Domingo,01/12/2019
ESTAR
VIGILANTE E PREPARADO PARA A VINDA DO SENHOR
I
DOMINGO DO ADVENTO DO “ANO A”
Primeira Leitura: Is 2,1-5
1 Visão de Isaías, filho de Amós, sobre Judá e Jerusalém. 2 Acontecerá,
nos últimos tempos, que o monte da casa do Senhor estará firmemente
estabelecido no ponto mais alto das montanhas e dominará as colinas. A ele
acorrerão todas as nações, 3 para lá irão numerosos povos e dirão: “Vamos subir
ao monte do Senhor, à casa do Deus de Jacó, para que ele nos mostre seus
caminhos e nos ensine a cumprir seus preceitos”; porque de Sião provém a lei e
de Jerusalém, a palavra do Senhor. 4 Ele
há de julgar as nações e arguir numerosos povos; estes transformarão suas
espadas em arados e suas lanças em foices; não pegarão em armas uns contra os
outros e não mais travarão combate. 5 Vinde, todos da casa de Jacó, e
deixemo-nos guiar pela luz do Senhor.
Segunda Leitura: Rm 13,11-14a
Irmãos: 11 Vós sabeis em que tempo estamos, pois já é hora de despertar.
Com efeito, agora a salvação está mais perto de nós do que quando abraçamos a
fé. 12 A noite já vai adiantada, o dia
vem chegando; despojemo-nos das ações das trevas e vistamos as armas da luz. 13
Procedamos honestamente, como em pleno dia; nada de glutonerias e bebedeiras,
nem de orgias sexuais e imoralidades, nem de brigas e rivalidades. 14 Pelo
contrário, revesti-vos do Senhor Jesus Cristo.
Evangelho: Mt 24,37-44
Naquele
tempo, Jesus disse aos seus discípulos: 37 “A vinda do Filho do Homem será como
no tempo de Noé. 38 Pois nos dias, antes do dilúvio, todos comiam e bebiam,
casavam-se e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. 39 E
eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e arrastou a todos. Assim
acontecerá também na vinda do Filho do Homem. 40 Dois homens estarão trabalhando
no campo: um será levado e o outro será deixado. 41 Duas mulheres estarão
moendo no moinho: uma será levada e a outra será deixada. 42 Portanto, ficai
atentos, porque não sabeis em que dia virá o Senhor. 43 Compreendei bem isto:
se o dono da casa soubesse a que horas viria o ladrão, certamente vigiaria e
não deixaria que a sua casa fosse arrombada. 44 Por isso, também vós ficai
preparados! Porque, na hora em que menos pensais, o Filho do Homem virá”.
____________
Com este primeiro domingo do Advento começamos
o Ano Novo na liturgia: o Ano A, durante o qual refletimos sobre as
mensagens do Evangelho de Mateus. Cada Ano Novo litúrgico começa no Primeiro
Domingo do Advento e termina na Festa do Cristo, Rei do Universo (XXXIV Domingo
do Tempo Comum).
Antes de refletirmos sobre o texto do
evangelho deste primeiro domingo, vamos olhar um pouco para o Tempo do Advento
e seu sentido.
SENTIDO DO ADVENTO
O termo “Adventus” é tirado do vocabulário
pagão que significa “chegada, vinda; aniversário de uma chegada, de uma vinda.
O tempo do Advento possui dupla característica:
- Um tempo de preparação para as solenidades do Natal, em que se comemora a primeira vinda do Filho de Deus entre os homens: Deus se doa totalmente. É uma festa de doação total. Natal não é presente que você compra, não é luzes luminosas, mas doar-se uns aos outros. Plante árvore no seu coração onde você possa pendurar, em vez de cartões, os nomes das pessoas próximas e distantes, os que você ama bastante e os que você ainda não ama bastante, os que não o amam etc....
- Um tempo em que, por meio desta lembrança, voltam-se os nossos corações para a expectativa da segunda vinda de Cristo (parusia) no fim dos tempos. Por este duplo motivo, o tempo do Advento se apresenta como um tempo de piedosa e alegre expectativa.
Em relação a esta dupla característica todos
nós somos chamados a viver algumas atitudes essenciais:
LITURGIA DO
ADVENTO
- A atitude da espera vigilante: Por que espera? Porque o Deus da revelação é o Deus da promessa que em Cristo manifestou toda a sua fidelidade. Ele prometeu e cumpriu porque Ele é fiel a si mesmo. O próprio nome dele é fidelidade. Esta atitude deve ser acompanhada pela vigilância. Vigiar é ser capaz de detectar tudo quanto possa desviar nossa atenção de nosso fim, de nossa meta, acabando por nos afastar dos caminhos de Deus; colocar-se em contínua ligação com Deus de Quem recebemos luz, força, consolo e firmeza.
- A esperança: O Advento celebra o Deus da esperança e vive a alegre esperança (Rm 5,13; 8,24s). A esperança é a característica dos que creem em Deus independentemente das circunstâncias. A esperança é aquela atitude que olha, primordialmente, o ser das coisas e o agir humano, o bom; descobrir no negativo o que há de positivo; transforma cada sofrimento em crescimento. Como diz um dito popular: Não se queixe de que as rosas têm espinhos, porque há consolo em pensar que até entre os espinhos há rosas. Esta possibilidade nos permite que nos tornemos esperançosos. O motivo profundo de nossa esperança é este: Deus vem nos salvar (Sl 84).
- Conversão: O Deus que entra na nossa história põe em causa cada um de nós. Questiona a nossa vida: atos e atitudes, critérios e visão sobre todas as coisas. Ele nos chama ao bem, a Ele e aos próximos. Que esta conversão seja sincera: passa do coração às obras e isto acontece durante a vida inteira de um cristão; é uma tarefa silenciosa de cada dia.
O conteúdo das leituras bíblicas, sobretudo
do Evangelho, focaliza para cada domingo do Advento um tema específico:
- 1º Domingo: A vigilância na espera do Senhor. O primeiro domingo anuncia o retorno do Senhor (O dia está próximo: Ano A; quando vier, tudo será restaurado, o universo e cada um de nós: Ano B; É preciso vigiar e estar pronto para comparecer de pé diante do Filho do Homem, a justiça será instaurada no fim dos tempos: Ano C).
- 2º Domingo: convite para a conversão. Se o Reino de Deus está próximo, é necessário preparar os caminhos: conversão. É o tema específico do II Domingo do Advento. O Espírito está sobre o Senhor e nele as promessas são confirmadas (Ano A). Preparar os caminhos significa preparar um mundo novo, uma terra nova(Ano B). Devemos saber ver a salvação de Deus, cobrir-nos com o manto da justiça e revestir-nos do esplendor da Glória do Senhor (Ano C).
- 3º Domingo: o testemunho dado a Jesus pelo Precursor (João Batista). O III domingo apresenta os tempos messiânicos. Deus vem salvar-nos, a sua vinda está próxima, as curas são o sinal da sua presença (Ano A). No meio de nós está alguém que não conhecemos. Exultamos pela presença de quem está marcado pelo Espírito (Ano B). Um mais poderoso que João Batista deve chegar. Já está aqui. É este o tempo de fraternidade e da justiça (Ano C).
- 4º Domingo: o anúncio do nascimento de Jesus. No quarto domingo todos os textos são de caráter mariano: destacam-se a relação e a cooperação de Maria no mistério da redenção. José foi pre-advertido. Uma virgem conceberá o Filho de Deus, Jesus Cristo, da descendência de Davi (Ano A). A notícia é comunicada a Maria (Ano B). Ele vem para cumprir a vontade de Deus (Ano C).
PARA REFLETIR
“Uma menina estava fazendo suas orações algumas noites antes do Natal. Repentinamente ela parou e perguntou à sua mãe sobre um problema que a fez preocupada: ‘O que estamos dando de presente a Deus neste Natal? O que é que Deus quer, realmente, neste Natal?’ Sorrimos, mas esta é a grande questão. Será que Deus está na lista do seu Natal?” (Frank Mihalic,SVD: 1000 Stories You Can Use vol.1)
Este Primeiro Domingo do Advento nos relembra o horizonte supremo da história, identificado com a vinda do Filho do Homem. Aí a nossa vida está inscrita, a importância do que está em jogo, e constitui um apelo à seriedade: “Irmãos, Vós sabeis em que tempo estamos, pois já é hora de despertar. Com efeito, agora a salvação está mais perto de nós do que quando abraçamos a fé” (Rm 13,11). Daqui nasce ou se revela a recomendação ou o alerta: frequentemente ficamos adormecidos. Na seriedade da vida nada é automático. É necessária uma escolha real em cada momento. A vida tem seu fim. Este mundo não é nossa morada eterna. Mas esta perspectiva não é fonte de medo, e sim de gozo. Trata-se do encontro definitivo com Aquele que conhecemos, com Quem vivemos (Jo 1,14) e que, finalmente, “Ele há de julgar as nações” (Is 2,4).
Os capítulos 24-25 de Mateus (Mt 23 faz uma retrospectiva e a ruptura com o judaísmo), onde se encontra o nosso texto deste domingo, constituem o quinto e último grande discurso de Jesus no evangelho de Mateus (o 1º Mt 5,1-7,29: o Sermão da Montanha onde Jesus proclama o Reino dos Céus e suas exigências; o 2º Mt 9,35-10,42: o discurso missionário; o 3º Mt 13,3b-52: o discurso sobre a natureza do Reino dos Céus em parábolas; o 4º Mt 18,3-34: o discurso eclesiológico onde se fala de como viver como uma comunidade que aceita o Reino dos Céus). Para compor este último discurso, Mateus elaborou notavelmente o chamado “discurso escatológico” de Marcos (Mc 13) e o ampliou com uma série de três parábolas e uma impressionante descrição do juízo final cuja principal intenção é orientar os cristãos sobre como devem preparar a Segunda Vinda do Senhor (Parusia).
“Uma menina estava fazendo suas orações algumas noites antes do Natal. Repentinamente ela parou e perguntou à sua mãe sobre um problema que a fez preocupada: ‘O que estamos dando de presente a Deus neste Natal? O que é que Deus quer, realmente, neste Natal?’ Sorrimos, mas esta é a grande questão. Será que Deus está na lista do seu Natal?” (Frank Mihalic,SVD: 1000 Stories You Can Use vol.1)
O Advento coincide com o lançamento comercial
da “operação natal”. Os comerciantes se preocupam mais em vender mais e os
consumidores se preocupam com um melhor presente para alguém. Justamente, por
isso, deve comprometer-se a transmitir os valores e as atitudes que estejam de
acordo com a visão escatológica transcendental desta vida. O Advento, com sua
mensagem de espera e de esperança diante da vinda do Senhor, deve formar
comunidades cristãs e crentes que se proponham como sinais alternativos para
uma sociedade em que as áreas do desespero parecem mais vastas do que as da
fome. A dimensão escatológica desta vida não deve diminuir, mas aumentar cada
vez mais o compromisso e a responsabilidade da parte que se declaram cristãos
através do serviço aos homens prestado aqui na terra.
É necessário reivindicar o sentido pleno do
Advento como atitude cristã fundamental: esperar a Deus e esperá-Lo em Jesus;
crer em Sua vinda progressiva, misteriosa, mas real para todos nós e para o
mundo. O Advento é esse tempo concreto que rompe nossa monotonia para nos pôr
no caminho da conversão, para centrar nossa vida não em uma irrealidade e sim
na realidade maravilhosa de Jesus que se aproxima da vida dos homens como nosso
Salvador. O aniversariante do Natal é Jesus Cristo, nosso Salvador.
Nossa salvação descansa em uma Vinda. Isso
nos diz o Advento. Todo ano o Advento nos exorta a considerarmos o prodígio
desta Vinda. Mas também nos lembra que seu significado só pode adquirir sua
plenitude se o Redentor não vier apenas para a humanidade como um todo, mas
para cada um de nós em particular: em suas alegrias e misérias, em suas
convicções, perplexidades e tentações, em tudo. O que constitui seu ser e sua
vida. Descobrir do fundo de nossas consciências que Cristo é meu Redentor e vem
para a minha vida é pôr-se no caminho do Advento. O Advento autêntico procede
do interior. Do interior do coração crente do homem e, acima de tudo, da
profundidade do amor de Deus. Devemos preparar o caminho para o Seu amor e
descobrir novas formas que nos disponibilizem para receber "o Salvador de
Deus". Este é o sentido do seguinte
belo desejo e da bela oração: “Venha, Senhor Jesus!”.
MENSAGENS DAS LEITURAS
DESTE PRIMEIRO DOMINGO DO ADVENTO
Este Primeiro Domingo do Advento nos relembra o horizonte supremo da história, identificado com a vinda do Filho do Homem. Aí a nossa vida está inscrita, a importância do que está em jogo, e constitui um apelo à seriedade: “Irmãos, Vós sabeis em que tempo estamos, pois já é hora de despertar. Com efeito, agora a salvação está mais perto de nós do que quando abraçamos a fé” (Rm 13,11). Daqui nasce ou se revela a recomendação ou o alerta: frequentemente ficamos adormecidos. Na seriedade da vida nada é automático. É necessária uma escolha real em cada momento. A vida tem seu fim. Este mundo não é nossa morada eterna. Mas esta perspectiva não é fonte de medo, e sim de gozo. Trata-se do encontro definitivo com Aquele que conhecemos, com Quem vivemos (Jo 1,14) e que, finalmente, “Ele há de julgar as nações” (Is 2,4).
O momento do juízo final é desconhecido. Trata-se
da ignorância que deve provocar a vigilância; da ignorância que deve
confundir-se com insciência ou despreocupação pelo momento do tempo em que
vivemos. As leituras deste domingo querem nos relembrar que caminhamos ao
encontro do momento último da fase final já inaugurada com a encarnação de
Deus. Em cada momento vivemos os tempos últimos: “A
noite já vai adiantada, o dia vem chegando; despojemo-nos das ações das trevas
e vistamos as armas da luz” (Rm 13,12).
A expectativa diante do Retorno do Senhor (Segunda
Vinda), como enfatizam as leituras deste Primeiro Domingo do Advento, polariza
a atenção da Igreja. Nossos olhares se fixam em Deus.
Na ANTÍFONA DA ENTRADA rezamos: “A vós, meu Deus, elevo a mina alma. Confio
em vós, que eu não seja envergonhado!” (Sl 24,1-3). E na COLETA
(oração inicial) pedimos ao Senhor que avive em seus fiéis o desejo de sair ao
encontro de Cristo, acompanhados pelas boas obras, para que, um dia, colocados à
sua direita, mereçamos possuir o Reino eterno. Na ORAÇÃO SOBRE AS OFERENDAS
suplicamos ao Senhor que aceite os bens que d´Ele recebemos (estamos no mundo
da gratuidade de Deus) e, pela apresentação do pão e do vinho, nos conceda que
a ação santa que celebramos torne-se prêmio da redenção eterna para nós. E na ORAÇÃO
PÓS-COMUNHÃO suplicamos ao Senhor que frutifique em nós a
celebração dos sacramentos, com os quais Ele nos ensina a descobrir o valor dos
bens eternos e pôr neles nosso coração.
Com o Advento tratamos, então, de abrir
nossas vidas ao mistério de Cristo vivo, proclamando a imensa necessidade que
temos d´Ele. Evocamos a Primeira e a Segunda Vinda do Salvador. Por isso, é
ocasião propícia para renovar nossa fé e nossa responsabilidade diante do mistério
salvífico de Cristo e diante da vida que vivemos.
Em Is 2,1-5
que lemos na Primeira Leitura o
Senhor reúne todos os povos na paz do Reino de Deus. Apesar da ignorância e das
aberrações dos homens, nos planos divinos, o desígnio de salvação se estende a
toda a humanidade. Todos temos total necessidade do Cristo Redentor e da
revelação plena do amor de Deus. Nesta primeira leitura, o profeta Isaías
contempla o dia do Senhor à distância e apresenta o caráter universal de toda a
salvação. O povo da Aliança (antigo e novo Israel) foi escolhido por Deus para
possuir e transmitir a fé e a salvação a todos os povos. Deus trabalha para o
mundo através da Igreja.
Daí a responsabilidade de todo cristão de não
pôr obstáculos para a missão salvadora e redentora de Cristo. A todos nos
incumbe sempre uma atitude missionária, na medida de nossas possibilidades,
segundo os diversos estados em que vivemos nossa vocação.
Com o Salmo Responsorial
(Sl 121) expressamos nossa alegria porque caminhamos para a
Jerusalém celeste, para a glória futura, e isto nos obriga a exortarmos a todos
os homens, nossos irmãos e irmãs para que vivam em paz e que também eles se
encaminhem para a Casa do Pai, nossa Casa Comum (o Céu).
A Segunda Leitura
tirada da Carta de são Paulo aos Romanos (Rm 13,11-14)
nos relembra que nossa salvação está próxima. Nós que conhecemos pela fé o mistério
de Cristo não podemos cair na inconsciência de viver na irresponsabilidade dos
filhos das trevas. Nossa vida presente é uma marcha para o futuro. Por isso,
para o cristão, que espera esse encontro e que fazem suas as aspirações dos
homens de seu tempo, o sentido da história da humanidade é o sentido de sua própria
história que somente tem valor à luz de Cristo. Afastar-se disso é caminhar nas
trevas.
No evangelho
deste Domingo (Mt 24,37-44), Jesus compara os
homens que vivem nesta fase final, caminhantes para o momento último, com a
geração do tempo de Noé. Viviam na insciência ou despreocupação total de sua
salvação e se sentiam seguros de si. Pensavam apenas no prazer do momento
(Carpe diem). Mas foram surpreendidos pela destruição total: do sentimento de
auto- segurança para a destruição. O cristão não deve ser surpreendido com uma
imprevisão tão lamentável. O cristão sabe muito bem o que espera e que a
repentinidade (algo repentino) dos acontecimentos últimos não permite pensar no
último momento para a conversão.
A preparação-vigilância nasce da própria
entranha do Evangelho, a Boa Nova da salvação. A pertença à família de Deus
leva consigo as exigências de uma conduta adequada. Trata-se de uma seriedade
posta em destaque no contraponto da superficialidade e d perversidade da geração
do dilúvio. O cristão por ser servo de seu Senhor deve permanecer vigilante e
cumprindo seu dever como cristão. Somente assim ele será recompensado por seu
Senhor que voltar na sua segunda vinda. A atitude do cristão deve traduzir
perfeitamente a postura do homem de fé, a exemplo de Noé. Aos cristãos há a
seguinte recomendação: “Sejam como Noé e não como seus contemporâneos!”. Porque
quando vier o Filho do Homem se repetirá o que aconteceu com a geração do tempo
de Noé: “Um será levado e o outro será deixado. Duas
mulheres estarão moendo no moinho: uma será levada e a outra será deixada”
(Mt 24,40-41). Quem será levado é aquele que pertence a Cristo (Cf. Mt
10,32-33). E isso sem previsão nenhuma, em plenos afazeres de cada dia, no
trabalho, no campo ou na preparação da farinha para fazer o pão de cada dia. Não
sabemos o dia nem a hora. Somente a fé vigilante e a fidelidade permanente
podem fazer nossas vidas dignas da salvação eterna.
Por isso, fica para nós o alerta: a realidade
cotidiana com sua monotonia pode nos fazer adormecidos. Ao nosso redor há
guerras, violências, injustiças, corrupções, e assim por diante. O perigo é que
ficamos acostumados com tudo isso sem nenhuma reflexão mais profunda. Existe quem
responde e quem se cala, quem se esforça e quem se abandona. São João Crisóstomo
chama aqui a vigilância cheia de esperança: “No
meio da escuridão, tu não podes distinguir o amigo do inimigo. Não distinguimos
de noite os metais preciosos das meras pedras. Do mesmo modo, o avaro e o
licencioso não distinguem a verdade e o valor da virtude. Assim como aquele que
caminha de noite, morto de medo, de igual modo os pecadores andam continuamente
atormentados pelo medo de perder seus bens e pelo remorso de sua consciência. ... Vivamos
sóbrios e vigilantes, como quer Cristo. Abramos
as portas para que aquela Luz nos ilumine” (Comentário ao Evangelho
de João, hom. 5). Por isso, a recomendação de são Paulo aos Romanos vale para
qualquer pessoa em qualquer tempo: “A noite já vai adiantada, o dia vem
chegando; despojemo-nos das ações das trevas e vistamos as armas da luz. Procedamos honestamente, como em pleno dia;
nada de glutonerias e bebedeiras, nem de orgias sexuais e imoralidades, nem de
brigas e rivalidades. Pelo contrário, revesti-vos do Senhor Jesus Cristo”
(Rm 13,12-14).
Estendamos um pouco mais nossa reflexão sobre o Evangelho deste
Domingo!
Os capítulos 24-25 de Mateus (Mt 23 faz uma retrospectiva e a ruptura com o judaísmo), onde se encontra o nosso texto deste domingo, constituem o quinto e último grande discurso de Jesus no evangelho de Mateus (o 1º Mt 5,1-7,29: o Sermão da Montanha onde Jesus proclama o Reino dos Céus e suas exigências; o 2º Mt 9,35-10,42: o discurso missionário; o 3º Mt 13,3b-52: o discurso sobre a natureza do Reino dos Céus em parábolas; o 4º Mt 18,3-34: o discurso eclesiológico onde se fala de como viver como uma comunidade que aceita o Reino dos Céus). Para compor este último discurso, Mateus elaborou notavelmente o chamado “discurso escatológico” de Marcos (Mc 13) e o ampliou com uma série de três parábolas e uma impressionante descrição do juízo final cuja principal intenção é orientar os cristãos sobre como devem preparar a Segunda Vinda do Senhor (Parusia).
Neste discurso, fala-se da vinda do Filho do
Homem e das atitudes com que os discípulos devem preparar para essa vinda. A
intenção de Mateus é responder à situação que vivia sua comunidade. Por um
lado, os membros da comunidade de Mateus perceberam que a segunda vinda do
Senhor estava se atrasando. Mas diante deles aparecia a história como espaço
para o compromisso. Por outro lado, o evangelista contempla com preocupação os
sinais de abandono, de negligência, de rotina e de esfriamento que começaram a
aparecer na comunidade. Nessa situação Mt descobriu que aquelas palavras de
Jesus contém uma exortação dirigida aos cristãos que se fundamenta numa
profunda convicção: a vinda do Filho do Homem é um fato certo, no entanto, não
se sucederá em seguida. Por isso, é necessário preparar esse grande
acontecimento vivendo segundo os ensinamentos de Jesus.
O estilo e as imagens desses capítulos podem
provocar temor. Trata-se, porém, de uma forma de falar que era relativamente freqüente
entre alguns grupos judeus e cristãos da época de Jesus. Esta linguagem se
conhece com o nome de apocalíptico, porque seu objetivo é manifestar uma revelação
escondida (apocalypsis). Em muitas ocasiões esta revelação está dirigida
a grupos e comunidades que vivem uma situação de perseguição, com o objetivo de
animá-los em suas tribulações. Por isso, não tem que ver neste texto uma
ameaça, mas sim uma mensagem de esperança.
Depois de descrever os sinais que precederam
a vinda do Filho do Homem (Mt 24,4-35), Jesus responde a outra pergunta acerca
do momento de sua vinda (24,3). A resposta é bem clara: ninguém sabe, somente o
Pai. Ante esse desconhecimento do dia e da hora, a única atitude possível é a
espera vigilante (v.42) e estar preparado (v.44).
A espera do Advento é pura esperança.
Espera-se Aquele que já está presente. Procura-se Aquele que deseja ser
encontrado. A atitude da espera caracteriza o cristão porque o Deus da
revelação é o Deus da promessa que em Cristo manifestou toda a sua fidelidade.
Tudo o que Deus prometeu através da boca dos profetas se cumpriu em Jesus
Cristo feito homem. Neste sentido o outro nome de Deus é FIDELIDADE. E todo o
caminho de fidelidade é sempre o caminho de felicidade.
Mas esta atitude de espera tem sua
característica vigilante (vv.42-44).
Vigiar é ser capaz de detectar tudo quanto possa desviar nossa atenção do fim
almejado, acabando por nos afastar dos caminhos de Deus. Inclusive ser vigilante no falar e nos
comentários: o que deve-se falar, o que não deve; no agir; no pensar, no julgar
e assim por diante. A vigilância tem a ver com a construção do Reino de Deus na
terra. Tem a ver com os pecados que devem ser superados e as virtudes que devem
ser vividas. Tem a ver com a prevalência dos critérios divinos cada vez que eu
confrontá-los com os meus. A vigilância
nos leva à idéia de estar acordado, atento e pronto para agir, seja para construir
uma obra de bem, seja para combater uma obra má. Sabemos que os atrativos e
prazeres passageiros do mundo, o acúmulo exagerado dos bens materiais e a
liberação dos instintos egoístas são todos elementos que corrompem o coração
humano, impedindo-o de se preparar para o encontro com o Senhor. O homem que
fica preocupado demais com viver e gozar o presente, acaba esquecendo, muitas
vezes, a dimensão futura da vida. Este é, certamente, o problema da geração do
dilúvio (vv.37-39): ela é tão imersa na vida do prazer desenfreado a ponto de
ficar cega diante do desastre iminente do dilúvio. A maior crise é não
reconhecer crise.
Ao mesmo tempo somos chamados a lembrar Noé
nesse dilúvio. Lembrar Noé é alimentar a esperança de que a salvação é possível.
Noé constrói um barco quando não há ainda sinal de chuva, confiando na voz de
Deus na sua consciência. Ele não constrói o barco só para si, mas para os
outros também. Ainda hoje, seguir a voz de Deus é alimentar a esperança da
salvação no meio de qualquer tipo de ameaça. Mas como Noé, deve-se produzir um
espaço de salvação onde outros podem e possam se abrigar. Onde há amor, todo
mundo tem lugar. Ninguém será agressivo, quando cada um tiver espaço.
A vinda de Cristo é certa mas o momento exato
dessa vinda é incerto. Mas devemos estar conscientes de que a vinda de Jesus é
luz que afugenta as trevas de nossos corações, é purificação de nossos pecados.
Por isso mesmo é motivo de alegria e nos alcança bens para a vida presente e a
futura. Para isso, é necessário cada cristão ter a atitude de abertura e de
vigilância. Por isso, quem cochila, quem para de se colocar em contínua ligação
com Deus de quem recebemos luz e força, acaba caindo na armadilha para pegar os
incautos. Só os vigilantes conseguem afastar-se das investidas do maligno.
Além disso, o que nos chama a atenção é a
afirmação de Jesus neste discurso: ”Dois
homens estarão trabalhando no campo: um será levado e o outro será deixado.
Duas mulheres estarão moendo no moinho: uma será levada e a outra será deixada”
(vv.40-41). Esta imagem nos apresenta como uma grande interrogação para a
consciência cristã. Primeiramente, porque o texto da Bíblia mostra que o juízo
de Deus tem em si uma real dimensão de surpresa. Existe em mim o que será
tomado e eternamente conservado por Deus? Ou toda a minha vida será deixada e
dolorosamente destruída? O homem ou a mulher ao meu lado, a mulher ou o homem
que passa à minha frente, quem são eles? Quem poderá afirmar com segurança que
será levado/eleito ou deixado/abandonado? A palavra de Jesus é tão grave, tão
franca, que nos coloca perante a real possibilidade duma perdição eterna.
Ninguém sabe quem é no pensamento de Deus, o seu próximo, que está ao seu lado.
A vigilância é, por isso, tão importante que é dela que depende de a sorte, de
perdição ou de salvação que vai tocar a cada indivíduo.
O sinônimo da vigilância é a atenção. Atenção é um comportamento
vigilante do eu sobre os outros porque os outros têm os mesmos sentimentos como
eu; atenção é uma transparência de olhar, uma prontidão em notar sinais de
sofrimento em volta de si, um doar-se; é a capacidade, antecipadamente, o que
os outros podem sentir. Desatenção é, ao contrário, fazer observação pungente,
sem pensar que alguém ao redor poderá se ferir; desatenção é não se dar conta
do que acontece com os outros. São tantas as desatenções que ferem e destroem
as mais belas amizades, que criam incompreensões nas famílias, noivos e
esposos. Ao contrário, quantos gestos de atenção reconciliam e reparam,
entrelaçam relações de paz. Atenção é um estremecer assustado do coração toda
vez que se viola a delicadeza, o respeito, o cuidado devido às pessoas. Atenção
é evitar fumar quando isto causa fastio aos outros. É saber tomar a devida distância
de si e dos acontecimentos para entender o que acontece. Atenção é, portanto,
amor verdadeiro, delicado, desinteressado, previdente. A atenção é uma
qualidade humana necessária e preliminar no caminho espiritual. A atenção é uma
graça que se pede e procura com meios adequados: estes não são somente a tensão
do espírito, mas também a oração insistente, a prudência de vida etc.
O Advento, por conseguinte, celebra o “Deus
da esperança” (Rm 15,13) e vive a alegre esperança. O homem de esperança sempre
acredita que tudo pode. Nesse “poder” há força. A esperança sempre repousa num
poder que possibilita a transformação da existência. O canto que caracteriza o
Advento é o do Salmo 25: “A ti, Senhor, eu me elevo. Eu confio em Ti…pois os
que esperam em Ti não ficam envergonhados”.
O conteúdo de toda esperança é sempre a busca
de libertação. Não se quer mudar pelo prazer de mudar. O que o homem espera é
“mudar de vida”, ou antes, transformar as condições inumanas da existência
humana. Não se pode dizer que há esperança, quando não se aspira a transformar
uma situação de servidão mais ou menos intolerável. Libertar-se para viver vida
verdadeiramente humana. Esperar é voltar-se para o futuro, é recusar-se a ser
bloqueado pelo imediato, resignando-se ao presente, às insuficiências do agora.
Jesus revela que o verdadeiro poder é uma
presença, a presença de um amor, cuja força, o Espírito Santo, é capaz de
atender as aspirações da esperança, transformando a humanidade inteira e libertando-a
plenamente. E Jesus Cristo é o poder de nossos poderes, a iniciativa de nossas
iniciativas. Por isso, “tudo posso em Jesus Cristo que me fortalece” (Fl 4,13).
Mas o Deus que entra na história põe em causa
o homem, questiona-o. Por isso, a vinda de Deus em Cristo requer contínua
conversão: a novidade do Evangelho é luz que exige despertar pronto e decidido
do sono, como diz São Paulo na segunda leitura deste domingo. O tempo do
Advento é o convite a deixar as trevas e ser iluminados pela luz de Jesus
Cristo. As palavras de São Paulo, na verdade, são um convite para a esperança,
para não deixar-se levar pelo desânimo, como acontece conosco frequentemente.
Se abrirmos melhor nossos olhos, descobriremos também os sinais luminosos de um
mundo novo, de uma vida nova que já começou em Jesus Cristo.
O que Jesus quer dizer no Evangelho é que ele
vem continuamente para salvar-nos e trazer-nos felicidade, mas temos que estar
acordados e atentos para perceber cada vinda sua. Não importa tanto se o dia de
amanhã será o último; importa que seja um dia repleto de eternidade. Todos os
dias “tocamos o final dos tempos” (1Cor 10,11). Os acontecimentos da vida são
tanto de Deus quanto nossos. Nossa vida, a cada instante, é julgada pela
presença crescente de Deus em nós.
P. Vitus Gustama,svd
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