segunda-feira, 2 de julho de 2018

05/07/2018
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SEJAMOS INSTRUMENTOS DA MISERICÓRDIA DIVINA E DA VERDADE, E NÃO DO PODER MUNDANO
Quinta-Feira Da XIII Semana Comum


Primeira Leitura: Am 7,10-17
Naqueles dias, 10 Amasias, sacerdote de Betel, mandou dizer a Jeroboão, rei de Israel: “Amós conspira contra ti, dentro da própria casa de Israel; o país não consegue evitar que se espalhem todas as suas palavras. 11 Ele anda dizendo: ‘Jeroboão morrerá pela espada, e Israel será deportado de sua própria pátria, como escravo’”. 12 Disse depois Amasias a Amós: “Vidente, sai e procura refúgio em Judá, onde possas ganhar teu pão e exercer a profecia; 13 mas em Betel não deverás insistir em profetizar, porque aí fica o santuário do rei e a corte do reino”.  14 Respondeu Amós a Amasias, dizendo: “Não sou profeta nem sou filho de profeta; sou pastor de gado e cultivo sicômoros. 15 O Senhor chamou-me, quando eu tangia o rebanho, e o Senhor me disse: ‘Vai profetizar para Israel, meu povo’. 16 E agora ouve a Palavra do Senhor. Tu dizes: ‘Não profetizes contra Israel e não insinues palavras contra a casa de Isaac’. 17 Pois bem, isto diz o Senhor: ‘Tua mulher se prostituirá na cidade, teus filhos e filhas morrerão pela espada, tuas terras serão tomadas e loteadas; tu mesmo morrerás em terra poluída, e Israel será levado em cativeiro para longe de seu país’”.


Evangelho: Mt 9,1-8
Naquele tempo, 1 entrando em um barco, Jesus atravessou para a outra margem do lago e foi para a sua cidade. 2 Apresentaram-lhe, então, um paralítico deitado numa cama. Vendo a fé que eles tinham, Jesus disse ao paralítico: “Coragem, filho, os teus pecados estão perdoados!” 3 Então alguns mestres da Lei pensaram: “Esse homem está blasfemando!” 4 Mas Jesus, conhecendo os pensamentos deles, disse: “Por que tendes esses maus pensamentos em vossos corações? 5 O que é mais fácil, dizer: ‘Os teus pecados estão perdoados’, ou dizer: ‘Levanta-te e anda’? 6 Pois bem, para que saibais que o Filho do Homem tem na terra poder para perdoar pecados, — disse, então, ao paralítico — “Levanta-te, pega a tua cama e vai para a tua casa”. 7 O paralítico então se levantou, e foi para a sua casa. 8 Vendo isso, a multidão ficou com medo e glorificou a Deus, por ter dado tal poder aos homens.
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Ser Voz De Deus É Não Compactuar Com o Mal e Maldade De Qualquer Pessoa e Instituição


Disse Amasias a Amós: ´Vidente, sai e procura refúgio em Judá, onde possas ganhar teu pão e exercer a profecia; mas em Betel não deverás insistir em profetizar, porque aí fica o santuário do rei e a corte do reino´”, assim lemos na Primeira Leitura de hoje.


Amasias, o sacerdote de Betel, é um fiel servidor do culto. Ele está comprometido com o rei e a instituição. Pode-se dizer que Amasias era um teólogo dependente do rei e da instituição (teólogo da corte). Exatamente, essa dependência leva Amasias a uma situação emaranhada. Em outras palavras, como sacerdote, ele não serve ao Senhor e ao seu povo e sim à ordem do rei.


Para agradar o rei, o sacerdote Amasias denuncia o profeta Amós como inimigo do estado e da religião. O que importa para Amasias não é a palavra da verdade e sim as palavras capazes de agradar os ouvidos do rei. “Vidente, sai e procura refúgio em Judá, onde possas ganhar teu pão e exercer a profecia; mas em Betel não deverás insistir em profetizar, porque aí fica o santuário do rei e a corte do reino”, disse Amasias para o profeta Amós. A voz do profeta Amós incomoda o rei Jeroboão e Amasias, sacerdote do Templo de Betel. Por isso, perseguem o profeta Amos.


Desde sempre, os verdadeiros profetas são perseguidos, porque dizem, não o que o povo ou os governantes querem escutar e sim, o que Deus quer que o profeta fale. Por isso, tanto no AT como n NT, na história antiga e na moderna, os que se dizem poderosos deste mundo querem calar ou excluir ou eliminar qualquer verdadeiro profeta, como Jesus Cristo, o profeta por excelência.


Paradoxalmente, o papel desempenhado pelo sacerdote Amasias é perverso, pois em vez de oferecer facilidade para a Palavra de Deus, expulsa o profeta de Deus. Amasias tem maior interesse em conservar a situação existente, da qual se aproveita, do que em colaborar na criação da situação que Deus quer surgir. Amasias se alinha com os poderosos e se coloca inteiramente a serviço da conservação de um poder edificado sobre a injustiça e a corrupção. Para o sacerdote Amasias, a participação na injustiça é mais importante do que se comprometer com o direito e com Deus que se coloca do lado dos pequenos, dos pobres e empobrecidos, dos justos e dos mansos e assim por diante. Como “sacerdote”, Amasias não se mostra como alguém preocupado com o futuro do povo. Ao contrário, ele procura garantir seus próprios privilégios, contra os interesses de sobrevivência do povo. Os interesses do sacerdote Amasias não coincidem com os do povo. A expulsão do profeta Amós do reino do Norte faz parte notória desse desinteresse “sacerdotal” pelo povo, uma vez que o povo é privado do que seria importante para o futuro: a palavra profética de Deus.


O profeta Amós não se deixa intimidar. Amós é uma pessoa de caráter firme, marcado pelo deserto e pelos campos áridos. Por isso, ele responde a Amasias: “Não sou profeta nem sou filho de profeta; sou pastor de gado e cultivo sicômoros. O Senhor chamou-me, quando eu tangia o rebanho, e o Senhor me disse: ‘Vai profetizar para Israel, meu povo´”. O profeta Amós quer dizer com outras palavras: “Eu não sou um profeta da corte. Eu mesmo posso ganhar meu pão. Sei, porém, que aqui represento a causa de Deus e isso constitui para mim vocação e legitimidade suficientes”. O profeta Amós fala de Deus não num tom confortador de púlpito, mas com imagens inabituais de Deus: Deus que ruge como leão (Am 1,2). Amós acusa frontalmente os responsáveis por sua falta de preocupação pela vida e salvação do povo.


Temos diante de nós, então, a aliança de trono e altar. Betel é o santuário do rei. E nele, no templo real, Amós fala em nome de Deus contra a casa real. Isso coloca o sacerdote do rei, Amasias, em guarda e consequentemente, anuncia ao rei a inquietação desencadeada pelo discurso profético.


A relação entre o trono e o altar, a relação da Igreja com o poder estatal é importante para a práxis profética da Igreja. Se for muito íntima, o altar, o “sacerdote”, perde a força profética. O conflito entre tal “sacerdote” e o profeta é inevitável.  O conflito entre “sacerdotes” e profetas aconteceu e continua acontecendo em todos os tempos e em todas as Igrejas e religiões. Quantos sacerdotes, quantos pastores que vivem servindo aos interesses dos poderosos em nome dos interesses econômicos e outros interesses.


Na nossa Igreja ocorre essa relação carregada de tensão entre o profético e o sacerdotal, algumas vezes no próprio individuo, outras vezes dentro da instituição. Sacerdotes como Amasias existem muitos hoje em dia. São “sacerdotes” que se limitam à rotina profissional e convertem a vocação em profissão. O impulso do Espirito Santo enfraquece neles, pois se transformam em funcionários da instituição e, acima de tudo, preferem uma boa relação com os poderosos ao compromisso profético com os pobres e empobrecidos.


Não é de hoje também que os profetas, os oponentes políticos éticos, os religiosos em favor dos pobres e empobrecidos, os Martin Luther King, as Madres Teresa de Calcutá são expulsos, como o profeta Amós? Não é de hoje também que se quer também calar as vozes que embaraçam? Jesus também não era uma dessa vozes que os adversários procuraram calar com sua morte? Não é de hoje também que muitos, como Amasias que era sacerdote oficial, tratam de conservar a qualquer preço seus privilégios e interesses? Não me sinto tentado alguma vez de adoçar a Palavra de Deus para evitar desgosto e para defender meus privilégios? Será que eu me deixo “prender” por Deus como Amós? Será que eu me atrevo a dizer certas palavras ainda que corra o risco de perder certas vantagens e certos privilégios? Será que sou tentado abandonar compromissos sérios em função do bem comum para que eu possa viver em paz comigo mesmo?


Deus É Misericordioso Para Quem Se Converte


Depois da tempestade acalmada e a libertação dos dois possuídos relatadas nos textos anteriores da passagem do evangelho de hoje (Mt 8,5-34), agora Jesus nos mostra seu poder sobre o mal mais profundo: o pecado. A salvação que Jesus Cristo quer para a humanidade é integral, do homem todo: seu corpo e espírito. O sinal externo- a cura da paralisia- é o símbolo da cura interior, a libertação do pecado, como tantas outras vezes em seus milagres.


Tem ânimo, meu filho; os teus pecados te são perdoados!”, diz Jesus ao paralítico. Para Jesus a enfermidade mais grave e urgente do paralítico não é sua enfermidade física e sim seu pecado (enfermidade da alma). Para a cura das enfermidades espirituais é necessária a colaboração do próprio enfermo (conversão e fé em Deus) e o perdão de Deus (misericórdia).


“Os teus pecados te são perdoados!” É a primeira vez que o evangelista Mateus menciona este tipo de poder que Jesus tem: o poder de perdão. O poder que Jesus tem em relação ao pecado é um poder de reconciliação dos homens com Deus. “Os pecados” em Mateus significam o passado pecador do homem, antes de seu encontro com Jesus. A fé em Jesus, que é a adesão a ele e a sua mensagem, apaga o passado pecador do homem e dá-lhe oportunidade de um novo começo. O pecado é capaz de paralisar a vida do homem, mas a conversão e a fé em Deus libertam o homem de sua paralisia para viver na liberdade de um filho de Deus. Da parte de Jesus não há pecado que não possa ser perdoado. Basta o homem se arrepender e voltar para Deus, o Deus da misericórdia não quer saber mais o passado do homem. Mas através do profeta Isaias Deus nos dá o seguinte recado: “Cessai de fazer o mal, aprendei a fazer o bem”.


Mas o evangelista Mateus não somente se concentra no poder de Jesus de perdoar pecados. Mais adiante, no seu evangelho, ele vai nos dizer que a comunidade cristã é o lugar de reconciliação e do perdão mútuo. Jesus Cristo vai dar o dom do poder de perdoar à comunidade cristã: “Em verdade vos digo: tudo o que ligardes sobre a terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu” (Mt 18,18). Assim a comunidade cristã ou a Igreja se transforma em lugar de libertação dos pecados e de liberdade dos reconciliados.


“Os teus pecados te são perdoados!” Como é bom viver com uma consciência limpa. Como é leve uma vida sem mancha moral ou ética. É uma liberdade que faz qualquer um viver a vida na alegria. Quando o coração estiver limpo podemos aplicar para nós as palavras de São Paulo aos filipenses: “Alegrai-vos no Senhor. Repito: alegrai-vos” (Fl 4,4). Há alegria disfarçada para calar ou abafar os gritos de um coração sujo, como escreveu um psicólogo argentino: “Há gargalhadas que se parecem mais com um soluço do que com uma risada” (René Juan Trassero). Mas a alegria no Senhor é uma alegria que liberta e salva: “Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus”, prometeu-nos Jesus no Sermão da Montanha (Mt 5,8).


 Ao dizer “Tem ânimo, meu filho; os teus pecados te são perdoados!”, Jesus usa aqui a visibilidade da cura corporal, perfeitamente controlável, para provar outra cura espiritual, a cura da alma em estado de pecado. Jesus pronunciou formulas de absolvição: “teus pecados são te perdoados”, e depois, fez gestos exteriores de cura: “levanta-te e vai para tua casa”. Muitas doenças acontecem conosco porque causa dos problemas não solucionados. Trata-se de doenças psicossomáticas. É preciso que reorganizemos nossa vida no Senhor para que nossa alegria seja plena.


A Igreja é o prolongamento real da Encarnação de Jesus, como Ele próprio é o grande Sacramento, a presença visível de Deus. Assim a Igreja é o grande Sacramento visível de Cristo. Jesus comunicou seu poder de perdoar a seus apóstolos, isto é, para aqueles que, durante todo o tempo da Igreja, têm missão de fazê-la existir como Igreja exercendo o ministério que lhes foi confiado (cf. Mt 16,19). Quando os apóstolos ou seus sucessores perdoam em nome de Cristo é todo o povo de Deus que se encontra comprometido no mistério da cruz e no ato divino-humano de perdão que ali tomou corpo. Os sacramentos são sinais visíveis que manifestam a graça invisível. A Igreja inteira, pelo ministério apostólico, está constituída no ato de misericórdia em proveito de toda a humanidade. Neste sentido pode se dizer que o cristão é ministro da misericórdia divina no sentido de que ele é chamado para perdoar sempre porque Deus o perdoa sempre e por isso, ele vive por causa da misericórdia divina. Todos são chamados a participar da obra de misericórdia. A Igreja é a misericórdia de Deus para os homens.


Vendo a fé que eles tinham, Jesus disse ao paralítico:Tem ânimo, meu filho; os teus pecados te são perdoados! ’”. A fé, que é o dom de Deus ao homem, se for autêntica é capaz de levar o homem à conversão, à orientação de sua vida e de sua caminhada para a felicidade e para a salvação. Deus valoriza o futuro do homem e perdoa seu passado desde que o homem se converta. Mas será que nossa fé é autêntica? A verdadeira fé em Deus mantém nossa vida em ordem que traz a paz. “A paz é a tranquilidade da ordem”, dizia Santo Agostinho. A fé é capaz de ordenar tudo na simplicidade de nossa vida, pois para Deus tudo é simples e para o simples tudo é divino.


Mas “alguns Mestres da Lei pensaram: ‘Esse homem (Jesus) está blasfemando’”. Com esta expressão se põe em evidência de que o Deus de Jesus não era o deus dos dirigentes de seu povo. Mais uma oposição contra o plano de Deus que o evangelista Mateus tem nos mostrado até agora.


Também nós corremos o perigo de fazermos um Deus à medida de um sistema ou de uma instituição que pode nos levar para um fanatismo fundamentalista que leva à autodestruição ou ao cataclismo de matar o outro por amor a suposto Deus em quem se acredita ou em nome de Deus e para servi-lo. Seria um Deus muito cruel, mas não é um Deus misericordioso revelado por Jesus. Temos que tomar cuidado para que nenhum sistema possa pensar por nós. Deste jeito criaremos ídolos e seremos idólatras, não mais filhos e filhas de Deus que precisam viver a fraternidade universal como consequência lógica e essencial da consciência de que Deus é o Pai de todos.
 
P. Vitus Gustama, SVD

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