“Nós somos os potes . Cristo é a fonte ” (santo Agostinho. Serm. 289,5)
Terminada a serie de milagres narrados depois do Sermão da Montanha , entramos agora no segundo dos cinco grandes discursos de Jesus no evangelho de Mateus chamado o Discurso missionário que abrange Mt 9,36-11,1 (cf. Mt 5,1-7,28: Sermão da Montanha ; Mt 9,36-11,1: Discurso missionário ; Mt 13,1-52: Discurso sobre o Reino em parábolas ; Mt 18,1-35: Discurso sobre a vida comunitária /Igreja ; Mt 24,1-25,46: Discurso sobre o Julgamento final / a Vinda do Filho do Homem ). Notemos que a missão em Mt não se limita apenas aos doze, mas para todos aqueles que queriam seguir a Jesus. Por isso , neste discurso sobre a missão não se fala nem da partida dos doze (Mc 6,12-13;Lc 9,6) nem do seu regresso (Mc 6,30;Lc 9,10). O discurso sobre a missão não é endereçado para a multidão e sim para os discípulos que serão enviados . Podemos dizer que este discurso serve como um tipo de “manual ” para os seguidores de Jesus na tarefa de exercer a missão .
Os Doze são enviados com algumas instruções básicas. A primeira instrução de Jesus é “Não tomeis o caminho dos gentios , nem entreis em cidade de samaritanos ” (v.5). Podemos ter duas interpretações deste versículo . Primeiro , ele reflete uma tensão viva na comunidade de Mt onde certos grupos de origem judia não compreendiam nem aceitavam a missão aos pagãos . Segundo , na cultura de Jesus, a palavra “estrada /caminho ” significa caminho ou modo de viver . Jesus pode ter querido dizer que não sigam o modo de viver dos pagãos que são idólatras.
A segunda instrução , “Ide, antes , às ovelhas perdidas da casa de Israel” (v.6). Em Mt encontramos duas etapas da missão . Na primeira etapa (Mt 10), a missão de Jesus e de seus discípulos é limitada para as “ovelhas perdidas de Israel”. Aqui não se fala da seleção entre os melhores , mas trata-se de gente necessitada. Foi para as pessoas necessitadas de Israel que foram enviados os Doze. Na segunda etapa (Mt 28,19), o mandato missionário será para espalhar a Boa Nova a todos os povos .
Estas duas etapas da missão nos trazem uma lição muito importante para nossa comunidade : somos chamados a cuidar tanto dos de dentro da comunidade (missão ad intra), como dos de fora (missão ad extra ). A Igreja ou comunidade sem caridade interna , não tem força para dar testemunho crível para os de fora da comunidade . O testemunho interno de comunhão é o primeiro passo para um anúncio mais eloqüente . Mas o cuidado com os de dentro não pode ser uma desculpa para ignorar os de fora . Ou , o cuidado com os de fora não justifica a falta de tempo ou atenção para com os de dentro . Temos, muitas vezes , mais facilidade de sorrir para os de fora do que para os de dentro . “É mais fácil simular virtudes que possuí-las. Por isso , o mundo está cheio de farsantes ” (Santo Agostinho).
Jesus é um grande organizador de comunidades de homens e mulheres . Havia muitas pessoas inquietas, mas necessitavam de um fator de coesão , de um líder que os vinculava e os ajudava a crescerem como pessoas . Esta faceta de organizador e de promotor de organizações comunitárias está condensada nos relatos de eleição dos doze missionários ou apóstolos para continuar a missão . E aqui está condensado um dos seus ensinamentos fundamentais : a comunidade cristã (pastorais , movimentos , grupos eclesiais ect.) existe para evangelizar . Não há outro motivo maior do que este . A comunidade cristã existe porque há um “povo cansado e abatido ” diante do qual cada membro da comunidade cristã é chamado a ser solidário capaz de aliviar a dor alheia e de dar resposta a partir de sua própria insignificância e debilidade. Cada um de nós , apesar das fraquezas , tem algo de bom para ser partilhado para os outros . Se cada um tirar um pouco de bom de dentro de seu coração o cristianismo vai fazer diferença na sociedade .
Jesus é muito consciente da amplitude de sua obra . É necessário ter muito tempo . Sem pressa Jesus limita a missão no momento só dentro do território de Israel. Ele mesmo , durante sua vida terrena , se limitou ao que podia fazer : dirigir-se às ovelhas agarradas da casa de Israel. Mais tarde ele enviará os discípulos pelo mundo inteiro (Mt 28,18-20). Em outras palavras , é preciso arrumar primeiro a casa . É preciso evangelizar os que estão dentro de casa para depois evangelizar os que estão fora dela que nem sempre é fácil . É o desafio de cada missionário-evangelizador.
Ao enviá-los Jesus dá-lhes o poder . Mas este poder deve ser entendido como um dom de autoridade . A palavra autoridade provem do latim augere que significa crescer . Somente tem autoridade aquele que é capaz de fazer o outro crescer . A autoridade dada por Jesus tem as seguintes características : (1). Está orientado por inteiro ao ministério apostólico, ou para o serviço (do bem ) e não para dominar ou mandar e desmandar : expulsar o mal , fazer o bem , pregar o Reino . É um dom completamente missionário . Por isso , não se trata de nenhum poder de direção ou de governo . (2). É uma autoridade conferida, mas não abandonada por Jesus a seus discípulos . (3). Jesus reconhece que haverá oposição por causa do jogo de interesses mesquinhos .
Somos chamados por Jesus Cristo para estar com ele a fim de aprendermos a ser parceiros do bem . Somos enviados depois do encontro com ele para fazer o bem e em busca dos novos parceiros do bem . A alma da missão é caridade . A única coisa que nos faz bem é fazer o bem . A vida não é uma luta para superar os outros , mas uma missão a ser exercida para dar o melhor de nós para a humanidade conforme os talentos recebidos de Deus . Estamos aqui neste mundo com um objetivo único , com um objetivo nobre que nos permitirá manifestar nosso mais alto potencial enquanto , ao mesmo tempo , acrescentamos valor às vidas das pessoas que estão a nossa volta . Descobrir a própria missão significa trazer mais de você mesmo para o trabalho , para a convivência e concentrar-se nas coisas que você sabe fazer melhor e dar sempre o melhor de você para os outros sem esperar nada em troca .
O que você faz e pode fazer pelo Senhor e pela sua Igreja ?
Vitus Gustama, SVD
“Faze o que podes. Deus não te pede mais ” (Santo Agostinho. Serm. 128,10,12).
“Deus não condena quem não pode fazer o que quer , e sim quem não quer fazer o que pode” (Santo Agostinho. Serm. 54,2).
“O nome de cristão traz em si a conotação de justiça , bondade , integridade , paciência , castidade , prudência , amabilidade , inocência e piedade . Como podes explicar a apropriação de tal nome se tua conduta mostra tão poucas dessas muitas virtudes ?” (Santo Agostinho. De vit. Christ.6).
“Enquanto houver vontade de lutar haverá esperança de vencer ” (Santo Agostinho. Serm. 154,8).
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