terça-feira, 31 de julho de 2018



2/8/2018




ESFORÇAR-SE PARA SELECIONADO POR DEUS NO FIM DA HISTÓRIA


Quinta-Feira da XVII Semana Comum


Primeira Leitura: Jr 18,1-6
1 Palavra dirigida a Jeremias, da parte do Senhor: 2 “Levanta-te e vai à casa do oleiro, e ali te farei ouvir minhas palavras”. 3 Fui à casa do oleiro, e eis que ele estava trabalhando ao torno; 4 quando o vaso que moldava com barro se avariava em suas mãos, ei-lo de novo a fazer com esse material um outro vaso, conforme melhor lhe parecesse aos olhos. 5 Fez-se em mim a palavra do Senhor: 6 “Acaso não posso fazer convosco como este oleiro, casa de Israel? diz o Senhor. Como é o barro na mão do oleiro, assim sois vós em minha mão, casa de Israel”.


Evangelho: Mt 13, 47-53
Naquele tempo, disse Jesus à multidão: 47 “O Reino dos Céus é ainda como uma rede lançada ao mar e que apanha peixes de todo tipo. 48 Quando está cheia, os pescadores puxam a rede para a praia, sentam-se e recolhem os peixes bons em cestos e jogam fora os que não prestam. 49 Assim acontecerá no fim dos tempos: os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, 50 e lançarão os maus na fornalha de fogo. E aí, haverá choro e ranger de dentes. 51 Compreendestes tudo isso?” Eles responderam: “Sim”. 52 Então Jesus acrescentou: “Assim, pois, todo mestre da Lei, que se torna discípulo do Reino dos Céus, é como um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas”. 53 Quando Jesus terminou de contar essas parábolas, partiu dali.
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É Preciso Voltarmos Para Quem Nos Criou e Para Quem Nos Inspirou


Acaso não posso fazer convosco como este oleiro, casa de Israel? Como é o barro na mão do oleiro, assim sois vós em minha mão, casa de Israel”, assim disse o Senhor para  o profeta Jeremias que lemos na Primeira Leitura.


A narração é breve que conta o episódio da vida de Jeremias  a partir dos acontecimentos triviais  da vida cotidiana (Jr 18,1-12). Deus pede que Jeremias preste atenção para o trabalho de um oleiro. Enquanto Jeremias observa como o oleiro trabalha com o barro na mão: moldar e dar forma até onde o barro permite, assim também faz Deus com Judá (Casa de Israel). O Deus de Israel reconhece a liberdade do povo para escolher o bem ou o mal. O Criador (“Oleiro divino”) está limitado pelas propriedades de sua matéria prima chamada o ser humano.


A liberdade é algo dado por Deus ao ser humano para seu bem ou para seu mal. Mas no universo criado por Ele há as próprias leis embutidas nele que o ser humano deve observar. O homem é parte da criação, foi tirado da terra (Gn 2,7) e por isso está vinculado a todo o criado; é um ser transitório. O homem é todo terra e, por isso, é mortal. No AT, morrer é voltar à terra de onde ele veio.


Pela sua incoerência, pelo abuso da liberdade, o ser humano peca. O pecado do ser humano consiste na impossibilidade de amar a Deus de todo o coração, com toda a alma e com todas as forças e assim amar aos demais. Por isso, o ser humano se encontra em oposição consigo mesmo, com Deus, com os outros e com o mundo. Em tudo ele necessita de Deus.


Para se tornar o pó vivente novamente, o ser humano deve estar vinculado permanentemente ao seu Criador em quem Deus soprou seu hálito (Gn 2,7) ou renovar este vínculo permanentemente. O ser humano é um ser inspirado por Deus porque traz em si a inspiração criadora. Mesmo praticando o mal, para o ser humano é dada oportunidade para estar vinculado outra vez com Aquele que o criou, para ser novamente o sopro divino. O homem-barro, o homem-carne precisa do poder de Deus para transcender sua condição de simples ser carnal, ser barro. O Deus vivo é como a estrutura que mantém a vida do homem. “Acaso não posso fazer convosco como este oleiro, casa de Israel? Como é o barro na mão do oleiro, assim sois vós em minha mão, casa de Israel”. É preciso que nós, barro, voltemos para a mão do Oleiro divino.


Esforçar-se Para Ser Contado Entre Os Escolhidos


No fim dos tempos os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, e lançarão os maus na fornalha de fogo”.


Estamos ainda no discurso de Jesus sobre o Reino de Deus em parábolas (Mt 13). Desta vez Jesus conta uma parábola sobre a rede na pescaria em que no fim haverá a seleção entre os peixes bons e os peixes que não prestam: “Quando está cheia, os pescadores puxam a rede para a praia, sentam-se e recolhem os peixes bons em cestos e jogam fora os que não prestam”.


Na vida cotidiana sempre selecionamos e escolhemos o que é bom ou o que é melhor.  Selecionamos boas amizades. Selecionamos algo de bom ou de melhor para comprar, para comer, para morar, selecionamos roupa melhor, e assim por diante. Vivemos selecionando o que é bom ou o que é melhor. O bom ou o melhor é sempre o objeto do apetite ou do desejo do homem, qualquer que seja esse objeto. O ruim é, ao contrário, o objeto de ódio ou de aversão do homem. Mas nem tudo o que desejamos é bom, mas tudo o que é bom sempre desejamos. A bondade atrai, pois ela agrada e edifica. A bondade é a própria perfeição possuída por um ser. Por possuir a bondade, um ser que a tem é capaz de dar a outro a perfeição que lhe falta.


Quando Jesus compara o Reino de Deus a uma rede que é lançada sobre todos, mas que só os peixes bons são selecionados, ele está dizendo que se trata de uma coisa seletiva, em que a bondade é que tem valor e permanece para sempre. A bondade é sinal de amabilidade. Quem ama porque é bom. Quem é bom, ama.  A bondade é algo que em si tem algo divino, pois Deus é a Bondade por excelência. Por isso, a bondade tem uma marca de eternidade.


Os maus, ao contrário, vão fazer parte de outro reino, onde as pessoas somente vão odiar-se, segundo Jesus. A expressão: “Chorar e ranger os dentes” mostra bem como é a pessoa que odeia: vive como que rangendo os dentes. Eternamente infeliz. A frustração definitiva do homem (pranto e ranger de dentes) é perder a vida para sempre. A grande frustração do homem é sua incapacidade de viver na bondade, no bem, na compaixão, na simplicidade, na solidariedade. A bondade atrai. A simplicidade atrai. A arrogância, a prepotência, o orgulho, o complexo de superioridade afasta as pessoas e mata a caridade e a igualdade, elimina a comunhão fraterna e afasta os demais. Qualquer arrogante, prepotente, orgulhoso, ambicioso vive na tremenda solidão. Viver é conviver. Através da convivência saudável é que podemos crescer como seres humanos. Até a própria vulnerabilidade da convivência nos ajuda a crescermos como pessoas saudáveis.


A parábola da rede lida neste dia se refere ao julgamento final. A imagem da pesca ilustra a dinâmica do Reino de Deus feita de perdas e ganhos. Uma vez a rede lançada ao mar, a pescaria já não depende da vontade do pescador. Cada lançada de rede é uma surpresa. A seleção será feita somente no final da pescaria, quando os peixes bons são colocados em cestas, enquanto os maus são jogados fora.


A parábola propõe a todos nós a sorte final, para orientar-nos na decisão presente. Quando soubermos para onde vamos, saberemos também escolher por onde devemos caminhar (saber escolher o caminho). Os únicos que chegam à vida em plenitude, pela misericórdia de Deus, são os que produzem fruto bom nesta vida; são os que em si tem a marca de eternidade como a bondade, o amor, a compaixão, a solidariedade e assim por diante. Tudo que tem algo divino em mim e na minha vivência será reconhecido por Deus (cf. Mt 25,31-46). A sabedoria cristã consiste no discernimento dos verdadeiros valores do Evangelho como amor, partilha, solidariedade, compaixão, perdão, honestidade, justiça, paz etc., e em sua aplicação para as circunstâncias atuais. Há que estabelecer uma escala de valores para que cada cristão possa orientar sua maneira de viver no presente. Os outros valores devem estar subordinados em função dos valores superiores do Reino de Deus.


Mas ao mesmo tempo, esta parábola quer nos recordar que somente Deus tem a competência na seleção entre os bons e os maus no fim de cada história. Cristão nenhum tem condições para classificar quem vai para o céu e quem não vai para lá, pois sua própria salvação ainda não está garantida, pois ele continua sendo pessoa capaz de pecar em qualquer momento. É preciso olharmos para cada ser humano como filho(a) de Deus e nosso irmão. Como dizia Santo Agostinho: “Amando ao próximo tu limpas os olhos para ver a Deus” (In Joan. 17,8). Quanto mais santo for o homem, mais se reconhecerá como pecador. A conversão não é uma carreira acabada. A conversão é diária, pois somos capazes de optar por outros valores em nome de algum interesse não-cristão. Deixemos Deus determinar a qualidade de cada um e não nos arroguemos pelas qualidades que temos, pois tudo de bom em nós tem sua origem no Supremo Bem que é Deus. Tudo de bom em nós deve ser partilhado para com os outros. Fazemos tudo de bom, porque Deus da bondade faz isso. “Faze o que deves fazer. E faze-o bem. Esta é a única norma para alcançar a perfeição”, dizia Santo Agostinho (In ps. 34,2,16). Somos prolongamento da generosidade do Deus-Criador que criou tudo para o bem da humanidade gratuitamente. Temos apenas o direito de usufruto. Esse direito cessará neste mundo cessará quando terminar nossa caminhada na história.


Deus tem paciência para esperar os frutos bons de cada um de nós. a história é o tempo para crescermos no bem e na bondade e para nos amadurecermos como filhos e filhas de Deus.  Primordialmente, somos bons porque tudo o que Deus criou era bom (cf. Gn 1,1ss). Deus aguarda a colheita, não diminuída por prematuras intervenções de escolha. Só então, no fim, haverá a colheita, com base na realidade de ser grão ou joio/cizânia, peixe bom ou mau, de ser caridoso ou egoísta. É uma advertência eficaz, embora tácita: Deus é paciente com todos e deixa aos pecadores, cada um de nós, tempo para amadurecer sua conversão; Deus sabe esperar a livre decisão do homem, cabe a cada um escolher ser bom grão e bom peixe e não peixe imprestável.


Portanto, é prudente premunir-se, pensar enquanto é tempo, decidir-se a fazer o bem, ser útil aos outros, ser peixe bom, ser selecionado por Deus no fim de nossa história, pois “No fim dos tempos os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, e lançarão os maus na fornalha de fogo”.

P. Vitus Gustama, SV

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