15/08/2017
Nesta página há duas reflexões:
1. Reflexão sobre as leituras do dia (para os lugares em que a Festa da Assunção será celebrada no próximo domingo).
2. Reflexão sobre a Asssunção de Nossa Senhora para os lugares em que a festa é celbrada no dia 15 de Agosto.
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SOMOS CHAMADOS A VIVER NA FRATERNIDADE E LIDERAR COM
O ESPÍRITO DIVINO
Terça-Feira
da XIX Semana Comum
Primeira Leitura: Dt 31,1-8
1 Moisés dirigiu-se a todo Israel com as seguintes palavras: 2 “Tenho
hoje cento e vinte anos e já não posso deslocar-me. Além do mais, o Senhor me
disse: ‘Não atravessarás este rio Jordão’. 3 É o Senhor teu Deus que irá à tua
frente; ele mesmo, à tua vista, destruirá todas essas nações, para que ocupes
suas terras. Josué passará adiante de ti, como disse o Senhor. 4 E o Senhor
fará com esses povos o que fez com Seon e Og, reis dos amorreus, e com suas
terras, que ele destruiu. 5 Quando, pois, o Senhor os entregar a vós, fareis
com eles exatamente o que vos ordenei. 6 Sede fortes e valentes; não vos
intimideis nem tenhais medo deles, pois o Senhor teu Deus é ele mesmo o teu
guia, e não te deixará nem te abandonará”. 7 Depois Moisés chamou Josué e,
diante de todo Israel, lhe disse: “Sê forte e corajoso, pois és tu que
introduzirás este povo na terra que o Senhor sob juramento prometeu dar a seus
pais, e és tu que lhe darás a posse dela. 8 O Senhor que é o teu guia,
marchará à tua frente, estará contigo e não te deixará nem te abandonará. Por
isso, não temas nem te acovardes”.
Evangelho: Mt 18,1-5.10.12-14
Naquele tempo, 1 os
discípulos aproximaram-se de Jesus e perguntaram: “Quem é o maior no Reino dos
Céus?” 2 Jesus chamou
uma criança, colocou-a no meio deles 3 e disse:
“Em verdade vos digo, se não vos converterdes, e não vos tornardes como
crianças, não entrareis no Reino dos Céus. 4 Quem se faz
pequeno como esta criança, este é o maior no Reino dos Céus. 5 E quem
recebe em meu nome uma criança como esta é a mim que recebe. 10 Não
desprezeis nenhum desses pequeninos, pois eu vos digo que os seus anjos nos
céus veem sem cessar a face do meu Pai que está nos céus. 12 Que vos
parece? Se um homem tem cem ovelhas, e uma delas se perde, não deixa ele as
noventa e nove nas montanhas, para procurar aquela que se perdeu? 13 Em verdade
vos digo, se ele a encontrar, ficará mais feliz com ela, do que com as noventa
e nove que não se perderam. 14 Do mesmo
modo, o Pai que está nos céus não deseja que se perca nenhum desses
pequeninos”.
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Ser Bom Lider É Aquele Que Guia o Povo Para Seu Bem e Anima o Sucessos
Quando Termina a Liderança
“O Senhor teu Deus é ele mesmo o teu guia, e
não te deixará nem te abandonará... O Senhor que é o teu guia, marchará à tua frente, estará
contigo e não te deixará nem te abandonará. Por isso, não temas nem te
acovardes”, disse Moisés no seus discurso ao povo eleito, e a
Josué. Trata-se do último testamento de Moisés pronunciado no fim de sua vida
dirigido para o povo eleito e para Josué a quem dá a inverstidura como seu
sucessor que vai guiar o povo eleito para a terra prometida.
No conjunto de Dt
31-34, no qual se situa o texto da Primeira Leitura, encontramos doze
“discursos”. Sete deles saíram da boca de Moisés e outros cinco, da boca de
Deus, sem perder a voz do narrador dentro desses discursos.
Moisés não vai poder
entrar na terra prometida, por mais que ele peça a Deus. Mesmo assim a ausência
de Moisés do meio do povo eleito, que se encontra na porta da terra prometida, não
produzirá um vazio no poder porque Moisés nomeia Josué como guia do povo nesta
etapa da entrada e o assentamento da terra prometida. E sobretudo, porque Deus
continua acompanhando Moisés e o povo eleito como fez ao longo de todo o
caminho pelo deserto. Mosiés anima o povo e Josue: “Sede fortes e valentes; não vos intimideis nem tenhais medo deles, pois
o Senhor teu Deus é ele mesmo o teu guia, e não te deixará nem te abandonará”.
É a convicção que o Responsório de hoje recolhe (Dt 32,3-12): “Recorda-te
dos dias do passado e relembra as antigas gerações; pergunta, e teu pai te
contará; interroga, e teus avós te ensinarão.... O Senhor, somente ele, foi seu guia, e jamais um
outro deus com ele estava.... Ele é a
Rocha: suas obras são perfeitas”.
O carisma de guiar
o povo passa agora de Moisés para Josué e assim se sudem as pessoas. Mas Deus e
sua fidelidade permanecem: “O Senhor
teu Deus é ele mesmo o teu guia, e não te deixará nem te abandonará”.
Esta promessa chega
intacta para o Novo Testamento e se expressa no paradoxo cristão: “Prefiro gloriar-me das minhas fraquezas para
que pouse sobre mim a força de Cristo” (2Cor 12,9). As pessoas e as
gerações se sucedem, mas permanece firme a promessa de Jesus: “Eis que eu estou convosco todos os dias, até
a consumação dos séculos” (Mt 28,20b).
Até aqui há algo
que possamos aprender de Moisés. Moisés aceita o fato de não poder entrar na
terra prometida. Ele não reage com amargura. O que preocupa Moisés é que o povo
eleito tenha um guia, que Deus continue protegendo o povo e o novo guia, e que
tenham sucesso na entrada e na ocupação da terra prometida. Alcançar a terra
prometida é o único objetico de Moisés para o povo eleito saído da escravidão
do Egito. Por isso, Moisés transmite a autoridade para Josué com sincero
interesse sem rancor. Nos lábios de Moisés não há nenhuma palavra agressiva nem
de queixa. Ele é um grande e verdadeiro líder.
De Moisés aprendemos
que em nossa vida pode acontecer a mesma coisa. Em determinado momento o que
semeamos, os outros vão colher seus frutos. Mas o importante é semear a semente
boa sem nos preocuparmos com a colheita. Uma mudança de destino ou uma
enfermidade ou a morte podem diminuir ou acabar com nossas forças. Mas os
outros vao continuar o nosso trabalho ou vão melhorar o que precisa ser
melhorado. A reação com um coração magnânimo é uma reação de um grande líder como
Moisés. Animar o povo, em vez de dividí-lo, no fim de nossa liderança demonstra
nossa verdadeira capacidade de liderar os outros. Um grande líder não se deixa
dominar pelo sentimento de vaidade e de exibicionismo. Dificilmente, um grande
líder cai na depressão a partir do momento em que deixa de ser líder do povo. Um
grande líder trabalha pelo bem do povo e continua a animá-lo e animar o
sucessor pela mesma obra: o bem do povo e sua salvação. A Igreja tem uma consciência
plena disso, como lemos no último cânon do Côdigo do Direito Canônico: “... tendo diante dos olhos a salvação das almas
que, na Igreja, deve ser sempre a lei suprema” (Can. 1752). Quando deixamos
de salvar as almas no nosso trabalho evangelizador é porque temos algo escondido
(interesses egositas) atrás de nossas atividades. Quando o objetivo é para
salvar as almas, seremos capazes de abrir mão de tudo que possa atrapalhar essa
missão mesmo que tenhamos algum interesses pessoal nisso, como Moisés que pediu
para viver mais a fim de poder levar o povo até a terra prometida. Mas Deus não
lhe concedeu essa graça. Deus coloca outro líder: Josué. Se reagirmos como Moisés,
será um sinal de que não estávamos buscando a nós mesmos e sim que nosso
interesse era o bem dos demais e a glória de Deus, pois somente Deus quem salva
e leva à plenitude nossas obras. Nós somos apenas colaboradores de Deus neste
mundo para salvar as almas. Não somos protagonistas nem imprencindíveis nem
insubstiuíveis. Temos que saber nos retirar a tempo com a elegância espiritual
de Moisés.
A autoridade de
Josué será de ordem profano: conquistar uma terra, ser forte para levar a cabo
a operação e infundir valor e confiança ao povo eleito. Nenhuma missão especificamente
religiosa foi-lhe confiada, no entanto, o autor sagrado declara que Deus está
com ele.
Um chefe politico não
tem necessidade de uma responsabilidade religiosa e menos ainda, de uma
consagração litúrgica para que sua autoridade revista um significado divino. Ele
organiza a comunidade/povo de tal maneira que as opções espirituais e o destino
de cada um possam realizar-se. Não é tampouco necessário que o chefe político
defenda para cada um, o exercício da religião de sua preferências. Cada um tem
a liberdade religiosa. Mas a partir do momento em que um chefe político se
preocupa das condições ótimas para melhorar a vida em sociedade (a vida e a
salvação do povo), sua liderança é revestida de uma dimensão divina.
Somos Chamados a Conviver Na Fraternidade Amorosa
“Em
verdade vos digo, se não vos converterdes, e não vos tornardes como crianças,
não entrareis no Reino dos Céus. Quem se faz pequeno como esta criança, este é
o maior no Reino dos Céus. E quem recebe em meu nome uma criança como esta é a
mim que recebe”, disse-nos o Senhor no texto do Evangelho deste dia.
Um Discurso Sobre Vida Comunitária
Estamos no quarto
grande discurso de Jesus nos evangelho de Mateus (Mt 18). E este quarto
discurso é conhecido como “discurso eclesiológico” (discurso sobre a Igreja) ou
“discurso comunitário” onde se acentua a vida na fraternidade, isto é, cada
membro da comunidade é considerado como irmão, pois tem Deus como o Pai comum.
Este capítulo (Mt 18,1-35) foi escrito para responder aos problemas internos
das comunidades cristãs: Quem é o primeiro na comunidade? O que fazer se
acontecem escândalos? E se um cristão se perde ou se afasta da comunidade, o
que fazer? Como corrigir um irmão que erra? Quando é que uma oração pode ser chamada
de comunitária e partilhada? E quantas vezes se deve perdoar?
Na comunidade de Mt
(como também em qualquer comunidade cristã) cresce a ambição e se cultivam
sonhos de grandeza dos membros que se acham mais importantes dos demais
membros. Há pouca consideração para com os pequenos, até são desconsiderados ou
desprezados. Estes pequenos correm risco de se tornarem incrédulos e de se
afastarem da atividade comunitária. Na comunidade de Mt suscitam também
pecadores notórios, inclusive as ofensas e os ressentimentos que abalam a
convivência fraterna.
Nesse capítulo, são
dadas diversas orientações e algumas normas que têm por objetivo desenvolver o
amor fraterno e favorecer a harmonia entre os membros da comunidade. Contra os
sonhos de grandeza e de orgulho, Mt coloca a atitude de humildade que agrada a
Deus e aos outros (18,1-4). Para os pequenos, os fracos na fé, é necessário ter
uma acolhida cheia de caridade e de desvelo (18,6-7). O desprezo é inadmissível
para uma boa convivência. Para enfatizar mais este tema, Mt fala dos anjos que
sempre estão do lado dos pequenos (18,10). Se um dos membros da comunidade
afastar-se ou desviar-se do caminho reto, em vez de condená-lo, a comunidade
toda deve esforçar-se para que esse irmão volte para a comunidade, pois Deus
não quer que nenhum deles se perca (18,12-14). E para o irmão pecador, a
comunidade inteira deve usar todos os meios para recuperá-lo (18,15-20). E para
as ofensas, deve haver perdão, pois uma comunidade só pode sobreviver se existe
o perdão mútuo (18,21-35).
Ser Irmão e Fazer-se Pequeno
“Quem é o maior no Reino dos céus?”.
“Quem é o maior diante de Deus?”. “Quem vale mais diante de Deus?”. Assim
inicia o quarto discurso de Jesus sobre a vida comunitária baseada na
fraternidade. A pergunta é feita pelos discípulos para Jesus. Maior aqui
significa proeminente, superior aos outros por força de uma qualidade ou de um
poder ou de um cargo.
Atrás desta
pergunta se esconde a ambição ou a mania de grandeza dos discípulos. É “a
psicologia do príncipe”, segundo o Papa Francisco. É a ambição de grandeza que
pode ser encontrada em qualquer comunidade cristã. É admirável a ambição de
alguém que deseja redimir sua humilde condição, valorizando todas as suas
capacidades de inteligência e de luta, pois um dos sentidos lexicais da palavra
ambição é
anseio veemente de alcançar determinado
objetivo, de obter sucesso; aspiração, pretensão. A ambição só se transformará
em vício quando a afirmação de si mesmo for exagerada e os meios adotados para
atingir a glória forem desonestos. Uma pessoa de alma nobre não sai à procura
das honras, e sim do bem, da fraternidade, da verdade, da caridade e assim por
diante. Ao contrário, o ambicioso se sente totalmente envolto pela espiral da
glória que o transforma em vítima da própria tirania. O ambicioso, quando
dominado pelo vício, não suporta competidores, nem admite rivais. Quem desejar
ser a todo o custo o primeiro, dificilmente se preocupar com ser justo. “A soberba gera a divisão. A caridade, a
comunhão” (Santo Agostinho. Serm. 46,18).
Como resposta para
a pergunta dos seus discípulos Jesus faz um gesto muito simbólico: Ele chamou
uma criança e a colocou no meio dos discípulos. Ao ser colocada no meio de
todos, a criança chamada se torna um centro de atenção de todos. Podemos
imaginar que todos os olhares são dirigidos a essa criança e os ouvidos prontos
para ouvir a palavra sábia do Mestre Jesus. “Em
verdade vos digo, se não vos converterdes, e não vos tornardes como crianças,
não entrareis no Reino dos Céus. Quem se faz pequeno como esta criança, este é
o maior no Reino dos Céus. E quem recebe em meu nome uma criança como esta é a
mim que recebe”, disse Jesus aos discípulos (Mt 18,3-5). Ser
criança: frescor, beleza, inocência, não se basta a si mesma!
Esta é a primeira
regra da vida comunitária: cuidar dos pequenos e tratá-los como irmãos, e
fazer-se pequeno. Fazer-se pequeno, como exigência para viver a vida
comunitária, significa renunciar a toda ambição pessoal e a todo desejo de
colocar-se acima dos demais para estar em destaque e para oprimir os demais.
Fazer-se pequeno é uma forma de “renegar-se a si mesmo” para colocar a vontade
de Deus acima de tudo. A grandeza do Reino consiste no serviço humilde e
gratuito ao próximo, na solidariedade para com os necessitados, na partilha do
que se tem para com os carentes do básico para viver dignamente como ser
humano, e no esforço para construir uma convivência mais fraterna. Trata-se de
viver a espiritualidade familiar onde cada membro se preocupa com o outro membro
e sua salvação. Vivendo desta maneira estaremos testemunhando para o mundo que
temos fé em Deus e que estamos no Reino de Deus já neste mundo, pois vivemos
como irmãos, filhos e filhas do mesmo Pai celeste.
Ser Ocasião de Salvação Para o Outro
“Se um homem tem cem
ovelhas, e uma delas se perde, não deixa ele as noventa e nove nas montanhas,
para procurar aquela que se perdeu? Em verdade vos digo, se ele a encontrar,
ficará mais feliz com ela, do que com as noventa e nove que não se perderam. Do
mesmo modo, o Pai que está nos céus não deseja que se perca nenhum desses
pequeninos”, acrescentou Jesus (Mt 18, 12-14). Esta é outra
regra essencial da vida comunitária!
Os fariseus eram
uns “separados”, e julgavam severamente os pecadores e os que erravam, os quais
eram excluídos dos banquetes sagrados ou de um simples banquete comunitário,
pois comer juntos significava igualar ou nivelar as relações. Deus atua
completamente diferente. Deus nem sequer espera o arrependimento do pecador
para amá-lo. Antes, abandonando o resto do rebanho, ele vai à busca de uma
ovelha perdida. Através de uma conversa fraterna e através de sua participação
na refeição com os excluídos pela sociedade em questão Jesus consegue trazer de
volta para Deus muitos pecadores, como Zaqueu (Lc 19,2-10), como Mateus (Mt
9,9) e assim por diante.
O saudoso Cardeal
François X. Van Thuan escreveu dois dos cinco “defeitos” de Jesus (Testemunhas Da Esperança. Edit. Cidade Nova). O primeiro defeito é que Jesus não tem boa memória.
Ele esquece todos os pecados dos que se arrependeram, como o “bom ladrão”:
“Hoje mesmo tu estarás comigo no Paraíso” (Lc 23,43) e a mulher pecadora: “...
seus numerosos pecados lhe estão perdoados, porque ela demonstrou muito amor”
(Lc 7,47). Deus não lhes pergunta nada a respeito de seu passado escandaloso.
Deus esquece até mesmo que perdoou. E o segundo “defeito” de Jesus é que ele
não “sabe” matemática. Ele abandona 99 ovelhas para procurar uma que está
perdida. Na nossa matemática uma ovelha não é igual a 99 ovelhas. Para Jesus
uma ovelha é igual a 99 ovelhas. Todos têm o mesmo valor diante de Deus.
Cada um de nós, por
menor que seja no olhar de um ser humano ou de uma sociedade, é objeto de um
carinho especial de Deus. Deus não despreza nenhum ser humano. Cada um é
considerado na sua individualidade. A graça de Deus nos faz nós mesmos: “Eu sou
o que sou pela graça de Deus” (1Cor 15,10). Jesus quer que cada membro da
comunidade cristã precise ser uma ocasião de salvação para o outro e o outro é
uma ocasião de salvação para mim. Somente é assim que uma comunidade cristã
pode ser chamada e considerada como uma comunidade de irmãos.
Na Bíblia a
misericórdia pertence rigorosamente à linguagem mais elevada da fé, designa uma
atitude de todo o ser. A misericórdia evoca tanto o aspecto de fidelidade ao
compromisso como o aspecto de ternura do coração. A experiência da condição
miserável e pecadora do homem deu corpo à noção da misericórdia de Deus, que se
apresenta a nós como a atitude de Deus diante do pecado do homem. A misericórdia
de Deus não é ingenuidade e sim convite à conversão e convite para cada homem a
praticar, por sua vez, a misericórdia para os demais homens.
Os escribas e os
fariseus não são capazes de ver no pecados mais que a um inimigo de Deus. Se um
pecador é inimigo de Deus, logo é inimigos dos que se consideram “religiosos”.
Não é esta a atitude daqueles que julgam com excessiva severidade das falhas
dos outros? Deus, ao contrário, não espera o arrependimento para amar o
pecador. Quem é responsável pela comunidade, pela pastoral, pelo grupo na
Igreja do Senhor é encarregado de revelar ao irmão que pecou que Deus o ama
primeiro (1Jo 4,10.19; 2Cor 5,20) e que esse Deus se preocupa com a salvação de
todos. Será que todos os responsáveis na comunidade está consciente dessa
responsabilidade?
P.Vitus Gustama,svd
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Texto : Lc 1,39-56
A proclamação do dogma
da Assunção de Maria à glória dos céus ,
em alma
e corpo , pertence
ao século XX: foi declarado solenemente por
Pio XII em
01 de Novembro de 1950 na bula Munificentissimus
Deus . No entanto ,
a liturgia da Igreja
universal , tanto
no Oriente quanto
no Ocidente , celebrou por muitos séculos esta convicção
de fé .
No século V celebrava-se em Jerusalém no dia
15 de agosto uma festa
importante que
tinha por
objeto a excelência
da pessoa da Mãe
de Deus , eleita por
supremo conselho
para desempenhar uma missão muito especial na história
da salvação. Entre o V e VI século , a narração
apócrifa sobre
o Trânsito de Maria da vida
terrena à glória
eterna alcançou uma difusão
extraordinária : a conseqüência
foi o desejo natural
dos peregrinos que
ocorriam a Jerusalém de honrar o túmulo da Virgem . Durante o século
VII, com o nome
de Assunção
foi acolhida na Igreja de Roma, juntamente com
as festa da Apresentação ,
Anunciação e Natividade ,
para as quais
o Papa Sérgio I(+ 701), instituiu uma procissão preparatória
para a missa ,
celebrada na Santa Maria Maior . No fim
do século VII encontra-se uma antiga
oração romana
composta para
a procissão que
introduz a celebração mariana do dia
15 de agosto : “Venerável é para nós , Senhor , a festa deste dia
em que
a Santa Mãe
de Deus sofreu a morte
terrena , mas
não permaneceu nas amarras
da morte , ela
que , do próprio
ser , gerou, encarnado ,
o teu Filho ,
Senhor nosso ”
(Sacramentário Gregoriano Adrineu,
no.661)
A bula
da definição dogmática
não fala
de argumentos bíblicos, pois
a Escritura não
afirma a Assunção de Maria. Discute-se
se Maria morreu ou não .
Por isso ,
o texto dogmático ,
cautelosamente , diz “terminado o curso de sua vida terrestre ”. Nós , por isso , afirmamos que
Maria morreu, pois só
assim se pode falar ,
verdadeiramente, de ressurreição , porquanto somente um morto pode ressuscitar . Maria morreu pelo fato
natural da morte
que pertence
à estrutura da vida
humana , independentemente
do pecado . Maria, livre e isenta
de todo o pecado ,
pôde integrar a morte como pertencente à vida
criada por
Deus . A morte
não é vista
como fatalidade
e perda da vida ,
mas como
chance e passagem
para uma vida
mais plena
em Deus .
Maria foi assunta
ao céu em corpo e alma .
Aqui não
se trata de dogmatizar
um esquema
antropológico (corpo e alma ). Utiliza-se esta expressão ,
compreensível à cultura
ocidental , para
enfatizar o caráter
totalizante e completo da glorificação de Maria. Maria vê-se envolvida na absoluta realização . “Assunta
ao céu ”, ela
se nos apresenta como
as primícias da redenção ,
tendo já consumado
em si
o que ainda
se realizará em nós
e na Igreja . O corpo de
Maria, enquanto ela
perambulava por este
mundo , foi somente
veículo de graça ,
de amor , de compreensão
e de bondade . Não foi instrumento
de pecado , da vontade
de auto-afirmação humana
e de desunião com
os irmãos . O corpo é forte e
frágil , cheio
de vida e contaminado pela doença e morte . Por isso , é exaltado por
uns até a idolatria
e odiado por outros
até a trituração. Maria vive e goza , no corpo
e na alma , quer
dizer na totalidade de sua existência ,
desta inefável realização
humana e divina .
Algumas
mensagens do texto
1. O Evangelista Lc não
descreve que Maria simplesmente
“andou”, mas que
ela “partiu” / pôr-se a caminho ”. Nos Evangelhos a idéia
de viagem , de caminho ,
está intimamente ligada à obediência a Deus
e ao discipulado de Jesus. O
verbo “pôr-se a caminho ”
tem em Lucas o significado
teológico de disponibilidade
e obediência aos planos
de Deus ; pôr-se a caminho
significa aceitar total
e existencialmente o caminho proposto por Deus , pois esse caminho nos
conduz sempre à felicidade
embora tenhamos que
atravessar vários
obstáculos , mas
no coração ressoa sempre
uma certeza de que
Deus está sempre
caminhando conosco (Maria foi com Jesus no ventre ).
Maria
se pôs a caminho significa que a partir daquele momento começou a sua
vida como
resposta
à proposta ou
aos planos de Deus . É a resposta
ao anúncio feito
por Deus ,
que se funda ,
sobretudo , a leitura
de Maria como modelo
do discípulo perfeito ,
como a alma
fiel por
excelência .
A fé
de Maria é uma fé missionária .
Depois de dizer
o seu “sim ”,
leva-o através dos caminhos
do nosso mundo
para suscitar a alegria e o louvor .
A viagem de Maria à Judéia(para Ain Karin), por isso , é um símbolo do caminho
da fé que
precisa ser
testemunhada, compartilhada, que precisa servir ; porque a fé não é somente o dom de Deus , mas também é
uma resposta humana ,
e com todo
ato humano .
Dessa fé é que
faz encontro e serviço .
E quando a Palavra
de Deus é ouvida
com autenticidade ,
como Maria, não
pode deixar de ser profundamente criativa
e dialogante. E quando a Palavra de Deus
é ouvida e refletida com atenção por qualquer um , ele não pode deixar de ser missionário desta
Palavra .
2. Maria partiu “apressadamente ”. A expressão
“apressadamente ” não
descreve a presteza externa
com que
parte nem
descreve o estado psicológico
de Maria. Lc quer sublinhar
a atitude interior
de fé e de obediência
de Maria. Sua “pressa ”
está dinamizada pelo fervor
interior , pela
alegria e, sobretudo ,
pela fé (cf.
Lc 1,38.45). “Às pressas ” significa seriedade ,
empenho , solicitude ,
zelo , entusiasmo ,
ardor , prontidão
etc.. No sentido teológico , então ,
a pressa de Maria é um
reflexo da sua
obediência , como
serva e discípula
fiel , em
relação ao plano
que lhe
foi revelado pelo anjo ,
um plano
que previa a gravidez
de Isabel.
3. Maria é a arca da nova aliança , o lugar
da presença de Deus
no meio de nós .
Como a arca
da nova aliança ,
em Maria o Verbo
se fez carne e os céus
e a terra se encontraram. Mas
ela não
é um lugar
que encerra
Deus e sim
um lugar
que O dá. Ela
não é uma arca
que esconde o mistério ,
mas uma arca
que o irradia. Maria é Aquela que , habitada pelo mistério , o dá.
4. Maria é o símbolo perfeito
da atenção , pois
ela tem o amor
no coração . O amor
é atenta . Maria serve Isabel na sua necessidade
real . O seu
amor se transforma em
gesto , pois a
caridade é concreta . O amor
sabe ver o que
o não- amor nunca
descobrirá. O seu amor
causa a alegria ,
pois a caridade
sabe se terna . A ternura
consiste certamente em
dar com alegria , suscitando em
quem recebe o dom
da alegria e não
um sentimento
de dependência . Ela
faz tudo isso ,
porque Maria depende só de Deus , por isso é livre (Nenhuma criatura
a prende). Quem é livre
na fé , pois
depende somente de Deus ,
torna-o doado aos outros na gratuidade.
Se
acreditarmos que Jesus está dentro de nós , nos comportaremos como
Maria: seremos portadores de alegria no Senhor para os outros . O nosso encontro com os outros
fará brotar neles a alegria
pela presença
do Messias , a docilidade ao Espírito ,
o louvor a Deus .
6.
No Magnificat Maria anuncia que os poderosos serão
derrubados de seus tronos . Não se trata de
punição nem
vingança , pois o Deus de Jesus não
é vingativo . Descer
do trono é condição
de salvação. É preciso descer
do trono para
aprender a ser irmão , a ser solidário , a servir , a criar relações horizontais . É preciso
despojar-se de auto-suficiência e reconhecer-se necessitado de salvação.
Estamos acostumados a reverenciar
o poder , de várias maneiras .
É só alguém
“subir na vida ”
que logo
começa a receber
um tratamento
mais respeitoso .
É como se o posto
que cada
um ocupa mudasse a qualidade
humana das pessoas .
Não será por
isso que
alguns são
chamados de “excelência ” mesmo quando não têm atitudes
tão excelentes
assim para com os outros ? Por esses e outros motivos
o poder fascina e muita
gente vive correndo atrás
dele.
O peso
do prestígio do poder
invade até o campo
religioso . Usamos para
Deus freqüentemente
as mesmas imagens com
que idealizamos o poder
humano : Deus
sentado no trono , Maria com coroa de rainha . Aliás ,
a Bíblia também
faz isso , refletindo a cultura da época . O problema não
está exatamente aí .
O perigo está no jeito
de utilizar essas imagens .
Com essa noção
de poder é possível
até tentar dominar os outros ,
autoritariamente, em vez de dialogar
e servir . Deus
vê essa questão
de outro jeito
que nem
sempre nós
estamos preparados para
entender .
Os “poderosos ”
não são
os outros . Cada
um de nós
pode fabricar seus
próprios “tronos ”
e olhar o próximo de cima , de forma opressora, indiferente ou superior .
Se somos realmente
Igreja servidora, como
Jesus sempre quis, temos que “descer ” de muitos “tronos ”
que criamos e tratar
o irmão , qualquer
irmão , como
um igual ,
digno de respeito
e precioso como
filho de Deus .
P.Vitus Gustama,svd
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