Domingo,17/01/2016
ELES NÃO TÊM MAIS VINHO
II DOMINGO DO TEMPO COMUM ANO “C”
I Leitura: Is 62,1-5
1 Por amor de Sião não me calarei, por amor de
Jerusalém não descansarei, enquanto não surgir nela, como um luzeiro, a justiça
e não se acender nela, como uma tocha, a salvação. 2 As nações verão a tua
justiça, todos os reis verão a tua glória; serás chamada com um nome novo, que
a boca do Senhor há de designar. 3 E serás uma coroa de glória na mão do
Senhor, um diadema real nas mãos de teu Deus. 4 Não mais te chamarão
Abandonada, e tua terra não mais será chamada Deserta; teu nome será Minha
Predileta e tua terra será a Bem-Casada, pois o Senhor agradou-se de ti e tua
terra será desposada. 5 Assim como o jovem desposa a donzela, assim teus filhos
te desposam; e como a noiva é a alegria do noivo, assim também tu és a alegria
de teu Deus.
II Leitura: 1Cor 12,4-11
Irmãos: 4 Há diversidade de dons, mas um mesmo é o
Espírito. 5 Há diversidade de ministérios, mas um mesmo é o Senhor. 6 Há
diferentes atividades, mas um mesmo Deus que realiza todas as coisas em todos. 7
A cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum. 8 A um é
dada pelo Espírito a palavra da sabedoria. A outro, a palavra da ciência
segundo o mesmo Espírito. 9 A outro, a fé no mesmo Espírito. A outro, o dom de
curas no mesmo Espírito. 10 A outro, o poder de fazer milagres. A outro,
profecia. A outro, discernimento de espíritos. A outro, falar línguas
estranhas. A outro, interpretação de línguas. 11 Todas estas coisas as realiza
um e o mesmo Espírito, que distribui a cada um conforme quer.
Evangelho: Jo 2,1-11
Naquele tempo, 1houve um casamento em Caná da
Galileia. A mãe de Jesus estava presente. 2Também Jesus e seus discípulos
tinham sido convidados para o casamento. 3Como o vinho veio a faltar, a mãe de
Jesus lhe disse: “Eles não têm mais vinho”. 4Jesus respondeu-lhe: “Mulher, por
que dizes isto a mim? Minha hora ainda não chegou”. 5Sua mãe disse aos que
estavam servindo: “Fazei o que ele vos disser”. 6Estavam seis talhas de pedra
colocadas aí para a purificação que os judeus costumam fazer. Em cada uma delas
cabiam mais ou menos cem litros. 7Jesus disse aos que estavam servindo: “Enchei
as talhas de água”. Encheram-nas até a boca. 8Jesus disse: “Agora tirai e levai
ao mestre-sala”. E eles levaram. 9O mestre-sala experimentou a água, que se
tinha transformado em vinho. Ele não sabia de onde vinha, mas os que estavam
servindo sabiam, pois eram eles que tinham tirado a água. 10O mestre-sala
chamou então o noivo e lhe disse: “Todo mundo serve primeiro o vinho melhor e,
quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu
guardaste o vinho bom até agora!” 11Este foi o início dos sinais de Jesus. Ele
o realizou em Caná da Galileia e manifestou a sua glória, e seus discípulos
creram nele.
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1. “Sinais” de Jesus
O evangelista João
jamais emprega a palavra milagre (dýnamis, grego, como ato de poder e de força)
que aparece com muita frequência nos sinóticos. Em vez disso, ele usa o termo
“sinal” (seméion, grego). Este
termo pertence ao vocabulário técnico do quarto evangelho, onde aparece 17
vezes, sobretudo na primeira metade. Em João, “sinal” é ação/obra realizada por
Jesus que, sendo visível, leva por si ao conhecimento de realidade superior. O
“sinal” remete a outra coisa. Os “sinais joaninos”, porém, não somente apontam
para uma realidade que está além da coisa ou acontecimento visível, mas contém
já em si mesmos a realidade significada. Eles são, de certo modo, uma
manifestação da “glória” de Jesus. Enquanto o milagre, pelo poder surpreendente
que ele força a constatar, tem por função orientar em direção à pessoa e à
dignidade do seu autor. O “sinal” visa a outra realidade além de si mesmo, ele
é considerado menos em si do que na sua relação com as testemunhas: o gesto
realizado as convida a deduzir uma consequência para além do significante. Este
termo joanino inclui sempre dois aspectos: demonstrativo, o sinal suscita a fé
dos discípulos em Jesus; expressivo, ele manifesta a glória daquele que o
opera. Encontram-se no Evangelho de João sete sinais de Jesus(2,1-11: bodas de
Caná;4,46-54: a cura do filho do funcionário real;5,1-9: a cura do
paralítico;6,1-15: a partilha dos pães;6,16-21: Jesus caminha sobre as
águas;9,1-41: a cura do cego de nascença;11,1-44: a reanimação de Lázaro). Por
isso, a primeira parte do Evangelho de João(1,19-12,50) chama-se o livro dos
sinais. Enquanto a segunda parte (13,1-20,29) chama-se o Grande Sinal que fala
da paixão, morte e ressurreição de Jesus.
O objetivo
principal de todos os sinais relatados no Quarto Evangelho é a fé, como João
deixa claro no final: os sinais feitos por Jesus foram escritos “para que acrediteis que Jesus é o Cristo, o
Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida eterna em seu nome” (Jo
20,31). Isto quer nos dizer que diante dos sinais operados por Jesus é
necessário tomar uma decisão (Jo 7,31;9,16;11,47). Sem tomar uma decisão
positiva (crer em Jesus), os sinais se tornarão juízo de acusação contra os que
se mostram incrédulos (cf. Jo 12,37ss).
João propriamente
não fala de fé: o substantivo “fé” não existe no seu Evangelho; aparece somente
o verbo “crer/acreditar” pelo menos 98 vezes (ao passo que o encontramos apenas
54 vezes em Paulo, que é o apóstolo da fé. Mas a palavra “fé” aparece pelo
menos 150 vezes nas suas cartas). João usará a palavra “fé” uma vez apenas, na
primeira carta, quando afirma: “O que
vence o mundo é a nossa fé” (1Jo 5,4). De outro lado, o verbo “crer”
aparece com frequência precisamente nos lugares privilegiados, no sentido de que
quase todo episódio tem esta estrutura: manifestação de Jesus- resposta de fé
ou de incredulidade dos ouvintes.
Por isso, o
objetivo único e central do crer é Jesus, na concretude de sua vinda do Pai como Filho e na sua iniciativa de
salvação pela qual nos leva ao Pai. Basta observar que o verbo “crer” aparece
33 vezes sozinho, 12 vezes em contexto do tipo “crer em Jesus, ou crer nas suas
palavras”, 36 vezes em contexto do tipo “crer nele”. O crer se qualifica, pois,
como um ato que nos coloca em relação imediata com a pessoa de Jesus e com o
seu mistério.
2. Primeiro Sinal de Jesus e
Seu Sentido
2.1. O Primeiro Sinal Acontece
Numa Festa De Casamento: O Que Representa?
O episódio de Caná,
isto é, o primeiro sinal de Jesus, acontece num casamento/bodas(gamos, em
grego). Na linguagem bíblica/teológico- simbólica, o casamento/bodas é símbolo
da aliança com Deus, sublinhando a relação de amor e fidelidade entre Deus e o
povo(Is 49,14-26;54,48;62,4-5;Jr 2;Ez 16). A eleição do povo e a aliança foram
expressão do amor de Deus por ele(Dt 4,37;7,7s;10,15). Os profetas usaram muitas vezes a imagem de
casamento para falar do amor mútuo entre Deus e Israel(Is 62,4-5;Os 2,18-22).
Portanto, o casamento em Caná é simbólico. O verdadeiro esposo da humanidade é
Jesus(3,29), pois foi assim que João Batista o anunciou(cf. 1,15.27.30). E toda
a Igreja é uma esposa.
2.2. O Casamento Ocorre No
“Terceiro Dia”
A narração é introduzida
pela fórmula “no terceiro dia” depois do encontro de Jesus com Filipe e
Natanael (cf. Jo 1,35-51). O modo como começa o relato deste primeiro sinal
evoca toda a vida pública de Jesus até sua morte e ressurreição “no terceiro
dia” (cf. Jo 2,19-21;1Cor 15,3ss;Mt 12,40;16,21;17,22;20,19;Mc 9,31 etc. veja
também como alusão Ex 19,11.16) quando ele manifestará plenamente sua “glória”
para que todos possam crer nele. O terceiro dia é, com efeito, o dia da
ressurreição, da plena manifestação da glória. Esta “glória” tem o lugar
de destaque no relato que de alguma
maneira é antecipada. As núpcias de Caná antecipam no sinal o acontecimento
pascal como acontecimento de aliança nupcial que é cumprimento e superação da
aliança do Sinai. O sinal de Caná revela Jesus como o esposo divino do novo
povo de Deus com o qual ele faz a aliança nova e definitiva em seu mistério
pascal. É a virada decisiva da história da salvação na qual a mãe de Jesus tem
um papel, o papel que o evangelista quis mostrar.
2.3. A Mãe De Jesus Percebe A
Falta De Vinho: Um Olhar Contemplativo
No evangelho de
João a mãe de Jesus (Maria) aparece somente duas vezes, mas nos momentos mais
importantes. Maria, em primeiro lugar, atua na realização do primeiro sinal de
Jesus, no momento em que Jesus inaugura sua missão pública, como lemos no
evangelho deste domingo (Jo 2,1-11). Em segundo lugar, Maria permanece ao pé da
cruz, no momento da morte de Jesus, no final de sua missão nesse mundo (cf. Jo
19,25-27). A cena da mãe ao lado da cruz e as palavras dirigidas por Jesus
agonizante a ela e ao discípulo amado contém denso valor simbólico: deduz-se
isso, antes de tudo, da alusão ao primeiro sinal de Caná, feita mediante a
mesma presença da “mãe de Jesus” (Jo 2,1 e 19,25), chamada também aqui
“mulher”(Jo 2,4 e 19,26), e mediante a recordação da “hora” (Jo 2,4 e 19,27: A
partir dessa hora...”).
O evangelista João
quer nos dizer que Maria tem um lugar especial no seu evangelho, pois ela se
faz presente nos momentos mais importantes da vida e da missão de Jesus. Tudo
que se prefigura no primeiro sinal se cumpre na cena da mãe de Jesus ao lado da
cruz.
Nas núpcias de Caná
“estava ali a mãe de Jesus”. Para o evangelista João, a figura da mãe de Jesus
é central, pois a partir dela é que a atenção se projetará sobre Jesus. A
manifestação da glória de Cristo passa através da mãe.
Na festa de
casamento em Caná, ou seja, na antiga aliança faltou vinho. O vinho, na
Bíblia, simboliza/representa o amor (cf. Ct 1,2;7,10;8,2). A antiga aliança,
portanto, não tem mais sentido, pois o amor foi substituído pela Lei. Os seis
enormes potes de pedra que serviam para os ritos de purificação dos judeus (v.6),
representam a falta de amor na relação com Deus. Além disso, estão vazios, ou
seja, não têm mais nada a dar.
A mãe de Jesus
reconhece isso, pois em vez de se dirigir ao organizador da festa, vai
diretamente a Jesus e lhe diz: “Eles não têm mais vinho” (v.3). A
expressão é semelhante à usada pelos apóstolos antes do milagre da
multiplicação dos pães: “Eles não têm mais nada para comer” (cf. Mc
8,2;Mt 15,32).
Maria vê o
conjunto, a visão do conjunto, e compreende aquilo que é essencial. Este é o
espírito contemplativo de Maria, o seu dom de síntese, a capacidade de dar atenção
às coisas particulares. Maria consegue ver o ponto central com a inteligência
do coração e não através do raciocínio ou da análise imediata de todos os
elementos. Quando o coração superar as razões, a caridade começará a agir,
pois a caridade sempre parte do coração. Quando negarmos o que o coração
pedir, começaremos a criar muitas desculpas, mas depois cairemos num remorso,
pois razão nenhuma pode negar o que o coração pede. “Eis o meu segredo,
disse a raposa ao Pequeno Príncipe. É muito simples: Só se vê bem com o coração. O essencial é
invisível para os olhos” (Antoine De Saint-Exupéry, em O Pequeno Príncipe,
37º Edição, Rio de Janeiro: Agir,1990 p.74).
Maria percebe o
gemido mudo da humanidade e simplesmente o exprime: “Eles não têm mais vinho”.
Maria se identifica com as pessoas numa situação sufocante, e por isso pede com
naturalidade uma solução para o seu Filho, Jesus Cristo. A partir de Maria
precisamos descobrir o que falta na nossa vida, na nossa vida religiosa, na
nossa convivência, na nossa comunidade, no casamento, na família com o intuito
de sofrer e amar juntos e não para acusar ou recriminar ninguém. O que falta em
mim: talvez sejam pequenas ou grandes coisas que me faltam; talvez faltem
perdão e renúncia ou tensões a cobrir ou pequenas palavras a frear. Ou de modo
geral, talvez falte muita coisa para que eu possa ser “ o bom vinho” para mim,
para os outros, e para Deus.
Quem são “eles” na expressão “eles não têm mais vinho”
nas núpcias de Caná? São aqueles que basearam a relação com Deus numa
série de regras, tornando-a fria e paralisada. Ama menos quem se preocupa com a
lei. Todas as leis devem submeter-se à Lei maior que é o Amor (cf. Jo 15,12). O
amor é o vinho da nova e definitiva aliança. O amor exige de qualquer pessoa um
despojamento total, o abandono de todas as falsas seguranças, a renúncia a seus
privilégios. Os dirigentes judeus vão responder ao amor pregando Jesus na cruz.
Mas o amor é mais forte que a morte, e o ódio é vencido em seu próprio terreno.
Se o vinho da nova e definitiva aliança é o amor, a missão deve ser como
serviço do amor. O amor é essencial à Igreja porque, sem o amor, a Igreja seria
nada(cf. 1Cor 13,1ss). Neste sentido, a Igreja será verdadeiramente missionária e cristã, se ela
se tornar o verdadeiro instrumento do amor universal.
2. 4. A Minha Hora Ainda Não
Chegou
A resposta de Jesus
é aparentemente negativa; e aparentemente, formal e mesmo dura: “Que temos
nós com isso, mulher? A minha hora ainda não chegou” (v.4). A expressão é
um semitismo frequente no Antigo Testamento e que aparece também algumas vezes
no Novo Testamento (cf. Mt 8,29;Mc 1,24;5,7;Lc 4,34;8,28). É usada ora para
rejeitar um pedido, ora para manifestar que a intervenção do interlocutor é
sentida como uma instrução, ora simplesmente para expressar surpresa diante de
uma intervenção cujo sentido e finalidade não aparecem claramente. O
significado, então, depende do contexto, do tom da voz e dos gestos que
acompanham as palavras. O sentido da frase neste texto poderia ser expresso
numa paráfrase deste tipo: “Qual é a razão que a move a dizer-me isso?” A
expressão em si não supõe rejeição
frontal, nem sequer distanciamento ou falta de afeto. A resposta de Jesus serve
como um convite feito diretamente ao leitor para compreender o que vai
acontecer num horizonte mais amplo.
O termo “mulher”
usado por Jesus para sua mãe não é uma expressão de desrespeito ou de distância
na relação mãe- filho, mas para acentuar o respeito e a reverência. Como entre
nós a palavra “senhora” usada para dirigir-se à própria mãe. Jesus usará o
apelativo “mulher” com frequência ao dirigir-se às mulheres em contextos de
elogio (cf. Mt 15,28;Lc 13,12; Jo 4,21;8,10;20,13.15).
Quando Jesus diz
que a hora dele ainda não chegou, não está olhando para o relógio. A “hora” (este
termo ocorre 26 vezes em Jo) no Evangelho de João tem um sentido simbólico.
Quer dizer o momento em que Jesus vai mostrar quem ele é e comunicar o amor do
Pai. Isso só vai acontecer de maneira completa na sua paixão, morte e
ressurreição. Ainda não chegou “a minha hora” quer dizer ainda não chegou o
momento da realização do grande sinal através do qual Jesus revelará sua glória
isto é a paixão, morte e ressurreição de Jesus onde ele entregará sua vida à morte
para a vida do mundo e por isso, será glorificado pelo Pai. Toda a missão de
Jesus está orientada e realizada em função dessa “hora”. Sua hora não pode ser
marcada pelos homens, nem por sua mãe.
2.5. Fazei Tudo O Que Ele Vos
Disser: A Fé Total No Filho De Deus
Maria não discute
com Jesus. Ela volta-se para os serventes: “Fazei tudo o que ele vos disser”
(v.5). Maria percebe a gravidade da situação, mas não se apavora, não se
desespera, pois Jesus está presente. Estas palavras mostram que Maria não
considerou a resposta de Jesus como uma recusa definitiva. Ela não tem dúvida
alguma de que Jesus vai fazer algo ou vai dar um jeito. Só não sabe como.
Assim, entregou-se com inteira submissão e confiança total ao mistério da
“hora”. Ela tem certeza de que seu filho atenderá porque é o Filho de Deus.
Maria é persistente apesar da resposta de Jesus(cf. também o exemplo da
persistência em Mt 15,21-28;Mc 7,24-30).
Até aqui podemos
fazer uma parada para olhara à certeza de Maria em Jesus, o Filho de Deus.
Talvez seja esta certeza que mais vezes nos falta. É a certeza em Jesus, a
única a dar vigor ao nosso agir cotidiano. Talvez falte-nos aquele salto de
qualidade na certeza em Jesus, nas coisas simples atrás das quais esconde-se o
divino. Precisamos decifrá-las para encontrar o seu significado na certeza em
Jesus.
O que o quarto
evangelista quer sublinhar não é, porém, o poder de intercessão de Maria. Mesmo
as palavras finais de Maria: “Fazei tudo o que ele vos disser”, sublinham a
soberania de Jesus e não a impetração de Maria. A mãe deixa tudo nas mãos do
Filho, ainda que não o chame de Filho: “Fazei tudo o que ele vos disser”. Não
se pode, contudo, negar que foi o pedido de Maria o que iniciou o processo que
desembocou na decisão de Jesus de realizar o primeiro sinal.
A atitude de Maria
é a mesma de Israel quando se dirige a Deus nas suas provações: “Tudo o que diz
Javé, nós o faremos”(cf. Ex 19,8;24,3.7;Js 24,24). Depois de ter apresentado
ela mesma a Jesus as nossas necessidades, agora pede aos serventes que façam tudo
o que ele lhes disser. Pela sua atitude e pelas suas palavras, ao convidar os
servidores a adotar a mesma atitude de obediência às palavras de Jesus, Maria é
modelo para todos os que fazem parte de novo Israel de Deus, do novo Povo de
Deus. Desde que respondeu ao anjo: “faça-se em mim segundo a tua palavra”(Lc
1,38), Maria conhecia, por experiência própria, os frutos produzidos pela
obediência incondicional à Palavra de Deus. Segundo João, Maria não só realiza
a vontade de Deus na sua vida, mas também orienta os outros a fazerem o que
Deus lhe pede. A perfeita discípula e seguidora de Jesus se torna mestra e guia
dos cristãos. Sua frase continua atual. Ela continua nos dizendo hoje: “Vale a
pena buscar a vontade de Jesus, ouvir suas palavras e tomar atitudes
concretas”. Maria estimula os seguidores de Jesus a realizarem a vontade de
Jesus. Ela ajuda os seguidores a terem fé em Jesus e ficarem junto dele. Sobre
tantos cristãos consagrados no sacramento do matrimônio, sobre tantos
religiosos que já perderam o ardor da primeira vocação, sobre tantos sacerdotes
que já esqueceram o santo estremecer do dia do chamado por Cristo, Maria tem
que interceder: “Eles não têm mais vinho” para que jamais chegue a terminar o
vinho do divino encanto. Além disso, Maria nos ensina a orar pelos nossos
irmãos, assim como ela fez primeiro. Maria é uma mulher que, num rápido golpe
de vista, vê o que falta e se preocupa com dar-lhe remédio. Ela simplesmente
verifica o que falta, e pede com naturalidade: “Eles não têm mais vinho”.
Maria também nos
convida a viver uma virtude que se chama “atenção”. A atenção é um
comportamento vigilante do eu sobre os outros; é uma transparência de olhar,
uma prontidão em notar sinais de sofrimento em volta de si, um doar-se. Ela é
amor verdadeiro, delicado, desinteressado e previdente. Ela é uma qualidade
humana necessária e preliminar no caminho espiritual.
2.6. Só Jesus Pode Preencher O
Coração Vazio.
O texto diz que há
ali seis talhas de pedra vazias para a purificação dos judeus. Nessas talhas
vazias é que Jesus manda os serventes encherem água. A descrição é bem
detalhada e simbólica. O número “seis” (= 7-1) representa a insuficiência, a
ineficácia de todo o ritual opressor das purificações. As talhas de “pedra”
estão vazias. As tábuas da Lei foram escritas em pedra em contraposição à
promessa para o tempo da Nova Aliança: “Tirarei do vosso peito o coração de
pedra e vos darei um coração de carne”(Ez 36,26). O novo mandamento é o
amor(cf. Jo 15,12) que se escreve em cada coração e não na tábua de pedras. As
talhas estão vazias. Isto quer dizer que a Lei antiga não tem mais nada para
oferecer. Essa talhas vazias serão enchidas com o vinho novo e abundante dos
tempos messiânicos. Jesus leva à perfeição o que pretendiam os ritos antigos.
Para ficar purificado é necessário que alguém purifique seu interior onde está
escrito o amor, como o novo mandamento.
A novidade trazida
por Jesus é superior à Lei antiga: “Tu guardes o bom vinho até agora”. Passou o
tempo da Lei e chegou o tempo da graça e da verdade trazido por Jesus e que
temos de receber esta salvação na alegria da festa. Jesus traz a
superabundância de Deus, que supera em quantidade e qualidade todas as
necessidades de que precisamos e sentimos, todas as esperanças que acalentamos
e todas as utopias que podemos imaginar. A superabundância de bom vinho era uma
das formas de expressar as bênçãos prometidas para os tempos messiânicas(cf. Am
9,13;Jl 2,24;4,18;Is 25,6
Jesus faz o
primeiro sinal de forma discreta. Tudo na simplicidade. Ele manda encher os
potes de água. O primeiro sinal de Jesus pretende começar a revelar quem é
Jesus para nós. A partir do sinal, entendemos que Jesus mesmo é o vinho novo da
nossa vida. Ele é capaz de transformar as situações em que tudo parece “água”,
sem sabor nem cor, no líquido da festa e da alegria. A partir de Jesus começou
o tempo da graça. Quem está com Jesus tem vida sobrando. A abundância de
vinho(em torno de 600 litros) revela o amor extraordinário de Deus presente na
vida e na ação de Jesus.
2.7. O Sinal Leva Os Discípulos A Crerem Em Jesus
O resultado da ação
de Jesus conforme o texto: “Jesus manifestou sua glória e seus discípulos
creram nele” (v.11). A glória para Jesus não é o poder e a fama, mas a capacidade
de realizar o bem e fazer Deus conhecido e amado. Essa glória consiste na
revelação de Deus através dos “sinais” que ele opera. A glória de Deus agora
torna-se visível para sempre em Jesus.
“E os discípulos creram nele”. Aqui chega ao
seu clímax o chamamento dos discípulos. O crer em Jesus do v.11 é a culminação
do seguimento iniciado em 1,37. Quem crê, vê além do sinal. O sinal não força
ninguém a acreditar, só abre a porta do coração para a fé. Para João, crer em
Jesus como o Cristo é crer no amor superabundante de Deus que enche de alegria
o coração dos homens e lhes dá a plenitude da vida. Crer em Jesus é crer que
ele realiza a união de Deus com seu povo através de sua vida, morte e
ressurreição. Crer em Jesus é crer que Deus se revela e atua amorosamente em
favor dos homens através da humanidade de Jesus. Na fé dos primeiros discípulos
de Jesus, começa a fé da Igreja. Essa mesma fé é solicitada de todos ao
situar-nos diante de Jesus, o portador da salvação definitiva oferecida por
Deus ao mundo.
Revivendo hoje o
momento em que o Filho de Deus transforma a água em vinho para os convivas de
Caná, deveríamos ter a capacidade de perceber que uma das mais exaltantes
mensagens do cristianismo é a mensagem de alegria. Deus quer que haja o vinho
nupcial da alegria, a alegria de permanecer unidos.
Cabe ao
cristianismo, e cabe a cada um de nós, a tarefa de repetir a mensagem do sinal
realizado por Jesus. Temos que proclamar as razões da alegria, não da tristeza;
temos que apontar os motivos do otimismo, não do pessimismo; temos que promover
a vida, não a agressão e a morte. A alegria deveria ser característica de quem
vive na fé e caminha para o Reino de Deus. É claro que a fé não nos põe a salvo
do sofrimento e dos vários motivos de tristeza. Contudo, é preciso deixarmos
transparecer a certeza de que toda nossa dor se transformará em alegria
pois Deus nos ama. É o testemunho que o
mundo espera de nós.
No evangelho de
hoje se põe em destaque Cristo que vem trazer o vinho novo de seu amor. Em Caná
a agua se converteu em vinho. Na Eucaristia o vinho se converte em sangue
redentor derramado por nós. Jesus está sempre próximo dos apuros dos homens,
como estava presente nas bodas de Caná em que o vinho estava faltando para a
alegria da festa.
Muitas vezes
ficamos como os noivos de Caná, sem vinho da alegria, do amor, da paz, da
tranquilidade, da ilusão, do trabalho, da harmonia e assim por diante. Muitas vezes
perdemos a esperança e cremos que nossa situação já não tem remédio. Pensamos que
nosso mundo, nossa nação, nossa vida é impossível suportar. Estamos, muitas
vezes, em apuros que nos reserva um vazio na nossa vida. Mas olhando para as
bodas de Caná acreditamos que sempre existe milagre ou algum sinal vivo do
Senhor. Podemos repetir o pedido da Mão do Senhor: “Eles não têm mais vinho. Nós
não temos mais vinho”. E temos que obedecer à Palavra do Senhor e encher nossas
“talhas” de “água”. Isto significa que temos que cooperar com a graça do
Senhor. Temos que encher as talhas de nossa vida de “água” para que se realize
o milagre. Se estivermos vazios, continuaremos sendo vazios. A “água” da
trivialidade será o vinho novo da graça capaz de devolver a esperança de uma
vida cheia de amor e, consequentemente, de alegria.
O vinho novo leva à
consideração do sangue salvador da Cruz. Ali Jesus se põe ao serviço dos homens
para dar-lhes a alegria definitivo da vida plena. Aquela foi a Hora, avançada já
agora na decisão de ajudar os homens com o vinho da alegria. “Fazei tudo o que
Ele vos disser” é a palavra de Maria-Igreja aos homens, em sua insistente oração
ao Senhor em favor dos próprios homens. Na Eucaristia celebramos tudo: a
entrega de Jesus na Cruz, a doação de Seu Espirito de alegria e de paz, a
gozosa comunhão dos homens, nossa fé.
Pe. Vitus Gustama,svd
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