Sábado Santo,11/04/2020
JESUS É NOSSA RESSURREIÇÃO, O NOSSO FUTURO COM DEUS ESTÁ GRANTIDO
Segundo o Missal Romano, a
Vigília Pascal é “mãe de todas as noites” e celebra o
acontecimento fundamental, o cume da história da salvação que é a Ressurreição
do Senhor. A noite pascal, em seu verdadeiro sentido, é a festa nupcial da
Igreja. Todas as imagens de núpcias e bodas, cheias de promessas, que nos
acompanham ao longo da liturgia anual, alcançam hoje toda a sua plenitude. A
solenidade desta noite começou na sepultura. Mas agora sabemos que o sepulcro
está vazio; apareceu o anjo para anunciar a ressurreição do Senhor. Por essa
razão, a Semana Santa sem a celebração pascal é algo mutilado e quase sem
sentido e pode conduzir a um cristianismo equivocado. Seria ficar-se apenas na
dor e morte, se Jesus não ressuscitasse e quando Ele não trouxesse a vida e a
renovação para a humanidade (cf. 1Cor 15,12-19).
A Páscoa é a grande festa cristã, pois Jesus
ressuscitou e nos deu a nova vida, a nova esperança de viver com sentido, e
para o homem de hoje que está carente da alegria e da esperança encontra a
fonte de sua vida em Jesus Ressuscitado. A partir de tudo isto, resta-nos uma
coisa a fazer: obedecer ao encargo do anjo para anunciar a ressurreição aos que
a buscam, aos que dela duvidam, aos que nela não creem. Para todos precisamos
dizer com São Paulo: “Se, pois,
ressuscitastes com Cristo, procurais as coisas do alto, onde Cristo está
sentado à direita de Deus. Pensais nas coisas do alto, e não nas coisas da
terra, pois morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus: quando
Cristo, que é a vossa vida, se manifestar, então, vós também com ele sereis
manifestados em glória” (Cl 3,1-4).
1. Ser Aroma Para
Os Outros E Para O Outro
A noite da Vigília Pascal é a noite central
da comunidade cristã. É noite de vela diante do trânsito do mundo velho ao
novo, da escravidão à liberdade, do desespero à esperança e da morte à vida,
pois Cristo ressuscitou e nos dá esperança para o futuro de Deus que é nosso
também.
São Lucas nos diz que o
novo dia começa com os “aromas” levados pelas mulheres no amanhecer do dia com
prontidão e esperança (cf. Lc 24,1). Por isso, o novo dia para nós começa
quando sairmos de nós mesmos ao encontro dos outros e do Outro com os aromas do
afeto, do encontro gratuito, da busca profunda do sentido da vida que consiste
no amor vivido, pois só no amor encontramos o sentido da vida. A busca dos
viventes e de Cristo vivo exige companhia compartilhada (comer o mesmo pão =
companheiro), caminho empreendido, mãos cheias de caridade e esperança ativa.
2. O Ressuscitado Nos
Abre O Futuro Escatológico
A liturgia da Vigília
Pascal nos oferece também uma visão global do passo e do itinerário da Criação
até a Nova Criação. Cristo é o primeiro fruto da Nova Criação, porque Sua vida
culmina com a Ressurreição e glorificação pelo Pai. A Vigília Pascal nos
apresenta, então, umas perspectivas da História da Salvação desde a criação do
mundo até sua plenitude. Com a Encarnação e a Ressurreição de Jesus Cristo o
mundo sofre uma revolução, mas, por sua vez, a partir dessa revolução, o mundo
é capacitado a participar da plenitude e soberania de Jesus Cristo com uma nova
e melhor forma de existência. A Ressurreição de Jesus dá vida ao mundo. O
escândalo da cruz resulta em fonte de vida. Com a Ressurreição de Jesus se abre
o futuro escatológico, isto é, a plenitude e perfeição de paz, de bem, de amor,
de vida, de justiça que serão o Reino de Deus já realizado. Mas através da
vivência destes valores neste mundo começamos já a viver o Reino de Deus como
início e em crescimento e que chegará um dia ao término definitivo e perfeito.
Em outras palavras, a partir da Ressurreição de Jesus a vida humana tem futuro e
por isso tem sentido. Se a vida humana tem seu fim (sentido), todos os nossos
comportamentos ou o nosso modo de viver têm um peso para este fim. Consequentemente,
jamais brinquemos com os nossos comportamentos ou com o nosso modo de viver.
Podemos ganhar o céu dentro de um minuto (cf. Lc 23,42-43), como podemos
perdê-lo dentro de um minuto.
3. A Partir Da Ressurreição Somos Convocados A Ser Uma Novidade E
Uma Nova Presença No Mundo
Por Jesus Ressuscitado ser o primeiro fruto
da Nova Criação pela sua ressurreição, somos chamados a acreditar n’Ele. A fé
em Jesus Cristo Ressuscitado nos configura em um povo convocado por Deus para
fazer presente no mundo uma novidade de vida, pois somos um povo com um futuro
certo. Quando há uma caridade discreta, forte e generosa sem medida, quando há
um respeito sagrado por cada pessoa como a imagem de Deus neste mundo, quando
há um trabalho perseverante por uma sociedade mais justa onde há umas relações
de sinceridade e confiança que geram a paz, quando há uma atenção preferencial
para os necessitados, quando há uma esperança certa de vida diante dos sinais
de dor e de morte, aí há uma Vida Nova. Aí há Alguém. É a presença do
Ressuscitado: “Nisto reconhecerão todos
que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13,35).
Não se busca entre os mortos Aquele que está vivo. Assim como Cristo é uma
ausência quando adoramos aos ídolos, assim também Cristo é uma presença quando
no próximo mais necessitado descobrimos o Senhor. Precisamos estar conscientes
sempre de que Cristo crucificado ressuscitou e está vivo e vive entre nós (cf.
Mt 28,20; 18,20; 25,39. 45).
Reflitamos as palavras de Madre Teresa de
Calcutá: “A Obra é nossa única maneira de
exprimir a Deus nosso amor. É preciso que nosso amor se derrame em alguém. E as
pessoas nos ensejam exprimir o nosso amor a Deus. Só no céu saberemos que
dívida temos para com os pobres, pois por causa deles pudemos prestar a Deus um
maior amor. Cristo não nos perguntará quantas coisas houvermos feito, mas
quanto amor houvermos posto em nossos atos”.
Precisamos nos conformar com a vida de Cristo
para que como ele e com ele também nós ressuscitaremos. Jesus Cristo
ressuscitou em mim quando meu coração de pedra se transforma em coração cheio
de amor e de compreensão. Jesus Cristo ressuscitou em mim quando eu sou capaz
de perdoar. Jesus Cristo ressuscitou em mim quando ninguém nem nada podem tirar
de mim a alegria por ter encontrado o sentido da vida em Jesus Ressuscitado que
abre para mim o futuro de Deus. Jesus Cristo ressuscitou em mim quando encaro a
violência e todo tipo de agressão com a paz e o diálogo. Jesus Cristo
ressuscitou em mim quando sinto grande amor a todos os irmãos independentemente
de sua crença e ideologia. Jesus Cristo ressuscitou em mim quando vejo no pobre
necessitado o rosto do meu Senhor, como dizia Madre Teresa de Calcutá: “Por não podermos ver a Cristo, não podemos
exprimir-lhe o nosso amor; mas o nosso próximo, nós o vemos e podemos fazer por
ele aquilo que gostaríamos de fazer por Cristo, se fosse visível”.
Por tudo isso, é bom
verificarmos nosso modo de viver para saber se realmente Cristo ressuscitou ou
não na nossa vida. Jesus Cristo ressuscitou em mim, na minha família, no meu
trabalho?
OUTRAS IMPLICAÇÕES DA FÉ NA RESSURREIÇÃO
a).
A Páscoa cristã é a festa das festas, e o cristão é aquele que afirma: o Senhor
ressuscitou verdadeiramente. O cristianismo nasce e progride desta proclamação
fundamental: Jesus Cristo, que foi crucificado, ressuscitou verdadeiramente. Da
ressurreição de Cristo deriva todo o resto da mensagem cristã. Sem a vitória de
Cristo sobre a morte, toda a pregação seria inútil e a nossa fé seria vazia de
conteúdo (cf. 1Cor 15,14-17). A ressurreição do Senhor é uma realidade central
da fé cristã. A importância deste milagre é tão grande que os Apóstolos são,
antes de mais nada, testemunhas da ressurreição de Jesus (cf. At
1,22;2,32;3,15). O núcleo de toda a pregação é este: Cristo vive e vive no meio
de nós (cf. Jo 1,14; Mt 28,20). A páscoa da ressurreição é a grande festa
cristã. Este mistério é tão importante e central é que o celebramos ao longo de
todos os domingos e festas do ano litúrgico e inclusivamente na Eucaristia
diária. Certamente cada eucaristia que se celebra, celebra-se e proclama-se ao
mesmo tempo a ressurreição do Senhor e a nossa também. A eucaristia dominical é
a páscoa semanal. A eucaristia diária é a páscoa diária.
Sem dúvida nenhuma, a Páscoa é, por isso, o
próprio conteúdo da fé cristã, é o coração da vida da Igreja porque ela nos
revela quem é Deus, quem é Jesus Cristo e quem somos nós. A ressurreição nos
mostra que o Deus revelado por Cristo é Aquele que ama e quer a vida. A Páscoa
nos revela que Jesus, morto e ressuscitado, é Aquele que converge toda a história
da humanidade. E ao mesmo tempo revela que a fidelidade é o caminho certo para
chegar à Páscoa eterna com Deus. A Páscoa também nos revela que somos chamados
a ressuscitar com Jesus, a superar com ele o drama da morte para podermos
permanecer com ele na vida que não tem fim.
b).
Pela ressurreição do Senhor sabemos que
Deus ama a vida. A Páscoa é a gloriosa manifestação de um Deus que ama a vida,
que quer a vida e não a morte, de um Deus que, além disso, faz com que da morte
surja a vida.
Crer na ressurreição implica, por isso,
defender a vida, especialmente a dos mais indefesos; implica respeitar a vida
alheia como a própria; implica lutar pelo que é certo e justo, pois estes
predicados como outros semelhantes é que garantem a vida sem fim; implica
estender a mão para levantar quem se encontra sob o peso dos problemas desta
vida. Procurar o Senhor ressuscitado implica comprometer-se com aqueles que veem
o seu direito à vida permanentemente violentado e violado. Acreditar na ressurreição
significa afirmar a vida contra a morte.
c).
A ressurreição é o grito festivo da fé. Com a ressurreição, o grito de Jesus na
Sexta-feira Santa “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?”(Mc 15,34),
grito que sintetiza todas as situações de aflição da humanidade se transforma,
na noite de Sábado Santo, em grito festivo de fé e de esperança: Cristo
ressuscitou. É um grito de fé porque anuncia algo que aconteceu em Cristo e
permanece para sempre. É o grito de esperança porque a partir de Jesus Cristo
ressuscitado a vida humana tem um futuro e que ninguém pode tirá-lo de nós, e
que seremos ressuscitados também. A certeza deste grito de alegria e de
esperança nos proclama que a bondade soterra a maldade, que a morte já tem o
seu contrapeso de vida, que toda crise pode ser suplantada, que com Cristo toda
tristeza conhecerá a alegria.
Infelizmente temos que confessar que a nossa
existência humana é muitas vezes dominada por uma tendência de diminuir as
esperanças, reduzindo-as cada dia mais por causa das ilusões, e a nossa
tristeza nos leva, com freqüência, a recusarmos palavras de conforto, porque
nós não temos idéia exata da libertação que nos foi concedida por Jesus
ressuscitado. Precisamos estar conscientes de que a Páscoa é uma recriação, é
uma nova criação da humanidade, pois Jesus, pela sua ressurreição, inaugurou um
mundo novo no meio de nós.
d).
A ressurreição de Cristo é uma resposta às esperanças de um destino humano
aberto para o futuro novo. Quando este futuro novo for negado, a pessoa se
fecha a si mesma, fica insatisfeita e chega às margens do desespero. A
ressurreição nos leva a certeza de que a vida jamais acabará e de que o triunfo
da vida não é mais ameaçado pela morte. O Ressuscitado está conosco, e continua
vivo dentro da história e junto com ele nós estamos em condições de vencer o
mal com o bem, de tirar do mal o maior dos bens. Esta é força e a novidade da
Páscoa. Quem crê na ressurreição não é permitido viver triste. Somos destinados
e chamados a viver plenamente com Deus, alegres na esperança com os irmãos da
mesma peregrinação.
e).
A ressurreição de Jesus provou que a morte não é uma fatalidade, que não é ela
quem diz a última palavra sobre o homem. Ela nos mostrou que, se permanecermos
em Deus, se formos fiéis ao seu amor até o fim, também nós venceremos a morte e
permaneceremos na vida e no amor. A ressurreição de Jesus Cristo nos revelou
que o sentido último de nossas vidas é a comunhão com Deus e com os homens que
Deus ama. A ressurreição nos revelou que uma vida de entrega e de serviço a
Deus e aos homens é uma vida ressuscitada.
f).
Da ressurreição de Jesus nasce, antes de mais nada, uma esperança. Cristo é
nossa esperança (1Tm 1,1). Nessa esperança nós, cristãos, aprendemos a
acreditar em Deus e a desentranhar o sentido último do homem. Mas a esperança
de que se trata não é virtude de um instante ou reação de um momento. É uma
atitude permanente, um estilo de vida. É a forma de enfrentar a própria vida do
cristão. Se perder essa esperança, perde tudo. Deixaria de ser cristão sem a
esperança. Aquele que vive animado pela esperança cristã põe seu olhar no
futuro, isto é, em Deus. Ele não fica apenas com o presente, nem vive preso no
passado, mas olha sempre para frente. A esperança sempre gera uma perspectiva
de futuro. E esta esperança dá origem a uma nova maneira de se posicionar na
vida apesar das dificuldades, como diz São Paulo: “Somos atribulados por todos os lados, mas não esmagados; postos em
extrema dificuldade, mas não vencidos pelos impasses; perseguidos, mas não
abandonados; prostrados por terra, mas não aniquilados” (2Cor 4,8-9). A
esperança vive da confiança em Deus, como o profeta Isaías diz: “É Deus quem dá forças ao cansado, quem
prodigaliza vigor ao enfraquecido. Mesmo os jovens se cansam e se fatigam; até
os moços vivem a tropeçar, mas os que põem a sua esperança em Deus renovam as
suas forças, abrem asas como as águias, correm e não se fatigam, caminhar e não
se cansam” (Is 40,29-31). Que cada um de nós seja um pequeno sinal, uma
pequena prova desse Deus da esperança!
P. Vitus Gustama,svd
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