ELE VEM PARA NOS SALVAR
Mas
Lucas tem seu próprio
estilo, pois seu evangelho
foi escrito depois
do ano 70 d.C. Para
ele a destruição
de Jerusalém é um fato
passado. Por
isso, ele
distingue claramente a parusia de Jesus
dos eventos ligados ao destino
de Jerusalém. Além disso, ele leva em consideração
o aspecto histórico
e eclesial do discurso dentro do contexto
da história da salvação. No discurso ele projeta a sua visão da história
da salvação em três
momentos: primeiro,
a destruição de Jerusalém (julgamento sobre
Jerusalém) como o fim
de toda uma etapa
da história salvífica, mas não é o sinal da chegada
do fim; segundo,
tempo da missão
da Igreja e terceiro,
a segunda vinda
do Filho do Homem
(parusia) que trará a plenitude do Reino
de Deus.
Ao redimensionar a perspectiva escatológica deste discurso
Lucas quer chamar
a atenção de dois
grupos, seja o dos fanáticos
que esperam com
impaciência o fim,
seja o dos decepcionados e resignados, que
não esperam mais
nada pela
demora, para
a necessidade do empenho
presente, no Tempo
da Igreja. Este
é o tempo oportuno
do testemunho em
meio às perseguições violentas, a confiança e a esperança
perseverante na espera da libertação
com a vinda
gloriosa do Senhor
Ressuscitado, o Filho do Homem.
Nesse discurso
Lc descreve simultaneamente a catástrofe (vv. 25-26)
e a vinda gloriosa
do Filho do Homem
(vv.27-28). O caos fantástico
que Lc descreve aqui
nos remete ao caos
dos começos (cf. Gn 1,2) em que a Palavra de Deus
foi introduzida para estabelecer
a harmonia, a beleza
e a bondade (do caos
para o cosmos pelo poder da Palavra de Deus).
Ao final das histórias
voltará a ressoar esta mesma
Palavra poderosa,
porém, será a Palavra
Encarnada, Jesus de Nazaré (cf. Jo
1-3.14). Essa Palavra Encarnada recriará a harmonia,
a beleza e a bondade.
Lucas chama tudo
isto de “Libertação”:
“Quando estas coisas
começarem a acontecer, levantai-vos e erguei a cabeça, porque
a vossa libertação
está próxima”(v.28). A palavra “libertação”
(apolytrosis: resgate de um cativo) é
uma palavra característica
da teologia paulina (1Cor 1,30; cf. Rm 3,24;8,23;Cl 1,14, etc.) que define o resultado
da ação redentora de Jesus em
favor dos homens.
Jesus veio para
resgatar a humanidade
prisioneira do egoísmo,
do pecado, do caos
interior que
resulta no caos da convivência
e da morte eterna.
Em outras palavras,
Jesus veio para
libertar os homens
de todo tipo
de escravidão que
os impede de viver na dignidade
de filhos de Deus.
Por isso,
a mensagem desse discurso
é bem clara:
“...levantai-vos e erguei a cabeça, porque
a vossa libertação
está próxima” (v.28). Lucas quer nos dizer em outras palavras: “Não vos deixeis afundar no desespero porque
Jesus, vosso Salvador,
vem”. “Levantar-se” e “erguer a cabeça”
são a atitude
própria de uma sentinela. Para os cristãos “levantar-se” e “erguer
a cabeça” são
características de quem
tem fé e esperança.
Essa posição vertical
(“levantar-se” e de “erguer a cabeça”)
é típica do homem
e exprime a sua dignidade
como homem,
marcando assim a diferença
entre todos
os outros seres
vivos.
Para manter a dignidade como homem é preciso
manter a diferença
diante de outros
seres vivos.
A Palavra de Deus
proclamada neste dia, na verdade,
é um grito de
Deus a todos
que vivem na escravidão
e vivem nos seus
vícios que
só afundam sua
dignidade.
Através desse discurso
apocalíptico Lc quer dizer
que os cristãos
não podem entregar-se à utopia futurista,
perdendo o laço com
a realidade histórica
e cotidiana, a realidade
do presente embora
ela esteja cheia
de mentiras, violências,
perturbações absurdas que podem levar a desejar o fim. Para Lc, se o Senhor aceitou ser pregado na cruz por amor e venceu a morte através de sua ressurreição, a comunidade
cristã não está caminhando rumo à uma utopia
anônima, pois
Cristo é garantia
e primícia da libertação humana. A nossa
esperança, por
isso, não
será fraudada pois ela
tem um nome:
Jesus Cristo. Por
isso, São
Paulo diz: ”Se Deus está conosco, quem
estará contra nós?
Quem nos
separará do amor de Cristo?
Em tudo
isto, somos mais
que vencedores, graças
Àquele que
nos amou” (Rm 8,31.35.37).
Lucas é o evangelista
que convida todos
os cristãos a viverem constante e conscientemente
na esperança baseada
na fé com
o olhar posto
na meta que
é a união plena
com seu
Salvador, Jesus Cristo.
No meio das dificuldades,
Lc quer levantar
o ânimo e a esperança
dos cristãos. Por
isso, nesse discurso
de caráter apocalíptico (escatológico)
Lc não dá ênfase
no cataclismo e sim
na presença majestosa
do Filho do Homem
quando a esperança
puramente humana
termina: “Então, eles verão o Filho do Homem,
vindo numa nuvem com
grande poder
e glória” (Lc 21,27). Diante da desesperança
humana, a presença
gloriosa de Jesus Cristo
devolve para os que
se apóiam em Deus
o que parecia impossível
do ponto de vista
humano. Por
esta razão pede-se de cada cristão que mantenha a cabeça
erguida independentemente da gravidade dos problemas
existentes.
Lucas convida, assim,
a comunidade cristã a trilhar
o caminho da fidelidade
e da coragem, o caminho
que o próprio
Senhor trilhou, mesmo
diante da repressão
violenta das estruturas
do poder, sinagogas,
e reis, mesmo
perante a morte
violenta (Lc 21,12). Lucas não fornece informações
sobre o fim,
mas refunda a esperança
no acontecimento central
da morte e ressurreição
de Jesus. Ele convida os cristãos a olharem para a história para decifrar seus sinais, que
fazem pressagiar/prever já agora a passagem da morte à vida, da escravidão
à liberdade(vv. 29-30). O que importa para uma comunidade cristã é a vivacidade
de esperança. É a esperança
que arranca o homem
de uma existência sem
futuro e sem
expectativas. A tristeza
e o desânimo são
um sinal
da ausência de uma verdadeira esperança cristã que
no fundo provém de uma falta de fé.
3.
É preciso ser vigilante e rezar na espera da vinda do Senhor
A libertação,
trazida por Jesus para
transformar a nossa
existência de escravos
do pecado em
estado de filhos
de Deus, não
deve ser esperada de braços
cruzados. A esperança
libertadora é feita de esperas
ativas (vv.34-36). A esperança final
preparada por
Deus para seus fiéis deve ser nutrida
de esperas ativas
manifestadas numa vida vivida no Senhor: na oração e na caridade.
A esperança final
nos faz evitarmos todo
modo de existência
que impeça a visibilidade
do horizonte de Deus.
A falta dessa visibilidade
faz qualquer pessoa
perder as expectativas
e acaba vivendo somente em
função do presente
sem uma visão
futura da vida:
“Carpe diem, quam minimum credula postero”, dizia Horácio (= Aproveita
o dia[de hoje],
confiada o menos possível
no de amanhã). Porém,
para nós cristãos que
temos uma visão futura
de nossa existência,
é preciso “estarmos atentos”
a Jesus que sempre
vem oferecer-se como dom. São
Bernardo dizia: “Existem três
vindas do Senhor.
De fato, uma vinda
escondida acontece entre as duas que conhecemos. Só
os eleitos vêem o Senhor como
Salvador dentro
de si mesmo.
A vinda intermédia
é, por assim
dizer, o caminho
que une a primeira
à última: na primeira,
Cristo foi nossa
redenção; na última,
se manifestará como nossa
vida; na intermédia,
é nosso repouso
e nossa consolação”.
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