quinta-feira, 25 de novembro de 2021

I Domingo Do Advento "C",28/11/2021

A FÉ PROFUNDA NOS FAZ ERGUER A CABEÇA EM TODAS AS SITUAÇÕES DA VIDA, POIS DEUS ESTÁ PRONTO PARA NOS SALVAR

I DOMINFO DO ADVENTO ANO “C

I Leitura: Jr 33,14-16

14 “Eis que virão dias, diz o Senhor, em que farei cumprir a promessa de bens futuros para a casa de Israel e para a casa de Judá. 15 Naqueles dias, naquele tempo, farei brotar de Davi a semente da justiça, que fará valer a lei e a justiça na terra. 16 Naqueles dias, Judá será salvo e Jerusalém terá uma população confiante; este é o nome que servirá para designá-la: ‘O Senhor é a nossa justiça’”.

II Leitura: 1Ts 3,12-4,2

Irmãos: 3,12 O Senhor vos conceda que o amor entre vós e para com todos aumente e transborde sempre mais, a exemplo do amor que temos por vós. 13 Que assim ele confirme os vossos corações numa santidade sem defeito aos olhos de Deus, nosso Pai, no dia da vinda de nosso Senhor Jesus, com todos os seus santos. 4,1 Enfim, meus irmãos, eis que vos pedimos e exortamos no Senhor Jesus: Aprendestes de nós como deveis viver para agradar a Deus, e já estais vivendo assim. Fazei progressos ainda maiores! 2 Conheceis, de fato, as instruções que temos dado em nome do Senhor Jesus.

Evangelho: Lc 21,25-28.34-36

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: 25 “Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, com pavor do barulho do mar e das ondas. 26 Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo, porque as forças do céu serão abaladas. 27 Então eles verão o Filho do Homem, vindo numa nuvem com grande poder e glória. 28 Quando estas coisas começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima. 34 Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; 35 pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes de toda a terra. 36 Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem”.

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Um Olhar Geral Sobre As Leituras Deste Primeiro Domingo Do Advento

As leituras dos domingos do Advento, que hoje iniciamos, mantêm um tom geral que lhes dá unidade em torno dos eixos centrais deste tempo litúrgico: confiança na promessa do Senhor, impregnação da nossa vida na sua Palavra, vigilância perante os sinais de sua presença em nosso mundo. 

Assim, este primeiro domingo recorda na primeira leitura que Deus cumprirá a sua promessa, garantindo ao povo a permanência da sua Palavra no meio dele: Deus suscitará o descendente legítimo de David, que implantará a lei e a justiça na terra.       

A comunidade cristã, lembra São Paulo, vive fortalecida pela esperança da manifestação, celebrando a Eucaristia e participando de sua vida "até que ele volte". E o evangelho convida, mais uma vez, à vigilância, sabendo que a verdade de nossa vida será um dia comparada com a verdade de Cristo. 

Na memória do passado em que Deus se encarnou, somos convidados a viver o presente com autenticidade cristã e a levar a sério a nossa vocação de eternidade, pois Ele veio para nos mostrar o caminho para a eternidade. O cristão é sempre um crente projetado para a eternidade, mas, ao mesmo tempo, ele deve viver sua responsabilidade todos os dias como o eleito de Cristo e testemunhar uma vida baseada no Evangelho na sua vida cotidiana. 

A Primeira Leitura (Jr 33,14-16) quer nos transmitir uma mensagem de esperança de que apesar da degradação e dos desvios dos homens, Deus continua sendo fiel à sua promessa messiânica. O Messias seria o descendente legítimo da linhagem de Davi, seu filho, vivendo com os homens. A vontade e a disposição de Deus para oferecer sua graça repetidas vezes, apesar das prevaricações do homem, são permanentes na Bíblia. Deus vive e desde que criou o homem, Deus vive sempre atento ao homem por amor perdoando o homem toda vez que ele se arrepende. Da parte Deus, o homem nunca será abandonado, pois Deus é como o pai do filho pródigo que está sempre na espera da volta do filho perdido. Deus procura e quer salvar o homem. Em toda a história da salvação, Deus aparece como fiel cúmplice de suas promessas. Eles são cumpridos na plenitude dos tempos, quando Cristo, o Salvador, veio, ou seja, quando Deus se encarnou como manifestação tão evidente seu amor pelos homens. 

Ao lado da mensagem da esperança há uma exortação. A exortação do profeta Jeremias é assim: o Senhor é a nossa justiça. Não é um título, e sim o projeto e o compromisso do Deus da Aliança, com Israel e com todos os povos. Esse é o Deus que está encarnado, aquele que faz justiça. Justiça é mais do que dar a cada um o que lhe pertence. Aqui justiça significa muito mais: Deus levanta os oprimidos; Ele reforça aquele que não tem valor, porque se preocupa com todos os seres humanos. Esse projeto e esse compromisso divino, porém, não se impõem pela força, como fazem os poderosos deste mundo com sua estratégia preventiva, mas somos chamados no Advento a considerá-lo como uma espera e esperança para nos convertermos a Ele. Podemos especificar a primeira etapa do Advento: a conversão ao Deus de uma justiça prodigiosa. E a conversão é muito mais do que fazer penitência; é uma mudança de mentalidade, uma mudança de curso em nossa existência, uma mudança de valores. Porque quando mudamos os valores da nossa vida, transformamos a nossa forma de ser, de viver, de agir e de conviver. 

Através do Salmo Responsorial (Sl 24) pedimos ao Senhor que nos ensine Seus caminhos, que nos instrua em Suas sendas, que caminhemos com lealdade, como o próprio Senhor sempre é fiel a suas promessas para todos nós por amor, pois o Senhor é bom e reto. Através de Jesus, Deus ensina o caminho aos pecadores e faz o humilde andar com justiça e Ele próprio é o Caminho (Jo 14,6). Seus caminhos são misericórdia e lealdade para com aqueles que guardam sua aliança e seus mandamentos. 

Podemos entender a mensagem da Segunda Leitura tirada da Primeira Carta aos Tessalonicenses, documento mais antigo do NT (1Ts 3,12-4,2) que a vontade de Deus é nossa santificação. Nossa autenticidade cristã consiste em viver cada dia nossa santidade para que possamos chegar irrepreensíveis ao julgamento de Deus a fim de possuir seu Reino eternamente. Para o cristão, não há outra finalidade ou outro propósito para sua vida e atividade responsável do que servir e amar a Deus com alegria e, portanto, estar sempre disponível para os outros, como Deus quer. Um vive pelo outro, mas como Deus quer, à maneira de Cristo. O cristão vive esperando e com os olhos fixos no futuro, não só no passado. Não é uma espécie de vida passiva ou resignada, melancólica ou retrógrada, mas em uma tensão alegre e pacífica, aguardando seu encontro definitivo com Jesus Cristo. O cristão espera não de braços cruzados, mas vivendo um amor ativo e concreto. Deste modo, o cristão está adiantando o que vai ser sua existência última e plena. 

A carta é dirigida a uma comunidade cristã em uma situação de diáspora no meio dos pagãos. Corre-se o risco de ser sufocada pelo ambiente que exerce uma forte pressão. A comunidade existe graças ao amor de Cristo. O amor e a presença de Cristo no meio da comunidade devem irradiar-se e manifestar-se no amor recíproco que cria a unidade da comunidade e está aberto a todos até atingir o seu aspecto mais radical: amar os inimigos (Mt 5,44). 

O próprio são Paulo coloca em prática o que ele recomenda. A autoridade de seu ministério é animada pelo amor aos irmãos. Com eles, ele se coloca no caminho da fé. A partir do amor, será mais fácil entender como agradar a Deus e colaborar na realização de seu plano de salvação.

A salvação que Cristo trouxe não é totalmente realizada. É uma realidade em expansão que avança em direção a sua realização escatológica, para a realização do mundo em Cristo ressuscitado. Assim, a Igreja de Cristo é, por definição, uma Igreja a caminho, chamada para ser enviada em missão. É uma Igreja em saída, na linguagem do Papa Francisco. Somente uma Igreja a caminho ou uma Igreja em saída, pode colocar o mundo na estrada rumo à Casa celeste, nossa Casa Comum (cf. Jo 14,1-4). 

Ser uma Igreja e ser enviado é um dom que comporta uma responsabilidade. O dinamismo, os imperativos da história, a vinda do Senhor e a salvação exigem a colaboração do homem. O Deus da promessa exige do homem a responsabilidade de suas opções. O homem nunca está satisfeito consigo mesmo, nem com suas conquistas ou realizações. Está sempre em tensão para um futuro melhor. 

Um Olhar Específico Sobre o Texto Do Evangelho 

“Levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima!” 

Como os dois outros evangelhos sinóticos (Mt e Mc), também o evangelho de Lucas encerra a atividade de Jesus em Jerusalém (Lc19,29-21,38), antes de sua prisão e morte, com o discurso sobre o fim (escatológico) ou discurso apocalíptico (Lc 21,5-38). Tanto Mateus como Lucas inspiram seu discurso escatológico/apocalíptico do evangelho de Marcos capítulo 13.        

Mas Lucas tem seu próprio estilo, pois seu evangelho foi escrito depois do ano 70 d.C. Para ele a destruição de Jerusalém é um fato passado. Por isso, ele distingue claramente a Parusia (Segunda Vinda) de Jesus dos eventos ligados ao destino de Jerusalém. Além disso, ele leva em consideração o aspecto histórico e eclesial do discurso dentro do contexto da história da salvação. No discurso ele projeta a sua visão da história da salvação em três momentos: primeiro, a destruição de Jerusalém (julgamento sobre Jerusalém) como o fim de toda uma etapa da história salvífica, mas não é o sinal da chegada do fim; segundo, tempo da missão da Igreja e terceiro, a segunda vinda do Filho do Homem (Parusia) que trará a plenitude do Reino de Deus.          

Ao redimensionar a perspectiva escatológica deste discurso Lucas quer chamar a atenção de dois grupos, seja o dos fanáticos que esperam com impaciência o fim, seja o dos decepcionados e resignados que não esperam mais nada pela demora, para a necessidade do empenho presente, no Tempo da Igreja. Este é o tempo oportuno do testemunho em meio às perseguições violentas, a confiança e a esperança perseverante na espera da libertação com a vinda gloriosa do Senhor Ressuscitado, o Filho do Homem. Por isso, Jesus diz: “Quando estas coisas começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima” (v.28).

Levantar-se” e “erguer a cabeça” são características de quem tem fé. Quando ousamos crer no domingo de Páscoa, porque em nós está a força da ressurreição, não há fracasso que nos faça sentir perdedores.  Os cristãos não podem se entregar a utopia futurista, perdendo o laço com a realidade histórica e cotidiana, a realidade do presente embora ela esteja cheia de mentiras, violências, perturbações absurdas que podem levar a desejar o fim. Se o Senhor havia vencido a morte, pensa Lucas, a comunidade cristã não está caminhando rumo à uma utopia anônima, mas o Filho do Homem, que é garantia e primícia da libertação humana. A nossa esperança, por isso, não será fraudada, pois ela tem um nome: Jesus Cristo. Por isso, São Paulo diz: ”Se Deus está conosco, quem estará contra nós? Quem nos separará do amor de Cristo? Em tudo isto somos mais que vencedores, graças àquele que nos amou” (Rm 8, 31.35.37). Por isso, “tudo posso naquele que me fortalece” (Fl 4,13).        

Lucas convida, assim, a comunidade cristã a trilhar o caminho da fidelidade e da coragem, o caminho que o próprio Senhor trilhou, mesmo diante da repressão violenta das estruturas do poder, sinagogas, e reis, mesmo perante a morte violenta (Lc 21,12). Lucas não fornece informações sobre o fim, mas refunda a esperança no acontecimento central da morte e ressurreição de Jesus. Ele convida os cristãos a olharem para a história para decifrar seus sinais, que fazem pressagiar/prever já agora a passagem da morte à vida, da escravidão à liberdade, como os primeiros brotos anunciam após o inverno a boa estação (vv. 29-30). 

O que importa para uma comunidade cristã é a vivacidade de esperança. É a esperança que arranca o homem de uma existência sem futuro e sem expectativas. A tristeza e o desânimo são um sinal da ausência de uma verdadeira esperança cristã que no fundo provém de uma falta de fé.        

Este discurso, portanto, é o discurso sobre o Filho do Homem, sobre Jesus, o Senhor Ressuscitado, o Homem fiel até a morte para dar a todos um futuro novo e diferente, e para afirmar aos cristãos ou para quem quer que seja que vale a pena lutar pelo que é digno, como o bem, o amor, a justiça, a solidariedade, a honestidade, a fraternidade, a paz etc., pois tudo isto tem a vitória sobre a morte como o ponto final.        

Para isso, são necessárias duas atitudes de esperança que recebem seu dinamismo da meta que é o encontro decisivo com o Filho do Homem: Vigilância (e conversão) e oração constante. “Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem”. 

1. Vigilância          

No sentido literal do termo, vigiar significa renunciar ao sono da noite com o intuito de prolongar o tempo para trabalhar ou para não ser apanhado de surpresa pelo inimigo. Daí o sentido metafórico: vigiar significa estar atento e pronto para acolher o Senhor quando vier. Toda a moral evangélica está fundada na vigilância. O tema da vigilância não é acidental nos evangelhos, mas sempre intervém nos textos. De certa forma, o cristão é sinônimo de pessoa vigilante. A vigilância é a qualidade de quem emprega todo cuidado naquilo que deve ouvir, olhar, pensar, falar e fazer. Para o cristão, qualquer momento pode-se transformar em momento de graça (kairós). Ele tem consciência de estar inserido na história da salvação como receptor e como cooperador da graça. O cristão vigilante vive profundamente imerso na história da salvação, isto é, no aqui-e-agora, descobrindo tudo o que lhe oferece e respondendo tudo o que lhe exige o momento presente. O cristão vigilante não se lamenta perante os momentos espinhosos e sufocantes, mas sabe decifrar seu sentido para torná-los em oportunidades preciosas. O cristão vigilante sempre pergunta: “O que é que Deus quer de mim através daquele acontecimento ou através daquela pessoa”. Ele sempre procura decifrar o sentido das coisas. Vigilância, por isso, significa acordar para os fatos, despertar do sono das ilusões para enfrentar a realidade. O vigilante está sempre em contato com Deus e com a realidade. Ele tem uma intuição do que significa viver, respirar, ver, reunir-se com as pessoas e degustar o mistério de cada momento.          

Se o sentido literal da vigilância aponta para o ato de renunciar ao sono da noite, isto quer dizer que quando se fala da vigilância é inevitável falar da renúncia. Renunciar quer dizer optar por aquilo que tem o valor absoluto ou simplesmente um valor maior que tenho até então. A renúncia precisa sempre da liberdade interior e ao mesmo tempo pode levar alguém à liberdade. Ela não permite o relaxamento moral e espiritual. Os cristãos, por isso, devem sempre tomar cuidado para não relaxar, pervertendo o testemunho e acabando por assumir os vícios provocados pela sociedade injusta como a gula, a embriaguez e a preocupação exagerada sobre a vida. Quem precisa satisfazer toda necessidade imediatamente fica dependente. Acaba determinado por suas necessidades, e por isso, perde a liberdade.          

O julgamento está sempre operando na história, pois Deus continua nos visitando através de Seu Espírito. Em qualquer momento Deus bate a nossa porta. Os impulsos com os quais Deus nos chama a atenção para o que se deve fazer agora são suaves e por isso, precisa-se de muita vigilância (atenção). Em outras palavras, vigilância significa prestar atenção àquilo que aflui até nós. Mas, muitas vezes, por causa de nossas preocupações, acabamos reprimindo essa voz suave. Vigilância no momento significa estar inteiramente presente, envolver-se por inteiro no momento presente sem pensar no passado ou já planejar o futuro. Quando não vigiarmos, vai entrar furtivamente em nós muita coisa que nos desvia de nosso caminho consciente. Não devemos dar livre acesso a qualquer pensamento ou emoção, porque eles logo revelariam ser invasores que nos dificultam a vida em nosso lar interior e querem nos expulsar cada vez mais longe de nosso centro. Consequentemente, não viveremos nós mesmos mas seremos guiados por forças inconscientes e não seremos mais os senhores em nossa casa, pois seremos dominados por insatisfação e amargura, por medo e depressão que tomarão para si o governo de nossa casa.          

Os cristãos devem, portanto, estar sempre de prontidão, vigiando e praticando a justiça. Somente a sua perseverança na prática e no anúncio da justiça lhes permitirá ser considerados justos e inocentes no dia do julgamento. 

2. Oração         

Além da vigilância, no seguimento de Jesus, a oração sustenta a caminhada dos cristãos. Ela é a expressão mais viva da fé. Quem crê, precisa orar e quem ora porque acredita. A oração é a alma da espera, o vigor espiritual de quem crê, capaz de assumir a lembrança do passado e de preparar para o futuro. Para tanto, Jesus ilustra o sentido profundo do advérbio “sempre” e do “não desistir jamais” por meio de uma parábola (cf. Lc 18,1-8). O rezar “sempre” é o programa de quem crê.           

A oração exige uma relação em que nós permitimos ao outro entrar no centro de nossa pessoa, permitimos-lhe falar ali, permitimos-lhe tocar o núcleo sensitivo de nosso ser e permitimos-lhe ver tudo o que nós preferiríamos ocultar na escuridão para que ninguém o soubesse.      

Ao homem convidado para rezar se pede que abra seus punhos fechados firmemente cerrados e dê sua última moeda.  Se nós não ousamos fazer ao menos uma pergunta a partir de nossa experiência com todos os nossos apegos, é porque já nos enrolamos no destino dos fatos. Nós nos sentimos mais seguros apegando-nos a um triste passado do que confiando em um novo futuro. Por isso, enchemos as mãos com pequenas moedas pegajosas das quais nunca quereremos nos desfazer.         

Por isso, sempre que nós rezamos de verdade, a nossa oração é eficaz, não porque modificamos Deus, mas porque nos modificamos. O mais difícil da oração não é tanto saber se Deus nos escuta, mas conseguirmos que nós O escutemos.          

Quando pararmos de rezar, e quando começarmos a nos impressionar demais os resultados de nosso trabalho, devagar chegaremos à conclusão errônea de que a vida é um grande placar onde alguém marca os pontos para medir nosso valor. Então, somos inteligentes porque alguém nos dá nota alta, úteis porque alguém agradece, dignos de estima porque alguém nos estima e importantes porque alguém nos considera indispensáveis. Em suma, somos de valor porque alcançamos sucessos.        

Mas de baixo de toda a nossa ênfase na ação bem-sucedida, muitos de nós sofremos de uma arraigada falta de amor-próprio e com o medo constante de que, algum dia, alguém descubra a ilusão e mostre que não somos tão espertos, tão bons ou tão estimáveis quanto fizemos o mundo acreditar que éramos. Esse medo desgastante de que descubram nossas fraquezas impede a participação comunitária e criativa. E corremos o sério perigo de ficar isolados, pois a amizade e o amor são impossíveis sem uma vulnerabilidade mútua.        

Levar uma vida cristã significa viver no mundo sem ser do mundo. É na solidão (oração) que essa liberdade se fortalece. A vida sem um lugar deserto torna-se facilmente destrutiva. Quando nos apegamos aos resultados de nossas ações como nosso único meio de identificação pessoal, tornamo-nos possessivos, ficamos na defensiva e tendemos a ver nossos semelhantes mais como inimigos a ser mantidos a distância que como amigos com os quais partilhamos as dádivas da vida.          

Na solidão (oração) descobrimos no centro de nossa personalidade que não somos mais o que conquistamos, mas o que nos é dado. Na solidão, escutamos a voz daquele que nos falou antes de pronunciarmos uma palavra, (Sl 139) que nos curou antes de esboçarmos um gesto pedindo ajuda, que nos libertou muito antes de libertarmos os outros e nos amou muito antes de darmos amor a alguém. Na solidão(oração), descobrimos que nossa vida não é um bem a ser defendido, mas uma dádiva a compartilhar.        

Quando deixamos de depender deste mundo, formamos uma comunidade de fé em que há pouco a defender, mas muito a partilhar. E como comunidade de fé lembramos uns aos outros constantemente que formamos uma fraternidade dos fracos, compreensível para aquele que nos fala nos lugares desertos de nossa existência e diz: Não temais, sois aceitos.           

Cristo já veio, mas nunca deixa de vir a caminho de nossa casa. O lugar que ele mais ambiciona é um coração convertido, que tenha a coragem de se “reformar” e de se abrir ao amor, à fraternidade, à justiça...Só criando espaço para Cristo num coração convertido é que conseguiremos à meta. Jesus continuamente visita e frequenta o coração daqueles que sabem crer, esperar e amar. Se na vida jogarmos sementes de egoísmo, de violência e de orgulho, de arrogância e de prepotência, estes serão nossos companheiros da viagem e por isso, nunca seremos felizes e nunca faremos ninguém feliz. Se jogarmos sementes da justiça, do amor, da fraternidade e da esperança e da fé em Cristo, Cristo será nossa herança feliz e com ele teremos a experiência da libertação. Importa viver sempre na presença de Cristo. Por isso,” ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem” (v.36). 

Portanto, o Advento nos convida a criarmos e cuidarmos de um espaço interior, no qual possamos ouvir uma voz e vivenciar uma presença amiga: “Estou à porta e bato”. Cuidemos de nossa alma. É uma bela tarefa para este tempo do Advento.

P. Vitus Gustama,svd

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