domingo, 13 de agosto de 2023

ASSUNÇÃO DE MARIA, NOSSA SENHORA

Para os lugares que celebram a Assunção no dia 15 de Agosto.

ASSUNÇÃO DE MARIA

Lc 1,39-56         

No calendário litúrgico temos as quatro solenidades nas quais Maria é protagonista: 1 de janeiro, Maternidade Divina; 8 de dezembro, Imaculada Conceição; 15 de agosto, Gloriosa Assunção; 25 de março, Anunciação do Senhor. Duas delas tem referencias mais cristológicas: maternidade e anunciação, e outras duas tem mais eclesiológicas: conceição e assunção. É claro que toda festa mariana é cristológica: em função de Cristo Salvador. Mas com esta distinção quer-se enfatizar um fator exemplar de Maria que é importante para a Igreja: ela é a primeira redimida (imaculada conceição) e é a primeira glorificada (assunção).

O Papa Paulo VI resume o sentido da festa com estas palavras: “A solenidade de 15 de agosto celebra a gloriosa Assunção de Maria ao céu; festa do seu destino de plenitude e de bem-aventurança, da glorificação da sua alma imaculada e do seu corpo virginal, da sua perfeita configuração com Cristo Ressuscitado. É uma festa, pois, que propõe à Igreja e à humanidade a imagem e o consolante penhor do realizar-se da sua esperança final: que é essa mesma glorificação plena, destino de todos aqueles que Cristo fez irmãos, ao ter como eles "em comum o sangue e a carne" (Hb 2,14; cf. Gl 4,4)” [Marialis Cultus, n. 6]. 

A partir desta exortação podemos dizer que a Assunção de Maria é a realização da utopia humana, isto é, aquilo que o homem sonha, aquilo que o homem aspira, aquilo que responde maximamente à vontade de Deus. Em Maria a humanidade chega ao maior esplendor da existência humana, à beleza suprema do ser. Em Maria encontramos a melhor resposta, a melhor realização da vida de uma pessoa humana: sua glorificação. Maria nos revela até onde pode chegar a cooperação entre Deus e a humanidade. Diante do mistério de Cristo, Maria se deixa levar pelo Espírito Santo, e inventou cada dia novas respostas. 

Todos sabemos que o Evangelho não é uma coleção de informações, escritas para satisfazer a nossa curiosidade, mas é um texto de catequese. Tem como objetivo alimentar a fé de quem segue a Jesus e quer conduzir à compreensão sobre quem é aquele Jesus, a quem somos chamados a dar nossa adesão.         

A leitura do Evangelho de hoje é riquíssima. Tentemos entender o que Lucas quer nos ensinar através da visita de Maria a Isabel. E escolhemos somente alguns dos detalhes para a nossa reflexão: 

1. O Evangelista Lc não descreve que Maria simplesmente “andou”, mas que ela “partiu”/pôr-se a caminho”. Nos Evangelhos a idéia de viagem, de caminho, está intimamente ligada à obediência a Deus e ao discipulado de Jesus. O verbo “pôr-se a caminho” tem em Lucas o significado teológico de disponibilidade e obediência aos planos de Deus; pôr-se a caminho significa aceitar total e existencialmente o caminho proposto por Deus, pois esse caminho nos conduz sempre à felicidade embora tenhamos que atravessar vários obstáculos, mas no coração ressoa sempre uma certeza de que Deus está sempre caminhando conosco(Maria foi com Jesus no ventre).          

Maria se pôs a caminho significa que a partir daquele momento começou a sua vida como resposta à proposta ou aos planos de Deus.  É a resposta ao anúncio feito por Deus, que se funda, sobretudo, a leitura de Maria como modelo do discípulo perfeito, como a alma fiel por excelência.          

A fé de Maria é uma fé missionária. Depois de dizer o seu “sim”, leva-o através dos caminhos do nosso mundo para suscitar a alegria e o louvor. A viagem de Maria à Judéia (para Ain Karin), por isso, é um símbolo do caminho da fé que precisa ser testemunhada, compartilhada, que precisa servir; porque a fé não é somente o dom de Deus, mas também é uma resposta humana, e com todo ato humano. Dessa fé é que faz encontro e serviço. E quando a Palavra de Deus é ouvida com autenticidade, como Maria, não pode deixar de ser profundamente criativa e dialogante.          

E esta viagem interior, que é o caminho da fé, sempre se caracteriza por certa precariedade mas esta precariedade nos leva a uma profissão da fé de que não há outras certezas ou outros absolutos nesta vida a não ser o Senhor que é fiel às suas promessas, pois ele é o nosso Deus caminha conosco, o  Deus conosco.           

E caminhar na fé implica mover-se na obscuridade, convencido das realidades que não se vêem(Hb 11,1). E aquele que acredita que existe o Absoluto e sabe aonde vai tem muitas possibilidades de ser feliz e de usufruir de todas as coisas boas que Deus lhe oferece diariamente. E cada felicidade que experimentamos é sempre um prelúdio da felicidade eterna que já deve começar aqui nesta terra.          

Não é fácil acreditar, especialmente quando se exige de nós contrariarmos o nosso “bom senso”. É preciso ter muita coragem para acreditar que se realizarão as promessas feitas por Deus aos que são fiéis à Palavra do Senhor. Maria nos ensina que vale a pena confiar sempre constantemente nas Palavras do Senhor pois ele é o Emanuel, o Deus conosco. 

2. Maria partiu “apressadamente”. A expressão “apressadamente” não descreve a presteza externa com que parte nem descreve o estado psicológico de Maria. Lc quer sublinhar a atitude interior de fé e de obediência de Maria. Sua “pressa” está dinamizada pelo fervor interior, pela alegria e, sobretudo, pela fé(cf. Lc 1,38.45). “Às pressas” significa seriedade, empenho, solicitude, zelo, entusiasmo, ardor, prontidão etc.. No sentido teológico, então, a pressa de Maria é um reflexo da sua obediência, como serva e discípula fiel, em relação ao plano que lhe foi revelado pelo anjo, um plano que previa a gravidez de Isabel.   

Segundo M. Descalzo, a viagem de Maria para visitar Isabel foi “a primeira procissão do Corpus Christi”. O corpo de Maria foi o ostensório vivo e precioso que carrega por primeira vez o Corpo de Cristo. Mas se nos mergulharmos um pouco mais no mistério, descobriremos que, na verdade, Maria é levada por Aquele que ela leva no seu ventre.          

Quando Deus entra e atua na história de uma pessoa e tem realmente Jesus no coração, esse mesmo Jesus vai levar essa pessoa ao encontro dos outros, especialmente aos necessitados para partilhar a alegria e a esperança e irradiará e santificará os que dela se aproximarem. 

3. Maria é a arca da nova aliança, o lugar da presença de Deus no meio de nós. Como a arca da nova aliança, em Maria o Verbo se fez carne e os céus e a terra se encontraram. Mas ela não é um lugar que encerra Deus e sim um lugar que O dá. Ela não é uma arca que esconde o mistério, mas uma arca que o irradia. Maria é Aquela que, habitada pelo mistério, o dá.          

Quando na fé se dá espaço ao absoluto primado de Deus, a conseqüência lógica de ser habitado, de ser amado por Deus é sair de si, viver o êxodo sem regresso, que é o amor. O acolhimento da gratuidade do amor eterno torna-se a doação gratuita de tudo que se recebeu. Quem crê e vive da fé, tem capacidade de olhar para fora, aprecia o dom e o comunica. Certamente, respeitamos o dom de Deus quando nos tornamos arca irradiante e quando o restituímos a Deus, que nos estende a mão nos nossos irmãos. 

4. Maria é o símbolo perfeito da atenção, pois ela tem o amor no coração. O amor é atenta. Maria serve Isabel na sua necessidade real. O seu amor se transforma em gesto, pois a caridade é concreta.  O amor sabe ver o que o não- amor nunca descobrirá. O seu amor causa a alegria, pois a caridade sabe se terna. A ternura consiste certamente em dar com alegria, suscitando em quem recebe o dom da alegria e não um sentimento de dependência. Ela faz tudo isso, porque Maria depende só de Deus, por isso é livre(Nenhuma criatura a prende). Quem é livre na fé, pois depende somente de Deus, torna-o doado aos outros na gratuidade. 

5. A saudação de Maria causa a alegria cuja característica é messiânica: os saltos de alegria de João no seio de sua mãe(vv.41.44); a irrupção do Espírito sobre Isabel(v.41b); a bênção messiânica de Isabel sobre Maria(v.42); a proclamação de Maria como “mãe do Senhor”(v.43); e a proclamação de que Maria é “bem-aventurada” por causa de sua fé(v.45). Todas estas reações são de caráter messiânico. O termo usado para expressar o júbilo de João pela irrupção dos tempos messiânicos é agallíasis, que é mais forte do que o termo normalmente usado para expressar a “alegria”(khará, usado 140 vezes em todo o NT). Agallíasis significa uma alegria causada pela vinda da salvação escatológica, alegria que é experimentada diante de Deus manifestada externamente.           

Se acreditarmos que Jesus está dentro de nós, nos comportaremos como Maria: seremos portadores de alegria no Senhor para os outros. O nosso encontro com os outros fará brotar neles a alegria pela presença do Messias, a docilidade ao Espírito, o louvor a Deus. 

6. No Magnificat, Maria é a porta voz da expectativa dos pobres, figura da primeira discípula cristã, cumprimento e superação do Israel da esperança. Ela é o sinal da esperança. O Magnificat é um resumo de todas as esperanças de Israel.           

Cada vez que cantamos o Magnificat, somos convidados a acolher Jesus e a salvação e a misericórdia que ele nos traz como o acolheu Maria. O projeto da misericórdia de Deus só pode ser realizado na história através de homens e mulheres que buscam a Deus, esperam em Deus, se abrem a Deus e acolhem o amor de Deus, o amor que leva a prática da justiça e da misericórdia.          

Temos certeza de que há ainda muitas mensagens deste texto que cada um pode descobrir. Vamos terminar esta reflexão com um texto bem conhecido de S. Grignion de Monfort com o intuito de nos ajudar a nos mergulhar no mistério de Maria e de Deus:

Nunca podeis pensar em Maria, sem que ela, em nossa vez, pense em Deus. Nunca podeis louvar e honrar Maria, sem que ela louve e honre conosco a Deus. Em Maria tudo está relacionado com Deus; ela é a orientação personificada para Deus, o eco de Deus que não sabe dizer, nem repetir senão o Santo Nome de Deus. Se dizemos “Maria”, ela diz “Deus”. Santa Isabel louvou Maria, chamou-lhe Bem-aventurada, porque acreditou Maria, eco fiel de Deus; entoou o hino “A minha alma glorifica o Senhor”. O que ela fez nesta ocasião, fá-lo todos os dias. Quando a louvamos, a amamos, a honramos ou nos damos a ela, é Deus que é louvado, amado, honrado, e é a Deus que nos damos por Maria e em Maria”.                  

Que Maria, Doce Mãe da esperança nos ajuda a ser peregrinos na esperança sem pararmos diante das resistências e das canseiras a caminho da comunhão plena com o nosso Criador, o Deus Conosco.

P. Vitus Gustama,svd

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