetas, sem guia... trata-nos segundo a tua clemência e segundo a tua imensa misericórdia; liberta-nos com o poder de tuas maravilhas e torna teu nome glorificado, Senhor”.


O texto da Primeira Leitura, tirado do Livro de Daniel, contém uma oração e confissão dos pecados do povo. Esta oração é composta na mesma época que o livro de Daniel foi composto (perseguição de Antíoco, 165 a.C). Esta passagem não se encontra no texto hebraico. Encontra-se nas seções gregas chamadas deuterocanônicas. Apesar de não ser original, a oração é belíssima.


O orante suplica a Deus que cumpra a sua promessa de fazer de Israel um povo incontável (Dn 3,36-37). Nos tempos da perseguição de Antíoco não há nem profeta, nem chefe nem sacrifício (Dn 3,38). O autor descobre o alcance sacrifical da penitência e da contrição.


A oração de Azarias gira em torno da tragédia do povo israelita castigado por Deus com o exílio na Babilônia. É uma confissão do povo por seus pecados posta nos lábios de Azarias pelo redator do Livro de Daniel.


As formulas de confissão dos pecados são estereotipadas e correntes na literatura dos Salmos: Israel foi castigado por seus pecados justamente, e parece como se Deus retirasse as promessas de Sua aliança. Consequentemente, Israel vive como um rebanho disperso, sem chefe nem profeta que lhe comunique as revelações de Deus. Para o perseguido somente Deus, por sua misericórdia, pode salvar seu povo. Ele suplica a Deus que se cumpra Sua promessa de fazer de Israel um povo numeroso. O arrependimento é seguido pelos sinceros propósitos de uma vida nova.


Em substituição dos sacrifícios de animais, que não podem ser feitos porque não tem mais templo, o protagonista se oferece humildemente a Deus. E sua oferenda, no lugar dos sacrifícios de animais, é um coração contrito e humilde. A oração do perseguido vale todos os sacrifício de bodes e de cordeiros.  


A doutrina do sacrifício espiritual (que os profetas pregam tanto) se estende, portanto, à perseguição. Deus educou progressivamente o seu povo a passar dos sacrifício sangrentos do começo para o sacrifício de oblação espiritual inaugurado por Jesus Cristo (cf. Hb 2,17-18; 10,5-7; Rm 5,19; Mt 27,38-60; Lc 18,9-14). Por sua vez, o sacrifício do cristão se inscreve na linha do sacrifício de Cristo: uma vida de obediência à vontade de Deus e de amor fraterno a fim de que a ação litúrgica tenha valor, como escreveu São Paulo aos romanos: “Eu vos exorto, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo, santo, agradável a Deus: é este o vosso culto espiritual. Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito” (Rm 12,1-2; Cf. Hb 9,14).


Pelo fato de pertencer à família de Deus, o cristão não pode ajustar-se aos moldes deste mundo. Diante da propaganda e da publicidade para a qual a massa é modelada, o cristão pode tirar de sua fé a resistência necessária. Diante das correntes majoritárias da opinião que não garante a salvação, o cristão encontra em sua fé a força suficiente para se manter em Deus que salva. Diante da tentação do poder e do dinheiro, o cristão encontra na sua fé as forças para testemunhar os valores cristãos. Ser cristão no mundo, desenvolver-se no mundo, aprender a viver com os demais é, portanto, para o cristão, um culto e um culto a Deus. Cristo nos salvou por meio de uma ação humana situada no coração do mundo e da história (cf. Hb 7,13). A integração de um cristão na organização da sociedade temporal e na resistência diante da injustiça e da desonestidade e da corrupção, para o cristão constitui um autêntico culto. “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito”.


Para Amar De Verdade É Necessário Aprender a Perdoar


Não te digo até sete vezes (deves perdoar), mas até setenta vezes sete”, disse o Senhor a Pedro.


Se a Primeira Leitura de hoje nos convida a pedirmos perdão a Deus, no Evangelho Jesus nos apresenta um passo a mais: que saibamos perdoar os outros toda vez que eles pecarem contra nós. Pedir o perdão a Deus e dar o perdão aos outros devem andar juntos, como rezamos no Pai-Nosso: “Perdoai-nos as nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”.


O texto do evangelho lido neste dia faz parte do quarto grande discurso de Jesus no evangelho de Mateus (Mt 18). Este discurso é conhecido como “Discurso comunitário”, isto é, como devemos conviver como uma comunidade. Para Mateus o pecado sempre existe, a fraqueza humana nunca conhece seu fim. Por isso, na comunidade deve haver espaço para o mútuo perdão. Perdão mútuo é um dos temas neste quarto discurso. Sem o perdão mútuo, a comunidade deixaria de existir. Os que são capazes de perdoar mostram que são totalmente dominados pela misericórdia de Deus apesar das ofensas recebidas. Se aplicar a lei de talião “dente por dente” e “olho por olho”, o que vai resultar? Todos ficarão sem dentadura e cegos. Para que todos possam continuar a enxergar a ação misericordiosa de Deus deve haver o perdão mútuo.


Até sete vezes devo perdoar meu irmão?” é a pergunta de Pedro a Jesus que lemos no evangelho de hoje.


Pedro propõe um número elevado de oportunidades de perdão, considerando que isso é uma atitude nobre. Sete vezes não são poucas! Mas de qualquer maneira, ele se preocupa com os limites da atitude fraterna.


Jesus lhe corrige sua perspectiva legalista. No lugar de umsete” é melhor setenta vezes sete. No AT o número 77 representava a vingança dos filhos de Caim (Gn 4, 24). Jesus muda os términos e converte o número de vingança em símbolo da reconciliação. Logo Jesus propõe uma parábola que mostra a deficiente atitude dos que estão pendentes de contabilizar a misericórdia, o perdão e a fraternidade.


Jesus fala para Pedro que no exercício da caridade fraterna, especialmente neste caso sobre o perdão mútuo, não existe limites. O perdão deve estender-se até onde chegou a dor ou o desejo de vingança. Em outras palavras, o perdão deve ser proporcional à dor que sentimos causada por nosso semelhante ou ao desejo de vingança que temos contra quem nos fez mal. Quem perdoa e é perdoado hoje, sempre tem possibilidade de voltar a pecar amanhã, porque nossa fidelidade a Deus pode não ser definitiva. No entanto, sempre que nos convertermos e voltarmos arrependidos, nós encontraremos um Pai bondoso e misericordioso para nos acolher e perdoar. A simples consciência da imensidade do perdão recebido de Deus deveria ser suficiente para motivar cada um de nós a perdoar. Ao contrário, a insensibilidade em relação ao dom recebido de Deus torna impossível a concessão de perdão ao próximo.


Perdoar não é somente dever moral, e sim o eco da consciência de ter sido perdoado por Deus. Assim chega a ser uma espécie de virtude teologal que prolonga o perdão dado por Deus a mim (cf. Cl 3,13; Mt 6,14-15; 2Cor 5,18-20).


O perdão refaz as pontes, encurta as distâncias e desarma os espíritos. Quando a pessoa não perdoar, ela se torna refém do próprio ódio ou rancor, e consequentemente perde a liberdade e perturba a convivência. O perdão é que possibilita a própria existência e a continuação da comunidade ou de uma convivência. Sem perdão não existe vida fraterna, vida conjugal, vida familiar, vida religiosa ou vida comunitária e social.


Hoje o mundo enfrenta um ambiente de intolerância, violência e desrespeito aos direitos humanos. Esta cadeia se faz interminável porque os agredidos buscam vingança por sua própria mão e fazem crescer a espiral de violência. É igual aos filhos de Caim: se um fosse agredido, a vingança seria sete vezes. Somos seguidores de Cristo e por isso, nossa atitude não é a dos filhos de Caim que assassinou o próprio irmão, Abel. Nossa atitude é a de Jesus Cristo que morreu perdoando: “Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem”, rezou Jesus da cruz pelos seus inimigos (Lc 23,34). Para perdoar o cristão tem que ser forte espiritualmente. Não perdoar é a manifestação de nossa fraqueza espiritual. Não podemos transformar nossa fraqueza espiritual em uma morte lenta de nossa vida como filhos e filhas de Deus.


Não saber perdoar para qualquer seguidor de Cristo é um comportamento cínico e é o fruto de uma atitude interior na qual o egoísmo, o próprio interesse ocupa de tal forma o posto reservado ao amor limpo, ao gozo pela felicidade dos demais, à alegria de sentir-se instrumento de paz e concórdia que não deixam a luz do Espírito divino e a luz da sensatez humana penetrar no nosso coração e inundar nossa vida de cristãos.


O perdão é uma categoria fundamental e radical no Evangelho e é proposto por Jesus, para a comunidade, como um elemento constitutivo da qualidade das relações. Perdoando o passado doloroso se constrói um futuro cheio de esperança. Trata-se de uma atitude positiva e otimista. O mal não tem a última palavra porque o homem e a mulher podem mudar.


A tradição bíblica apresenta um Deus que ama um povo apaixonadamente. Ele ama o povo não por sua grandeza cultural nem por mérito, e sim porque Deus o ama loucamente. Não existe outra razão. “O amor apaixonado de Deus pelo seu povo — pelo homem — é ao mesmo tempo um amor que perdoa. E é tão grande, que chega a virar Deus contra Si próprio, o seu amor contra a sua justiça. Nisto, o cristão vê já esboçar-se veladamente o mistério da Cruz: Deus ama tanto o homem que, tendo-Se feito Ele próprio homem, segue-o até à morte e, deste modo, reconcilia justiça e amor”, escreveu o Papa Bento XVI (Carta Encíclica: Deus Caritas Est, no.10).


Deus que ama e perdoa se encarna em Jesus. Da cruz Jesus faz um testamento sobre o perdão ao perdoar aqueles que o crucificaram: “Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Nós somos convidados a atuar nesta direção de gratuidade. Se nossa relação com o próximo é vivida sob o sinal da maldade, não há razão para que nossa própria relação com Deus se viva de outra maneira. Para amar verdadeiramente, temos que aprender a perdoar a exemplo de Jesus Cristo.


O versículo final da parábola (Mt 18,35) considera o amor fraterno como uma condição para obter o perdão de Deus. O amor dispõe ao homem para o perdão. O perdão fraterno significa submeter-se completamente à ação misericordiosa de Deus. Neste sentido, perdoar o próximo é sinal da plenitude da eficácia do perdão de Deus recebido. O perdão dado é o perdão recebido.


O perdão é um ato de doação, tanto para aquele que o recebe como para aquele que o brinda. Ambos se enriquecem com o benefício da paz; ambos se libertam do cárcere que os aprisiona. Por isso, o perdão é seguir avançando; é amparo e encontro. O perdão revela a graça. O ato de perdoar é um ato da misericórdia de Deus que apaga os pecados (Am 7; Ex 32,12.14; Jr 26,19; Ez 36,29.33). No NT, reconciliação e perdão somente se entendem a partir da cruz, do amor entregue e do sangue derramado pelo perdão dos pecados (Mc 10,45; Hb 9,22; Rm 8,32; Mt 26,28...).


Deixemos hoje as seguintes interrogações que podem complementar a interrogação de Pedro: Quantas vezes eu tenho que perdoar? O que tenho que perdoar? Quantas vezes os outros devem me perdoar? O que devem me perdoar?


A vida nos oferece diversas ocasiões para exercermos o mistério do perdão entre nós: na família, no trabalho, nas relações pessoais e assim por diante. Cada sinal de perdão comunica também a graça de Deus que atravessa todas as nossas ações. A reconciliação nos devolve a verdadeira liberdade e a responsabilidade que nos permite acolhermos e praticarmos novamente o bem, suscitá-lo ou restaurá-lo dentro de nós e ao nosso redor. Ao cultivarmos a dimensão do perdão e da reconciliação entre nós temos a esperança de construir um mundo novo sem violência. O fraco jamais perdoa, o perdão é característica do forte” (Mahatma Gandhi). Quaresma é o tempo para se reconciliar e para o mútuo perdão a fim de podermos experimentar, por antecipação, a vitória da ressurreição sobre a morte e sobre o que é mortal em nós.


Na oração do Senhor, Jesus nos ensinou a pedir: "Perdoai as nossas ofensas assim como perdoamos a quem nos tem ofendido". O gesto de paz antes de entrarmos em comunhão com o Senhor tem essa intenção: já que vamos receber o mesmo Senhor, que se entrega a nós, devemos estar muito mais dispostos a perdoar nossos irmãos. O amor dispõe ao homem o perdão.


Você quer ser feliz por um instante? Vingue-se. Você quer ser feliz para sempre? Perdoe” (Tertuliano)
P. Vitus Gustama,svd

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