terça-feira, 31 de agosto de 2021

Sábado Da XXII Semana Comum,04/09/2021

VIVER CONFORME O ESPIRITO DE DEUS É VIVER EM FUNÇÃO DO BEM DO HOMEM

Sábado da XXII Semana Comum

Primeira Leitura: Cl 1,21-23

Irmãos, 21 e vós, que outrora éreis estrangeiros e inimigos pelas manifestas más obras, 22 eis que agora Cristo vos reconciliou pela morte que sofreu no seu corpo mortal, para vos apresentar como santos, imaculados, irrepreensíveis diante de si. 23 Mas é necessário que permaneçais inabaláveis e firmes na fé, sem vos afastardes da esperança que vos dá o evangelho, que ouvistes, que foi anunciado a toda criatura debaixo do céu e do qual eu, Paulo, me tornei ministro.

Evangelho: Lc 6,1-5

1 Num sábado, Jesus estava passando através de plantações de trigo. Seus discípulos arrancavam e comiam as espigas, debulhando-as com as mãos. 2 Então alguns fariseus disseram: 'Por que fazeis o que não é permitido em dia de sábado?' 3 Jesus respondeu-lhes: 'Acaso vós não lestes o que Davi e seus companheiros fizeram, quando estavam sentindo fome? 4 Davi entrou na casa de Deus, pegou dos pães oferecidos a Deus e os comeu, e ainda por cima os deu a seus companheiros. No entanto, só os sacerdotes podem comer desses pães.' 5 E Jesus acrescentou: 'O Filho do Homem é senhor também do sábado.'

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A Salvação É Para Todos Os Que Acreditam Em Jesus Ressuscitado

Do Hino Cristológico que lemos no dia anterior (Cl 1,15-20), agora, através da Primeira Leitura de hoje, são Paulo tira consequências para a comunidade. Antes de ter fé em Cristo, os Colossenses eram “estrangeiros e inimigos pelas manifestas más obras”, mas graças a esse Cristo que morreu na Cruz por todos todos eles foram reconciliados com Deus. Por causa desta reconciliação agora ele são “santos, imaculados, irrepreensíveis” diante de Deus. 

Vós, que outrora éreis estrangeiros e inimigos pelas manifestas más obras, eis que agora Cristo vos reconciliou pela morte que sofreu no seu corpo mortal, para vos apresentar como santos, imaculados, irrepreensíveis diante de si, escreveu São Paulo aos colossenses. Através destas frases São Paulo quer conscientizar os colossenses que eles não estão excluídos da ampla obra de reconciliação de Jesus Cristo. “Antes”, quando não tinham sido batizados, não somente viviam com angústia e temor de um destino inescrutável (insondável) e sim, de fato, eram “estrangeiros” (pagãos) para o verdadeiro Deus, pois consideravam Deus como seu inimigo. As más obras dos Colossenses criaram neles uma má consciência e pensavam que tinham que se esforçar para ter a benevolência do ser divino através das diversas práticas pagãs de índole mágica e supersticiosa.

Em que consiste este ser “estrangeiro” ou “estranho” para os colossenses? São “estranhos” para eles mesmos porque as obras praticadas eram más: “Vós, que outrora éreis estrangeiros e inimigos pelas manifestas más obras...”. O homem é chamado a crescer no bem e a fazer crescer os outros para o bem. O resto vale a pena a ser abandonado pelo homem, pois sem sentido nenhum. São “estranhos” para os demais homens na impossibilidade de não considerá-los como próximos e sim como rivais ou inimigos a ser eliminados do caminho; na impossibilidade de estabelecer com eles solidariedades reais. Também são “estranhos” para Deus na impossibilidade de não percebê-Lo como um Dono todo-poderoso que vigia implacavelmente pela boa ordem do mundo. 

Consequentemente, é preciso reconciliar-se consigo próprio que possibilita de ter um futuro melhor em Deus. Trata-se de uma descoberta de que eu pertenço a Deus. É preciso reconciliar-se com os demais, pois o Senhor revelou que todos são irmãos e irmãs gerados pela mesma e única ternura e membros de um só Corpo cuja cabeça é o próprio Cristo. Trata-se de uma revelação da fraternidade universal. É preciso reconciliar-se com Deus na possibilidade oferecida de corresponder à Sua vontade diante de um abandono em sua misericórdia e na certeza de ser amado incondicionalmente. Trata-se de uma descoberta de um Deus que ama com o amor misericordioso. Em Cristo somos capazes de tudo isso.

Em outras palavras, “Agora” a situação mudou, porque os Colossenses ouviram o Evangelho de sua libertação por meio de Jesus Cristo (Cl 1,6) que morreu por eles e agora estão reconciliados com Deus em Jesus Cristo. O Evangelho do Senhor tem o poder de libertar as pessoas a partir do momento em que for aceito e colocado na prática. A reconciliação por meio de Jesus Cristo não é somente uma boa nova (Evangelho), mas também tem um fim moral: a santificação dos homens para que Cristo possa conduzi-los diante do trono do divino juiz como os que foram santificados por sua ação. O Evangelho é sempre um chamamento à realização e à confirmação moral e ética a fim de que todos vivam e convivam como irmãos e irmãs, pois Deus é o Pai-Nosso, o Pai da humanidade. a partir de agora em diante os Colossenses são exigidos a permanecer firmes na FÉ, na adesão e na entrega à pessoa de Cristo, e na ESPERANÇA que o Evangelho lhes oferece, pois fé e esperança são dois pilares firmes para a vida cristã. Junto  a fé e esperança é mencionada a CARIDADE em Cl 1,4.8. 

Todos nós somos chamados hoje e agora para permanecer como homens “santos, imaculados, irrepreensíveis” diante de Deus. Para isso é preciso praticarmos permanentemente a fé, a caridade e a esperança. 

O Amor Fraterno É o Cumprimento Da Vontade De Deus

O Filho do Homem é senhor também do sábado 

A controvérsia entre Jesus e os fariseus continua. No evangelho anterior era sobre o jejum. Hoje é sobre o Sábado. Guardar o sábado para um judeu era algo importantíssimo; estava entre os principais mandamentos. Transgredir o sábado podia levar o acusado à condenação de acordo com a gravidade do ato. A punição prevista chegava à pena de morte (cf. Ex 31,12-17; 35,1-3). 

E tirar espigas (com foice) era uma das trinta e nove formas de violar o sábado, segundo as interpretações exageradas que algumas escolas dos fariseus faziam da lei na época. Por isso, se escandalizam quando percebem que os discípulos de Jesus arrancam as espigas para matar a fome no dia de sábado. Na verdade Dt 23,25 determina: “Quando entrares na seara de trigo do teu próximo, poderás colher espigas com a mão, mas não usarás a foice”. Era permitido, então, colher espigas com a mão. Só não era permitido passar a foice.

Os fariseus ficam presos com suas próprias ideias e usam os textos da Sagrada Escritura em função de suas ideias. Ler e meditar a Palavra de Deus é para descobrir a vontade de Deus. Precisamos rezar, a exemplo de Samuel, quando lemos e meditamos a Palavra de Deus: “Fale, Senhor; vosso servo escuta!” (1Sm 3,10). A Bíblia é inspirada por Deus e por isso, precisamos pedir ao Espírito Santo que nos inspire na hora de ler e de meditá-la. Em outras palavras, quando lermos e meditarmos a Palavra de Deus temos que ter uma mente aberta e um coração necessitado da graça de Deus. 

Jesus veio ao mundo para salvar a humanidade por amor (cf. Jo 3,16). Por isso, Jesus aplica um princípio fundamental para todas as leis, em função dos homens: “O Sábado foi feito para o homem e não o homem para o Sábado”. O homem está sempre no centro da doutrina de Jesus. Sua preocupação é fazer o bem para o homem, mesmo no dia de Sábado, mesmo transgredindo a lei religiosa. A lei do Sábado foi dada precisamente a favor da liberdade, do bem e da alegria do homem (Dt 5,12-15). 

Para Jesus, o espírito da lei deve estar sempre ao serviço de Deus para glorificá-Lo, e ao serviço do ser humano para dignificá-lo e para salvá-lo. A glória de Deus é a vida e a felicidade de seus filhos, os seres humanos. Para Jesus, as leis, ainda que pareçam ser sagradas, não podem estar por cima da vida, das necessidades vitais, da felicidade, da plena realização dos seres humanos. Por isso Jesus tem coragem de afirmar: “O Sábado foi feito para o homem e não o homem para o Sábado”. A lei civil é necessária desde  que proteja o ser humano. A lei (civil) é uma afirmação dupla: a existência dos maus e a dos bons. Para que os bons sejam protegidos é necessário ter lei. Se todos fossem bom, se todos tivessem capacidade de amar, a existência da lei não teria sentido. “Ama e faze o que quiseres. Por esse caminho não existe outro”, dizia Santo Agostinho. 

A lei é boa e necessária. A lei é, na verdade, o caminho para levar à prática o amor. Somente o mandamento do amor rompe fronteiras, divisões, prejuízos e escravidões (Jo 13,34-35; 15,12). Por isso mesmo a lei não pode ser absolutizada. O Sábado, (para nós o domingo), está pensado para o bem do homem. É um dia em que nos encontramos com Deus, com a comunidade, com os irmãos, com a natureza e com nós mesmos. O descanso é um gesto profético que nos faz bem a todos para fugir ou escapar da escravidão do trabalho ou da carreira consumista. O dia do Senhor é também dia do homem, com a Eucaristia como momento privilegiado. 

“O sagrado do sábado”, comenta o rabino Nilton Bonder, “não é o descanso em si, mas o ritmo mágico do trabalho ao descanso e ao trabalho novamente. É essa entrada e saída que é sagrada. (...) Sem as pausas há apenas ilusão; sem os silêncios há apenas ilusão da música; sem a luz-transparência há apenas ilusão da cor” (Código Penal Celeste). 

“Por que fazeis o que não é permitido em dia de sábado?”, perguntaram alguns fariseus a Jesus. O homem sempre tem uma tendência fastidiosa em dar uma importância aos meios, esquecendo-se muitas vezes do fim. Na minha fé, nos costumes religiosos, nos ritos há de ver primeiro sua finalidade, seu objetivo profundo, e os modos de expressão podem mudar. O legalismo religioso pode matar o espírito cristão. Toda comunidade em que os interesses particulares, as desigualdades, o monopólio têm espaço, deixa de ser campo para o triunfo do Espírito Santo. Jesus nos pede que acima de tudo deve ficar a misericórdia, o amor: “A caridade é a plenitude da Lei” (Rm 13,10b). Nascemos do Amor criador e devemos levar essa marca divina para toda a nossa vida. Somos filhos de Deus em Jesus Cristo e não estranhos, e, portanto, devemos atuar e viver como tais. Somos membros do Corpo de Cristo unidos pela fé, amor e esperança. Somos chamados a viver em comunhão da fé, amor, esperança, vida e solidariedade. Temos que nos salvar juntos. Todos nós temos que chegar juntos à casa do Pai (cf. Jo 14,1-6). Mas diante da responsabilidade não podemos pretender que os outros realizem a parte que a cada um corresponde. Cada um é insubstituível na sua responsabilidade.

Jesus nos convida, então, a fazer da Palavra de Deus um instrumento de libertação. Sua Palavra é a constituição para os cristãos, o novo povo de pessoas livres. 

Precisamos nos perguntar: “Não somos, às vezes, demasiados legalistas? Não julgamos nossos irmãos quando cremos que eles não cumprem as leis ou as regras, sejam as leis humanas, as leis da Igreja ou as leis consideradas como divinas? Se para Jesus o homem está sempre no centro de seu ensinamento, será que colocamos o ser humano como centro de nossas atividades?”. A denúncia da escravidão ao sábado nos convida a nos libertarmos da religião da observância formal e segui-la pelos caminhos do amor libertador. Quando as coisas materiais ou rituais mandam, e não a lei do amor, o homem se faz escravo. 

“O Filho do Homem é senhor também do sábado”. Deus entrou na história do homem fazendo-se palavra de homem. Com sua encarnação, a vida dos homens se torna o único lugar onde Deus fala. Praticamente, Jesus é acusado como “ateu”, pois não respeita o Sábado. Através de sua encarnação, Deus não levanta uma barreira entre o mundo da terra e o mundo de Deus. Deus santifica a condição mundana do homem. 

Por que fazeis o que não é permitido em dia de sábado?”, perguntaram os fariseus. O homem tem uma tendência de dar uma importância desmedida aos “meios”, esquecendo-se, muitas vezes, do “fim”. O homem, frequentemente, dedica seu tempo para discutir coisas secundárias, e não sobra tempo para tratar dos essências da vida. Disto aprendemos que em nossa fé, em nossos costumes religiosos, nos ritos, temos que ver primeiro sua finalidade, seu objetivo profundo e pensar que os meios de expressão podem mudar.

P. Vitus Gustama,svd

Sexta-feira Da XXII Semana Comum, 03/09/2021

SER SERVIDOR DE CRISTO E PRÁTICA DO O JEJUM QUE MUDAM NOSSA MENTALIDADE

Sexta-Feira da XXII Semana Comum

Primeira Leitura: Cl 1,15-20

15 Cristo Jesus é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, 16 pois por causa dele foram criadas todas as coisas no céu e na terra, as visíveis e as invisíveis, tronos e dominações, soberanias e poderes. Tudo foi criado por meio dele e para ele. 17 Ele existe antes de todas as coisas e todas têm nele a sua consistência. 18 Ele é a Cabeça do corpo, isto é, da Igreja. Ele é o princípio, o Primogênito dentre os mortos; de sorte que em tudo ele tem a primazia, 19 porque Deus quis habitar nele com toda a sua plenitude e 20 por ele reconciliar consigo todos os seres, os que estão na terra e no céu, realizando a paz pelo sangue da sua cruz.

Evangelho: Lc 5,33-39

Naquele tempo, 33 os fariseus e os mestres da Lei disseram a Jesus: “Os discípulos de João, e também os discípulos dos fariseus, jejuam com frequência e fazem orações. Mas os teus discípulos comem e bebem”. 34 Jesus, porém, lhes disse: “Os convidados de um casamento podem fazer jejum enquanto o noivo está com eles? 35 Dias virão em que o noivo será tirado do meio deles. Então, naqueles dias, eles jejuarão”. 36 Jesus contou-lhes ainda uma parábola: “Ninguém tira retalho de roupa nova para fazer remendo em roupa velha; senão vai rasgar a roupa nova, e o retalho novo não combinará com a roupa velha. 37 Ninguém põe vinho novo em odres velhos; porque, senão, o vinho novo arrebenta os odres velhos e se derrama; e os odres se perdem. 38 Vinho novo deve ser posto em odres novos. 39 E ninguém, depois de beber vinho velho, deseja vinho novo; porque diz: o velho é melhor”.

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Cristo Está Acima De Tudo e De Todos Em Quem Devemos Acreditar 

Para entender o conteúdo da Primeira Leitura de hoje que fala do Hino ao Cristo (Cl 1,15-20), é preciso voltar a ler o comentário da Primeira Leitura da Quarta-feira passada (Cl 1,1-8), especialmente sobre algumas crises na comunidade de Colosso, e, de modo específico sobre  a devoção excessiva aos anjos com o perigo de ocupar a primazia e supremacia de Cristo no universo criado. 

O texto da Primeira Leitura (Cl 1,15-20) é chamado Hino Cristológico de Colossenses. Este texto quer responder à pergunta: Quem é Cristo nesta Carta (ou especificamente, neste Hino)? Este texto quer completar o conhecimento que os Colossenses já têm, com um olhar mais profundo sobre quem é Cristo no plano de Deus.

este texto é um verdadeiro hino a Jesus Cristo, imagem do Deus invisível, gerado antes de toda a criação, por quem e para quem tudo foi criado. Ele é a cabeça do corpo, que é a Igreja, e o primogênito dentre os mortos. Nada escapa à sua plenitude: não existem poderes angélicos ou práticas mágicas que exerçam qualquer domínio sobre nós, e que fomos reconciliados pelo sangue da sua cruz. Jesus Cristo é o único Senhor da vida e da morte (Glória e Credo da Missa). 

Este Hino é composto por duas seções: vv 15-17 e vv. 18-20.

No vs. 15-17 trata da criação a partir da perspectiva cristológica. Geralmente é atribuído ao Pai, mas aqui o papel de Cristo é destacado. Por um lado, é a imagem perfeita do próprio Pai; de outro, um modelo de toda a criação. É a tradução paulina do texto do Gênesis.  Pode-se dizer com justiça, dentro deste texto, que o homem foi criado à imagem e semelhança de Cristo. Esse aspecto é muito importante. Porque a imagem e semelhança de Deus, simplesmente assim, podem ser interpretadas de maneiras muito diferentes, uma vez que não podemos conhecer a Deus diretamente. Mas neste texto, Deus é refletido e revelado em Cristo, imagem visível do Deus invisível: “Cristo Jesus é a imagem do Deus invisível...” (Cl 1,15). E a partir dessa imagem de Deus podemos entender melhor o que somos e o que devemos ser. Daí a importância de Cristo para compreender Deus e compreender a nós mesmos. Essa é também a importância antropológica de Cristo como nosso modelo. 

A segunda estrofe (v. 18-20) trata da redenção, expressa sobretudo com a imagem da reconciliação. Essa forma de falar leva em consideração a realidade do pecado no mundo e no homem. o homem deixou de viver como imagem de Deus em Cristo. consequentemente, o homem não é mais uma criação imaculada. Por se tornar maculado pelo pecado, o homem precisa recuperar sua novidade original. Na verdade, nós, homens, não vivemos o plano de criação de Deus. vinda de Cristo é para recriar para que o homem volte à sua imagem imaculada como Deus sempre quis, através da redenção. Cristo nos reconcilia com Deus. 

Se tudo foi criado através de Cristo e se Cristo salvou o homem pecador a fim de voltar para sua imagem original (que o homem era muito bom, segundo Gênesis), logo Cristo está acima de tudo e de todos. Os anjos não estão acima de Cristo, como pensavam e entendiam os Colossenses. Em outras palavras, Cristo é o centro do Cosmos e da Igreja, o Primeiro na criação e na salvação. E com esta resposta tudo fica bem claro para os Colossenses que Cristo está acima de todos os anjos.

Neste Hino, então, Cristo é:

·      Imagem do Deus invisível.

·      Primogênito de toda a criação, porque tudo foi criado “por meio dele, “por ele e para ele”.

·      Anterior a tudo ("pré-existente") e tudo se manifesta nele: existe antes que nada e tudo consiste por ele.

·      Cabeça da Igreja.

·      O primogênito dos ressuscitados, primeiro em tudo.

·      Em Cristo reside toda plenitude, segundo a vontade de Deus.

·      E nele tudo ficou reconciliado com Deus, pelo sangue de sua Cruz.

Portanto, a perspectiva deste Hino é dupla. Cristo, o Senhor ressuscitado se converte em Chefe (Cabeça) dos fieis que querem segui-Lo participando na vida da Igreja (Cristo é Cabeça da Igreja). Mas sua ressurreição O estabelece e O confirma em uma preeminência absoluta sobre a criação natural e sobre os anjos, e este direito de preeminência lhe vem não somente de que Ele é o Criador (através d´Ele tudo foi criado), mas também, e sobretudo, de que Ele é o Senhor da criação, por sua ressurreição.

Em outras palavras, Cristo é Criador, porém não se pode considerar esta característica de Cristo isolada de outra característica: a de Redentor. Ele é Quem cria, e é Ele quem repara a criação e a faz melhor como foi criada. Cristo é imagem do Deus invisível, Sacramento do encontro com Deus. É o primeiro na ordem das criaturas, em sua condição de Homem-Deus. Tudo foi criado por Cristo, n´Ele e para Ele. 

Consequentemente, segundo a cosmogonia de são Paulo, as potências e as dominações angélicas tinham usurpado um poder sobre esta criação que a ressurreição volta a dar a seu primitivo Dono: Jesus Cristo. Não há nada no mundo criado que seja alheio a Jesus Cristo, pois tudo foi criado através d´Ele, e não há nada que possa dominar Jesus Cristo que está acima de tudo e de todos. Tudo está sob o domínio de Jesus Cristo. Crer verdadeiramente em Jesus é acreditar que Ele é o Senhor de tudo e de todos. com Ele não podemos mais ter medo de qualquer outro poder neste mundo. Para que tudo isto se torne realidade, temos que manter unidos a Cristo como Cabeça da Igreja. Fazemos parte inseparável do Corpo Místico de Cristo que é a Igreja. Tudo tem que ser feito na Igreja conforme aquilo que a Cabeça (Jesus Cristo) quer, pois se não, viraremos ramos secos que serão queimados no fogo (Cf. Jo 15,1-5). 

em todos os momentos de nossa vida somos chamados para a plenitude em Cristo. Se o pecado tira de nós a imagem de Deus, a volta para Cristo significa recuperar a imagem de Cristo em nós. deste modo, Cristo não cessa de nos recriar. O mundo tem que perceber em cada um de nós que somos imagem de Cristo que é nossa Cabeça. Se Cristo não é visto no mundo, é porque não é mais visto em cada cristão. 

O Sentido Do Jejum Para a Vida De Um Cristão 

Pela terceira vez em Lc 5 Jesus entra em controvérsias com os fariseus (cf. Lc 5,12-16; 5,27-32; 5,33-39). O tema da controvérsia desta vez é o do jejum que lemos no Evangelho de hoje. 

O jejum é algo antigo escrito na Lei de Moisés (Lv 23,26-32; Nm 29,7-11). O jejum era praticado dentro do contexto de expectativa ou de preparação. Os fariseus e os discípulos de João Batista necessitavam fazer jejuns, pois estavam no tempo de espera. Os discípulos de Jesus não precisam fazer o jejum, nesta perspectiva, pois o Messias esperado está com eles: Jesus Cristo. Nesse sentido perdeu a razão de fazer o jejum.

Em qualquer controvérsia, Jesus sempre se apresenta como um independente diante das regras e das observâncias legais conforme as tradições. A independência de Jesus choca os que estão apegados ao pé da letra todas as leis. Jesus entra no espírito da lei, naquilo que possa edificar o ser humano, pois a pessoa humana é o foco de todo trabalho de Jesus (cf. Jo 3,16; 10,10). Por isso, em outra ocasião ele diz: “O sábado existe para o homem e não o contrário”. 

O jejum sempre tem sentido de “privação” ou de “renúncia”. Jejuar consiste essencialmente em nos privar de alimento pelo sentido da palavra, mas em geral é referido a qualquer tipo de privação. Ao se controlar diante de um alimento ou da bebida, o homem é disciplinado para se controlar diante de outras provações ou desafios da vida. através do jejum o homem faz uma passagem significativa do autocontrole físico para o autocontrole psicológico, mental e espiritual. Pode-se também fazer uma passagem contrária: a força espiritual faz com que o homem seja capaz de se controlar diante do alimento ou bebida ou as demais coisas. O verdadeiro jejum sempre beneficia ao homem para seu bem (físico e espiritual simultaneamente: Mens sana in corpore sano- Mente sã em corpo são). 

A prática do jejum está ligada, no AT, à espera da vinda do Messias. A prática do jejum aceleraria a chegada do Messias. Os fariseus e os discípulos de João Batista praticam o jejum. Por isso, questionam o comportamento dos discípulos de Jesus que não o praticam. A resposta de Jesus aqui é bem clara: se seus discípulos não praticam o jejum é porque não tem nada que esperar porque o Messias já chegou e está com eles. Eles estão vivendo esta intimidade. Esta intimidade será rompida no momento da paixão e da morte de seu Mestre.

Estamos em outro contexto. Por isso, o jejum ganha seu novo significado. Quando soubermos dar ou preparar o espaço para Deus na nossa vida, este espaço não será ocupado por outra coisa. Ao darmos esse espaço para Deus o resto ganha seu justo valor e sua justa perspectiva. Por isso, ao praticarmos o jejum estamos manifestando nossa vontade de não deixar nenhuma coisa material dominar nossa vida ou mandar na nossa vida. Podemos possuir as coisas, mas as coisas jamais podem nos possuir para não perdermos nossa liberdade. Mesmo não querendo, um dia largaremos tudo. É preciso que aprendamos a ser livres todos os dias, desde já. Sou livre quando a graça pesa mais do que as regras e não o contrario. Sou livre quando o amor e a humanidade pesam mais do que a religião. Sou livre quando eu estou no coração de Deus de Amor (1Jo 4,8.16) para eu ser capaz de amar com total liberdade e amar para libertar o outro da escravidão de uma vida sem sentido apesar de tratar-se de uma crença. 

Tanto cristã como humanamente o jejum faz bem a todos. Fazer jejum significa saber renunciar a algo e dá-lo aos demais; é saber controlar nossas apetências; é saber nos defender com liberdade interior das contínuas urgências do mundo de consumismo. Jejuar é purificador. Jejuar não seria privar-se de tudo e sim usar moderação em tudo, isto é, ser sóbrios. Jejum supõe um grande domínio de si, de disciplina de olhos, de mente e da imaginação. A falta de sobriedade é uma das causas pelas quais se obscurecem e se debilitam as melhores iniciativas e decisões de um cristão. A sobriedade é certamente uma garantia da capacidade de orar e de apreciar o Espírito Santo. Com a renúncia às coisas Cristo nos chama à alegria, a uma alegria profunda, nascida da paz da alma. Fazer jejum é renunciar a algo para dá-lo aos necessitados. O jejum com uma dimensão de solidariedade nos tira do egoísmo, nos tira de uma vida vazia. Paradoxalmente a vida vazia é pesada para quem a tem. Sou livre quando a graça pesa mais do que as regras e não o contrario.

Por isso, o jejum cristão não consiste apenas em abster-se de alimentos. Consiste, sobretudo, em desejar o encontro com Jesus salvador e o encontro com irmão, especialmente com irmão carente do básico para viver e sobreviver como um ser humano. Jejuamos para nos tornarmos sensíveis à fome e à sede de tantos irmãos e para assumirmos a nossa responsabilidade na resolução dos problemas dos pobres, dos necessitados e dos carentes do essencial e básico.

O profeta Isaias descreve qual é o verdadeiro jejum que agrada a Deus (Is 58,6-9).  Deus não quer o jejum formalista que não tem em conta a vida do outro, e muito menos a justiça. Nada valem as ações que excluem o amor do próximo. O verdadeiro jejum, no pensamento do profeta, remete ao comportamento capaz de renunciar à ganância, à avareza para começar a ser generoso; capaz de renunciar ao tempo pessoal para ir ao encontro do necessitado (doente, prisioneiro, idoso etc.) para estar com ele a fim de aliviar uma parte de sua dor. O jejum verdadeiro consiste em quebrar todas as cadeias injustas, em repartir o pão com o faminto. Segundo o profeta Isaias, o culto deve estar unido à solidariedade com os necessitados. Caso contrário, não agrada a Deus e é estéril. As manifestações exteriores de conversão têm a sua prova real na caridade e na misericórdia para com os necessitados, com os pobres, com os carentes do essencial como um ser humano para viver. O verdadeiro jejum é um verdadeiro compromisso com os irmãos necessitados e empobrecidos ou injustamente são presos.

Por isso, pode-se dizer que o que importa no jejum não é somente a privação de alimento e sim a seriedade da fé nas tarefas da vida para que sejam a expressão mais viva do serviço de Deus e dos homens ao mesmo tempo. O jejum não se concebe sem caridade e sem uma mudança de vida para uma vida mais fraterna. O jejum que Deus quer é o cumprimento dos deveres morais e humanos com o próximo.  

Além disso, no evangelho de hoje Jesus faz uma declaração que tem o mesmo conteúdo: “Ninguém põe o vinho novo em odres velhos”. Aceitar Jesus em nossa vida comporta mudanças importantes. Não se trata somente de “saber” de quantas verdades a respeito de Jesus, mas trata-se de mudar nosso estilo de vida segundo o estilo de vida de Jesus. Significa viver com alegria interior. Significa também novidade radical. Jesus rompe moldes. É aquilo que São Paulo chama de “revestir-se de Cristo Jesus”. Quais são nossos “odres velhos” que não servem mais para “guardar” os tesouros de Deus? Quais são nossos “odres velhos” que precisamos abandonar? 

Uma mentalidade velha, caduca nunca nos aproximará do novo e do avançado. A mentalidade velha é sinônimo  de mediocridade, de estancamento e de pobreza. “A maior descoberta de uma geração é que os seres humanos podem mudar sua vida modificando suas atitudes mentais” (Albert Schweitzer). Precisamos abandonar uma mente de escravo porque ela é nostálgica, isto é, acredita que o passado foi melhor. Um homem com mentalidade de escravo é briguento, gozador, fanfarrão e vive criticando a tudo e a todos. Uma pessoa com uma mente de escravo se conforma com a mediocridade e não se permite aprender. A mente de escravo utiliza mecanismos de defesa que não nos permitem visualizar onde está a falha para saber em que devemos melhorar. Quem for capaz de fazer uma observação inteligente dos fatos, ele alcançará os melhores resultados. Quem tem mente de escravo usa a gentileza e a cortesia com os que estão acima (superiores), mas agride, maltrata e abusa emocionalmente dos que estão abaixo (inferiores).

Todos temos forças para mudar. Basta praticar a vontade de mudar. Dizia Victor Hugo: “A ninguém faltam forças; o que falta a muitos é vontade”. A vida é uma questão de decisão, e você se faz a cada decisão que toma. Decidir supõe sempre escolher, preferir e abandonar. “Quando um homem não sabe para onde navega, nenhum vento lhe é favorável” (Sêneca). 

Ninguém põe vinho novo em odres velhos; porque, senão, o vinho novo arrebenta os odres velhos e se derrama; e os odres se perdem “, disse-nos o Senhor hoje.

P.Vitus Gustama,svd

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Quinta-feira Da XXII Semana Comum, 02/09/2021

TRABALHAR COM O SENHOR PRODUZ FRUTOS ABUNDANTES

Quinta-Feira da XXII Semana Comum

Primeira Leitura: Cl 1,9-14

Irmãos: 9 Por isso, desde que tomamos conhecimento do fato, não paramos de rezar por vós, e de pedir que conheçais plenamente a sua vontade, em toda sabedoria e inteligência dadas pelo Espírito. 10 Assim andareis de maneira digna do Senhor, para lhe agradardes em tudo. Produzindo toda espécie de boas obras, crescereis no conhecimento de Deus. 11 Que o seu glorioso poder vos fortifique com pleno vigor, para suportardes todas as contrariedades com paciência e constância, cheios de alegria; 12 dai graças ao Pai, que vos tornou capazes de participar da maravilhosa sorte dos santos, na luz. 13 De fato, ele nos arrancou do poder das trevas, para nos transferir para o reino de seu Filho amado, 14 por quem temos a redenção, o perdão dos pecados. 

Evangelho: Lc 5,1-11

Naquele tempo, 1 Jesus estava na margem do lago de Ge­nesaré, e a multidão apertava-se a seu redor para ouvir a palavra de Deus. 2 Jesus viu duas barcas paradas na margem do lago. Os pescadores haviam desembarcado e lavavam as redes. 3 Subindo numa das barcas, que era de Simão, pediu que se afastasse um pouco da margem. Depois sentou-se e, da barca, ensinava as multidões. 4 Quando acabou de falar, disse a Simão: “Avança para águas mais profundas, e lançai vossas redes para a pesca”. 5 Simão respondeu: “Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos. Mas, em atenção à tua palavra, vou lançar as redes”. 6 Assim fizeram, e apanharam tamanha quantidade de peixes que as redes se rompiam. 7 Então fizeram sinal aos companheiros da outra barca, para que viessem ajudá-los. Eles vieram, e encheram as duas barcas, a ponto de quase afundarem. 8 Ao ver aquilo, Simão Pedro atirou-se aos pés de Jesus, dizendo: “Senhor, afasta-te de mim, porque sou um pecador!” 9 É que o espanto se apoderara de Simão e de todos os seus companheiros, por causa da pesca que acabavam de fazer. 10 Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram sócios de Simão, também ficaram espantados. Jesus, porém, disse a Simão: “Não tenhas medo! De hoje em diante tu serás pescador de homens”. 11 Então levaram as barcas para a margem, deixaram tudo e seguiram a Jesus.

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Os Líderes e Os Membros Da Comunidade Necessitam Estar Em Oração Permanentemente 

Desde que tomamos conhecimento do fato, não paramos de rezar por vós, e de pedir que conheçais plenamente a sua vontade, em toda sabedoria e inteligência dadas pelo Espírito. Assim andareis de maneira digna do Senhor, para lhe agradardes em tudo. Produzindo toda espécie de boas obras, crescereis no conhecimento de Deus. São as palavras de São Paulo aos colossenses no texto da Primeira Leitura de hoje. 

O texto da Primeira Leitura fala da oração de São Paulo aos colossenses para que os cristãos de Colossos tenham conhecimento perfeito dos caminhos de Deus. com este conhecimento, a comunidade de Colossos será capaz de distinguir a doutrina correta que Epafras pregou, dos desvios dos falsos doutores. E com este conhecimento a comunidade poderá levar uma vida cristã agradável a Deus. Mas o conhecimento dos caminhos de Deus não significa que os cristãos de Colossos estejam isentos de dificuldades. A vida cristã levada a sério sempre encontrará provas e dificuldades que exigem espirito de luta, paciência e fortaleza. 

Por isso, para que avance na escola do Evangelho de Jesus Cristo, a comunidade de Colossos necessita de orações, especialmente de seus pastores e responsáveis (coordenadores ou líderes). Um pastor que não reza pelo seu rebanho não é digno de ser pastor do rebanho. Um coordenador ou líder que não reza pela comunidade tende a impor sua vontade do que a vontade de Deus (torna-se ditador). São Paulo sabe da importância da oração pelas comunidades e assim assegura repetidas vezes às comunidades, que leem suas cartas, que suas orações apostólicas serão incessantes (Ef 1,16; Fl 1,3-5). Os dois verbos “rogar” e “pedir” mostram a intensidade das orações de São Paulo. São Paulo não quer cessar em suas orações pela comunidade. 

A oração exige uma relação em que nós permitimos ao Outro (Deus) entrar no centro de nossa pessoa e de nossas atividades, permitimos-lhe falar ali, permitimos-lhe tocar o núcleo sensitivo de nosso ser e permitimos-lhe ver tudo o que nós preferiríamos ocultar na escuridão. Mas será que nós em algum momento queremos realmente fazer isso?     

Ao homem convidado para rezar se pede que abra seus punhos fechados firmemente cerrados e dê sua última moeda. No início, a verdadeira oração é sempre dolorosa, porque nós descobrimos que não queremos nos desfazer de nada. Pois logo nos agarramos ao que nos é familiar, mesmo que não tenhamos motivos para isso, pois simplesmente por comodismo ou algum vício. Se nós não ousamos fazer ao menos uma pergunta a partir de nossa experiência com todos os nossos apegos, é porque já nos enrolamos no destino dos fatos. Nós nos sentimos mais seguros apegando-nos a um triste passado do que confiando em um novo futuro oferecido por Deus para nossa paz e salvação. Por isso, enchemos as mãos com pequenas moedas pegajosas das quais nunca quereremos nos desfazer, mas ficamos com o coração vazio que grita em silêncio por uma vida com sentido. 

Não paramos de rezar por vós, e de pedir que conheçais plenamente a sua vontade, em toda sabedoria e inteligência dadas pelo Espírito”, prossegue São Paulo. O apóstolo Paulo precede do judaísmo, pois antes foi um piedoso fariseu. Para o judaísmo o conhecimento religioso e a ação religiosa formam uma unidade. Como se fosse um sistema em que tudo funcionará quando cada elemento funcionar. No judaísmo o que se conhece (na lei) também deve ser realizado. Por isso, um judeu piedoso busca com fervor a vontade de Deus. São Paulo também se sente movido como cristão por esta questão e converte o desejo de conhecer a vontade de Deus num tema de sua oração pelas comunidades: ” ... que conheçais plenamente a sua vontade, em toda sabedoria e inteligência dadas pelo Espírito. Assim vos comportareis de um modo digno de Deus, para lhe agradardes em tudo. Produzindo toda espécie de boas obras, crescereis no conhecimento de Deus”. São Paulo deseja que as comunidades estejam plenas do conhecimento da vontade de Deus para que nelas também seja conseguida a unidade da teoria e da prática, pois isso é o sinal certa de um cristianismo autêntico e fidedigno. A fé cristã sem as obras boas seria para São Paulo algo absurdo (sem sentido), é algo contrário à vontade de Deus (cf. também Tg 2,17.24.26). 

Assim andareis de maneira digna do Senhor, para lhe agradardes em tudo”. Atrás do verbo “andar/caminhar” (comportar-se) está a ideia bíblica de que o homem está em caminho, que sua vida se assemelha a uma peregrinação que conduz à salvação ao à ruina. Por isso, São Paulo pede que toda a vida do cristão deva ser segundo a vontade do Senhor. O conceito de “caminhar” é caminhar “no Espírito” (Gl 5,16), “como filhos da luz” (Ef 5,8), “em obras boas” (Ef 2,10), “em uma vida nova” (Rm 6,4), “com sábia discrição” (Cl 4,5), “em amor” (Ef 5,2). 

Nos últimos versículos da Primeira Leitura lemos: “De fato, ele (Deus) nos arrancou do poder das trevas, para nos transferir para o reino de seu Filho amado, por quem temos a redenção, o perdão dos pecados” (Cl 1,13-14). Estas afirmações são densas de conteúdo teológico. O Pai nos livrou do poder das trevas e nos transladou ao reino do Filho de seu amor, em quem teremos a redenção. “As trevas” aqui designam a situação em que se encontrava a humanidade, também os colossenses, antes da vinda Cristo em que os homens estavam dominados ou submetidos aos espíritos do mal. Outra expressão que são Paulo usa aqui é o reino de seu Filho amado. Normalmente usa-se a expressão “Reino do Pai”. Ao usar a expressão “reino de seu Filho amado”, o autor quer enfatizar que o Reino do Pai pertence igualmente ao Filho (1Cor 15,24ss). Cristo com a redenção é que nos perdoou nossos pecados e nos translada para o reino da luz. Esta transladação é possível pela fé em Cristo. Por isso, os colossenses não necessitam do favor das potestades celestiais. 

Trabalhar Com o Senhor Sempre Rende Frutos Abundantes 

É narrada no evangelho de hoje a história da pesca milagrosa, ressaltando o papel de Jesus e o dos pescadores. Pedro que é especialista na pescaria se torna um pescador frustrado pelo insucesso da noite inteira, pois nada pescou. Por isso, quando Jesus lhe disse: “Avança para águas mais profundas e lança redes para a pesca” (v.4) veio aquela resposta de desconfiança da parte de Pedro: Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos” (v.5). “Deus precisou de apenas uma palavra para criar-nos, mas de seu sangue para redimir-nos. Se às vezes te sentes frustrado por tuas misérias, recorda quanto custaste”, dizia Santo Agostinho (Serm. 36,8).

Espelhando-nos em Pedro frustrado, podemos também citar muitas das nossas situações frustrantes de cada dia: cansei-me muito, gastei muita energia e tempo, empenhei-me a fundo, rezei muito e não aconteceu nada. É aquela sensação de derrotismo, de desânimo, de desespero. Dá vontade de desistir de tudo, de fugir, de abandonar tudo. Em outras palavras, quantas vezes experimentamos o cansaço, isto é, aquele estado de esgotamento físico ou emocional que se manifesta como um constante sentimento negativo cujos sintomas são sensação de incapacidade, raiva e aversão, sentimento de culpa, desânimo e indiferença, negativismo, isolamento e retraimento, constante sensação de cansaço e esgotamento.

Apesar dessa sensação negativa, o cansaço nos desafia a perguntarmos a nós mesmos: para onde, na verdade, caminha minha vida? Para onde meu cansaço vai me levar? O que espero da minha vida (de mim mesmo), dos outros e de Deus? Por acaso, tenho humildade de escutar os bons conselhos? Por acaso tenho tempo para escutar a Palavra de Deus mesmo que seja contrária ao bom senso? A partir dessas perguntas e outras perguntas relacionadas à questão, o cansaço nos leva a encontrarmos nosso verdadeiro ser e consequentemente, é também um momento transcendente de nossa vida.          

Experimentando a frustração e o cansaço físico e mental, Pedro põe em jogo a própria pessoa, a própria vida e o próprio futuro. Ele e seus companheiros haviam trabalhado durante a noite inteira sem conseguir apanhar um só peixe, e agora, em plena luz do dia, Jesus manda-lhes que lancem as redes para a pesca. Eles conhecem Jesus, mas apenas como Mestre: “Mestre nós trabalhamos...”. Apesar de todas as objeções que um profissional poderia levantar contra ela, a palavra de Jesus tem mais força para Simão do que sua longa experiência de pescador: “Avança para águas mais profundas e lança redes para a pesca”, ordenou Jesus. Pedro tenta superar a própria desconfiança: “Na tua palavra lançarei a rede”.

A palavra de Deus é poderosa, mas é preciso que seja posta em prática para que desenvolva sua força. E Pedro cumpre a palavra de Jesus imediatamente: “Na tua palavra lançarei a rede” (v.5). Notemos quanto há de profundo neste “na tua palavra” porque é a expressão que, na Bíblia, especialmente nos Salmos, designa a atitude do homem diante de Deus. “Confio na Tua Palavra, é Tua Palavra que me dá vida, Senhor; Tu me afligiste. Tu permitiste tantos sofrimentos na minha vida, mas na Tua Palavra confio”. Em outra ocasião, no discurso sobre o Pão da vida, Pedro dirá a Jesus: Senhor, a quem iremos? Tens palavras de vida eterna e nós cremos e reconhecemos que Tu és Santo de Deus(Jo 6,68-69). Certamente, na força da Palavra de Deus, os apóstolos encontram a vida ali onde tudo parecia morto; messe abundante onde tudo parecia vazio; abertura onde tudo parecia fechado. Quando for colocada em prática, a Palavra de Deus sempre dá fruto.          

Na tua palavra lançarei a rede”. Aqui Pedro sai dos cálculos e se atira, confiando na Palavra do Senhor. De fato, à fé, à obediência incondicional de Simão Pedro segue-se o milagre, a manifestação do poder da Palavra criadora de Deus. O poder da Palavra de Deus manifestada em Jesus domina toda esta cena. Toda força, todo poder vem de Deus. Nesta perspectiva devemos situar-nos para compreender o que segue. Mas antes disso, vamos tirar alguma lição.          

Jesus nunca permite o aborrecimento pelo insucesso no nosso trabalho. Não cabe a cada um de nós calcular o último resultado. Cada um deve trabalhar, empenhar-se todo, confiando unicamente na Palavra do Senhor. Empenhar-se significa dar tudo, experimentar tudo, estudar, corrigir, mudar e recomeçar. A eficácia de nossa ação está na obediência à Palavra de Deus. Se agirmos em nome próprio, nossos esforços serão estéreis. A Palavra de Deus é a semente que tem em si uma força criadora, uma potência enorme. Então, por que ainda duvidamos dela? Por que não levamos a sério a Palavra de Deus? Por que não a lemos e meditamos? Com Deus podemos pescar onde parece que não há peixe, podemos plantar justiça ou amor onde outros dizem que não adianta tentar; podemos levar fraternidade onde parece que a competição é a única lei que funciona.         

Vendo a pesca milagrosa, Pedro descobre a manifestação do poder de Deus em Jesus e se lança aos pés dele, dizendo: “Afasta-te de mim, Senhor, pois sou um pecador” (v.8). Ele não chama mais Jesus de “Mestre”, mas de “Senhor”. O poder de Jesus faz sobressair a pecaminosidade de Pedro: Pedro não estava entre os maiores pecadores, mas também ele era um homem que, colocado diante do poder, da santidade de Deus, sentia que muitas coisas de sua vida não funcionavam. Com clarividência instantânea, Pedro percebe a distância entre seu pecado e a santidade de Deus, entre sua pequenez e sua fragilidade e a grandeza e poder de Deus. Pedro sente com uma clareza insuportável que não há lugar para ele, pecador, na presença do Deus santo. Esta experiência da sua indignidade diante da manifestação de Deus é o que causa em Pedro e em seus companheiros o “tremendo espanto” de que nos fala o texto. A Palavra de Deus nos ensina a não temer, mesmo que tenhamos medo, e a temer mesmo quando não temos medo. Temamos, pois, para não temer”, dizia Santo Agostinho (Serm. 65, 1,1). 

Num fragmento de Votos Irlandês encontram-se as seguintes frases: “Deus está sobre mim para dar-me abrigo. Deus está diante de mim para indicar-me o caminho certo. Deus está junto de mim para proteger-me dos perigos à esquerda e à direita. Deus está à minha retaguarda para defender-me da malícia dos maus. Deus está sob mim para reerguer-me quando caio. Deus está em mim para consolar-me quando eu estou triste”. Basta ter fé e vivê-la em todos os momentos de nossa vida, então nossas forças serão renovadas na graça de Deus.          

Da experiência percebemos que enquanto vivemos no meio dos outros homens, fracos e frágeis como nós, não nos damos conta do nosso pecado, de nossa fragilidade, de nossas fraquezas; aliás, comparando-nos com os que estão ao nosso lado, podemos até pensar que sejamos justos, honestos, sinceros, caridosos, misericordiosos e irrepreensíveis. Mas ao entrarmos em contato com Deus, as coisas mudam: constatamos de forma dramática a nossa pobreza, a nossa indignidade, a nossa miséria. Só quem fica perto de uma luz percebe a sujeira da própria roupa. Esta experiência é vivida por todos aqueles que entram em contato com a Palavra de Deus, aquela palavra que é “viva e eficaz, mais penetrante do que uma espada de dois gumes” (Hb 4,12). É a experiência vivida por Paulo, quando toma consciência da própria indignidade de pregador do Evangelho: “Nós carregamos este tesouro em vasos de barro” (2Cor 4,7).                    

A palavra de Deus se manifesta em Jesus Cristo como uma palavra que pacifica, que infunde ânimo, que dá segurança; como uma palavra que escolhe, que chama, que fortalece e que transforma a existência daquele que é chamado. A palavra de Jesus vai superar a distância: “Não temas!” São mesmas palavras que ecoam nas manifestações de Deus no AT (cf. Gn 15,1;21,17;26,24;28,13;Jz 6,23;1Sm 4,20).          

Às palavras de pacificação, de segurança e de coragem, seguem-se as da promessa- missão: “Doravante serás pescador de homens”. A palavra de Jesus tem esse poder de fazer começar uma história nova na vida de um homem.          

A nova missão de Pedro e de seus companheiros será a de “salvar vidas”: entrar mar adentro para tirar os homens das águas profundas, do abismo da morte; “pegar vivos ou para a vida” os homens, assim como eles mesmos foram colhidos- escolhidos. A resposta de Pedro e de seus companheiros às palavras de Jesus foi a disponibilidade absoluta, a da obediência incondicional: “...e deixando tudo, eles o seguiram” (v.11). A renúncia, o “deixar tudo”, é uma consequência, e não uma condição prévia, do chamamento de Jesus. A vocação é a vocação para uma missão.

Aprendemos que pescar- salvar sem Jesus é impossível. Todos os saberes e técnicas humanas, horas oportunas (a noite), não são capazes de salvar sem a ajuda de Jesus. O fruto abundante (pesca milagrosa) será constante na atividade missionária se cada cristão seguir as diretrizes de Jesus. Nossas próprias forças não são suficientes para superar tudo. Necessitamos da confiança na Palavra d’Aquele que nos prometeu que nunca nos deixaria sozinhos (cf. Mt 28,20). Quem, como Pedro, aceitar sua limitação, estará em condições de aceitar que os frutos de seu trabalho apostólico não são seus e sim d’Aquele que nos convidou para ser seu instrumento. Jesus chama os apóstolos a serem pescadores de homens, mas o verdadeiro pescador é Ele.          

Diante da força da Palavra de Deus posta em prática a exemplo de Pedro que resultou na pesca abundante, devemos, por acaso, desistir diante das dificuldades? Devemos recusar o convite do Senhor para ser pescadores de homens, para espalhar a Palavra do Senhor? Temos convicção de que a única força que possuímos é a da Palavra de Deus que nos foi confiada? Não nos sentimos, por vezes, inclinados a confiar em outras forças? 

“Meu Senhor e meu Deus, despoja-me de tudo que me afaste de Ti. Meu Senhor e meu Deus, concede-me tudo que me conduz a Ti. Meu Deus e meu Senhor, despoja-me de mim mesmo e faz com que eu pertença totalmente a Ti” (Nicolau de Flüe [1407-1487]).

P. Vitus Gustama,svd

Quarta-feira Da XXII Semana Comum, 01/09/2021

SER SALVO POR DEUS PARA SERVIR AO PRÓXIMO

Quarta-Feira da XXII Semana Comum

Primeira Leitura: Cl 1,1-8

1 Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus e o irmão Timóteo, 2 aos santos e fiéis irmãos em Cristo que estão em Colossas: graça e paz da parte de Deus, nosso Pai. 3 Damos graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, sempre rezando por vós, 4 pois ouvimos acerca da vossa fé em Cristo Jesus e do amor que mostrais para com todos os santos, 5 animados pela esperança na posse do céu. Disso já ouvistes falar no Evangelho, cuja palavra de verdade chegou até vós. 6 E como no mundo inteiro, assim também entre vós ela está produzindo frutos e se desenvolve desde o dia em que ouvistes a graça divina e conhecestes verdadeiramente. 7 Assim aprendestes de Epafras, nosso estimado companheiro, que é junto de vós um autêntico mensageiro de Cristo. 8 Foi ele quem nos deu notícia sobre o amor que o Espírito suscitou em vós. 

Evangelho: Lc 4,38-44

Naquele tempo, 38 Jesus saiu da sinagoga e entrou na casa de Simão. A sogra de Simão estava sofrendo com febre alta, e pediram a Jesus em favor dela. 39 Inclinando-se sobre ela, Jesus ameaçou a febre, e a febre a deixou. Imediatamente, ela se levantou e começou a servi-los. 40 Ao pôr do sol, todos os que tinham doentes atingidos por diversos males, os levaram a Jesus. Jesus punha as mãos em cada um deles e os curava. 41 De muitas pessoas também saíam demônios, gritando: “Tu és o Filho de Deus”. Jesus os ameaçava, e não os deixava falar, porque sabiam que ele era o Messias. 42 Ao raiar do dia, Jesus saiu e foi para um lugar deserto. As multidões o procuravam e, indo até ele, tentavam impedi-lo de as deixar. 43 Mas Jesus disse: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado”. 44 E pregava nas sinagogas da Judéia.

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Somos Irmãos e Apóstolos de Cristo 

Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus e o irmão Timóteo, aos santos e fiéis irmãos em Cristo que estão em Colossas: graça e paz da parte de Deus, nosso Pai”. Assim lemos no texto da Primeira Leitura que foi tirado da Carta de São Paulo aos colossenses. 

A partir de hoje, durante alguns dias leremos a Carta de São Paulo aos cristãos de Colossos.

Colossos é uma cidade de Ásia Menor, perto de Efeso, atualmente na Turquia. Esta cidade não foi evangelizada por São Paulo (Cf. Cl 2,1; 4,1ss) e sim por Epafras, convertido, provavelmente por São Paulo em Éfeso. Epafras se encontra junto a Paulo no momento de escrever a Carta (Cl 1,7; 2,12s). a comunidade de Colossos era formada, em sua maior parte por cristãos convertidos do paganismo. Mas havia um bom número de judeu-cristãos. Dos judeu-cristãos provieram em boa parte os problemas que são mencionados nesta Carta. 

São Paulo toma a responsabilidade de escrever à comunidade cristã de Colossos porque há várias crises nela. Primeiro, parece que determinados judeus convertidos ao cristianismo não aceitavam desprender-se das tradições judaicas: circuncisão (Cl 2,11-13), o sábado e festas judaicas (Cl 2,16), abstinência de alimentos (Cl 2,16.20-22). Eles pensam que para ser cristão tem que ser judeu, vivendo as tradições judaicas. Segundo, nesta comunidade há uma devoção excessiva aos anjos (Cl 2,18) com o risco de que possam ocupar o lugar de Cristo. Conforme a antiga filosofia os anjos eram os “elementos do mundo”. Os judeus os converteram em anjos e eram considerados guardiões da lei (Gl 3,19) e a estas potestades angélicas se atribui a criação com a consequente influencia sobre os homens. Para estes judeus, os anjos são aqueles que possuem a plenitude da sabedoria e a perfeição e em consequência da função de salvar o indivíduo. Consequentemente, o homem deve servi-los e prestar-lhes culto (Cl 2,18). Com isso, esta doutrina destrona Cristo do lugar e na salvação do homem. Terceiro, em consequência do poder dessas potestades, tinha suma importância chegar ao conhecimento das mesmas, de seu modo de atuar e tê-las animadas. Para isso, eram precisos ritos de iniciação nos mistérios ocultos e um ascetismo rígido: purificações, abstinência de certos alimentos e celebrações de festas (Cl 2,2; 3,16). Estes erros eram graves, pois misturados de elementos cristãos, judeus e pagãos que ameaçavam obscurecer o mistério de Cristo, único mediador e redentor nosso. Por isso, nesta Carta São Paulo insistirá em destacar o papel centra e insubstituível de Cristo. Consequentemente, o autor da Carta destacará, com toda a ênfase, a unicidade de Cristo e a sua primazia apresentando Cristo pré-existente como mediador da criação, e Cristo ressuscitado como reconciliador do universo, acentuando, por sua vez, sua posição de cabeça e senhor de toda potestade e dominação.

Um grupo dos exegetas pensam que São Paulo escreveu essa Carta ao final de sua vida, durante seu cativeiro em Roma (ano de 61 a 63). Nesta carta encontramos uma síntese teológica mais curta, mas que expressa o pensamento mais maduro de São Paulo como se manifesta abertamente na Carta aos Efessos. 

Paulo, apóstolo de Cristo Jesus por vontade de Deus e o irmão Timóteo, aos santos e fiéis irmãos em Cristo que estão em Colossas: graça e paz da parte de Deus, nosso Pai”, assim inicia a Carta, como lemos na Primeira Leitura  

Aqui São Paulo chama a si próprio de “apóstolo”. A palavra “apóstolo” literalmente significa aquele que é enviado. São Paulo é enviado do Senhor para ser seu embaixador. Além disso, ele é apóstolo “por vontade de Deus”. Isto quer nos dizer que o cargo de “apóstolo” não foi adquirido pelo próprio São Paulo. É algo dado por Deus. A vocação não provém da vontade de São Paulo e sim da vontade de Deus: “Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi” (Jo 15,16). 

Um dia Jesus disse aos discípulos: “A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos” (Mt 9,37). Esta frase é dirigida para cada cristão. É um convite de Jesus a cada um para trabalhar com ele em favor dos abandonados, dos desorientados, dos doentes e de outros com suas variedades de problemas, de muitos que vivem como “ovelhas sem pastor”. São Gregório Magno dizia: “A messe é muita, mas os operários poucos... Ao escutarmos isto, não podemos deixar de sentir uma grande tristeza, porque é preciso reconhecer que há pessoas que desejam escutar coisas boas; falta, no entanto, quem se dedique a anunciá-las”. 

Além disso aqui São Paulo usa duas vezes o termo “irmão”. Era a maneira de nomear-se entre os primeiros cristãos. Com efeito, o cristianismo é para nós uma grande fraternidade. Não se trata somente de solidariedade humana. Mas trata-se de considerar as relações humanas a partir do ângulo da fé: Somos irmãos em Cristo. Somos os homens unidos ao mesmo Cristo e por isso, somos irmãos. Eu sou de Cristo com os outros cristãos, unicamente de Cristo, Cabeça e centro da unidade. Eu sou da Igreja como os outros cristãos, em comunhão com todos os irmãos. Eu sou para os demais, em atitude de solidariedade e de serviço a exemplo de Cristo. 

Na Primeira leitura de hoje São Paulo quer nos relembrar que necessitamos dar graças a Deus permanentemente: “Damos graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, sempre rezando por vós, pois ouvimos acerca da vossa fé em Cristo Jesus e do amor que mostrais para com todos os santos, animados pela esperança na posse do céu”. 

Uma pessoa agradecida é interiormente rica. Não somente tem consciência dos dons recebidos, como também reconhece que todo o bem procede de Deus. Quanto mais grata for uma pessoa, maior riqueza interior possui. O agradecido guarda na memória todas as boas experiências vividas. O ingrato, ao contrário, é um ser mesquinho, um isolado. Ele é infeliz por dentro apesar da sua aparente satisfação. 

O objetivo da ação de graças de São Paulo na leitura de hoje é a fé, a esperança e a caridade dos colossenses. A fé, a caridade e a esperança caracterizam os cristãos. 

O cristãos, enquanto peregrinos nesta terra, sabem que o motor, o dinamismo das outras duas virtudes é a esperança. Os cristãos estão em marcha e sabem aonde vão: vão para o céu. A fé e a caridade são como algo antecipado desse céu que realizará na plenitude de todas as aspirações do homem. A esperança sustenta a fé e frutifica em obras de amor. O amor no Espirito que os colossenses professam não é somente um amor meramente humano. Mas é muito mais do que isso: é um amor sobrenatural baseado no amor de Cristo que nos amou até o fim (cf. Jo 13,1). 

Somos Salvos Para Servir e Salvar Os Outros 

O que Jesus anunciou na sinagoga de Nazaré, no seu discurso programático (Lc 4,14-30), ele vai o cumprindo. Aplicando para si a profecia de Isaias, Jesus diz que vem anunciar a salvação aos pobres e curar os cegos e dar a liberdade aos oprimidos. 

Hoje lemos o programa de uma jornada de Jesus “ao sair da sinagoga”: curar a febre da sogra de Pedro, impor as mãos e curar os enfermos que as pessoas trouxeram para Jesus, libertar os possuídos pelo demônio e não se cansar de ir ao encontro do povo para anunciar o Reino de Deus. Mas, no meio de suas atividades missionárias, Jesus nunca deixa de buscar momentos de paz para rezar pessoalmente num lugar solitário. 

Depois de sair da Sinagoga, em Nazaré, Jesus e alguns discípulos foram para a casa de Simão Pedro. Jesus saiu de um lugar oficial (sinagoga é lugar de oração, de ensino e de catequese para os judeus) para um ambiente familiar: casa. Em casa todos tem seu espaço e cada um é chamado pelo nome e não pelo título (se é um doutor, deputado, presidente e assim por diante). Cada um é gente em casa. Em casa um se preocupa com o outro. Basta um membro sofrer, todos sofrerão. Basta um membro ter sucesso, todos experimentarão a felicidade. Ninguém fica feliz sozinho como também ninguém sofre sozinho, pois não somente vivemos, mas convivemos. Nossa vida é cercada por outras vidas. Oxalá possamos viver a espiritualidade familiar também fora de nossa família, como Jesus nos diz hoje: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado” (Lc 4,43). O cristão existe para os outros. Nisto consiste o sentido de sua vida de cristão. 

Pedro encontra sua sogra com febre em sua casa. No pensamento daquela época, a febre era causada pelo demônio. Com um gesto familiar, Jesus se aproximou da mulher, tocou-a e a ajudou a se levantar e a febre desapareceu. A sogra de Pedro começou a servir a todos imediatamente. 

A febre representa tudo que nos impede de servirmos aos outros. Cada um pode descobrir que tipo de “febre” que o impede de servir aos outros, “febre” que faz a vida perder seu sentido (ficar deitado todo tempo). O que é que me faz viver uma “vida deitada”, isto é, sem ação, sem ânimo, sem perspectivas. Eu preciso convidar Jesus para entrar na minha casa onde estou “deitado” para que ele se aproxime de mim, me toque e me ajude a me levantar. A palavra “levantar-se” no Novo Testamento, em outros contextos, também significa ressuscitar. Eu preciso me levantar de uma vida estéril (deitar) para uma vida fecunda (servir). Para isso, eu preciso segurar a mão de Jesus, mão que me potencia, mão que me levanta, mão que me cura e liberta, mão que me torna uma mão que ajuda os outros.

Um outro detalhe que chama nossa atenção no evangelho deste dia é que Jesus não deixava os demônios falarem, e os expulsou (Lc 4,41). Nesta marca comum nos antigos exorcismos se descobre que é preciso lutar contra o mal sem deter-se em discutir suas pretensões.

Todos nós sabemos que o mal pode vestir-se de uma aparência boa, enganando os que procuram escutar suas “orações” ou “pedidos”. Jesus não ficou parado nisto. Jesus sabe que tudo que destrói o homem é perverso e Jesus se esforça para vencê-lo, devolvendo assim a dignidade para as pessoas sofridas. 

Outro detalhe que chama bastante nossa atenção é que diante da obra de Jesus surge uma reação bastante egoísta entre as pessoas: querem monopolizar o aspecto mais extenso da atividade de Jesus e utilizá-lo como um simples curandeiro: “As multidões o procuravam e, indo até ele, tentavam impedi-lo de as deixar”. 

Podemos ter a tentação ou a tendência para este tipo de relacionamento com Jesus no sentido de que nós aceitamos Jesus simplesmente na medida em que ele nos ajuda a resolver nossos problemas para garantir tranqüilidade psicológica ou uma ordem na família, ou uma garantia na vida financeira. Santo Agostinho nos relembra que a razão de nossa existência neste mundo é a vida eterna. Temos que viver e conviver dentro desta dimensão. Conseqüentemente eu sou uma ocasião de salvação para o próximo e o próximo é uma ocasião de salvação para mim. Jesus nos salva na medida em que cada um se torna uma ocasião de salvação para o outro (cf. Mt 25,40.45; veja também Lc 22,31-32). Estando conscientes disso entenderemos que Jesus é muito maior do que um fazedor de milagres. Ele é a nossa Salvação (cf. Jo 6,68-69). Que Jesus Cristo é nosso Salvador é uma das afirmações mais sólidas e repetidas do Novo Testamento. É a primeira noticia do céu à terra através do anjo falando a uns pastores: “Hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador que é o Cristo Senhor” (Lc 2,11). A salvação alcança o que foi criado, pessoas humanas em umas condições concretas. Anunciar a salvação é anunciar a vida em todas as suas dimensões, inclusive em algo tão relativo como a saúde (a palavra “salus” [salvar/salvação] exige previamente uma cura. Para um cego, depois da recuperação de vista, Jesus disse: “Tua fé te salvou” [Mc 10,52]). Cada cristão existe para ajudar, proteger e salvar o outro. Se um cristão é egoísta é porque ele deixa de ser cristão. Se um cristão é desonesto, injusto, incoerente, etc., não ele não pode ser chamado mais de cristão, como dizia Santo Agostinho: “O nome de cristão traz em si a conotação de justiça, bondade, integridade, paciência, castidade, prudência, amabilidade, inocência e piedade. Como podes explicar a apropriação de tal nome se tua conduta mostra tão poucas dessas muitas virtudes?” (De vit. christ. 6).

A resposta de Jesus, para a tentação de monopólio, é clara: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado” (Lc 4,43). Sua exigência se traduz em um dom que fica aberto para todos os que O esperam. Certamente o Evangelho é um presente que enriquece a existência, porém um presente que não se pode encerrar e sim um presente que nos abre sem cessar para os outros.

Podemos revisar alguns traços significativos do texto do evangelho lido neste dia. Em primeiro lugar, o texto diz que Jesus foi para casa de Pedro ao sair da sinagoga. Trata-se de um bom programa para qualquer cristão. “Ao sair da sinagoga...”. Ou seja, na nossa linguagem “ao sair de nossa missa ou de nossa oração”, nos espera uma jornada de trabalho, de pregação e evangelização, de serviço curativo para os demais traduzindo nossas orações em ações. É colocar a oração na vida e a vida na oração. Em segundo lugar, Jesus, em meio de uma jornada com um horário intensivo de trabalho e dedicação missionária, encontra momentos para rezar sozinho. Em terceiro lugar, Jesus não quer “se instalar” num lugar onde ele é bem acolhido: “Eu devo anunciar a Boa Nova do Reino de Deus também a outras cidades, porque para isso é que eu fui enviado”. É preciso que nós evitemos dois perigos: o ativismo exagerado, descuidando da oração (espiritualidade) e a tentação de ficarmos no ambiente em que somos bem recebidos, descuidando da universalidade de nossa missão. É preciso que olhemos para Cristo para saber o que precisamos fazer: Jesus é evangelizador, libertador, orante.

Para Refletir Mais...

Uma das atitudes fundamentais de Jesus, que Lucas nos descreveu no seu evangelho, é a sua grande misericórdia. A misericórdia leva Jesus a ser disponível para os demais. Por causa da misericórdia, para Jesus não há momento determinado para ajudar, para curar e para atender aos que O procuram e necessitam dele. Todo tempo de Jesus é para os necessitados, para os quais ele foi enviado (cf. Lc 4,18-19). E todos encontram nele alívio, consolo e força para continuar a seguir adiante na vida. Servir é amar. E amar é viver para sempre, pois “Deus é amor” (1Jo 4,8.16).

Que “motor” que nos move a trabalharmos como cristãos tanto na Igreja como na sociedade em geral? Como está nossa disponibilidade como cristãos? Existe algum momento dedicado para os outros no nosso dia-a-dia para ajudar, consolar, aconselhar ou simplesmente para escutar o outro?

P. Vitus Gustama,svd

23/11/2024-Sábado Da XXXIII Semana Comum

CREMOS NO DEUS DA VIDA E POR ISSO CREMOS NA RESSURREIÇÃO QUE NOS FAZ RESPEITARMOS A DIGNIDADE DA VIDA DOS OUTROS Sábado da XXXIII Semana C...