domingo, 2 de setembro de 2018

13/09/2018
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VIVER NA MISERICÓRDIA DIVINA É VIVER NO AMOR SEM FRONTEIRAS
Quinta-Feira da XXIII Semana Comum


Primeira Leitura:1Cor 8,1b-7.11-13
Irmãos, 1b o conhecimento incha, a caridade é que constrói. 2 Se alguém acha que conhece bem alguma coisa, ainda não sabe como deveria saber. 3 Mas se alguém ama a Deus, ele é conhecido por Deus! 4 Quanto ao comer as carnes de animais sacrificados aos ídolos, nós sabemos que um ídolo não é nada no mundo, e que Deus é um só. 5 É verdade que alguns são chamados deuses, no céu ou na terra, e muita gente pensa que existem muitos deuses e muitos senhores. 6 Para nós, porém, existe um só Deus, o Pai, de quem vêm todos os seres e para quem nós existimos. E, ainda, para nós, existe um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual tudo existe, e nós também existimos por ele. 7 Mas nem todos têm esse conhecimento. De fato, alguns habituados, até o presente, ao culto dos ídolos, comem da carne dos sacrifícios, como se ela fosse mesmo oferecida aos ídolos. E assim, a sua consciência, que é fraca, fica manchada. 11 E então, por causa do teu conhecimento, perece o fraco, o irmão pelo qual Cristo morreu. 12 Pecando, assim, contra os irmãos e ferindo a consciência deles, que é fraca, é contra Cristo que pecais. 13 Por isso, se um alimento é ocasião de queda para meu irmão, nunca mais comerei carne, para não escandalizar meu irmão.


Evangelho: Lc 6,27-38
Naquele tempo, falou Jesus aos seus discípulos: 27 “A vós que me escutais, eu digo: Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, 28 bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam. 29 Se alguém te der uma bofetada numa face, oferece também a outra. Se alguém te tomar o manto, deixa-o levar também a túnica. 30 Dá a quem te pedir e, se alguém tirar o que é teu, não peças que o devolva. 31 O que vós desejais que os outros vos façam, fazei-o também vós a eles. 32 Se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Até os pecadores amam aqueles que os amam. 33 E se fazeis o bem somente aos que vos fazem o bem, que recompensa tereis? Até os pecadores fazem assim. 34 E se emprestais somente àqueles de quem esperais receber, que recompensa tereis? Até os pecadores emprestam aos pecadores, para receber de volta a mesma quantia. 35 Ao contrário, amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai sem esperar coisa alguma em troca. Então, a vossa recompensa será grande, e sereis filhos do Altíssimo, porque Deus é bondoso também para com os ingratos e os maus. 36 Sede misericordiosos, como também o vosso Pai é misericordioso. 37 Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados. 38 Dai e vos será dado. Uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante será posta no vosso colo; porque com a mesma medida com que medirdes os outros, vós também sereis medidos”.
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A Caridade Fraterna Está Acima De Nosso Conhecimento


Irmãos, quanto ao comer as carnes de animais sacrificados aos ídolos, nós sabemos que um ídolo não é nada no mundo, e que Deus é um só. ... Se um alimento é ocasião de queda para meu irmão, nunca mais comerei carne, para não escandalizar meu irmão.”, escreveu são Paulo aos Coríntios.


No dia anterior, são Paulo nos falou sobre o casamento e o celibato. Agora surge outra questão: é permitido ou não comer carne que foi oferecida para os ídolos nos templos pagãos? Na época de são Paulo, a maior parte das carnes vendidas ao povo provinha dos templos, onde tinham sido oferecidas e consagradas para as divindades. Além disso, havia no pátio dos templos banquetes sagrados dos quais todas as pessoas podiam participar como sinal de comunhão com a divindade. Aqueles cristãos de Corinto, antes de converter-se, estavam acostumados a participar nos banquetes deste tipo em honra a tal deus ou a tal deusa, comendo carne gratuitamente e celebrando festa com a comunidade dos adoradores dos deuses.


A razão parece válida: como já sabem (a sabedoria dos gregos outra vez) que tais deuses não existem, porque somente existe um Deus, o Pai de Jesus. Por isso, poderiam comer tranquilamente essa carne, comprando-a, por exemplo, nos vendedores da carne ou quando participam de um banquete para o qual foram convidados.


Esta razão já sabem os mais “fortes”, isto é, os que são libertados de escrúpulos. Mas há outros irmãos que são mais “débeis”. São Paulo quer que estes irmãos de consciência mais delicada sejam respeitados, porque poderiam se escandalizar. Por isso, são Paulo lhes diz: “Irmãos, o conhecimento incha, a caridade é que constrói. Se alguém acha que conhece bem alguma coisa, ainda não sabe como deveria saber. Mas se alguém ama a Deus, ele é conhecido por Deus!”. A “sabedoria” dos fortes “perece o fraco, o irmão pelo qual Cristo morreu”.


O conhecimento incha e constrói altares para si mesmo, se crê imortal. Mas tem pés de barro, como os homens. Ao contrário, o conhecimento enriquecido com o amor faz coisas belas na vida e na sociedade, e faz mais feliz o homem do que um mero saber.


A ciência humana "deificada", "auto-suficiente" não molda o coração humano para que ele viva a experiência de ser feliz fazendo os outros felizes. Por outro lado, a ciência que nos torna servos dos outros e admiradores do poder criativo de Deus, nos faz felizes em nossa pequenez, porque descobrimos o Infinito no qual podemos permanecer deliciosamente.


Aprendamos, junto ao saber humano, a sabedoria divina do amor que conhece e respeita os demias e os anima, que compreende os demais e os perdoa, que sabe da dignidade dos demais e lhes faz felizes como realmente são: pessoas, filhos(as) de Deus. O critério da caridade fraterna com os irmãos é mais importante do que o critério de conhecimento.


Em rigor, se poderia comer carne imolada aos deuses num contexto não sagrado. Mas se há alguém a quem isso vai escandalizar, então devemos renunciar ao nosso direito: “Por isso, se um alimento é ocasião de queda para meu irmão, nunca mais comerei carne, para não escandalizar meu irmão”, escreveu são Paulo (1Cor 8,13).


Entre nós não seria exatamente o caso de idolatria. Mas há muitos outros em que meus “direitos” podem chocar com a consciência delicada de um irmão: maneiras de falar e de atuar que em si não sejam reprováveis, mas que podem ocasionar que os outros se debilitem em suas convicções.  Então vale o argumento de são Paulo: “Por causa do teu conhecimento, perece o fraco, o irmão pelo qual Cristo morreu.  Pecando, assim, contra os irmãos e ferindo a consciência deles, que é fraca, é contra Cristo que pecais” (1Cor 8,11-12).


Um pode ser “progressista” em suas ideias e em seus costumes. Porém, a delicadeza para com a consciência dos demais é uma finura ou delicadeza espiritual que se pode exigir de nós como uma das maneiras concretas da caridade fraterna. O respeito ao irmão está acima de nosso “conhecimento” e de nosso “direito”. Estamos, na verdade, no binômio da Carta: a “gnosis” (o conhecimento) e a “ágape” (a caridade). A posição de são Paulo é clara: “O conhecimento incha, a caridade é que constrói” (1Cor 8,1b).


Não podemos fazer de nossa fé algo meramente racional, pois isto pode nos levar a criarmos uma religião meramente personalista, atuando conforme nossas crenças e convicções pessoais sem nos importar se com isso pisoteamos os demais ou escandalizamos os outros. A fé se vive na comunidade. Por isso, não podemos perder de vista que no fundo deve estar o amor a Deus e o amor ao próximo.


Somos Chamados a Ser Sinal Do Amor Misericordioso de Deus Neste Mundo


Estamos acompanhando o Sermão da Planície do Evangelho de Lucas (Lc 6,20-49). Na passagem do evangelho de hoje o evangelista Lucas resumiu vários conselhos dados por Jesus, e que Mateus agrupou no Sermão da Montanha (Mt 5-7). Esses conselhos são umas atitudes evangélicas essenciais para qualquer cristão ou qualquer pessoa de boa vontade.


Sede misericordiosos, como também o vosso Pai é misericordioso. Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam”.


O evangelho não inventou novos valores. O próprio perdão, expressão máxima do amor, faz parte de toda vida numa sociedade que queira ser duradoura. Mas o exemplo de Cristo é um estímulo poderoso que pode nos dar fortaleza de chegar ao extremo no amor que perdoa. Sem amor os mais formosos valores podem degenerar em orgulho, em auto-suficiência, em farisaísmo, em exibicionismo, em intolerância, em fanatismo, em legalismo e assim por diante (cf. 1Cor 13,1-13). O amor nos impede de cairmos em moralismo e rigorismo sem flexibilidade.


Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam”, disse Jesus.


“Inimigo” é uma palavra muito forte. Geralmente se refere àqueles que estão em estado de guerra. Pode também ser usada para descrever grupos ou indivíduos que oprimem outros, que algemam sua liberdade e impedem seu crescimento. Inimigo também é alguém que se coloca no caminho da nossa liberdade e dignidade. É alguém a quem evitamos e com quem nos recusamos comunicar. São os que nos odeiam, nos amaldiçoam, nos injuriam, os que nos roubam a alegria de viver, os que nos comentam com maldade e assim por diante. Todas essas pessoas não são idéias nem fantasmas irreais, e sim são pessoas de carne e osso. Nem sempre temos coragem de dizer que temos inimigos, pois esta palavra é muito forte.


Porém, consciente ou conscientemente a atitude de alguém de não querer se comunicar com seu rival/inimigo vai virar a antipatia e a antipatia pode se transformar em mágoa; a mágoa se torna raiva e a raiva vai virar ódio. O ódio é como uma gangrena: devora a pessoa. O ódio é igual alguém a tomar o veneno e espera que o outro morra. Todas as nossas recusas em nos comunicarmos com os outros e nos abrirmos a eles encerram-nos na prisão. Em vez de nos ajudar a crescermos no amor, no perdão e na abertura, esse processo pode nos fechar em formas sutis de depressão e inércia. Nesse caso somos prisioneiros de nós mesmos ou do nosso grupo.


Amai... Fazei o bem... Desejai-lhes o bem... Rogai por eles... Daí... etc.”. Tudo isso não são idéias nem sentimentos e sim atos reais e atitudes concretas. Nisso percebemos que não é fácil viver o evangelho. É preciso fazer e ter a experiência pessoal com Cristo para podermos viver tudo isso.


O ensinamento essencial de Jesus é que nosso amor há de ser universal libertando-nos das comunidades naturais: a família, a nação, a etnia nas quais se exerce ou se vive o amor quase espontaneamente. É preciso nós irmos além das fronteiras, pois o amor sempre vai além das fronteiras: “Se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Até os pecadores amam aqueles que os amam. E se fazeis o bem somente aos que vos fazem o bem, que recompensa tereis? Até os pecadores fazem assim”, disse Jesus. A solidariedade, o amor, a compaixão, não é um bem em si, há que praticá-los também para os pecadores, os malvados, os egoístas, pois o amor é o valor que convence até os ateus, os desesperados e desesperançosos. O amor sem fronteiras é muito mais exigente do que todas as leis psicológicas e sociais. O amor deve alcançar as dimensões de toda a humanidade: inimigos, adversários, maldosos, maliciosos e assim por diante. É um amor desinteressado e gratuito: “Amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai sem esperar coisa alguma em troca”. É amar como Deus ama, imitando o amor infinito de Deus, pois “Deus é bondoso também para com os ingratos e os maus”, e ser um sinal de amor do Pai que ama todos os homens que “faz nascer seu sol igualmente sobre maus e bons e cair a chuva sobre justos e injustos” (Mt 5,45).


Portanto, o texto do evangelho de hoje é uma chamada a construirmos uma nova relação com Deus a partir de um novo comportamento com os demais. O primeiro mandamento que Jesus deu aos seus seguidores é superar o ódio, a vingança e o rancor: “Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam, bendizei os que vos amaldiçoam, e rezai por aqueles que vos caluniam”. Nenhum cálculo humano deve orientar a pratica do amor autêntico e eficaz. Os seguidores de Jesus, ao amar os inimigos, imitam a bondade de Deus de Quem recebe o perdão de seus pecados e este amor é a resposta agradecida ao Deus da misericórdia. O amor dos seguidores de Jesus deve ser uma ação e uma tarefa, o amor deve ser eficaz e alcançar, inclusivo, aqueles que não o merecem: os inimigos. As palavras de Jesus supõem uma nova atitude, supõe a conversão e a aceitação plena do conteúdo dos ensinamentos de Jesus, supõem construir um novo modelo de sociedade porque não pode haver uma comunidade autêntica sem a justiça e o perdão necessário para restabelecer a comunidade. No entanto, o perdão nunca pode servir de pretexto para ocultar a ausência de justiça. Nosso amor não pode encobrir injustiças e desigualdades. Amar, verdadeiramente, é andar na verdade.


É bom nos relembrarmos novamente que o estilo de atuação que Jesus pede a todos os cristãos é:
  • Amem seus inimigos.
  • Façam o bem aos que os odiaram.
  • Abençoem aqueles que os amaldiçoaram.
  • Rezem pelos que os injuriaram.
    O que nos custa é cumpri-los, adequar nosso estilo de vida a estes ensinamentos de Jesus. Somos chamados a ter bom coração com todos: não julgar, não condenar, não injuriar, não agredir, mas rezar, perdoar e ser compassivo. A misericórdia é um especial poder do amor, que prevalece sobre o ódio, a infidelidade, a deslealdade, a ingratidão. Como diz João Paulo II: “Esse amor misericordioso é capaz de curvar-se ante o filho pródigo, ante a miséria humana e, sobretudo, ante a miséria moral, ante o pecado. A misericórdia se manifesta em seu aspecto verdadeiro e próprio quando valoriza, promove e explicita o bem em todas as formas de mal existente no mundo e no homem” (Dives in misericórdia, no.6).
P. Vitus Gustama,svd

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