05/01/2016
COMPADECER-SE É
VESTIR-SE DOS “SENTIMENTOS ” DE DEUS
Terça-Feira Após a
Epifania
Caríssimos: 7 amemo-nos uns aos outros ,
porque o amor
vem de Deus e todo
aquele que
ama nasceu de Deus
e conhece Deus . 8 Quem
não ama
não chegou a conhecer
Deus , pois Deus é amor . 9 Foi
assim que
o amor de Deus
se manifestou entre nós :
Deus enviou o seu
Filho único
ao mundo , para
que tenhamos vida
por meio
dele. 10 Nisto consiste o amor : não fomos nós que amamos a Deus ,
mas foi ele
que nos
amou e enviou o seu Filho
como vítima
de reparação pelos
nossos pecados .
Naquele tempo , 34
Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão ,
porque eram como
ovelhas sem
pastor . Começou, pois , a
ensinar-lhes muitas coisas . 35 Quando estava ficando tarde ,
os discípulos chegaram perto de Jesus e disseram: “Este
lugar é deserto
e já é tarde .
36 Despede o povo para
que possa ir
aos campos e povoados
vizinhos comprar
alguma coisa para comer ”. 37 Mas Jesus
respondeu: “Dai-lhes vós mesmos de comer ”. Os discípulos perguntaram: “Queres
que gastemos duzentos denários para comprar pão
e dar-lhes de comer ?” 38 Jesus perguntou: “Quantos pães
tendes? Ide ver ”. Eles
foram e responderam: “Cinco pães e dois peixes ”. 39 Então
Jesus mandou que todos
se sentassem na grama verde , formando grupos .
40 E todos se sentaram, formando grupos de cem e
de cinqüenta pessoas . 41 Depois Jesus pegou os cinco
pães e dois peixes , ergueu os olhos
para o céu ,
pronunciou a bênção , partiu os pães
e ia dando aos discípulos , para que os
distribuíssem. Dividiu entre todos também os
dois peixes .
42 Todos comeram, ficaram satisfeitos , 43 e recolheram doze cestos
cheios de pedaços
de pão e também
dos peixes . 44 O número
dos que comeram os pães
era de cinco
mil homens .
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· Das multiplicações
dos pães (Mc 6,30-44; 8,1-10),
· Discussão sobre
o sentido das abluções
antes de comer
o pão e sobre
o falso fermento
(Mc 7,1-23; 8,11-20),
· Discussão com
uma pagã em torno
das migalhas de pão
que solicita (Mc 7,24-30).
A alimentação da multidão (multiplicação
de pães ) é o único
milagre narrado em
todos os quatro
evangelhos (Mt 14,13-21; Mc 6,32-44; Lc
9,10-17; Jo 6,1-15), e o único narrado
duas vezes (em
duas versões variantes )
em Mc (Mc 8,1-10) e em
Mt (Mt 15,29-39). Obviamente o relato da multiplicação
tem sua alusão
a Ex 16, história do maná no deserto
(aqui se diz no lugar
deserto ) e a 2Rs 4,42-44, Eliseu
alimentou 100 pessoas com 20 pães e ainda sobraram.
Compadecer-se
Significa Vestir-se Dos “Sentimentos ” de
Deus
O evangelista nos relatou que
“Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão
porque eram como
ovelhas sem
pastor ” (Mc 6,34). Ninguém
escapa do olhar
de Jesus: “Jesus viu uma numerosa multidão ”. O olhar de Jesus
é penetrante : Jesus “teve compaixão
porque eram como
ovelhas sem
pastor ”. Jesus olha
ou vê
tudo atentamente
e amorosamente . Um
olhar atento leva Jesus a uma ação concreta diante
da pessoa que
Ele olha
ou vê .
Jesus anda atentamente
e olha amorosamente .
A atenção é uma das expressões
do amor profundo .
“Jesus viu uma numerosa
multidão e teve compaixão
porque eram como
ovelhas sem
pastor ”. Aqui
Jesus revela a “misericórdia ”, o “amor ”, a “fidelidade ”
de Deus (as três
palavras se resumem densamente numa
palavra só: compadecer-se). Jesus se
apresenta e se revela como o Pastor prometido que vem reunir as ovelhas (unir,
reunir= salvar). Deus não abandona seu povo nas suas lutas de cada dia. Deus
sempre se compadece. Deus sempre olha para Seu povo.
A compaixão é uma atitude primordial de Deus. Por isso, quando se fala da
compaixão, não se trata de um vago sentimento de comoção. O verbo usado nos
Evangelhos (compadecer-se) é muito
forte e quer dizer sentir-se perturbado nas entranhas. A compaixão, por isso,
nos pede que vamos até onde existem feridas, que entremos em lugares onde
existe o sofrimento, que compartilhemos os desânimos, os temores, as angústias
dos nossos próximos, de nossos irmãos. No Evangelho este verbo é usado
exclusivamente em relação a Jesus ou a Deus. Por isso, quem tem compaixão, ele
está em sintonia com Deus e está com Deus.
Esta profunda compaixão diante das necessidades dos nossos
semelhantes é a primeira condição para nos sentirmos motivados para a ação.
Quem permanece impassível, quem não alimenta os sentimentos de Cristo, muito
dificilmente será induzido a fazer qualquer coisa pelo bem dos próximos. Por
isso, quando der alguma ajuda, ele dá somente para obedecer a alguma imposição
externa, a uma convenção social, e não por uma premente necessidade interior.
Partilha Contra
Egoísmo
Os discípulos têm pena da multidão que está com fome, por
um lado. Mas por outro lado, eles reconhecem a incapacidade de saciá-la com
cinco pães apenas. Como resolver o problema? Eles aproximam-se de Jesus não
para perguntar-lhe que planos tem, mas para oferecer-lhe uma “solução”: “Despede o povo, para que possa ir aos campos
e povoados vizinhos comprar alguma coisa para comer ”(Mc 6,36). A solução
oferecida pelos discípulos, então, é despedir para comprar. Em outras palavras,
cada um tem que prover para si mesmo, por meio de dinheiro. Mas vem a pergunta:
“Será que todo este povo tem dinheiro?”
Comprar e vender (pães) supõem orientar as relações sociais
pelas leis da economia, onde impera a concentração de bens e a exploração;
supõem submeter-se às leis econômicas que mantém essa multidão na miséria.
Sabemos que onde há concentração de bens e alimentos, lá há sempre fome e
miséria. Neste contexto, quem tem dinheiro, tem direito de comer; quem não o
tem, torna-se vítima da fome. O que tem por trás disso é o egoísmo. E as
pessoas contaminadas pelo egoísmo acabam virando as costas para o seu próximo
em dificuldade.
A atitude que Jesus tem com a multidão faminta do pão e da
palavra contrasta com a sugestão dos discípulos. A “comprar” Jesus opõe “dar” e
”repartir”: “Dai-lhes vós mesmos de comer”
(Mc 6,37). Os discípulos só têm cinco pães e dois peixes. Cinco pães e dois
peixes somam sete, o número que indica a totalidade. Aparentemente há pouco pão
(cinco pães) para saciar tanta gente (mais de cinco mil pessoas). Somente
aparentemente há pouco pão! Porque se cada ser humano tivesse amor e justiça, o
pão não faltaria para ninguém. Se cada um tirasse um pouco de bom dentro de si,
ninguém viveria na miséria. Para Jesus, o eterno problema da vida não é a falta
do pão, e sim as causas que geram a falta do mesmo na mesa da grande maioria. O
que se revela, além disso, não é a ausência do pão, e sim a presença do
egoísmo, do individualismo, da ganância e da total ausência do amor fraterno.
Mas no fim da vida todos ficam sem nada materialmente, pois o homem somente tem
o direito de usar e não de possuir. Nossa relação com as coisas não é de
propriedade e sim de uso. Este direito cessará no dia em que partirmos deste
mundo.
Aquele Que Ama é Uma Parcela de Deus que é
Amor
“Dar” ou “repartir” os pães comporta uma dinâmica
diferente, comporta o amor fraterno, comporta a compaixão, comporta a
solidariedade, comporta a partilha que é a alma de todo projeto de Jesus. Jesus
não nos revela os “truques” dos milagres, mas nos ensina a fazer bem tudo que
não é milagre: pôr em comum o que temos e reparti-lo entre os irmãos,
especialmente os necessitados do básico da vida. E tudo parte do amor ao
semelhante cuja penúria ou miséria torna-se um apelo para a solidariedade e a
partilha. Quem possui algo para comer, deixa-se tocar por quem não o tem e abre
mão, generosamente, do que lhe pertence para saciar a fome do próximo. Esta
atitude funda-se na pura gratuidade e exclui qualquer desejo de recompensa.
Nessa direção é que os cristãos, todos nós, devem caminhar: partilhar,
partilhar e partilhar, pois a partilha é a alma de todo projeto de Jesus
Cristo. Trata-se de vivenciar o amor fraterno.
Por isso, o apelo que o autor da primeira Carta de João nos
faz é atual: “Caríssimos: amemo-nos uns
aos outros, porque o amor vem de Deus e todo aquele que ama nasceu de Deus e
conhece Deus” (1Jo 4,7). “Amemo-nos
uns aos outros!”. Trata-se de um programa para todos os que acreditam em
Deus e para aqueles que têm boa vontade. É todo um programa para nossas
famílias, nossos ambientes de vida, nosso trabalho, nossa comunidade, nossa
Igreja, nossa sociedade e assim por diante. É todo um programa para a
humanidade que Deus ama primeiro.
Precisamos colocar em prática este “Amemo-nos uns aos outros!”, porque não somente acreditamos em Deus,
e sim em Deus de amor: “Caríssimos:
amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus e todo aquele que ama
nasceu de Deus e conhece Deus. Quem não ama não chegou a conhecer Deus, pois Deus é amor” (1Jo 4,7-8). “Deus é
amor”. É um texto de insondável profundidade. Há que escutá-lo em silencio,
repeti-lo, tratá-lo com palavras nossas e vivê-lo na vida cotidiana. Aquele que
ama é como uma parcela de Deus, uma parte do Amor, porque Deus é amor.
Todo ato de amor vem de Deus, tem sua fonte e origem no
coração de Deus. Por isso, Deus pode ser contemplado em:
·
O
amor de uma mãe que ama seu filhinho e de um filho que ama seus pais.
·
O
amor de um prometido a sua prometida, de um esposo para sua esposa.
·
O
amor de um homem que se desvela por seus companheiros de trabalho.
·
O
amor de um pastor para seu rebanho. E assim por diante.
Se a partilha e a compaixão são a atitude primordial e a
expressão do amor de Deus, portanto repartir o pão significa prolongar a
generosidade de Deus- criador: Ele criou tudo por amor e gratuitamente sem nenhum
mérito de um ser humano.; significa que vivenciamos a nossa fé no Deus de amor
(cf. 1Jo 4,8.16); significa Deus está em nós e nós permanecemos em Deus.
Lutar pelo alimento é o mais elementar dos deveres dos
homens. O pão é o símbolo de toda a alimentação. Com o milagre do Evangelho de
hoje Jesus abre os nossos olhos para os compromissos que a eucaristia traz:
somos responsáveis pela fome e a miséria dos nossos próximos. Somos
responsáveis pela crença ou pelo ateísmo nos outros. Se Deus não se vê no mundo
é porque não se vê mais na vida dos cristãos. Entrar em comunhão com o Senhor
na eucaristia exige fazer comunhão com aqueles que lutam na busca do pão
necessário à vida. Assim vivida, a eucaristia torna-se para quem dela se
alimenta, fonte de coragem e esforço permanente no compromisso com a
concretização do reino de Deus através da partilha de tudo que se tem.
P. Vitus Gustama,svd
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