terça-feira, 8 de setembro de 2020

11/09/2020

SER LÍDER AUTOCRÍTICO

Sexta-Feira da XXIII Semana Comum

Nos Passos de Paulo: O Apóstolo Paulo nos fala hoje...

 

Primeira Leitura:1Cor 9,16-19.22b-27

Irmãos, 16 pregar o evangelho não é para mim motivo de glória. É antes uma necessidade para mim, uma imposição. Ai de mim se eu não pregar o evangelho! 17 Se eu exercesse minha função de pregador por iniciativa própria, eu teria direito a salário. Mas, como a iniciativa não é minha, trata-se de um encargo que me foi confiado. 18 Em que consiste então o meu salário? Em pregar o evangelho, oferecendo-o de graça, e sem usar os direitos que o evangelho me dá. 19 Assim, livre em relação a todos, eu me tornei escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível. 22b Com todos, eu me fiz tudo, para certamente salvar alguns. 23 Por causa do evangelho eu faço tudo, para ter parte nele. 24 Acaso não sabeis que os que correm no estádio correm todos juntos, mas um só ganha o prêmio? Correi de tal maneira que conquisteis o prêmio. 25 Todo atleta se sujeita a uma disciplina rigorosa em relação a tudo, e eles procedem assim, para receberem uma coroa corruptível. Quanto a nós, a coroa que buscamos é incorruptível! 26 Por isso, eu corro, mas não à toa. Eu luto, mas não como quem dá murros no ar. 27 Trato duramente o meu corpo e o subjugo, para não acontecer que, depois de ter proclamado a Boa Nova aos outros, eu mesmo seja reprovado.

 

Evangelho: Lc 6,39-42

Naquele tempo, 39 Jesus contou uma parábola aos discípulos: “Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco? 40 Um discípulo não é maior do que o mestre; todo discípulo bem formado será como o mestre. 41 Por que vês tu o cisco no olho do teu irmão, e não percebes a trave que há no teu próprio olho? 42 Como podes dizer a teu irmão: Irmão, deixa-me tirar o cisco do teu olho, quando tu não vês a trave no teu próprio olho? Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás enxergar bem para tirar o cisco do olho do teu irmão”.

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Pregar O Evangelho É Partilhar Com Total Liberdade o Dom Recebido Do Senhor

 

“Pregar o evangelho não é para mim motivo de glória. É antes uma necessidade para mim, uma imposição. Ai de mim se eu não pregar o evangelho! Em que consiste o meu salário? Em pregar o evangelho, oferecendo-o de graça, e sem usar os direitos que o evangelho me dá”.

 

Continuamos a acompanhar a leitura da Primeira Carta de São Paulo para a comunidade cristã de Corinto.

 

No capítulo nove desta Carta, onde se encontra o texto da Primeira Leitura de hoje, são Paulo expõe sua atuação apostólica pessoal como modelo para os Coríntios: modelo em quanto renúncia de próprios direitos em ordem a ajudar os demais. É uma ajuda gratuita para o bem de todos por causa de Jesus Cristo. Para ajudar verdadeiramente os outros é necessário renunciar a tantas coisas a fim de ter mais disponibilidade. Quem se amarra a tanta coisa tem dificuldade para ajudar.

 

O texto de hoje é a parte central do capítulo nono que oferece as motivações profundas da atividade apostólica de são Paulo. São Paulo se dedica a esta atividade por uma pura eleição pessoal, nem tampouco primeiramente por uma necessidade objetiva por parte dos evangelizandos e sim por um impulso interior, dado pelo Senhor e recebeido pelo Apóstolo. Quando estivermos bem abertos para o impulso do Espírito Santo, não tem como não fazer algo de bom para qualquer pessoa que está em necessidade de nossa ajuda. O homem do Espírito e no Espírito é o homem do bem e por isso, sempre pratica o bem e pronto para ajudar.

 

São Paulo é dominado totalmente pelo Espírito do Senhor a ponto de ele viver tão profundamente o mistério de Cristo que o faz não poder calar-se ou ficar na passividade. Para são Paulo o dedicar-se a pregar o mistério de Cristo é o próprio prêmio  pelo convencimento e persuasão de que essa atividade é a melhor a que pode dedicar-se o homem, a exemplo do próprio Senhor que anda de aldeia em aldeia para pregar o Reino de Deus, gratuitamente. O que são Paulo faz é simplesmente a continuação do que Jesus fez em sua vida. São Paulo é um homem que convencido do valor do dom recebido, sente o impulso de comunicar esse dom aos outros. É não guardar o tesouro somente para si mesmo, e sim dá-lo a conhecer para os outros, fazer os outros participantes do mesmo dom dentro das próprias possibilidades. O dom não é para ser enterrado nem guardado e sim para ser partilhado. Na medida em que se partilha o dom se multiplica. Partilhar o dom é multiplicar o dom. quando o dom se multiplica, muitas pessoas serão beneficiadas. Empobrecer o dom é guardá-lo para si.

 

No texto de hoje, são Paulo expõe um princípio geral de seu trabalho missionário e, ao mesmo tempo, nos permite compreendermos por que ele repete neste capítuloa que é “um homem livre” (1Cor 9,1.19). o princípio é claro: renunciar às liberdades pessoais com o fim de ganhar a todos para a causa de Cristo: “Assim, livre em relação a todos, eu me tornei escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível. Com todos, eu me fiz tudo, para certamente salvar alguns. Por causa do evangelho eu faço tudo, para ter parte nele”. É renunciar a muita coisa para ganhar as pessoas para o Cristo. Em outras palavras, para salvar os outros ele não põe nenhuma condição. São Paulo faz tudo dentro de todas as possibilidades para levar os outros para Cristo, isto é, para a salvação. Ele é livre de tudo e por isso, é livre para tudo que é salvação dos outros. Parece simples, mas não o é. Para poder renunciar a uma coisa há que ser dono dela e ter liberdade para fazer dela o que quiser. Não é dominado pela coisa e sim ser dono da coisa. Nisto consiste a liberdade. Para são Paulo, a renúncia para seus direitos está em vista a um bem superior. O momento da renúncia é o momento de crescimento; é o momento da descoberta do bem superior. Não se renuncia por renunciar e sim por um valor maior.

 

Portanto, que imagem mais nobre deste Apóstolo Paulo que se faz “débil com os débeis”, que se faz “tudo para todos”, para ganhar, seja qual for, as pessoas para Cristo. O principal para ele não são os direitos adquiridos e sim a missão que recebeu de evangelizar, e para poder cumprir bem, é capaz de renunciar a coisas que lhe apeteceriam.

 

Fica para nós as seguintes perguntas: Como cristãos, buscamos o bem dos demais, ou sempre estamos dispostos a defender nossos direitos e gostos? Será que estamos convencidos de que como cristãos devemos fazer o bem ao nosso redor a ponto de poder dizer como são Paulo: “Aí de mim se não evangelizar!” ou seja, “Aí de mim se não faço o bem para os demais?”

 

Ser Líder

 

O texto do evangelho de hoje faz parte do Sermão da Planície de São Lucas. Neste Sermão encontramos varias sentenças de Jesus sobre como devemos conviver com os demais, como devemos tratar os outros? E de que maneira podemos olhar para os defeitos dos outros e os nossos próprios defeitos. O que é indispensável para sermos bons guias?

 

 

“Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco?”, disse Jesus no Evangelho de hoje.

 

Liderar é envolver-se seriamente na vida dos outros. Por isso, para saber como você está se saindo como líder, a resposta está nas pessoas sob a sua liderança. Você deixa as coisas melhores do que as encontrou? As pessoas se aperfeiçoam por causa do convívio com você? Você deixa as pessoas e organizações em melhores condições do que as encontrou? A liderança é a marca que deixamos nas organizações e nas pessoas. Liderança é uma autoridade, pois o líder faz as pessoas crescerem por causa de sua influencia. Por isso, alguém pode ser um chefe, mas nem sempre é um líder. Para ser chefe, alguém precisa ter um cargo. Para ser líder uma pessoa não precisa ter um cargo. Não é preciso ser chefe para liderar.

 

Liderar não tem nada a ver com o que ganha ou com o lugar onde se senta (cargo), mas tem a ver com a maneira brilhante como alguém trabalha. Todos precisam liderar onde estão estabelecidos e brilhar no lugar em que se encontram.

 

“Se um homem tem o dom de varrer ruas, deve varrê-las como Michelangelo pintava, como Beethoven compunha ou como Shakespeare escrevia. Deve varrê-las tão bem que todas as hostes dos céus e da terra pararão para dizer: ‘Aqui viveu um grande varredor de ruas, que fez um bom trabalho’” (Martin Luther King Jr.).

 

“Pode um cego guiar outro cego? Não cairão os dois num buraco?”, perguntou Jesus retoricamente. Jesus pede uma autocrítica para qualquer liderança. Na ausência da autocrítica qualquer líder é incapaz de reconhecer suas fraquezas e limitações e ainda se arrogam o direito de ser juízes para os demais.

 

Um bom líder tem um agudo senso de autocrítica. Ele reconhece seus pontos positivos e seus pontos negativos. Ele aceita qualquer correção quando houver fundamentos. Ele transforma as críticas em sugestões, pois no seu coração há misericórdia e mansidão. Quanto mais o líder for transparente tanto mais estará capacitado para ajudar o próximo. Um líder que ama, é respeitado. Um líber temido não é respeitado, e ele cria muitos hipócritas e bajuladores ao seu redor. O medo que os outros têm de um líder não mede a autoridade dele e sim seu poder autoritário. Quando um líder apela para a força e o poder é porque não tem mais autoridade nele.

 

Somente um ser humano livre e consciente é capaz de guiar os demais. Enquanto a pessoa for dominada pelas ambições, pelo egoísmo, pela arrogância, ou pela violência será incapaz de ver melhor e incapaz de guiar os outros. Jesus, precisamente, formou seus discípulos em uma atitude crítica, serena e responsável que lhes permitem ver e amar os outros e a realidade com benevolência. Quem quer conduzir seu próximo pelo caminho do amor, da fidelidade, da retidão, antes deve deixar-se conduzir por Cristo pelo mesmo caminho.

 

Ser Autocrítico

 

Como podes dizer a teu irmão: Irmão, deixa-me tirar o cisco do teu olho, quando tu não vês a trave no teu próprio olho? Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás enxergar bem para tirar o cisco do olho do teu irmão”, continuou Jesus no Seu Sermão da Planície.

 

Jesus quer nos dizer de outra maneira: Abram os olhos sobre vocês mesmos! Critiquem-se! Sejam vocês mesmos objeto de sua própria crítica! Vocês que percebem facilmente os defeitos dos outros que não pensam como vocês, procurem também ter em conta seus próprios defeitos. Que não condenem uns aos outros, que tratem os outros com mais indulgência. Que vocês sejam compassivos e misericordiosos como Deus Pai que é compassivo e misericordioso.

 

As palavras de Jesus são um chamado para que descubramos nosso próprio pecado, a “trave” que há em nossos olhos. As palavras de Jesus nos chamam para a coerência e a autoridade moral que devemos ter na correção fraterna. Se assim fizermos, nossa correção fraterna será respeitada.

 

A revisão de vida é um exercício espiritual eminentemente evangélico: trata-se de reconsiderar-se a si mesmo, de revisar a própria vida e o próprio caminho e os próprios compromissos. Não temos que nos fixar tanto nos defeitos dos demais e sim nos nossos próprios defeitos. Se não, seriamos hipócritas. Muitas de nossas misérias  provém da falta de autocrítica, de não corrigir nossos erros. Não corrigir os erros é uma forma de cometer outros erros. Nunca vamos atingir nossos objetivos ou realizar nossos sonhos se formos incapazes de fazer uma autocrítica.

 

O evangelho de hoje nos convida a olharmos para o mundo e para os outros com o mesmo olhar de Jesus: um olhar de benevolência. Os olhos são como um espelho no qual se reflete o mundo e os outros. Há pessoas para as quais toda a realidade é triste e está sujeita para lamentações. Como se tudo fosse mal. O mundo toma cor de nosso olhar.

 

Jesus nos convida a olharmos tudo com seu olhar: um olhar benévolo. Jesus quer nos dizer: “Sejam pessoas consagradas à misericórdia! Sejam benévolos com vocês mesmos e com os outros. Aprendam a olhar com menos severidade. Se tiver algum sentimento de antipatia, que sua antipatia se transforme em humor. Sejam benévolos com o mundo, pois foi Deus quem criou o mundo. E Deus foi o primeiro que se admirou da obra saída de Suas mãos nos primeiros dias do universo: ‘Deus viu que tudo era bom!’ (Gn 1,10b.12b.18b.21b.25b.31). Vivam bem a vida, pois Eu sou a vida (Jo 14,6)”.

 

Ser benévolo não significa ser indiferente nem ser ingênuo. A palavra “benévolo” deriva de duas palavras: bem e querer. Ser benévolo significa querer sempre o bem para tudo e para todos. Ser benévolo também significa ser responsável, ser bom, ser vigilante, denunciar as ilusões, os valores falsos, e as palavras enganosas. A benevolência é uma responsabilidade e a assunção de um dever. E a razão de nossa benevolência é o próprio Deus da misericórdia que tem paciência para conosco que mesmo que cometamos erros na vida Ele perdoa tudo e sua graça jamais falha.

 

Enquanto não adquirirmos um olhar misericordioso e benévolo, nós não estaremos em condições de guiar os outros e nada mudará na nossa vida. O que se tem por guia deve “ver” bem, assim também aquele que quer passar de discípulo para mestre.

 

Na verdade, o que Jesus nos oferece é um processo educativo ético. Segundo Jesus, o mais urgente é tomar consciência da própria hipocrisia e trabalhar sobre ela. Jesus nos apresenta cinco etapas desta pedagogia ética, que para Lucas é uma pedagogia eclesial:

 

  1. Renunciar a ser juiz dos demais.

  2. Abertura para as palavras de Jesus que me interpelam com amor e esperança.

  3. Reconhecimento dos meus próprios defeitos ou pecados.

  4. Compromisso de ser um ser humano novo e renovado no espírito de Jesus.

  5. Somente assim terei condições de ser guia ou mestre para os outros.

     

    Na vida o viver para os demais, respeitando e aprovando a verdade, não é somente um dever, mas é uma grande felicidade. Somente ao fazer os outros felizes, seremos felizes também.

     

    Através do evangelho de hoje Jesus nos convida a fazermos revisão de nossa conduta, pois muitas vezes vemos e não queremos saber o que vemos, entendemos e não queremos saber o que entendemos, está diante de nós a verdade e retiramos o olhar para não sentir feridos. A verdade liberta, a falsidade dói. O cristão sempre deve estar em estado de aprendizagem.

     

    O Senhor nos reúne em torno da mesa eucarística para nos libertar de nossas diversas escravidões. Ele quer nos enviar como testemunhas suas, mas quer que façamos a experiência de seu amor misericordioso. Ele entregou sua vida para o perdão de nossos pecados. Ele nos fez partícipes de sua vida e derramou em nossos corações o dom de seu Espírito Santo. Por isso, a participação na Eucaristia não é para nós somente um ato de culto para Deus, mas também é a aceitação de nos fazer um com Cristo, de nos identificar com Ele e de anunciá-Lo tanto com as palavras como com a própria vida.

     

    “Se queres conservar tua inocência, não consintas nas más ações dos outros, nem julgues precipitadamente suas intenções” (Santo Agostinho. Epist. Ad cath. 2,4)

     

    P. Vitus Gustama,svd

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