quarta-feira, 9 de março de 2016

12/03/2016



VIVER EM COMUNHÃO COM CRISTO PARA ENTENDER SUA PESSOA E SUA MENSAGEM  


Sábado da IV Semana da Quaresma


Primeira Leitura: Jr 11,18-20


18 Senhor, avisaste-me e eu entendi; fizeste-me saber as intrigas deles. 19 Eu era como manso cordeiro levado ao sacrifício, e não sabia que tramavam contra mim: “Vamos cortar a árvore em toda a sua força, eli­miná-lo do mundo dos vivos, para seu nome não ser mais lembrado”. 20 E tu, Senhor dos exércitos, que julgas com justiça e perscrutas os afetos do coração, concede que eu veja a vingança que tomarás contra eles, pois eu te confiei a minha causa.


Evangelho: Jo 7,40-53


Naquele tempo, 40ao ouvirem as palavras de Jesus, algumas pessoas diziam: “Este é, verdadeiramente, o Profeta”. 41Outros diziam: “Ele é o Messias”. Mas alguns objetavam: “Porventura o Messias virá da Galileia? 42Não diz a Escritura que o Messias será da descendência de Davi e virá de Belém, povoado de onde era Davi?” 43Assim, houve divisão no meio do povo por causa de Jesus. 44Alguns queriam prendê-lo, mas ninguém pôs as mãos nele. 45Então, os guardas do Templo voltaram para os sumos sacerdotes e os fariseus, e estes lhes perguntaram: “Por que não o trouxestes?”  46Os guardas responderam: “Ninguém jamais falou como este homem”. 47Então os fariseus disseram-lhes: “Também vós vos deixastes enganar? 48Por acaso algum dos chefes ou dos fariseus acreditou nele? 49Mas esta gente que não conhece a Lei, é maldita!” 50Nicodemos, porém, um dos fariseus, aquele que se tinha encontrado com Jesus anteriormente, disse: 51“Será que a nossa Lei julga alguém, antes de o ouvir e saber o que ele fez?” 52Eles responderam: “Também tu és galileu, porventura? Vai estudar e verás que da Galileia não surge profeta”. 53E cada um voltou para sua casa.


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Viver Em Função Do Bem e Na Mansidão Como Cordeiro


Senhor, avisaste-me e eu entendi; fizeste-me saber as intrigas deles. Eu era como manso cordeiro levado ao sacrifício, e não sabia que tramavam contra mim”.


O profeta Jeremias aplica para si a imagem do cordeiro: “Eu era como manso cordeiro levado ao sacrifício”. Por causa da sua simplicidade e paciência e também por causa da sua cor branca, cordeiro é símbolo da mansidão, da inocência e da pureza. E também símbolo do homem piedoso. No Oriente antigo e nas regiões do mar Mediterrâneo, os cordeiros eram os mais frequentes animais de sacrifício. O cordeiro se deixa levar ao matadouro sem oferecer resistência. Em visão simbólica, estes cordeiros de sacrifícios no Antigo Testamento são prefigurações do único Cordeiro da nova Aliança que é o próprio Jesus Cristo que se oferece por toda a humanidade.


Na primeira leitura, o profeta Jeremias utiliza a imagem do cordeiro manso levado ao matadouro para falar de sua própria inocência, pureza, mansidão e sua fidelidade aos mandamentos de Deus. Para manter a fidelidade à aliança com Deus o profeta Jeremias denuncia os crimes e as traições cometidos pelo seu próprio povo. Em outras palavras, Jeremias chama o seu povo à conversão, a voltar ao Deus da Aliança. Infelizmente, como conseqüência, Jeremias é odiado pelo bem que faz. Isto nos mostra que até para fazer o bem encontramos, muita das vezes, obstáculos ou dificuldades postos pelas outras pessoas em nome de interesses egoístas. Jeremias é uma vitima inocente comparada a um cordeiro manso. “Toda vez que um justo grita, um carrasco vem calar. Quem não presta, fica vivo; quem é bom, mandam matar” (Cecília Meireles).


A sorte ou o destino do profeta Jeremias que viveu seis séculos antes de Jesus é a mesma sorte, o mesmo destino de Jesus. Jesus é também perseguido por ser fiel à Palavra de Deus, por criar a inclusão para todos. O cordeiro manso que o profeta Jeremias usa é imagem de Jesus que, como Cordeiro, morrerá para tirar o pecado do mundo (Jo 1,29). Imediatamente, antes de sua prisão, Jesus celebrou com seus discípulos a Ceia pascal e instituiu nessa ocasião a Eucaristia. De sua palavra fica claro que se entendeu a si mesmo como o Cordeiro Pascal (cf. Mt 26,26ss). Jesus morreu na mesma hora que no templo eram abatidos os cordeiros para a festa da Páscoa. Podemos entender que na arte cristã, o Cordeiro (como símbolo de Cristo) aparece com a cruz.


A imagem do “cordeiro” nos sugere a inocência dessa pequena vitima que não merece ser sacrificada. Essa imagem nos sugere a liturgia do Cordeiro pascal cujo sacrifício é útil para o povo inteiro.


Percebemos da primeira leitura de hoje que até para fazer o bem encontramos dificuldades, inclusive a violência da parte daqueles que defendem seus próprios interesses mesmo que sejam errados eticamente. Mas todo homem que sofre inocentemente e injustamente é uma imagem de Cristo sofredor. Todo sofrimento fruto da colaboração para salvar o mundo, para edificar a humanidade, para defender os sem voz e sem vez é o sofrimento do próprio Cristo. Todos esses sofredores estão no coração de Deus: “A vida dos justos está nas mãos de Deus, nenhum tormento os atingirá... Os que confiam em Deus compreenderão a verdade e os que são fieis permanecerão junto a ele no amor, pois graça e misericórdia são para seus santos e sua visita é para seus eleitos” (Sb 3,1.9). Jesus continua sofrendo nos justos perseguidos. Jesus continua sendo crucificado nos inocentes vítimas dos que retém o poder nas mãos. Por essa razão, não podemos tirar  o corpo de Cristo da cruz (Cristo crucificado), pois o próprio Jesus continua sendo crucificado, maltratado, injustiçado, explorado, assassinado nos inocentes, pois “todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes”, disse o Senhor (Mt 25,40).


Quem É Jesus Para Mim?


No evangelho de hoje lemos como a pessoa de Jesus e sua maneira de viver e de falar provocam discussões e posturas diversas. A vida dos homens se decide de acordo com sua atitude vivencial com Jesus.


Da parte do povo, uns dizem que é o Messias, outros dizem que é o profeta. Jesus é o sinal de contradição no mundo: divide os homens com sua simples presença entre os homens (cf. Lc 2,34-35). Jesus continua sendo um mistério para seus contemporâneos.


Os escribas e os fariseus eram a mais alta autoridade doutrinal, os melhores especialistas em discussões sobre a Escritura. Segundo eles, em Jesus não se cumprem todas as condições necessárias para ser um Messias. Por isso, Ele não é o Messias, apesar das evidências. Segundo eles o Messias não vem da Galiléia e sim de Belém (Jo 7,52). 


Mas os fatos não negam, mesmo que alguém tente argumentar. Os fatos falam por si sobre quem é Jesus. Os fariseus  e os escribas não reconhecem mais a presença de Deus nos acontecimentos, particularmente em Jesus. Eles ficam presos na letra morta das Escrituras. Jesus, que o evangelista João nos apresenta, possui uma ciência que penetra mais fundo no coração do homem do que os escribas. Jesus substitui o conhecimento técnico das Escrituras, que os escribas tem, pelo conhecimento direto do Pai (cf. Jo 3,12; 5,24; 6,45). Esse conhecimento é adquirido, porque Jesus e o Pai são um só (cf. Jo 10,30; 17,11.21). Para Jesus, a Palavra de Deus não é sobretudo a que está contida nas Escrituras e sim a que Ele percebe diretamente em sua vida. A ciência é incapaz de conhecer Jesus, muito menos a opinião pública. Somente a fé nos ajuda a conhecer a personalidade de Jesus Cristo e compreender sua mensagem.


O pior cego é aquele que não reconhece a própria cegueira a fim de poder pedir a ajuda. Daí nós concluímos que a condição essencial para conhecer a Deus é a humildade. Há que saber renunciar aos nossos próprios pontos de vista, deixar-nos conduzir pela luz da sabedoria divina. A crença bíblica não basta para descobrir verdadeiramente quem é Deus em Jesus Cristo. A vida e seus acontecimentos são outra “Escritura” que Deus nos deixou para que leiamos cada dia uma página para saber o recado de Deus para nós e sobre nós. O conhecimento de Deus não é questão de intelectualidade. O Espírito é que nos sensibiliza para nos abrirmos à verdade de Deus, ao seu amor, à vida nova que Ele quer nos comunicar, à luz com que Ele quer iluminar nossa escuridão.


Nicodemos, o fariseu notável que pertencia ao circulo dos membros do Sinédrio (Sinédrio ou Sanhedrin era uma assembleia de juízes judeus que constituía a corte e legislativo supremos da antiga Isarael) e que havia visitado Jesus de noite (Jo 3,1-21), mostra sua preocupação pela justiça: “Será que a nossa Lei julga alguém, antes de ouvi-lo e saber o que ele fez?”. Ele pensa que a Lei deve ser usada como instrumento de justiça. No entanto, ele é reprovado pelos colegas ao chamá-lo de ”galileu” (chamar alguém de “galileu” na época era um palavrão):Também tu és galileu, porventura? Vai estudar e verás que da Galileia não surge profeta”. No lugar de responder Nicodemos, eles o insultam, tratando-o como um ignorante. Para eles, segundo a Lei na qual eles se apóiam e não em Deus, profetas jamais sairiam da Galileia, enquanto que Deus sopra para onde quer e através de qualquer pessoa e em qualquer lugar. Basta cada um ficar atento para captar a passagem de Deus em cada momento na vida de qualquer homem.


Quem Julga Os Outros Não Têm Tempo Para Amá-los


Será que a nossa Lei julga alguém, antes de ouvi-lo e saber o que ele fez?”. Esta frase nos convida a refletirmos profundamente sobre nosso comportamento ou nosso julgamento em relação aos outros.  Jamais podemos falar além daquilo que vemos e daquilo que sabemos, pois cairemos na invenção dos fatos e no julgamento sem fundamento e faremos aquele que julgamos sofrer injustamente. Não podemos julgar qualquer pessoa apressadamente. É preciso sabermos ouvir e conhecermos a pessoa e suas obras. Não podemos nos deixar guiar por nossos motivos egoístas e interesseiros. Lembremo-nos de que a palavra é poderosa e por isso é perigosa. Uma vez pronunciada, a palavra não tem volta. Se feriu, a ferida fica. Se curou, a pessoa fica livre de sua prisão. Não podemos falar o que pensamos, mas temos que pensar bastante sobre tudo que vamos falar. O silêncioconteúdo para nossas palavras. Temos que silenciar nossa boca, para o intelecto ter vez em escolher palavras certas para momentos certos a fim de não ferir gratuitamente as pessoas.


Os escribas e os fariseus se sentem seguros na Lei a ponto de chamarmalditoquem não conhece a Lei. Em nome desta Lei, eles vão crucificar e matar Jesus Cristo sem ouvir Jesus e sem verificar o que Ele faz. Nas mãos dos escribas e dos fariseus a Lei não é um instrumento de justiça e sim de vingança. Eles confundem o conhecimento da Lei com o conhecimento de Deus. Para eles, os que estão fora da Lei são considerados desviados, malditos. Mas na verdade, os próprios fariseus e os escribas estão fora do conhecimento de Deus. Conhecer Jesus consiste em se preocupar com o bem do homem e sua salvação. Quem não se preocupa com o bem do homem e com a sua salvação, ele se separa de Deus, o Pai, que quer a vida para todos os homens, seus filhos (cf. Jo 10,10).


Os simples têm, ao contrário, facilidade de captar a mensagem de Jesus e de considerar Jesus como Messias ou Profeta: “Este é, verdadeiramente, o Profeta. Ele é o Messias”. Jesus dirá mais tarde: “Minhas ovelhas escutam minha voz”. “Escutar” e “crer” são quase sinônimos no evangelho de João.


A condição essencial para conhecer Deus é a humildade e a simplicidade. A simplicidade é a condição fundamental para conhecer o projeto de Jesus sobre o homem. Há que saber desprender-se de si mesmo, renunciar a seus próprios pontos de vista, de suas “regrinhas” (como os escribas e os fariseus presos na própria Lei que acabam não conhecendo o verdadeiro Deus) e deixar-se conduzir pelo Espírito divino.


Encontrar o sentido da vida é independente da idade, do sexo, da capacidade intelectual e do grau de instrução da pessoa, pois a vida é simples. Nós é que não sabemos nos comportar diante desse dom de Deus. Em Jesus encontramos o sentido, pois Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida. Por causa de Jesus milhares de homens mudaram de vida, abandonaram seus hábitos negativos. Por causa dele muitos dedicam sua vida para o bem do próximo até a morte. O modo de viver de Jesus em se preocupar com os pequenos, com os necessitados, com os excluídos, com os abandonados fascinam qualquer pessoa. Ele trabalha sem esperar nada de recompensa. Ele quer ver todo mundo na sua dignidade como um ser humano e acima de tudo, como filho e filha de Deus.


Deus permanece escondido atrás das aparências humanas. Cada um tem que descobrir esse Deus diariamente. “Se dizes ‘já basta’, tu estás perdido; aumenta sempre, progride sempre, avança sempre, não te pares no caminho, não voltas para trás, não te desvies!” dizia Santo Agostinho.


Vale a pena cada um se perguntar: “Quem é Jesus para mim? O que significa ele na minha vida? Será que seus ensinamentos provocam uma profunda reflexão para mim? Será que Jesus e seus ensinamentos ocupam o centro de minha vida? Será que escuto a voz de Jesus como meu pastor?” será que eu me preocupo com a regra ou com o bem do homem e sua salvação? Será que eu uso também as regras para dominar os demais ou eu uso a caridade fraterna? Temos que caminhar com Jesus Cristo e fazer nossa sua salvação. Posso dizer que sou também uma vitima inocente no ambiente em que vivo? Jesus salvou o mundo comportando-se como cordeiro e não como o lobo feroz. Será que eu uso da mansidão no relacionamento com os demais? Será que sou uma pessoa que julga as pessoas apressadamente? Quantas pessoas eu feri por causa da minha precipitação em julgar?


P. Vitus Gustama,svd

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