terça-feira, 17 de setembro de 2024

XXV Domingo Comum, Ano "B",22/09/2024

SERVIR OS OUTROS PARA SALVÁ-LOS É O ESTILO DE VIDA DO CRISTÃO  A EXEMPLO DE CRISTO JESUS

XXV DOMINGO DO TEMPO COMUM B                                   

Primeira Leitura: Sb 2,12.17-20

Os ímpios dizem: 12 “Armemos ciladas ao justo, porque sua presença nos incomoda: ele se opõe ao nosso modo de agir, repreende em nós as transgressões da lei e nos reprova as faltas contra a nossa disciplina. 17 Vejamos, pois, se é verdade o que ele diz, e comprovemos o que vai acontecer com ele. 18 Se, de fato, o justo é ‘filho de Deus’, Deus o defenderá e o livrará das mãos dos seus inimigos. 19 Vamos pô-lo à prova com ofensas e torturas, para ver a sua serenidade e provar a sua paciência; 20 vamos condená-lo à morte vergonhosa, porque, de acordo com suas palavras, virá alguém em seu socorro”.

Segunda Leitura: Tg 3,16-4,3

Caríssimos: 3,16 Onde há inveja e rivalidade, aí estão as desordens e toda espécie de obras más.17 Por outra parte, a sabedoria que vem do alto é, antes de tudo, pura, depois pacífica, modesta, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem fingimento. 18 O fruto da justiça é semeado na paz para aqueles que promovem a paz. 4,1 De onde vêm as guerras? De onde vêm as brigas entre vós? Não vêm, justamente, das paixões que estão em conflito dentro de vós? 2 Cobiçais, mas não conseguis ter. Matais e cultivais inveja, mas não conseguis êxito. Brigais e fazeis guerra, mas não conseguis possuir. E a razão está em que não pedis. 3 Pedis, sim, mas não recebeis, porque pedis mal. Pois só quereis esbanjar o pedido nos vossos prazeres.

Evangelho: Mc 9,30-37

Naquele tempo, 30Jesus e seus discípulos atravessavam a Galileia. Ele não queria que ninguém soubesse disso, 31pois estava ensinando a seus discípulos. E dizia-lhes: “O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens, e eles o matarão. Mas, três dias após sua morte, ele ressuscitará”. 32Os discípulos, porém, não compreendiam estas palavras e tinham medo de perguntar. 33Eles chegaram a Cafarnaum. Estando em casa, Jesus perguntou-lhes: “O que discutíeis pelo caminho?” 34Eles, porém, ficaram calados, pois pelo caminho tinham discutido quem era o maior. 35Jesus sentou-se, chamou os doze e lhes disse: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!” 36Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio deles e, abraçando-a, disse: 37“Quem acolher em meu nome uma destas crianças, é a mim que estará acolhendo. E quem me acolher, está acolhendo, não a mim, mas àquele que me enviou”.

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Visão Geral Do Texto

Este texto faz parte de uma seção chama-se de “O caminho de Jesus e dos discípulos(8,22-10,52). Este conjunto começa com a cura do cego (8,22-26) e termina com a mesma cura de outro cego (10,46-52). Com isso Marcos quer nos mostrar que os discípulos continuam com sua incompreensão diante da missão de Jesus (Continuam cegos). Continuam cegos diante do ministério do Senhor. Com muita paciência Jesus instrui os discípulos.

Aqui se revela a falta de sintonia dos discípulos com os interesses e missão de Jesus. Quando Jesus falava de sofromento, cruz, morte e ressurreição, seus discípulos discutiam entre si de quem entre eles seria o maior. Para Jesus pretensões de grandeza, de prestígio e de domínio não tem lugar ou espaço em seu movimentoe e missão, pois o serviço do Senhor se baseia no serviço desinteressado. Para Jesus não há superior e inferior e sim irmãos e irmãs, pois todos são filhos e filhas do mesmo Pai do céu. Por isso, o maior seria aquele que serve, pois estará cuidando dos filhos e filhas de Deus aqui na terra. Cuidar dos filhos é sinal de respeito e de amor  ao Pai. Com esta catequese, Jesus inverte o modo de pensar de seus discípulos e procura colocá-los no caminho certo ou correto.

Ser discípulo é ser servidor dos outros, especiamente dos menos favorecidos: Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!”.

Não podemos negar que, para a sociedade em geral, ser o último é uma tragédia: o último da classe é que leva broncas de mestres; o último na oposição faz a risada de todos; o último em dinheiro é quase um exemplar de museu; o último em beleza nos é repugnante; o último em fama é um pobre desgraçado; o último em amor é idiota ou tonto; último numa fila grande é um desespero. Você ainda quer ser o último desse jeito? Creio que você diria: “Não!”. Mas Jesus diz aos seus: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos”.

Quem pode entender isso? Ninguém na sociedade, ou muito poucos, porque todos querem ficar em primeiro lugar, ser primeiro na fila etc... Mas a fé em Jesus é uma vivência, uma experiência, uma relação pessoal e comunitária com Ele e não um costume social nem uma rotina ou ativismo tradicional nem uma soma de ritos ou de práticas superficiais, ou de atos semi-mágicos. Enquanto relação pessoal, o mais importante é uma pessoa, um Alguém com quem convivemos, com quem entrelaçamos e entretemos nossa vida, um Alguém com quem contamos, a quem consultamos na hora de tomar decisões em nossa existência; um Alguém cujas idéias influem e informam nossas idéias, e portanto, nossa vida; um Alguém cuja vida é um modelo a seguir e imitar: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância(Jo 10,10). Por isso, a fé traspassa o nível de meramente pensado, racionado ou razoável, e é algo muito mais profundo, mais sério e mais vital.

Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!”. “Servo-servir” é aquele que está em prontidão para servir. É aquele que não espera nada em troca pelo serviço prestado para o bem de todos. A própria Mãe de Jesus se considera como “serva do Senhor”: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a Tua Palavra” (Lc 1,38). Em grego, “Diácono” significa “servidor”. A palavra grega que a Bíblia geralmente traduz como “servir” é DIAKONEIN, que significa o serviço à mesa. Isto significa que quem serve à mesa serve à vida, nutre o outro com vida, atrai vida para o outro. É despertar vida. É atrair vida nas pessoas. Servir é, portanto, algo vital, isto é, algo que tem a ver com a vida. Quando sirvo alguém, não me rebaixo, mas sirvo à vida e busca a chave para suscitar vida nas pessoas. A diakonia será uma das dimensões fundamentais da Igreja, junto ao culto e a Palavra.

Para aprofundar mais esta catequese Jesus faz um gesto gracioso cheio de simbolismo: Ele chama uma criança, coloca-a no meio dos discípulos e a abraça. O gesto de abraçar é expressão de ternura e de amor. Na cultura judaica a criança era vista como travessa, imprudente e sem juizo. No gesto simbólico de Jesus, vemos de modo muito claro a postura que Jesus quer da comunidade: acolher os pequenoa e aqueles que são pouco considerados na sociedade. A catequese de Jesus é tão intensa que Ele mesmo se coloca como se fosse uma das crianças ou um dos pequeninos: “Aquele que recebe uma destas crianças, por causa do meu nome, a mim recebe”.

O caminho de serviço aos demais até dar a vida se opõe radicalmente ao domínio sobre os demais até não deixar-lhes viverem. Por isso, é tão difícil compreender o caminho de Jesus porque a ambição sem limite e a vontade de poder estão arraigadas fortemente em cada um de nós.           

Esta seção é a parte central do Evangelho de Marcos. Nela o autor trabalha com grande habilidade para apresentar o verdadeiro Cristo aos fiéis da sua comunidade. Pois, esses fiéis precisavam compreender que os sacrifícios e sofrimentos que experimentavam como cristãos eram conseqüência lógica de eles serem discípulos de Jesus de Nazaré, que se fez Servo sofredor e que é agora o Cristo Ressuscitado.            

Nesta seção Marcos colocou cinco temas:

1). Jesus assume seu papel do Servo sofredor, descrito por Isaías (Is 53; cf. também Is 42), no plano do Pai.

2). Jesus explica aos discípulos que ele está indo para sua morte, mas que ele ressuscitará dos mortos. Em três predições da sua morte e ressurreição, Jesus revela novos horizontes para a fé deles. Ele quer ensinar-lhes o tipo de Messias que ele é: um Messias que doa sua vida até as últimas possibilidades de doação: a morte na Cruz.

3).Os discípulos não compreendem quando Jesus fala de sacrifício e sofrimento. Para eles um Messias que sofre é uma contradição. Depois de cada uma das três predições da sua Paixão e Morte, os discípulos mostram sua falta de compreensão (9,5-6.10.19.32.34.38;10,13.24.32.37.41).

4).O convite ao espírito de doação de si. Jesus responde à incompreensão dos discípulos, instruindo-os sobre a maneira correta em que eles terão de segui-lo. Nesta seção Marcos concentra o ensinamento ético e moral de Cristo. “No caminho a Jerusalém”, Jesus se aproveita das oportunidades que surgem espontaneamente para mostrar aos discípulos como deverão tornar concreto o seu espírito de amor sacrifical no dia-a-dia de suas vidas. Assim, o convite à fé e à conversão com que Jesus iniciou a sua missão(1,15) tornou-se agora um convite a segui-lo neste mesmo espírito de doação de si que motiva a sua ida a Jerusalém.           

Em todas as situações e em todos os seus relacionamentos, os cristãos deverão manifestar o mesmo espírito de amor que motiva Jesus no caminho a Jerusalém. Os primeiros cristãos eram tão conscientes de que sua conduta devia refletir o amor sacrifical de Jesus, que as comunidades se designavam “os adeptos do caminho” (At 9,2;18,25-26;19,9.23). 

5). No início (Mc 8,22-25: a cura em duas etapas para mostrar a grave cegueira dos discípulos diante da missão de Jesus) e no fim desta seção (Mc 10,46-52: Desta vez, Jesus cura o cego de maneira imediato para dizer que os discípulos começam a enxergar/ver o sentido da missão de Jesus), Marcos coloca o tema de fé como dom de Deus. A fé faz ver ou enxergar quem é Jesus. Desde o começo da atividade pública de Jesus, Marcos mostrou-nos a cegueira dos discípulos. Mas Jesus fará tudo para, pouco a pouco, tirar a cegueira dos discípulos. A visão clara que se tem de Jesus não vem de uma só vez. Mas com a ajuda de Jesus, veremos mais claro e com maior nitidez quem é Jesus para nós. A fé também faz ver ou enxergar o caminho que Jesus trilhou e que devemos trilhar. Assim a seção começa e termina com a cura de um cego (8,22-26; 10,46-52). E essas duas curas têm uma função simbólica: para mostrar a cegueira dos discípulos. Elas também lembram o leitor de que é Jesus quem faz possível a fé daqueles que acreditam nele e O seguem no caminho.

Somente Quem Serve Aos Outros Tem Autoridade

Domingo após domingo vamos escutando a Palavra de Deus, que é a melhor escola de sabedoria e que neutralizando a mentalidade que o mundo nos quer inculcar.

Na Carta de são Tiago que lemos na Segunda Leitura nota-se bem esta contraposição. Para ele, se vivermos segundo a mentalidade deste mundo, não poderemos escapar da espiral das ambições e conflitos e cobiças. Em seu tempo e agora, o egoísmo parece ser o slogan daqueles que são guiados apenas por visões terrenas. E isso nos traz inveja e luta, desordem e todo tipo de males: “Onde há inveja e rivalidade, aí estão as desordens e toda espécie de obras más. (Tg 3,16).

Mas quando seguimos “a sabedoria que vem de cima” como enfatiza são Tiago, mudarão nossos critérios, porquepura, pacífica, modesta, conciliadora, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade e sem fingimento”. É bom para nós irmos à escola de Cristo em cada Eucaristia, assimilar, na teoria e na prática, o estilo de vida que ele ensina aos seus seguidores. 

No domingo anterior, o anúncio de que a promessa de vida nova do Messias se relizaria através do “fracasso” da cruz, suscitou a reação contrária de Simão Pedro. Hoje a reação é muito mais lamentável e entristecedora: os discípulos nem sequer escutaram. Suas preocupações se dirigiam para o êxito pessoal, exatamente o contrário do que Jesus intentava explicar-lhes. Jesus deve voltar a explicar e a insistir no estilo que Ele propõe: trata-se de querer viver toda a vida como serviço, e trata-se de sabê-lo reconhece-Lo não nos grandes e prestigiosos, e sim nos humildes e débeis. A proposta de Jesus é um estilo que abraça toda a vida. O caminho de serviço aos demais até dar a vida se opõe radicalmente ao caminho de domínio sobre os demais até não deixa-los viver.

Porém, por outro lado, a incompreensão dos discípulos sobre o ensinamento de Jesus é total. Com isso, Marcos quer lembrar com mais freqüência como é difícil para os discípulos acreditarem em Jesus e aceitarem as exigências de segui-lo. Diante da incompreensão que os discípulos continuam a mostrar, Jesus repete o ensinamento sobre o seu destino e junto com ele, os seus seguidores.            

Mas eles têm medo de lhe perguntar porque vislumbram que a explicação não corresponderia à sua expectativa de triunfo. Uma sabedoria chinesa diz: “Quem pergunta, é bobo por cinco minutos. Quem não pergunta é bobo para sempre. Quem te instruiu por um dia é teu pai por toda a vida”. Os discípulos são como homens que sabem tanto até têm medo de saber mais.

Por isso, é tão difícil compreender o caminho de Jesus, porque a ambição e a vontade de poder estão arraigadas fortemente em nós. E esta é também a razão de um grande malentendido: se diz que o poder é um serviço, e o que se quer dizer com isso, de maneira escondida, é que os que ostentam o poder “servem” ao povo mandando. Por isso é justamente o contrário do que pensava Jesus quando dizia aos discípulos: “Se alguém deseja ser o primeiro seja o último e ser servidor de todos”.            

Jesus propõe-se a ajudá-los através de uma pergunta e de uma afirmação: “Sobre o que vocês estavam discutindo no caminho?” É uma pergunta que lhes causa embaraço. O silêncio deles revela sua cegueira/obcecação (veja Mc 3,4; 7,25) e improcedência do tema que discutiram: quem tinha status superior ou maior categoria no grupo. A incompreensão dos discípulos é total. Domina neles a ambição de preeminência, à qual o sistema judaico incita, radicalmente oposta ao ensinamento de Jesus (v.31). Empolgados pelo líder que fazia sucesso, sonhavam com uma boa posição no futuro Reino. E já brigavam, competindo por essa boa posição.        

Muitos cristãos aceitam algumas partes da mensagem cristã que eles gostam e servem para eles e recusam entender o resto. Um verdadeiro cristão deve aceitar a mensagem toda do cristianismo, todo o ensinamento que Jesus nos deixou. Muitos séculos depois, é pena que ainda hoje na Igreja nem todos tenham entendido a lógica do serviço. Muita gente ainda pensa que ter “cargos” é que tornam as pessoas mais importantes.           

Jesus muda as palavras. Em vez  de “o maior”, Jesus fala sobre “o primeiro e “o último” e “servo”. Com isso, o sujeito é mais claramente centrado no lugar de honra, pois um discípulo pode ser que seja o maior do que os outros de certa perspectiva. Com palavras e gesto, Jesus traduz sua intenção aos discípulos: “Se alguém deseja ser o primeiro seja o último e ser servidor de todos” (v.35). 

Como é que pode  alguém ser o primeiro sendo o último ? Com um gesto Jesus pega uma criança e a acaricia. Em aramaico a palavra que se usa é “talya  que pode significar “servo” ou “criança”. Na época a criança com menos de doze anos e servo, não tinham qualquer consideração social. Eles eram “proprietários do dono”. O jogo de palavra estabelece o elo entre “o servo/servidor” do v.35 e a “criança” dos vv.36-37. 

Jesus pega/toma a criança para seus braços”. Este é um ato simbólico: pegar/tomar significa acolher (cf. 6,11); significa servir com amor os membros mais fracos da comunidade, aqueles que estão em maior necessidade. E Jesus vai além disso: ao fazer isso, o discípulo estará servindo a Jesus e o Pai que enviou Jesus. Na comunidade de Jesus, então, o que serve, e não o que manda, é o maior. Toda ambição de preeminência ou de domínio é excluída. Marcos sublinha aqui a lição sobre a dignidade de serviço (Cf. Jo 13,14-16).            

É admirável a ambição de alguém que deseja redimir sua humilde condição de nascimento, valorizando todas as suas capacidades de inteligência e de luta. É um desejo inato, primordial. É muito normal ter o desejo de ser, de valorizar a própria existência, de subir mais alto na vida. E isso acontece em todos os campos. Não há ninguém que, para viver, não sinta necessidade de ser o primeiro em alguma coisa.            

O que Jesus muda radicalmente é o motivo desse desejo e, portanto, também o modo de realizá-lo: “Seja o último de todos e o servo de todos”. Com estas palavras Jesus dá um golpe mortal contra a idéia que os homens sempre fazem da autoridade, do poder e do governo. A verdadeira autoridade não está em afirmar a si mesmos reduzindo os outros a escravos, a clientes, mas em colocar para fora (fazer bondade) aquilo que é e aquilo que se tem de bom em benefício de todos. Isso cria a nova grandeza evangélica. Uma pessoa de alma nobre não sai à procura das honras, mas do bem. “Chegamos mais perto da grandeza quando somos grandes na humildade”(R.Tagore) e no serviço.          

Em sua Meditação sobre o poder e a graça, José I. Gonzalez Faus(o mesmo autor de A autoridade da verdade) afirmou: “O poder serve para muitas coisas. Mas não serve para que os homens se tornem bons; não serve para libertar ou curar a liberdade humana, só serve para suprimi-la. A graça, ao contrário, faz bons homens e liberta a liberdade humana. O poder obriga, a graça ajuda. O poder cria quartéis ou campos de concentração; o crisma edifica a comunidade. O poder impõe o silêncio, o carisma fala em silêncio...O poder se atribui carismas, o carisma não se atribui poderes. O poder suplanta o Espírito, o carisma faz transparecer o Espírito. E por isso o poder acaba por levantar a cruz, e o carisma acaba por morrer pregado na cruz”.            

Para um ambicioso as honras valem tudo: ele se sente totalmente envolto pela espiral da glória. Quando dominado pelo vício, ele não suporta competidores, nem admite rivais. Quem é ambicioso, é dificilmente se preocupará com ser justo. Perante a necessidade de alcançar o que deseja, ele só enxerga uma alternativa: humilhar os outros e eliminá-los. Os outros já não são pessoas que merecem respeito, mas são degraus que só servem para ser galgados no intuito de ele atingir o vértice do poder. O ambicioso, quando estiver no vértice do poder, transmitirá aos súditos os seus sentimentos, arruinando a nação/grupo/comunidade etc. com assim chamada de política do prestígio, dos que só visam a conseguir a sua própria grandeza. Ele só obedece ao seu instinto de mandar e receber honrarias.            

Infelizmente, ninguém escapa da ambição. Cada qual tem as suas aspirações; até mesmo uma pessoa humilde tem as suas pequenas ambições.            

Não dá para ter boas relações com Deus sem acolhimento afetuoso das pessoas, sem ser para os outros um sinal da solicitude de Deus. E isso aparece mais quando vamos aos pequenos porque os grandes costumam estar bem servidos, independentemente dos nossos sentimentos cristãos. Os cristãos existem para ser presença do amor de Deus lá onde estão os mais esquecidos e desamparados, não para cuidar de manter a própria importância ou para se afirmar sobre a miséria dos outros. Não se trata de cálculo, de estratégia para ganhar adeptos. Trata-se de exigência fundamental do seguimento de Jesus.         

Creio que cada problema econômico seria resolvido, se os homens vivessem por aquilo que eles poderiam fazer para os outros e não por aquilo que eles poderiam tirar dos outros. Cada problema político seria resolvido, se a ambição dos homens fosse somente a de servir os outros e não para aumentar seus próprios privilégios. As divisões e as disputas que rasgam a Igreja não aconteceriam, se seus dirigentes e seus membros vivessem e trabalhassem para servir a Deus e ao próximo, especialmente os mais necessitados sem se preocupar com a posição que eles poderiam ocupar.         

Talvez tudo isto aconteça porque estamos longe demais do espírito de Jesus Cristo. Se quisermos, realmente, ser cristãos verdadeiros, devemos escutar, refletir e viver aquilo que Jesus pede no evangelho de hoje:” Quem quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos”. Que nós briguemos para servir ou para fazer o bem para os outros, e não para ser quem manda mais, pois ao servirmos aos demais, estaremos prolongando o ato de servir de Jesus nesta terra, e através os outros vão nos reconhecer não apenas pela pertença religiosa, mas principalmente pelo comportamento cristão. Em outras palavras podemos dizer o cristão se define não a partir da pertença religiosa, mas a partir do modo viver segundo os ensinamentos de Cristo que se resume no amor a Deus e ao próximo. 

Ser Cristão É Ser Educador-Servidor-Profeta 

Pela segunda vez Jesus revela aos seus discípulos sua próxima Paixão (Mc 8,31-33; 10,31-34). Ao mesmo tempo ele abandona deliberadamente a pregação à multidão (Mc 9,30) incapaz de compreendê-Lo para se dedicar exclusivamente à formação definitiva dos discípulos: “Ele não queria que ninguém soubesse disso, pois estava ensinando a seus discípulos”. 

Ensinar é uma das preocupações de Jesus nos evangelhos, especialmente no evangelho de Marcos (Mc 1,22; 4,2; 6,2; 9,31 etc..). Jesus Cristo é a Palavra divina (Jo 1,1). Jesus é a Palavra inesgotável de Deus para se comunicar com os seres humanos. Como a Palavra divina, as palavras de Jesus são sempre promessa e expressão de vida. Através de seu ato e atividade de ensinar Jesus quer que os seus ouvintes cresçam na liberdade e dignidade tendo consciência critica sobre a realidade ao seu redor (cf. Mc 1,22). Cristo é o bom Mestre, o Mestre profundamente humano que acaricia, exorta e ameaça com palavras duríssimas (Cf. Mt 11,20-24; 23, 1ss), mas humanismo não ao estilo humano e sim ao estilo divino, porque ensina fazendo-se um, encarnando-se, pondo-se à altura dos que ele quer ensinar para que se tornem pessoas realizada e sejam salvas. 

Cada cristão é chamado a ser educador-profeta. Os profetas falam em nome de Deus, são Seus porta-vozes que sacudam as consciências, levantem as vidas de mediocridade, de desesperança, do tédio e de insensibilidade. Todo profeta é educador e todo educador cristão é chamado a ser um profeta. A educação é, portanto, uma vocação de serviço. Cada cristão, cada educador cristão é chamado a transformar cada lugar, cada escola em lugares de vida nos quais se aprende a viver e conviver, a desfrutar a vida e a dignidade, a defender a vida, a combater tudo o que ameace a vida. 

Em seguida, Marcos nos relatou sobre o anúncio da Paixão, morte e ressurreição de Jesus. Ao anunciar pela segunda vez aos seus discípulos sua paixão e morte Jesus quer educá-los sobre o que significa seguir a Jesus Cristo. Mas os seus não estão dispostos a atender o que seu Mestre quer dizer ou ensinando. O que lhes preocupa é “quem será o mais importante”. Cada educador, cada mestre precisa ter paciência em ensinar ou educar. É um trabalho de serviço. Um servo está sempre disposto e disponível para atender a seu senhor.

Para acabar com a ambição dos discípulos de quererem ocupar primeiros lugares Jesus dá algumas lições (ensinar) sobre o estilo de vida para quem quiser ser seu discípulo. Jesus marca as linhas fundamentais da espiritualidade que se deve respirar qualquer comunidade cristã. A idéia-mestra é esta: “Se alguém quiser ser o primeiro, que seja o último de todos e aquele que serve a todos!”. Isto é, ser o servidor de todos. Aos olhos de Deus é realmente o primeiro aquele que se dispor a estar a serviço de todos. Não se trata de um servir com segundas intenções ou um escolher diplomático do último lugar visando promoção. Deus considera o primeiro na comunidade àquele que em seu interior, com toda a sinceridade, assume nessa comunidade uma posição de disponibilidade em relação aos outros. 

Para acentuar a lição dada aos discípulos Jesus põe uma criança (um menino) no meio deles:Em seguida, pegou uma criança, colocou-a no meio deles, e abraçando-a disse: ‘Quem acolher em meu nome uma dessas crianças, é a mim que estará acolhendo. E quem me acolher, está acolhendo, não a mim, mas àquele que me enviou’”. Jesus utiliza uma estratégia pedagógica: coloca um menino no meio e o abraça. Um menino! Uma criança! Quantas coisas diz a imagem deste menino abraçado por Jesus! É um abraço com que Deus abriga, anima e fortalece o novo começo (menino/ criança). É o abraço que envolve toda a confiança, toda a ternura, toda a proximidade do Senhor para quem quiser ser verdadeiro discípulo, e não prematuro mestre. A criança, ainda que seja capaz de mentir por medo ou por pavor, quando bem educada, ela é quase incapaz de disfarçar os seus sentimentos. Achando algo estranho ou ridículo, ela o demonstrará externamente. Pela veracidade dos seus sentimentos, ela desarmará e até incomodará os adultos. 

A figura bíblica do “menino” ou “criança” é símbolo de marginalização e indefesa. No tempo de Jesus, um menino era símbolo de ignorância, imaturidade e insignificância. Um menino era equiparava com os escravos. No entanto, por seu grau de dependência o menino se converte em preocupação permanente para seus progenitores sem os quais o menino não sobreviveria ou não receberia uma boa educação. Assim, o menor se converte no mais importante porque requer a atenção e o cuidado dos maiores. É uma lição viva de pequenez e de humildade. Ser simples é ser modesto, singelo, puro, desprovido de elementos acessórios, isento de significações secundárias, sem luxo nem ostentação. Ser humilde consiste em manifestar a virtude de conhecer suas próprias limitações. É reconhecer ser pó, mas é pó vivente, pois Deus soprou seu espírito nele que o capacita a viver na espera divina. 

Por isso, a grandeza do homem está na humildade. “Quanto mais humildes, maiores” dizia Santo Agostinho. Mas “simular humildade é a maior das soberbas”, acrescentou Santo Agostinho. A paz florescerá em qualquer comunidade cristã se seus membros fazem seu o espírito evangélico de humildade e de simplicidade. O próprio Jesus serve de exemplo, pois sua vida está na sua atitude de entrega para a salvação de todos. 

Depois que colocou a criança ou o menino no meio dos discípulos, Jesus pronunciou a seguinte frase: ““Quem acolher em meu nome uma dessas crianças, é a mim que estará acolhendo. E quem me acolher, está acolhendo, não a mim, mas àquele que me enviou”. Esta sentença nos recorda a parábola do juízo final (Mt 25,31-46) e o final do discurso missionário (Mt 10,42). Assim a criança aqui assume um sentido novo. Não é mais a criança em sentido próprio e sim o símbolo do necessitado. É o sedento, o faminto, desnudo, o prisioneiro, o marginalizado, o abandonado, o doente, o drogado e assim por diante. 

Também podemos ter dificuldades em querer entender a lição que Jesus deu aos discípulos. Tendemos a ocupar os primeiros lugares, a buscar nossos interesses, a desprezar as pessoas que contam pouco na sociedade e das pessoas que não podemos esperar grandes coisas. 

Se quisermos colaborar com Jesus Cristo e fazer algo válido na vida, temos que contar em nosso programa de vida com a renúncia e a entrega, com a humildade e a simplicidade. O desejo de poder e a busca dos próprios interesses fazem impossíveis a renúncia, a entrega e impossibilita o cristão a servir aos demais. Um cristão que não serve não serve como cristão. Uma Igreja que não serve, não serve para nada. Servir pela salvação dos demais é o centro do cristianismo. Para sermos felizes temos que fazer os outros felizes. A competitividade faz desaparecer a solidariedade, a compaixão, a igualdade, a fraternidade e a colaboração. A competitividade sempre torce para que a vida do outro não dê certo para que ele possa estar em destaque solitariamente para ser adorado pelos demais. 

Servir é adorar a Deus em ação. Servir é a oração e a adoração colocadas na prática do amor fraterno. Servir é fazer algo de bom sem esperar nada de troca ou de reconhecimento. Renunciar a ser o servidor, a ser o pequeno significa renunciar Jesus, porque somente quem acolhe sua vocação de serviço como se acolhe um pequeno (criança), acolherá Jesus e o próprio Deus que o enviou. O poder e o serviço se excluem. A ambição de poder é o câncer do serviço. O poder pode servir para muitas coisas, mas não serve para tornar bons os homens. Geralmente os maus líderes produzem os maus funcionários. Um coração corrompido é ninho de discórdia. Uma mente obcecada nunca ilumina bem os caminhos. 

Não dá para ter boas relações com Deus sem acolhimento afetuoso das pessoas, especialmente os mais desamparados, sem ser para os outros um sinal da solicitude de Deus. E isso aparece mais quando vamos aos pequenos porque os grandes costumam estar bem servidos, independentemente dos nossos sentimentos cristãos. Os cristãos existem para ser presença do amor de Deus lá onde estão os mais esquecidos e desamparados, não para cuidar de manter a própria importância ou para se afirmar através da miséria dos outros. Não se trata de cálculo, de estratégia para ganhar adeptos. Trata-se de exigência fundamental do seguimento de Jesus. O que nos faz mais humanos é o cuidado e a proteção do fraco, do necessitado, do ancião, do desvalido. Jesus nos ensinou, por sua palavra e por sua vida, que Deus se esconde e se revela no vizinho, no drogado, no doente, no pobre, no necessitado (Cf. Mt 25.31-45). A espiritualidade cristã é encontrar Deus no irmão, sobretudo, no pequeno. Trata-se de fazer-se próximo do desvalido, do desconhecido, do machucado pela vida, do fraco, dos que sentimos afastados.

P. Vitus Gustama,svd

sábado, 14 de setembro de 2024

São Mateus, Apóstolo e Enagelista-21/09/2024

SÃO MATEUS, APÓSTOLO E EVANGELISTA

SEGUIR A JESUS PARA SER SEU DISCÍPULO-MISSIONÁRIO

21 de Setembro

Leitura - Ef 4,1-7.11-13

Irmãos: 1 Eu, prisioneiro no Senhor, vos exorto a caminhardes de acordo com a vocação que recebestes: 2 Com toda a humildade e mansidão, suportai-vos uns aos outros com paciência, no amor. 3 Aplicai-vos a guardar a unidade do espírito pelo vínculo da paz. 4 Há um só Corpo e um só Espírito, como também é uma só a esperança à qual fostes chamados. 5Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, 6um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por meio de todos e permanece em todos. 7Cada um de nós recebeu a graça na medida em que Cristo lha deu. 11E foi ele quem instituiu alguns como apóstolos, outros como profetas, outros ainda como evangelistas, outros, enfim, como pastores e mestres. 12Assim, ele capacitou os santos para o ministério, para edificar o corpo de Cristo, 13até que cheguemos todos juntos à unidade da fé e do conheci mento do Filho de Deus, ao estado do homem perfeito e à estatura de Cristo em sua plenitude.

Evangelho: Mt 9,9-13

Naquele tempo: 9 Partindo dali, Jesus viu um homem chamado Mateus, sentado na coletoria de impostos, e disse-lhe: 'Segue-me!' Ele se levantou e seguiu a Jesus. 10 Enquanto Jesus estava à mesa, em casa de Mateus, vieram muitos cobradores de impostos e pecadores e sentaram-se à mesa com Jesus e seus discípulos. 11 Alguns fariseus viram isso e perguntaram aos discípulos: 'Por que vosso mestre come com os cobradores de impostos e pecadores?' 12 Jesus ouviu a pergunta e respondeu: 'Aqueles que têm saúde nóo precisam de médico, mas sim os doentes. 13 Aprendei, pois, o que significa: `Quero misericórdia e não sacrifício'. De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores'.

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No dia 21 de setembro celebramos a festa de São Mateus, Apóstolo e Evangelista. O seu nome hebraico significa "dom de Deus. A tradição da Igreja antiga concorda na atribuição a Mateus da autoria do primeiro Evangelho. Isto acontece já a partir de Papias (+140 d.C), Bispo de Hierápoles na Frígia por volta do ano 130. Ele escreveu: "Mateus reuniu as palavras (do Senhor) em língua hebraica, e cada um as interpretou como podia" (em Eusébio de Cesareia, Hist. eccl. III, 39, 16). Como Apóstolo Mateus está sempre presente nos elencos dos Doze escolhidos por Jesus para serem apóstolos (cf. Mt 10, 3; Mc 3, 18; Lc 6, 15; At 1, 13).

Mateus desempenhava a profissão de publicano (cobrador de impostos) e por isso era considerado pecador público (publicano), excluído da convivência. Mas tudo mudou quando Jesus o chamou: "Segue-me!". Não há nada que seja mais salvador para um pecador do que ouvir a chamada de Deus para viver novamente o caminho da felicidade e de salvação. Mateus experimentou isso. E Mateus respondeu prontamente ao chamado: ele se levantou e seguiu a Jesus. De cobrador de impostos tornou-se imediatamente discípulo de Cristo. De "último" passou a ser "primeiro", graças à lógica de Deus que amou a todos de igual maneira! A base da chamada de Deus é amor, e o amor desconhece a discriminação. Nisto percebemos que os planos humanos são totalmente diferentes do plano de Deus: "Os meus projetos não são os vossos projetos e os vossos caminhos não são os meus caminhos", diz o Senhor (Is 55, 8). Se dependesse dos planos humanos (especialmente dos fariseus e escribas) Mateus, como um publicano, jamais poderia ser discípulo do Senhor. O encontro de Jesus com Mateus, o publicano, foi um escândalo para os escribas e fariseus que andavam espiando os passos de Jesus para colocá-Lo contra o povo. Mas o Senhor chama a quem Ele quiser para estar com Ele a fim de ser seu discípulo/Apóstolo. E Mateus, que sem dúvida nenhuma, havia visto e ouvido Jesus pregando em várias ocasiões, se decidiu a abandonar seu posto de trabalho de publicano para seguir, definitivamente, a Jesus até a morte. Desde então, a casa de Mateus em Cafarnaum foi escolhida por Jesus para descansar de suas excursões apostólicas na Galileia.

Mateus é um cristão de origem judaica. Seu conhecimento do Antigo Testamento (AT), suas citações literais do AT (ao todo 44), suas alusões ao AT (cerca de 130), seus hebraísmos ou aramaísmos (cerca de 329) mostram claramente que se trata de um judeu convertido ao cristianismo. Mateus escreveu seu evangelho em língua grega entre anos 80-85 depois de Cristo, provavelmente em Antioquia da Síria, uma das mais importantes cidades do Império romano (500.000 habitantes), cidade conhecida por suas escolas, a cidade que, após a destruição de Jerusalém, se tornou a mãe das igrejas e centro de expansão do Cristianismo. Foi ali que, pela primeira vez, os discípulos de Jesus foram designados como “cristãos” (cf. At 11,26. E foi de Antioquia que Paulo e seus companheiros empreenderam as três viagens missionárias (cf. At 13,1-3). Destinatários do seu evangelho são cristãos convertidos do judaísmo e cristãos convertidos do gentilismo (paganismo). Isso indica que a comunidade destinatária é mista. O evangelho de Mateus possui 28 capítulos com um total de 1.068 versículos e 18.278 palavras.

O Evangelho de Mateus ocupa o primeiro lugar na sequência atual dos livros do Novo Testamento, porque o evangelho de Mateus foi o Evangelho mais lido, mais comentado, mais rezado e mais divulgado nos dois primeiros séculos do Cristianismo. Mateus é o evangelho preferido da Igreja dos primórdios. “De todos os escritos do Novo Testamento, o Evangelho de Mateus foi o que exerceu a influência mais generalizada e profunda na literatura cristã que vai até as últimas décadas do século II” (E. Masseax). Prova disto é o uso de Mateus feito pela Didaquê, o primeiro catecismo cristão escrito entre os anos 90-100 depois de Cristo: o Pai-Nosso que ali encontramos se baseia sobre Mt 6,9-13 (e não sobre Lc 11,2-4); os seis primeiros capítulos de Didaquê são profundamente influenciados pelo Sermão da Montanha (Mt 5,1-7,29). Prova desta mesma influência são os numerosos comentários que surgiram sobre Mateus nos primeiros séculos: Hipólito de Roma (+235 d.C); Orígenes (+254 d.C); Santo Ambrósio (+397 d.C), São Jerônimo (+420 d.C); Santo Agostinho (+ 430 d.C) e assim por diante. Somente a partir do século III, o Evangelho de Lucas começou a ser aceito por todas as comunidades. Dai porque as festas da Ascensão e Pentecostes (que constam apenas em Lucas) apareceram pelo ano 350 d.C.

Mateus é representado por um anjo ou homem alado como símbolo de seu evangelho porque inicia o seu evangelho com a genealogia de Jesus Cristo, mostrando a sua origem e descendência humanas, marcados pelo seu nascimento (Cf. Mt 1). É a dimensão da obra-prima de Deus que criou o homem à sua imagem e semelhança. São Mateus é simbolizado pelo anjo com rosto de homem, porque seu Evangelho se preocupa em comprovar a natureza humana de Cristo.

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O texto do evangelho proclamado na festa de São Mateus nos relatou que depois da cura do paralítico Jesus se encontrou com Mateus, cobrador de impostos e o chamou para segui-lo: “Segue-me!”. Trata-se de um homem que o povo detesta, pois é um colaborador do governo romano na cobrança de impostos. Os publicanos se enriquecem, especialmente, a custo dos pobres. Por isso, é uma profissão odiada.

Qualquer pessoa pode perguntar-se: “Como pode Deus estar presente em certos ambientes, como o de Mateus, especialmente tão repugnantes, maus ou perversos, em certas situações injustas como a vida vivida pelo publicano Mateus?”. Deus se encontra ali para curar, para salvar: “Quero misericórdia e não sacrifício”. Todo o Evangelho, quando se trata de Deus, nos urge que saibamos ultrapassar a noção de justiça e descobrir a Misericórdia infinita de Deus pelos pecadores. Deus não se cansa de perdoar e de se encontrar com os pecadores, os perdidos da vida para salvá-los, pois Jesus, o Deus-Conosco, veio para chamar e salvar os pecadores.

Como Jesus transformou os pescadores de peixes em pescadores de homens, assim também transformou um cobrador de impostos, um pecador público num “escriba do Reino de Deus”, num discípulos e mais ainda, num apóstolo.  Quem entra na esfera de Jesus deixa de ser como antes. Por isso, é preciso definir a que seguimos e a quem seguimos na vida para antecipar qual resultado final deste seguimento?

Jesus chama Mateus para segui-lo: “Segue-me” (Mt 9,9). E ele o segue (Mt 9,9). Ele diz a mesma coisa para Simão e André (Mt 4,19) e para Tiago e João (Mt 4,21). O termo “seguir” (akoloutheo, em grego) aparece 90 vezes no NT, das quais 11 vezes se encontram fora dos Evangelhos (em Atos, 4 vezes; em Ap, 6 vezes; e o resto em 1Cor 10,4). Nos evangelhos este termo se refere ao seguimento de Jesus (no total 73 vezes).          

O verbo “seguir”, em sentido próprio, significa “ir atrás de alguém”; e no sentido figurado significa “ser discípulo”, “ir em seguimento de alguém”. Seguir significa andar, avançar, ver mais, aprender mais. Quem andar, quem caminhar vai encontrar muita coisa no caminho. Quem fica parado e paralisado vê menos.         

Seguir a Jesus significa romper todo o passado, abandonar tudo (cf. Mt 4,18-22;9,9s;19,21; Lc 9,61; Mc 10,28), submetendo-se com fé e obediência à salvação oferecida em Cristo. Seguir também tem sentido de imitação. Neste sentido seguir significa unir-se com Jesus numa comunhão de vida e de destino; é modelar-se segundo o exemplo de Jesus (cf. Jo 13,15.34;15,12;1Ts 1,6;1Cor 11,1;Ef 5,2;1Jo 2,6 etc.). Assim, seguir a Jesus não é apenas aderir a um ensinamento moral e espiritual, mas compartilhar sua sorte. Por isso, Jesus exige o desapego total: renunciar às riquezas e à segurança, deixar os familiares (Mt 8,19-22;10,37;19,16-22), sem esperar o retorno (troca ou retribuição). Ao exigir de seus discípulos um tal sacrifício, Jesus se revela como Deus, única garantia, e revela integralmente até que ponto vão as exigências de Deus. Pode ser que seja até o sacrifício da cruz e até se sentir abandonado pelos outros, como Jesus sentiu (Mt 26,56).         

A partir deste sentido, somos convidados a refletir sobre o nosso seguimento de Cristo. Até que ponto nós estamos dentro deste padrão? Em outras palavras, o que significa para nós hoje seguir a Jesus? Para responder esta pergunta, devemos responder outra pergunta: quem é Jesus a quem seguimos?          

Seguir a Jesus é viver a sua vida. E a vida de Jesus foi marcada particularmente por amor ao Pai e aos homens, especialmente aos mais necessitados. Seu relacionamento profundo com o Pai se traduz na prática da solidariedade com os marginalizados e pecadores. Seguir a Jesus é viver segundo o seu projeto. Ele quer que as relações humanas e sociais se baseiem sobre a justiça, o amor, a fraternidade e o perdão. Tudo isso se tornará realidade, se o homem se descobrir como filho de um Pai amoroso. Seguir a Jesus é estar pronto para viver o Seu destino. Viver segundo o projeto de Jesus leva o seguidor a viver o martírio. O martírio é o preço a pagar pela fidelidade à causa jamais traída. Quem se propõe a seguir a Jesus deve estar pronto também para viver a bem-aventurança das perseguições (Mt 5,10s). 

Ao ouvir a chamada do Senhor Mateus prontamente aceitou o convite. Não só a prontidão para seguir a Jesus, mas a prontidão para limpar seu coração de toda a maldade praticada, pois ele era um cobrador de impostos e por isso, era um ladrão diplomado, pecador público, ladrão do bem comum. Ele deixa seu coração livre e limpo para que o Senhor possa usá-lo para o bem do seu Reino. O fruto maior de sua conversão para nós hoje é o evangelho que ele escreveu sobre a vida de Jesus: O evangelho de Mateus. Através do seu evangelho conhecemos o Jesus em quem acreditamos, como Emanuel, Deus Conosco (Mt 1,23; 18,20; 28,20).

Hoje é o dia mais adequado para recordar nosso particular “segue-me”. É o dia em que celebramos uma festa por nosso nome, pois Deus nos chama pelo nome. Diante de Deus cada um tem nome e Deus chama cada um pelo nome (cf. Is 43,1; Jo 10,3). É o dia adequado para recordar a maneira que Deus chamou cada um de nós. O seguimento é a expressão prática da fé/adesão. Mas temos que estar conscientes de que esse chamamento é permanente. Quem não tem tempo para ouvir Deus permanentemente, vai ouvir somente desgraças dos outros e do mundo. Quem não presta para Deus, não presta para os outros. Mas quem presta para os outros é porque no seu coração mora Deus, mesmo que ele não tenha nenhuma religião. Temos que confessar que o que determina a nossa salvação não é aquilo que rezamos, pois pode acontecer que façamos apenas monólogos nas nossas orações. A oração feita é um compromisso assumido para viver de acordo com o Espírito de Deus. Ninguém crê impunemente. O que determina nossa salvação é o nosso comportamento diário, nossa maneira de viver e de conviver de acordo com o bem praticado (cf. Mt 25,31-46).

Quero Misericórdia, Não Sacrifício

O evangelista Mateus relata que “Alguns fariseus viram isso e perguntaram aos discípulos: 'Por que vosso mestre come com os cobradores de impostos e pecadores?'”. Os fariseus acham que os pecadores não podem misturar com os outros. Eles devem ficar isolados da comunidade, especialmente os publicanos.

Diante dessa crítica Jesus afirma: “Quero misericórdia e não sacrifício. De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores”. A lei denuncia o pecado e pune o pecador. O Senhor Jesus, por causa  de sua misericórdia, rejeita o pecado e acolhe o pecador. Deus é amor; Ele não é lei; Deus não punição e sim perdão e remédio. A nossa miséria fica pequena diante do tamanho da misericórdia de Deus por nós. Deus ama mais o pecador, porque necessita mais de sua misericórdia. O doente, quanto mais doente, mais tem direito ao médico. O pecado não exclui desde que o pecado se converta. Quanto mais longe fica de Deus um pecador, mais tem direito para a misericórdia de Deus.

A misericórdia é o mistério do Pai em seu ser divino. A misericórdia é a face que o amor de Deus Pai assume por nós. Para a  criação inteira, e sobretudo, para o ser humano, sua criatura espiritual, o amor do Pai se revela como benevolência. 

A questão não é, portanto, como” ganhar” ou “conquistar” o amor de Deus. A verdadeira questão, a questão primeira e última, é como conhecer, acolher e experimentar esse amor primeiro de Deus. Em outras palavras, a questão é: como deixar-se amar por Deus. Amar a Deus é deixar-se amar por Ele.

P. Vitus Gustama,svd

20/09/2024-Sextaf Da XXIV Semana Comum

HOMENS E MULHERES SÃO CHAMADOS A SER EVANGELIZADORES

Sexta-Feira da XXIV Semana Comum

Primeira Leitura: 1Cor 15,12-20

Irmãos, 12 ora, se se prega que Cristo ressuscitou dos mortos, como podem alguns dizer entre vós que não há ressurreição dos mortos? 13 Se não há ressurreição dos mortos, então Cristo não ressuscitou. 14 E se Cristo não ressuscitou, a nossa pregação é vã e a vossa fé é vã também. 15 Nesse caso, nós seríamos testemunhas mentirosas de Deus, porque teríamos atestado — contra Deus — que ele ressuscitou Cristo, quando, de fato, ele não o teria ressuscitado — se é verdade que os mortos não ressuscitam. 16 Pois, se os mortos não ressuscitam, então Cristo também não ressuscitou. 17 E se Cristo não ressuscitou, a vossa fé não tem nenhum valor e ainda estais nos vossos pecados. 18 Então, também os que morreram em Cristo pereceram. 19 Se é para esta vida que pusemos a nossa esperança em Cristo, nós somos — de todos os homens — os mais dignos de compaixão. 20 Mas, na realidade, Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram.

Evangelho: Lc 8,1-3

Naquele tempo: 1 Jesus andava por cidades e povoados, pregando e anunciando a Boa Nova do Reino de Deus. Os doze iam com ele; 2 e também algumas mulheres que haviam sido curadas de maus espíritos e doenças: Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete demônios; 3Joana, mulher de Cuza, alto funcionário de Herodes; Susana, e várias outras mulheres que ajudavam a Jesus e aos discípulos com os bens que possuíam.

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Crer Na Ressurreição É Crer Na Vida Que Não Conhece a Morte

Se Jesus Cristo não ressuscitasse, seria vã a nossa pregação e seria vã também a vossa fé”, disse são Paulo aos Coríntios.

Os Coríntios acreditam na imortalidade da alma, segundo a filosofia grega. Mas eles negam a possibilidade da ressurreição dos mortos. Para o pensamento grego é impensável que o corpo que eles desprezam e o consideram como o cárcere da alma, possa ser transformado para uma vida nova. Muitos membros da comunidade de Corinto seguem este pensamento.

São Paulo faz, então, um ataque forte contra esses cristãos na Comunidade de Corinto.  Para são Paulo negar a ressurreição dos mortos é negar a ressurreição de Cristo com são Paulo encontrou a caminho de Damasco (At 9,1-9). Como se são Paulo quisesse dizer aos Coríntios: Eu vi pessoalmente Cristo ressuscitado. Como é que  eu negaria o meu encontro pessoal com o Ressuscitado? Em outras palavras, são Paulo quer afirmar para os Coríntios a certeza da ressurreição por causa do próprio Ressuscitado, Jesus Cristo. Daqui podemos entender a afirmação de são Paulo ao escrever: “Se Jesus Cristo não ressuscitasse, seria vã a nossa pregação e seria vã também a vossa fé”. Negar a ressurreição de Cristo é negar nossa fé e nossa salvação, pois quem nos salva é Cristo. No texto do dia anterior são Paulo reafirmava a verdade central da fé, que Cristo ressuscitou. Hoje prossegue seu raciocínio: nosso destino, como seguidores de Cristo é o mesmo que o destino de Cristo. Para são Paulo nossa sorte está tão intimamente à de Cristo. Se Cristo ressuscitou, segui-Lo vale a pena.

A convicção na ressurreição, a parte central de todo nosso Credo e da Boa Notícia que Deus anuncia à humanidade é o que dá sentido e enche de esperança nossa vida: Cristo ressuscitou e nós também estamos destinados, ainda que não saibamos como, à vida eterna, como Cristo e com Ele.

Se não ressuscitássemos, tampouco Cristo. Se Cristo não ressuscitasse, tampouco nós. Mas o grito de são Paulo, que é também nosso grito, já desde mais de dois mil anos: Cristo ressuscitou e nós vamos ressuscitar também como Ele. Cristo ressuscitou dentre os mortos, o Primeiro de todos!

Nós mesmos temos que crer nesta fé, pois a fé na ressurreição nos dará ânimos para tudo. E por isso, vale a pena comunicarmos esta fé para os outros. Esta fé é que mais pode nos ajudar a vivermos esta vida com um norte cheio de esperança. A partir de Cristo Ressuscitado e a partir da fé n´Ele, a última palavra não vai ser a morte, e sim a vida, e a felicidade plena na presença de Deus. Se não fosse verdade isto, não valeria a pena seguirmos a Jesus Cristo. A partir da ressurreição do Senhor em quem acreditamos não vivemos mais para morrer e sim morremos para viver; a vida não pertence mais à morte e sim a morte pertence à vida.

É uma reflexão que não somente devemos recordar quando celebramos as exéquias de nossos seres queridos e sim, sempre, pois é a verdadeira fonte e a verdadeira força para continuar nossa luta pela dignidade de cada ser humano. A fé na ressurreição dá tom pascal para toda nossa vida: trata-se de um tom sério e cheio de confiança ao mesmo tempo. Na Eucaristia que celebramos já antecipamos de alguma maneira esta vida definitiva, pois celebramos a ressurreição do Senhor em cada Eucaristia e portanto, nossa futura ressurreição. “Quem come minha carne e bebe meu sangue tem a vida eterna”.

Homens e Mulheres São Chamados a Ser Evangelizadores

Jesus andava por cidades e povoados, pregando e anunciando a Boa Nova do Reino de Deus. Os doze iam com ele; e também algumas mulheres”: Maria, chamada Madalena, Joana, mulher de Cuza, alto funcionário de Herodes; Susana, e várias outras mulheres que ajudavam a Jesus e aos discípulos com os bens que possuíam”.

O evangelista Lucas se detém para apresentar a pequena comunidade itinerante, que serve como modelo para a vida da Igreja para a qual ele dirige seu evangelho. Jesus é acompanhado pelos “Doze” que intencionalmente foram escolhidos através de uma oração a noite inteira (cf. Lc 6,12-16). Mas Lucas também menciona de próposito algumas mulheres com seus nomes que acompanham o ministério de Jesus. Mais adiante, em Lc 10,39, Lucas vai dizer que entre os discípulos há também discípulas. Uma dessas discípulas é Maria, irmã de Marta, pois a expressão “Maria ficou sentada aos pés do Senhor” significa que Maria é discípula. “Ficar sentado aos pés de um mestre” significa “ser discípulo” (veja At 22,3: Paulo era o discípulo de Gamaliel).

As mulheres tiveram um grande papel na comunidade primitiva (Rm 16,1;  At 1,14; 12,12; 16,13s; 17,4.12.34). A própria Maria, Mãe do Senhor, modelo da Igreja e do fiel, figura do povo de Deus, a filha de Sião, aquela que gurada a Palavra de Deus nos seu coração é apresentada nos dois primeiros capítulos do Evangelho de Lucas. Maria escuta as Sagradas Escrituras e torna-se a esposa do Espírito Santo que gera a vida nova; é a nova Eva, mãe dos viventes. Os rabinos não admitiam as mulheres no círculo dos discípulos (veja Jo 4,27).

Em outras palavras, o evangelista Lucas afirma que, com os Doze, havia um grupo de mulheres que seguiam a Jesus. O evangelista Lucas é o único que menciona os nomes das mulheres que acompanhavam Jesus ao longo de suas viagens ou na sua missão itinerária. Essas mulheres são um bom símbolo das incontáveis mulheres que ao longo dos séculos deram na Igreja testemunho de uma fé rica e generosa: religiosas, leigas, missioneiras, catequistas, ministras extraordinárias da comunhão eucarística, as celebrantes, as mulheres testemunhas qualificadas para o matrimônio,  mães de família, enfermeiras, doutoras, mestras e assim por diante, que ajudaram Jesus em vida e que colaboraram eficazmente na missão da Igreja, cada uma a partir de sua situação, entregando seu tempo, seu trabalho e também sua ajuda econômica. Temos que agradecer a Deus pelo empenho de tantas mulheres na missão evangelizadora. O papel das mulheres na Igreja de Jesus hoje em dia já um fato incontestável.

Lucas é designado como “o Evangelho das mulheres”. Ele dá atenção e valoriza a mulher, precisamente por ela ser como “menor”, “pobre”. Por não ser valorizado a mulher fazia parte dos “pequenos” e marginalizados. Entre os quatro evangelistas, Lucas é aquele que mais dignifica, valoriza, enaltece e exalta o papel da mulher.

Para Deus Eu Tenho Nome e Sou Chamado Pelo Nome

Maria Madalena, Joana e Suzana! São nomes das mulheres, segundo o texto do evangelho deste dia, que também acompanhavam Jesus no seu trabalho de levar a Boa Nova para todos, especialmente para os excluídos da sociedade. Uma é casada, Joana, a mulher de Cuza, alto funcionário de Herodes. Outra é uma mulher renascida à vida nova graças à intervenção de Jesus que a resgatou da morte (libertada de sete demônios, segundo o evangelho), Maria Madalena. E a terceira, Suzana, é uma discípula da qual somente sabemos seu nome, mas que estava lá.

Maria Madalena, Joana e Suzana! Para o evangelista Lucas é muito importante mencionar seus nomes. Ter nome é ter dignidade, é ser gente! Ter nome é ser alguém e não ser número. É ser pessoa. Ter nome é ter personalidade. Chamar alguém e ser chamado pelo nome é sinal de intimidade. Entre dois amigos os títulos ficam de lado; cada um é chamado pelo nome. Em casa cada um tem seu nome e é chamado pelo nome e não pelo titulo. Para Deus eu tenho nome e Deus me chama pelo nome: “Eu te chamo pelo nome, és meu” (Is 43,1). E que meu nome está gravado na palma da mão de Deus e por isso, Ele jamais me esquecerá: “Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não tem ternura pelo fruto de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, eu não te esquecerei nunca. Eis que estás gravado na palma de minhas mãos” (Is 49,15-16). Deus nunca pode olhar Sua mão sem ver o meu nome. E meu nome quer dizer EU mesmo. Sou feliz por eu ser o que sou para Deus. Para sociedade em geral posso não ter nome, mas para Deus eu tenho nome. Eu sou uma pessoa e não um número para Deus. Quantas vezes saia dos lábios de Jesus os seguintes nomes: Maria Madalena, Joana, Suzana. Jesus as chamava pelo nome.

Diante de Deus Todos São Iguais

Maria Madalena, Joana e Suzana são seguidoras de Jesus junto com os doze Apóstolos. Esta frase tinha um grande peso para a sociedade da época de Jesus.

Na Palestina a estrutura social era patriarcal. Ou na linguagem mais popular: uma sociedade machista. O pai era o único que tinha direito de dispor, dar ordens, castigar, pronunciar as orações, oferecer os sacrifícios. A mulher era considerada em tudo inferior ao homem. Ela pertence completamente ao seu “dono”: ao pai, se for solteira; ao marido, se for casada; ao cunhado solteiro, se for viúva sem filhos (Dt 25,5-10).       

No Templo e na sinagoga homens e mulheres ficavam rigorosamente separados: as mulheres sempre em lugares inferiores, secundários. O culto na sinagoga era celebrado apenas caso houvesse ao menos 10 homens. As mulheres não contavam, por mais numerosas que fossem.  

A mulher não podia atuar como testemunha num tribunal, nem como testemunha de acusação. Apoiando-se em Gn 18,11-15, consideravam que seu testemunho carecia de valor por causa de sua inclinação à mentira. Os rabinos da época excluíam as mulheres do circulo de seus discípulos.

Jesus se levanta contra esse sistema sociorreligioso, dominante e opressivo para a mulher. Com sua atuação concreta, Jesus dá à mulher o seu devido lugar na vida social e religiosa. Para sua época essa atitude era considerada revolucionária e audaciosa! O que tem por trás da atitude de Jesus é o amor. E o amor é capaz de fazer até o impossível (cf. Jo 3,16). Tendo acompanhado Jesus desde o começo de seu ministério público, como os Doze, as mulheres discípulas eram iguais aos homens para o anúncio da Boa Nova (cf. Jo 4,28-29). Para Jesus, a mulher tem a mesma dignidade, categoria e direitos que o homem. Por isso, Jesus admite em sua comunidade homens judeus e mulheres judias com os mesmos direitos de aprender, de ser discípulos-discípulas, seguidores-seguidoras de Jesus pelo Reinado de Deus. As exigências e responsabilidades do seguimento são iguais para todos, homens e mulheres. A tradição nos relata que as primeiras aparições do Ressuscitado foram feitas para as mulheres (Lc 24,10) e precisamente às que Lucas anota no texto do evangelho deste dia.

Que belo é ver como desde as origens apostólicas, Jesus conta com as mulheres em plano de igualdade. Não faz plano machista do seguimento. Cria uma comunidade mista.

As mulheres não são meras assistentes dos homens e sim autênticas protagonistas da vida e missão da Igreja. Atuar de outra maneira é infidelidade ao Senhor que desde o princípio contou com elas. Elas serviam, punham seus bens ao serviço de Jesus e sua missão.

A Palavra de Deus de hoje quer nos enfatizar que todos, mulheres e homens, são chamados de igual maneira a proclamar a Boa Notícia. O Reino de Deus é uma Boa Notícia. No meio da superabundância de notícias ruins, o cristão e a cristã, a exemplo de Cristo, devem pregar a Boa Notícia. Martin Luther King dizia que o grande problema não é o avanço da maldade ou do mal, mas o silêncio dos bons. Em certo sentido, ficar calado pode ser até uma manifestação da prudência. Mas se ficar calado diante da maldade pode significar a cumplicidade.

Homens e mulheres são chamados a colaborar na evangelização a partir de seu próprio talento e de outras contribuições como as três mulheres citadas no evangelho deste dia. Assim um completa o outro para uma perfeita evangelização. Victor Hugo escreveu que o homem e a mulher se complementam para edificar a dignidade de um ser humano. Evangelizar significa dignificar a vida humana. Deveríamos ser mais abertos em nossa ideia teológica e social da Igreja. A Igreja do Senhor é de todas as pessoas de boa vontade para levar adiante a causa de Jesus: homens e mulheres, jovens e adultos, crianças e adolescentes. Não só de uma etnia, mas pluralista. Todos os cristãos temos algo em comum: fé e ação evangelizadora. “Todo aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt 12,49-50).

P. Vitus Gustama,svd

XXV Domingo Comum, Ano "B",22/09/2024

SERVIR OS OUTROS PARA SALVÁ-LOS É O ESTILO DE VIDA DO CRISTÃO   A EXEMPLO DE CRISTO JESUS XXV DOMINGO DO TEMPO COMUM B                    ...