ASSUNÇÃO: 15 de Agosto
Esta reflexão é para os lugares em que a Assunção é celebrada no próprio dia 15 de Agosto
ASSUNÇÃO DE
MARIA
Texto : Lc 1,39-56
A proclamação do dogma
da Assunção de Maria à glória dos céus ,
em alma
e corpo , pertence
ao século XX: foi declarado solenemente por
Pio XII em
01 de Novembro de 1950 na bula Munificentissimus
Deus . No entanto ,
a liturgia da Igreja
universal , tanto
no Oriente quanto
no Ocidente , celebrou por muitos séculos esta convicção
de fé .
No século V celebrava-se em Jerusalém no dia
15 de agosto uma festa
importante que
tinha por
objeto a excelência
da pessoa da Mãe
de Deus , eleita por
supremo conselho
para desempenhar uma missão muito especial na história
da salvação. Entre o V e VI século , a narração
apócrifa sobre
o Trânsito de Maria da vida
terrena à glória
eterna alcançou uma difusão
extraordinária : a conseqüência
foi o desejo natural
dos peregrinos que
ocorriam a Jerusalém de honrar o túmulo da Virgem . Durante o século
VII, com o nome
de Assunção
foi acolhida na Igreja de Roma, juntamente com
as festa da Apresentação ,
Anunciação e Natividade ,
para as quais
o Papa Sérgio I(+ 701), instituiu uma procissão preparatória
para a missa ,
celebrada na Santa Maria Maior . No fim
do século VII encontra-se uma antiga
oração romana
composta para
a procissão que
introduz a celebração mariana do dia
15 de agosto : “Venerável é para nós , Senhor , a festa deste dia
em que
a Santa Mãe
de Deus sofreu a morte
terrena , mas
não permaneceu nas amarras
da morte , ela
que , do próprio
ser , gerou, encarnado ,
o teu Filho ,
Senhor nosso ”
(Sacramentário Gregoriano Adrineu,
no.661)
A bula
da definição dogmática
não fala
de argumentos bíblicos, pois
a Escritura não
afirma a Assunção de Maria. Discute-se
se Maria morreu ou não .
Por isso ,
o texto dogmático ,
cautelosamente , diz “terminado o curso de sua vida terrestre ”. Nós , por isso , afirmamos que
Maria morreu, pois só
assim se pode falar ,
verdadeiramente, de ressurreição , porquanto somente um morto pode ressuscitar . Maria morreu pelo fato
natural da morte
que pertence
à estrutura da vida
humana , independentemente
do pecado . Maria, livre e isenta
de todo o pecado ,
pôde integrar a morte como pertencente à vida
criada por
Deus . A morte
não é vista
como fatalidade
e perda da vida ,
mas como
chance e passagem
para uma vida
mais plena
em Deus .
Maria foi assunta
ao céu em corpo e alma .
Aqui não
se trata de dogmatizar
um esquema
antropológico (corpo e alma ). Utiliza-se esta expressão ,
compreensível à cultura
ocidental , para
enfatizar o caráter
totalizante e completo da glorificação de Maria. Maria vê-se envolvida na absoluta realização . “Assunta
ao céu ”, ela
se nos apresenta como
as primícias da redenção ,
tendo já consumado
em si
o que ainda
se realizará em nós
e na Igreja . O corpo de
Maria, enquanto ela
perambulava por este
mundo , foi somente
veículo de graça ,
de amor , de compreensão
e de bondade . Não foi instrumento
de pecado , da vontade
de auto-afirmação humana
e de desunião com
os irmãos . O corpo é forte e
frágil , cheio
de vida e contaminado pela doença e morte . Por isso , é exaltado por
uns até a idolatria
e odiado por outros
até a trituração. Maria vive e goza , no corpo
e na alma , quer
dizer na totalidade de sua existência ,
desta inefável realização
humana e divina .
Algumas
mensagens do texto
1. O Evangelista Lc não
descreve que Maria simplesmente
“andou”, mas que
ela “partiu” / pôr-se a caminho ”. Nos Evangelhos a idéia
de viagem , de caminho ,
está intimamente ligada à obediência a Deus
e ao discipulado de Jesus. O
verbo “pôr-se a caminho ”
tem em Lucas o significado
teológico de disponibilidade
e obediência aos planos
de Deus ; pôr-se a caminho
significa aceitar total
e existencialmente o caminho proposto por Deus , pois esse caminho nos
conduz sempre à felicidade
embora tenhamos que
atravessar vários
obstáculos , mas
no coração ressoa sempre
uma certeza de que
Deus está sempre
caminhando conosco (Maria foi com Jesus no ventre ).
Maria
se pôs a caminho significa que a partir daquele momento começou a sua
vida como
resposta à proposta
ou aos planos
de Deus .
É a resposta ao anúncio feito por Deus , que se funda , sobretudo , a leitura
de Maria como modelo
do discípulo perfeito ,
como a alma
fiel por
excelência .
A fé
de Maria é uma fé missionária .
Depois de dizer
o seu “sim ”,
leva-o através dos caminhos
do nosso mundo
para suscitar a alegria e o louvor .
A viagem de Maria à Judéia (para Ain Karin), por isso , é um símbolo do caminho
da fé que
precisa ser
testemunhada, compartilhada, que precisa servir ; porque a fé não é somente o dom de Deus , mas também é
uma resposta humana ,
e com todo
ato humano .
Dessa fé é que
faz encontro e serviço .
E quando a Palavra
de Deus é ouvida
com autenticidade ,
como Maria, não
pode deixar de ser profundamente criativa
e dialogante. E quando a Palavra de Deus
é ouvida e refletida com atenção por qualquer um , ele não pode deixar de ser missionário desta
Palavra .
2. Maria partiu “apressadamente ”. A expressão
“apressadamente ” não
descreve a presteza externa
com que
parte nem
descreve o estado psicológico
de Maria. Lc quer sublinhar
a atitude interior
de fé e de obediência
de Maria. Sua “pressa ”
está dinamizada pelo fervor
interior , pela
alegria e, sobretudo ,
pela fé (cf.
Lc 1,38.45). “Às pressas ” significa seriedade ,
empenho , solicitude ,
zelo , entusiasmo ,
ardor , prontidão
etc.. No sentido teológico , então ,
a pressa de Maria é um
reflexo da sua
obediência , como
serva e discípula
fiel , em
relação ao plano
que lhe
foi revelado pelo anjo ,
um plano
que previa a gravidez
de Isabel.
3. Maria é a arca da nova aliança , o lugar
da presença de Deus
no meio de nós .
Como a arca
da nova aliança ,
em Maria o Verbo
se fez carne e os céus
e a terra se encontraram. Mas
ela não
é um lugar
que encerra
Deus e sim
um lugar
que O dá. Ela
não é uma arca
que esconde o mistério ,
mas uma arca
que o irradia. Maria é Aquela que , habitada pelo mistério , o dá.
4. Maria é o símbolo perfeito
da atenção , pois
ela tem o amor
no coração . O amor
é atenta . Maria serve Isabel na sua necessidade
real . O seu
amor se transforma em
gesto , pois a
caridade é concreta . O amor
sabe ver o que
o não- amor nunca
descobrirá. O seu amor
causa a alegria ,
pois a caridade
sabe se terna . A ternura
consiste certamente em
dar com alegria , suscitando em
quem recebe o dom
da alegria e não
um sentimento
de dependência . Ela
faz tudo isso ,
porque Maria depende só de Deus , por isso é livre (Nenhuma criatura
a prende). Quem é livre
na fé , pois
depende somente de Deus ,
torna-o doado aos outros na gratuidade.
Se
acreditarmos que Jesus está dentro de nós , nos comportaremos como
Maria: seremos portadores de alegria no Senhor para os outros . O nosso encontro com os outros
fará brotar neles a alegria
pela presença
do Messias , a docilidade ao Espírito ,
o louvor a Deus .
6.
No Magnificat Maria anuncia que os poderosos serão
derrubados de seus tronos . Não se trata de
punição nem
vingança , pois o Deus de Jesus não
é vingativo . Descer
do trono é condição
de salvação. É preciso descer
do trono para
aprender a ser irmão , a ser solidário , a servir , a criar relações horizontais . É preciso
despojar-se de auto-suficiência e reconhecer-se necessitado de salvação.
Estamos acostumados a reverenciar
o poder , de várias maneiras .
É só alguém
“subir na vida ”
que logo
começa a receber
um tratamento
mais respeitoso .
É como se o posto
que cada
um ocupa mudasse a qualidade
humana das pessoas .
Não será por
isso que
alguns são
chamados de “excelência ” mesmo quando não têm atitudes
tão excelentes
assim para com os outros ? Por esses e outros motivos
o poder fascina e muita
gente vive correndo atrás
dele.
O peso
do prestígio do poder
invade até o campo
religioso . Usamos para
Deus freqüentemente
as mesmas imagens com
que idealizamos o poder
humano : Deus
sentado no trono , Maria com coroa de rainha . Aliás ,
a Bíblia também
faz isso , refletindo a cultura da época . O problema não
está exatamente aí .
O perigo está no jeito
de utilizar essas imagens .
Com essa noção
de poder é possível
até tentar dominar os outros ,
autoritariamente, em vez de dialogar
e servir . Deus
vê essa questão
de outro jeito
que nem
sempre nós
estamos preparados para
entender .
Os “poderosos ”
não são
os outros . Cada
um de nós
pode fabricar seus
próprios “tronos ”
e olhar o próximo de cima , de forma opressora, indiferente ou superior .
Se somos realmente
Igreja servidora, como
Jesus sempre quis, temos que “descer ” de muitos “tronos ”
que criamos e tratar
o irmão , qualquer
irmão , como
um igual ,
digno de respeito
e precioso como
filho de Deus .
P.Vitus Gustama,svd
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