domingo, 17 de janeiro de 2016

19/01/2016

SACRALIDADE DA PESSOA HUMANA PERANTE A LEI


Terça-Feira Da II Semana Do Tempo Comum


Primeira Leitura: 1Sm 16,1-13


Naqueles dias, 1 o Senhor disse a Samuel: “Até quando ficarás chorando por causa de Saul, se eu mesmo o rejeitei para que não reine mais sobre Israel? Enche o chifre de óleo e vem, para que eu te envie à casa de Jessé de Belém, pois escolhi um rei para mim entre os seus filhos”. 2 Samuel ponderou: “Como posso ir? Se Saul o souber, vai me matar”. O Senhor respondeu: “Tomarás contigo uma novilha da manada, e dirás: ‘Vim para oferecer um sacrifício ao Senhor’. 3 Convidarás Jessé para o sacrifício. Eu te mostrarei o que deves fazer, e tu ungirás a quem eu te designar”. 4 Samuel fez o que o Senhor lhe disse, e foi a Belém. Os anciãos da cidade vieram-lhe ao encontro, e perguntaram: “É de paz a tua vinda?” 5 “Sim, é de paz”, respondeu Samuel. Vim para fazer um sacrifício ao Senhor. Purificai-vos e vinde comigo, para que eu ofereça a vítima”. Ele purificou então Jessé e seus filhos e convidou-os para o sacrifício. 6 Assim que chegaram, Samuel viu a Eliab, e disse consigo: “Certamente é este o ungido do Senhor!” 7 Mas o Senhor disse-lhe: “Não olhes para a sua aparência nem para a sua grande estatura, porque eu o rejeitei. Não julgo segundo os critérios do homem: o homem vê as aparências, mas o Senhor olha o coração”. 8 Então Jessé chamou Abinadab e apresentou-o a Samuel, que disse: “Também não é este que o Senhor escolheu”. 9 Jessé trouxe-lhe depois Sama, e Samuel disse: “A este tampouco o Senhor escolheu”. 10 Jessé fez vir seus sete filhos à presença de Samuel, mas Samuel disse: “O Senhor não escolheu a nenhum deles”. 11 E acrescentou: “Estão aqui todos os teus filhos?” Jessé respondeu: “Resta ainda o mais novo, que está apascentando as ovelhas”. E Samuel ordenou a Jessé: “Manda buscá-lo, pois não nos sentaremos à mesa, enquanto ele não chegar”. 12 Jessé mandou buscá-lo. Era ruivo, de belos olhos e de formosa aparência. E o Senhor disse: “Levanta-te, unge-o: é este!” 13 Samuel tomou o chifre com óleo e ungiu Davi na presença de seus irmãos. E a partir daquele dia, o espírito do Senhor se apoderou de Davi. A seguir, Samuel se pôs a caminho e voltou para Ramá.


Evangelho: Mc 2,23-28


23Jesus estava passando por uns campos de trigo, em dia de sábado. Seus discípulos começaram a arrancar espigas, enquanto caminhavam. 24Então os fariseus disseram a Jesus: “Olha! Por que eles fazem em dia de sábado o que não é permitido?” 25Jesus lhes disse: “Por acaso, nunca lestes o que Davi e seus companheiros fizeram quando passaram necessidade e tiveram fome? 26Como ele entrou na casa de Deus, no tempo em que Abiatar era sumo sacerdote, comeu os pães oferecidos a Deus, e os deu também aos seus companheiros? No entanto, aos sacerdotes é permitido comer esses pães”. 27E acrescentou: “O sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado. 28Portanto, o Filho do Homem é senhor também do sábado”.
---------------


A controvérsia entre Jesus e os fariseus continua. No dia anterior a controvérsia era sobre o jejum. Hoje a discussão ou a controvérsia está em torno do Sábado e sua observação.


O sábado era um dos principais mandamentos para os judeus.  A finalidade de sua observação era, inicialmente, para o descanso humano para celebrar a libertação humana (Dt 5,12-15). Na linha sacerdotal (cf. Ex 20,8-11) a finalidade do sábado era para imitar o repouso de Deus ao findar-se a obra da Criação. O sábado tornou-se como dia para ser dedicado a Deus e ao culto. A partir do exílio na Babilônia a valorização do sábado se tornou exagerada. Observar o sábado entre os pagãos, durante o exílio, era um sinal da identidade israelita. Era tão importante como todos os mandamentos juntos. Todo trabalho era proibido (234 atividades proibidas).  Transgredir o sábado podia levar o acusado à condenação dependendo da gravidade do ato até a pena de morte (cf. Ex 31,12-17; 35,1-3). O sábado se tornou, então, algo pesado para o povo. A instituição do sábado que tinha como finalidade assegurar o homem o tempo de repouso necessário para a realização da vida foi esquecida.


Os discípulos de Jesus arrancavam espigas durante o caminho com Jesus. Tirar espigas era uma das trinta e nove formas de violar o sábado, segundo as interpretações exageradas que algumas escolas dos fariseus faziam da lei na época. Por isso, os fariseus se escandalizam quando percebem que os discípulos de Jesus arrancam as espigas para matar a fome no dia de sábado. “Quem não sabe julgar o que merece crédito e o que merece ser esquecido presta atenção ao que não tem importância e se esquece do essencial” (Buda).


Diante dessa crítica Jesus aplica um princípio fundamental para todas as leis: “O Sábado foi feito para o homem e não o homem para o Sábado”.


O homem está sempre no centro da doutrina de Jesus. Jesus olha para a necessidade real do homem e se oferece como solução. Em nome do ser humano nas suas necessidades básicas, principalmente quando se trata de salvar ou proteger a vida, Jesus é capaz de “transgredir” a Lei por sagrada que ela pareça ser. Por causa de mim, ser humano, Deus aceitou se encarnar em Jesus para me dizer que não estou sozinho na minha luta pela vida digna. Deus quer vida em abundância para todos (Jo 10,10). Para Jesus, o ser humano é mais sagrado do que qualquer lei. Sua preocupação é fazer o bem para o homem, mesmo no dia de Sábado. A lei do Sábado foi dada precisamente a favor da liberdade, do bem e da alegria do homem (Dt 5,12-15).


Por isso, o espírito da lei deve estar sempre ao serviço de Deus para glorificá-Lo, e ao serviço do ser humano para dignificá-lo. A glória de Deus é a vida e a felicidade de seus filhos, os seres humanos. Para Jesus, as leis ainda que sejam sagradas, não podem estar por cima da vida, das necessidades vitais, da felicidade, da plena realização dos seres humanos. Por isso Jesus tem coragem de afirmar: “O Sábado foi feito para o homem e não o homem para o Sábado”.


Nós que cremos em Cristo devemos saber dar culto a Deus manifestando-Lhe, assim, nosso amor, mas não podemos deixar de amar nosso próximo ajudando-lhe a remediar suas necessidades. Se não o nosso culto e nosso amor a Deus seriam inúteis e hipócritas.


A fidelidade às tradições religiosas deve favorecer ao direito à vida. As tradições religiosas, que não apoiam o direito à vida, perdem sua razão de existir. Para Jesus a finalidade de qualquer lei religiosa deve ajudar o ser humano a ter uma verdadeira experiência de encontro com a vontade de Deus resumida no mandamento do amor fraterno. Praticar as leis religiosas sem levar em conta o respeito pela vida seria inútil. Jesus é o Senhor do Sábado. Se o Sábado devia significarlibertação”, Jesus é o Senhor da libertação. Se o Sábado devia significarsantificação”, Jesus é o Senhor da santidade e da santificação. Uma libertação sem Jesus será opressão reeditada de outro modo. Uma santificação sem Jesus será egoísmo, orgulho ou vaidade, editados de outros modos.


Não podemos viver sem leis, normas ou regras que nos ajudem a dirigir ou governar nossa vida. A liberdade sempre supõe a existência de regras. Da nossa própria casa (família) até as últimas instituições necessitam de leis, normas ou regras. Mas aqueles que são encarregados da aplicação dessas devem ter sempre em conta o “espíritoque as inspirou e que em ultima instância é o bem dos indivíduos e da comunidade.


A lei é boa e necessária. A lei é, na verdade, o caminho para levar à prática do mandamento do amor. Somente a lei do amor rompe fronteiras, divisões, prejuízos e escravidões. Por isso mesmo, a lei não pode ser absolutizada. O Sábado, para nós o domingo, está pensado para o bem do homem. É um dia em que nos encontramos com Deus, com a comunidade, com a natureza e com nós mesmos. O descanso é um gesto profético que nos faz bem a todos para fugir ou escapar da escravidão do trabalho ou da carreira consumista. O dia do Senhor é também dia do homem, com a Eucaristia como momento privilegiado.


“O sagrado do sábado” comenta o rabino Nilton Bonder, “não é o descanso em si, mas o ritmo mágico do trabalho ao descanso e ao trabalho novamente. É essa entrada e saída que é sagrada. (...) Sem as pausasapenas ilusão; sem os silênciosapenas ilusão da música; sem a luz-transparência há apenas ilusão da cor” (cf. Código Penal Celeste).


A partir do ensinamento de Jesus no evangelho deste dia precisamos nos perguntar: “Não somos, às vezes, demasiados legalistas? Não julgamos nossos irmãos quando cremos que não cumprem as leis ou as regras, sejam as leis humanas, as leis da Igreja ou as leis consideradas como divinas? Se para Jesus o homem está sempre no centro de seu ensinamento, será que colocamos o ser humano como centro de nossas atividades diárias e pastorais?”. A denúncia da escravidão ao sábado nos convida a nos libertarmos da religião da observância formal e segui-la pelos caminhos do amor libertador. Quando as coisas materiais ou rituais mandam, e não a lei do amor, o homem se faz escravo. Somente a lei do amor rompe fronteiras, divisões, prejuízos e escravidões.


Para Refletir: DIA DO SENHOR


“Na verdade, a vida inteira do homem e todo o seu tempo, devem ser vividos como louvor e agradecimento ao seu Criador. Mas a relação do homem com Deus necessita também de momentos explicitamente de oração, nos quais a relação se torna diálogo intenso, envolvendo toda a dimensão da pessoa. O «dia do Senhor» é, por excelência, o dia desta relação, no qual o homem eleva a Deus o seu canto, tornando-se eco da inteira criação.


Por isso mesmo, é também o dia do repouso: a interrupção do ritmo, muitos vezes oprimente, das ocupações exprime, com a linguagem figurada da «novidade» e do «desprendimento», o reconhecimento da dependência de nós mesmos e do universo de Deus. Tudo é de Deus! O dia do Senhor está continuamente a afirmar este princípio. Assim, o «sábado» da revelação bíblica foi sugestivamente interpretado como um elemento qualificante naquela espécie de «arquitetura sagrada» do tempo que caracteriza a revelação bíblica. Ele nos lembra que a Deus pertencem o universo e a história, e o homem não pode dedicar-se à sua obra de colaboração com o Criador, sem ter constantemente em consideração esta verdade” (João Paulo II, Carta Apostólica: DIES DOMINI, n.15).


P. Vitus Gustama,svd

Nenhum comentário:

25/11/2024-Segundaf Da XXXIV Semana Comum

GENEROSIDADE E DESPOJAMENTO DE UMA VIÚVA, FRUTO DE SUA FÉ EM DEUS Segunda-Feira da XXXIV Semana Comum Primeira Leitura: Apocalipse 14,1-...