segunda-feira, 14 de novembro de 2022

18/11/2022-Viver Conforme a Palavra de Deus

HONRAR E RESPEITAR O ESPAÇO E O TEMPO SAGRADOS SÃO TRADUZIDOS NO AMOR FRATERNO

Sexta-Feira da XXXIII Semana Comum

Primeira Leitura: Apocalipse 10,8-11

8 Aquela mesma voz do céu, que eu, João, já tinha ouvido, tornou a falar comigo: “Vai. Pega o livrinho aberto da mão do anjo que está de pé sobre o mar e a terra”. 9 Eu fui até o anjo e pedi que me entregasse o livrinho. Ele me falou: “Pega e come. Será amargo no estômago, mas na tua boca, será doce como mel”. 10 Peguei da mão do anjo o livrinho e comi-o. Na boca era doce como mel, mas quando o engoli, meu estômago tornou-se amargo. 11 Então ele me disse: “Deves profetizar ainda contra outros povos e nações, línguas e reis”. 

Evangelho: Lc 19, 45-48

Naquele tempo, 45Jesus entrou no Templo e começou a expulsar os vendedores. 46E disse: “Está escrito: ‘Minha casa será casa de oração’. No entanto, vós fizestes dela um antro de ladrões”. 47Jesus ensinava todos os dias no Templo. Os sumos sacerdotes, os mestres da Lei e os notáveis do povo procuravam modo de matá-lo. 48Mas não sabiam o que fazer, porque o povo todo ficava fascinado quando ouvia Jesus falar.

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A Palavra De Deus Tem Que Ser Interiorizada e Vivida Antes De Pregá-la 

“Pega o livrinho aberto da mão do anjo que está de pé sobre o mar e a terra. Pega e come. Será amargo no estômago, mas na tua boca, será doce como mel”. 

O fato de João ter que digerir o pequeno livro de profecias do Antigo Testamento para compreender o sentido do tempo presente revela que ele alimenta suas visões da misteriosa realidade dos acontecimentos da fé no Deus único, guia da História. Deus é o autor da História e Ele a marca refletindo nela a sua singularidade. Isso não significa que ele tenha introduzido nele um tipo de fatalidade semelhante àquela com que a natureza se sobrecarrega. A história é produto do encontro de duas liberdades: a de Deus e a do homem, mas Deus tem algumas perspectivas sobre esse encontro, especialmente desde que Jesus Cristo pronunciou o "sim" dessa aliança. Nem os acontecimentos poderão pôr em causa a vitória conquistada pelo Senhor sobre o mal e a morte. João está cheio de amargura depois de ter engolido o livro, mas o sabor é finalmente um gosto de doçura e paz (Ap 21-22). A este respeito, as Escrituras são de fato consoladoras, não porque descobriram antecipadamente a evolução dos acontecimentos previstos por Deus, mas porque ajudam a revelar o sentido profundo da presença de Deus nos acontecimentos que os homens vivem. 

Hoje lemos, na Primeira Leitura, tirada do Livro do Apocalipse, um gesto simbólico: João, o vidente, tem que comer o rolo, o livro, antes de transmitir seu conteúdo. O texto de hoje tem sua chave de interpretação em Ezequiel 2, 8; Jeremias 1, 10. São João recebe a ordem de comer um livro! O símbolo é bastante claro: trata-se de “alimentar-se da Palavra de Deus e do pensamento que ela contém”. É um gesto muito expressivo, que já encontramos em Ez 3,1.3: “Filho do homem, come o que tens diante de ti, come este rolo e vai falar com a casa de Israel... Ingere este rolo que te estou  dando e sacia-te com ele”. O profeta Ezequiel tem que comer o rolo para anunciá-lo depois. O livro que come, isto é, a Palavra de Deus, é em uma parte é doce e em outra parte é amarga. Na imagem do comer estão evidenciados, de maneira incisiva, os pressupostos básicos e a carcateristica essencial de toda pregação: seu objeto não são pensamentos pessoais, mas revelações de Deus. O prfeta deve se apossar dessas revelações intimamente, antes de poder transmiti-las aos outros sem diminuição de conteúdo: engolir o rolo inteiro. O profeta é acima de tudo um mensageiro e um intérprete da Palavra divina. Cabe, portanto, a ele, estar completamente repleto da Escritura, descobrir nela o mistério do projeto de Deus para o mundo, para poder fazer novas aplicações a partir da situação atual. É o que São João faz. Ele retoma passagens do Antigo Testamento, alimenta-se delas, assimila-as e esclarece questões contemporâneas com elas.

Peguei da mão do anjo o livrinho e comi-o. Na boca era doce como mel...”. É normal que o alimento divino seja doce: revela o amor de Deus por nós. A meditação da Palavra de Deus deve ser para nós, de forma habitual, um momento reconfortante, "forte", um momento feliz; embora às vezes aconteça o contrário. É preciso saborearmos a Palavra de Deus para saborear o sentido da vida. “... mas quando o engoli, meu estômago tornou-se amargo”. A Palavra de Deus, contida no Livro, tem aspectos difíceis, duros, exigentes. É amargo no sentido de que também nos revela nossos pecados, nossas insuficiências, que abala nossa tibieza e nossas covardias. Além disso, embora a Palavra de Deus nos dê o sentido dos nossos sofrimentos e da morte, não nos isenta deles: o cristão não é um ser preservado. 

Os cristaos, e sobretudo, os que, de alguma maneira, transmitem a outros a Palavra de Deus: sacerdotes, educadores, pregadores, catequistas, missionários/missionarias, devem primeiro assimilá-la e vivê-la. Então, será mais crível o próprio testemunho. Somente assim não será repetido aquilo que Jesus disse aos fariseus e escribas: “eles dizem, mas não fazem” (Mt 23,3). 

A Palavra de Deus deve tomar carne em nós. Temos que ter nossa própria experiência da Palavra de Deus. Somente assim proclamaremos a Palavra de Deus não como pregadores expertos e insignes  e sim como testemunhas da Palavra de Deus. Por isso, não podemos nos dedicar à evangelização ou à pregação sem anter ter estado aos pés de Jesus. 

Para todos nós, a Palavra de Deus é agridoce: doce e amarga, ao mesmo tempo. Muitas vezes a Palavra de Deus é consoladora. Muitas outras vezes é exigente, como por exemplo: amar os inimigos e rezar por aqueles que nos perseguem; perdoar sem limites; largar tudo para seguir a Jesus, e assim por diante. Nem para nós, nem para os demais devemos cair na tentação de fazer seleção a nossa medida, censurando a Sagrada Escritura e escolhendo apenas o que nos agrada. O conteúdo da Palavra de Deus não é só graça, é julgamento também. Temos ler e meditar e aceitar a Palavra de Deus na sua totalidade. A Palavra de Deus é também o Pão da Vida para nosso cotidiano. É preciso “comê-La”. 

Templo De Deus e O Homem-Templo 

Terminada a etapa das lições do caminho (Lc 9,51-19,28), Jesus se encontra, finalmente, em Jerusalém e continua dando suas ultimas lições antes de sua Paixão e Morte (Lc 19,29-21,38). 

Na passagem do evangelho deste dia o evangelista Lucas nos apresenta Jesus expulsando os vendedores do Templo. Trata-se do primeiro gesto profético de Jesus no Templo de Jerusalém. Jesus atua como os profetas clássicos que, primeiro, faziam alguma ação simbólica e logo em seguida, pronunciavam seus oráculos. 

A ação simbólica de Jesus no texto de hoje é expulsar os vendedores do Templo. Logo em seguida Jesus pronuncia dois oráculos. O primeiro oráculo é tirado de Is 56,7 sobre o caráter do Templo como casa de oração. O segundo oráculo é tirado de Jr 7,1-15, um texto que inspira toda a ação e o pensamento de Jesus. Para Jeremias e Jesus o Templo se transforma em uma cova de bandidos porque nele encontram os assassinos e os idólatras que matam, oprimem e exploram até os mais pobres. 

A intervenção de Jesus no Templo na expulsão dos vendedores é uma chamada de atenção para recolocar nossa atitude religiosa num plano de autenticidade e sinceridade. O espaço sagrado e o tempo sagrado (momento de oração e de celebração) devem adquirir seu verdadeiro sentido como forma de encontro com Deus que s traduz na vivencia do amor fraterno.  Ambos (o espaço sagrado e o tempo sagrado) têm que assumir sempre a forma da intercessão e da busca do perdão de Deus para um coração arrependido: “Minha casa será casa de oração”. 

Diante da intervenção de Jesus na expulsão dos vendedores do Templo “Os sumos sacerdotes, os mestres da Lei e os notáveis do povo procuravam modo de matar Jesus”.  Enquanto que o povo, na sua simplicidade, não encontrou nenhuma dificuldade para aceitar a mensagem de Jesus, como Lucas nos relatou: “o povo todo ficava fascinado quando ouvia Jesus falar”.  

O valor de nossa religiosidade e o de nosso verdadeiro encontro com Deus que dão sentido para toda nossa existência dependem da escolha que fazemos entre estas duas formas de receber a mensagem de Deus.   

Nem sempre estamos prontos ou preparados diante da intervenção de Deus na nossa vida. Como os dirigentes do povo de Israel podemos também assumir atitudes contraditórias diante da intervenção de Deus na nossa vida. Deus quer expulsar de nossa cabeça ou de nosso coração todas as atitudes que querem ocupar o lugar de Deus na nossa vida. Mas por causa de nossos pensamentos pré-fabricados ou pré-estabelecidos acabamos expulsando Deus de nossa vida e permanecemos na nossa vida sem direção, pois vivemos sem escala de valores. Deus intervém na nossa vida com intuito de recolocar nossa vida no seu eixo verdadeiro ou no caminho da salvação. Mas quantas vezes eliminamos ou procuramos algum meio para eliminar o plano de Deus para nossa vida ou tentamos esquecer Sua Palavra inquietante tal como sucedeu na vida dos dirigentes do povo durante a atuação de Jesus em Jerusalém.  

Jamais podemos identificar religião com prática cultual. O culto verdadeiro e autentico tem conseqüências verticais e horizontais. Honramos Deus na medida em que passamos da comunidade cultual para a vida na prática da solidariedade com os irmãos, especialmente com os mais necessitados. Ao sair do templo ou da igreja não podemos fingir não olhar para o irmão que necessita de nossa ajuda. O verdadeiro culto é o culto da vida inteira vivida com fidelidade na vivencia da vontade de Deus e na solidariedade com os irmãos. 

A entrada de Deus e de Sua Palavra na nossa vida quer colocar em questão as nossas atitudes religiosas. Esta entrada serve para desmascarar nosso egoísmo e nosso jogo de interesse em nome de uma vida sem sentido e sem rumo e para tirar de nós um falso sentimento de segurança a fim de nos salvar. A entrada de Deus e de Sua Palavra na nossa vida exige que coloquemos em revisão a nossa religiosidade se é autentica ou falsa. Ninguém pode crer impunemente. A religião não pode nos assegurar a impunidade em nossas más ações, e a religião nunca pode ser considerada como o refugio seguro para malfeitores. Uma religião sem o compromisso de uma conduta coerente em função da vivência dos valores humanos reconhecidos universalmente é um ópio que faz adormecer a própria consciência. Precisamos questionar o questionável e perguntar o perguntável. Precisamos ficar atentos para que nossa prática religiosa não seja mais importante do que o próprio Deus e o ser humano. Onde há o amor fraterno, ali Deus está, mesmo que se trate do ateísmo. Onde não há o amor fraterno, não há o verdadeiro cristianismo, pois o amor fraterno é o mandamento do Senhor (Jo 13,34-35; 15,12).

P. Vitus Gustama,svd

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