segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

25/02/2015
 
CONVERTER-SE PARA VIVER NA ALEGRIA DIVINA

Quarta-Feira da I Semana da Quaresma

Textos: Jonas 3,1-10; Lc 11,29-33


Lc 11,29-33

Naquele tempo, 29quando as multidões se reuniram em grande quantidade, Jesus começou a dizer: “Esta geração é uma geração má. Ela busca um sinal, mas nenhum sinal lhe será dado, a não ser o sinal de Jonas. 30Com efeito, assim como Jonas foi um sinal para os ninivitas, assim também será o Filho do Homem para esta geração. 31No dia do julgamento, a rainha do Sul se levantará juntamente com os homens desta geração, e os condenará. Porque ela veio de uma terra distante para ouvir a sabedoria de Salomão. E aqui está quem é maior que Salomão. 32No dia do julgamento, os ninivitas se levantarão juntamente com esta geração e a condenarão. Porque eles se converteram quando ouviram a pregação de Jonas. E aqui está quem é maior do que Jonas”.

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No texto do evangelho lido neste dia, Jesus convida seus ouvintes para a conversão e a penitência na versão de Lucas. O evangelista Lucas demonstra maior interesse na idéia da conversão do que Marcos e Mateus juntos. As palavras básicas para a conversão em Lucas ocorrem com mais freqüência (metanoia, 5x; metanoeo, 9x).   O evangelista Lucas desenvolve o entendimento da conversão, ligando-a explicitamente a outros temas como perdão e reconciliação, a salvação, a misericórdia divina e a alegria. Lucas quer nos mostrar que a conversão é algo prazeroso, pois nos traz a alegria de se libertar de uma situação que não nos salva. A conversão nos faz voltarmos para a comunhão (reconciliação). Consequentemente, o convite para a conversão é um convite para a alegria.


Os seus contemporâneos pedem a Jesus um sinal para demonstrar ou comprovar que Ele é verdadeiramente Messias de quem falavam Moisés e os profetas. Ao pedir um sinal, eles renovam a tentação do deserto (cf. Ex 16,1-17,7). Eles querem que Jesus proporcione uma prova palpável, isto é, a prova experimental que se exige na ordem das coisas materiais ou físicas. É uma forma clara da negação da messianidade de Jesus apesar das evidências. A exigência de uma demonstração física, de um sinal que elimine toda dúvida esconde, no fundo, a recusa da fé e, portanto, demonstra também a recusa do amor, pois o amor exige, por sua mesma essência, um ato de fé, um ato de entrega de si mesmo.


Jesus é, mais uma vez, tentado (cf. Lc 4,1-13). Diante desta tentação Jesus responde: “Esta geração é uma geração má. Ela busca um sinal, mas nenhum sinal lhe será dado, a não ser o sinal de Jonas. Com efeito, assim como Jonas foi um sinal para os ninivitas, assim também será o Filho do Homem para esta geração”.  


O livro de Jonas (uma parte lemos na primeira leitura) no qual Jonas é protagonista citado por Jesus não é um relato histórico e sim didático. Mediante esquemas e repetições neste livro, o autor quer nos inculcar que Deus é, antes de tudo, misericordioso, perdoa a todos, inclusive aos pagãos desde que se convertam. Para nos inculcar esta mensagem tão extraordinária o autor nos apresenta neste relato o protagonista Jonas.


Jonas não se dirige a Nínive como missionário, e sim como executor do juízo implacável de Deus sobre os nivitas. Sua expedição é, antes de tudo, punitiva: “Ainda quarenta dias, e Nínive será destruída” (Jn 3,4). É assim que pensa Jonas que reflete o pensamento dos judeus na época. Para os judeus (na época) o juízo consiste em fazer justiça para Israel castigando e destruindo os pagãos. Pensam também que Deus perdoa a Israel em vez de castigá-lo (cf. Jr 18,7-8). É claro que este pensamento é inconcebível para os pagãos.


Diante da pregação de Jonas os nivitas se converteram. Essa conversão é, para Jonas, inesperada. Na verdade o livro de Jonas é uma reflexão do autor do século V antes de Cristo sobre Jr 18,7-8 em que o profeta Jeremias observa que Deus pode “arrepender-se” do castigo que decidiu ao constatar que se esboça uma conversão (cf. Jr 36,3.13.19; 42,10). A doutrina do profeta Jeremias deve ter impressionado o autor do livro de Jonas que fez dela uma parábola.


A conversão imediata dos ninivitas diante da pregação de Jonas é, na verdade, uma crítica para os próprios judeus na época, inclusive para seus reis. O rei de Nínive se arrependeu diante da pregação de Jonas (Jn 3,5-8), enquanto que alguns reis de Israel ou o rei de Judá se recusaram a se converter (cf. Jr 36,24). O autor quer também envergonhar seus contemporâneos (os judeus) por sua lentidão em se converterem (Jr 7,25-26; 25,4; 26,5 etc.), enquanto que Nínive se converteu desde o primeiro sinal ou desde a primeira pregação de Jonas.


Não consideramos também que os outros sejam pecadores que merecem castigo severo de Deus e nós próprios nos esquecemos de nos converter? Não somos nós também novo Jonas que quer a destruição dos outros ou sua eliminação desta terra em vez de torcer e rezar pela sua conversão? No nosso coração não mora, de vez em quando, o desejo vingativo e espera uma ação punitiva de Deus sobre nosso suposto inimigo ou adversário? Se nós desejamos, assim, não devemos nós mesmos nos converter, primeiro?


O tema fundamental do livro de Jonas é a conversão. O vocábulo grego para a conversão é metanoia. Metanoia quer dizer literalmente mudança de mentalidade. A conversão envolve mudança. Quando a Bíblia fala de conversão, isso envolve a pessoa toda: seu senso moral, sua capacidade intelectual e sua vida espiritual. Na conversão corpo, mente e alma juntos são afetados pelo ato da conversão, e as conseqüência são sentidas em todos os aspectos da vida da pessoa (pessoal, familiar, social, político etc.). Por isso, a conversão opõe-se à manutenção do status quo, ao conservadorismo, pois sempre envolve movimento de uma dimensão para outra.  Trata-se de abandonar as velhas categorias de julgar e de pensar para tomar novos critérios para ver a vida crescer na direção de Deus e do irmão. Converter-se é desandar o caminho, é pôr os pés onde está a cabeça (isto é, viver de acordo com uma nova visão) e colocar a cabeça onde estão os pés.


Lembremo-nos de que Deus, por causa de sua misericórdia por nós, está contra a Si próprio, pois ele poderia usar de justiça contra todos nós, pecadores diários (ninguém está livre de pecar com pensamentos, palavras, atos, omissões etc. diariamente). A misericórdia de Deus é maior do que sua justiça. Nem o próprio Jonas consegue escapar dessa misericórdia. A misericórdia de Deus se estende a todos.


A raiz da equivocada exigência de um sinal da parte dos contemporâneos de Jesus não é outra coisa que o egoísmo, um coração impuro, um coração duro que unicamente espera de Deus o êxito pessoal, a ajuda necessária para absolutizar o próprio ego (eu). Esta forma de religiosidade representa a recusa fundamental da conversão.


Quantas vezes nos tornamos escravos do sinal do êxito! Quantas vezes pedimos um sinal e nos fechamos diante da chamada à conversão! Nós queremos, muitas vezes, milagres de Deus e Deus poderia dizer: “Me largue! Pois vocês devem ser a luz do mundo e o sal da terra” (cf. Mt 5,13-16). Quantas vezes esperamos a demonstração, o sinal do êxito, tanto na história universal como em nossa vida pessoal! E perguntamos até que ponto nós cristãos transformamos realmente o mundo? Até que ponto nós cristãos demonstramos os princípios cristãos e damos provas de nosso êxito criando o paraíso na terra!?


O próprio Jesus, em sua Palavra e em sua inteira personalidade é sinal para todas as gerações. Por isso, no evangelho de João, Jesus diz: “Quem me , o Pai” (Jo 14,8s). O Pai se faz visível no Filho. É ver Jesus e aprender a vê-Lo! Esta é a resposta. Para isso, é preciso que contemplemos Jesus em Sua Palavra inesgotável, em seus mistérios: nos mistérios de Seu nascimento, nos mistério de sua vida oculta num vilarejo de Nazaré, nos mistérios de sua vida publica, no mistério pascal, nos sacramentos, na história da Igreja com a qual Ele caminha (Mt 28,20).


Para ser redimido, para situar-se na verdade intima da idéia criadora de Deus é preciso que o homem supere o espaço das coisas físicas, do tangível. Ao superar esse espaço o homem pode alcançar a própria certeza das realidades mais profundas e eficazes: as realidades do Espírito divino. A exigência de uma demonstração física, de um sinal que elimine toda dúvida, oculta no fundo a recusa da , um negar-se a rebaixar os limites da segurança trivial e por isso, fecha-se também diante do amor, pois o amor exige, por sua própria essência, um ato de , um ato de entrega de si próprio sem reservas. Atrás desse fenômeno se oculta um empobrecimento da idéia da realidade e no fundo há a miopia de um coração demasiado centrado na busca do poder físico, da possessão, do ter.


Além disso, o maior sinal que Deus nos dá é a sua misericórdia. Jesus se aproxima dos pobres, dos marginalizados, dos excluídos e dos pecadores. Em Jesus eles encontram o Deus misericordioso. Não existe maior milagre do que reconstruir interiormente um ser humano. Quem não tem olhos para a misericórdia, continuará a pedir a Jesus milagres que o fazem acreditar. Diante deste tipo de pessoa Deus permanecerá calado.


O Senhor que é rico em misericórdia quer que também sejamos misericordiosos para com os demais (cf. Lc 6,36). A misericórdia é querer o bem até para aqueles que nos machucaram, pois a misericórdia é amar até aqueles que não merecem ser amados do ponto de vista humano a exemplo de Jesus (cf. Lc 23,34). A misericórdia tem sempre a grande atração de fazer-nos semelhantes a Deus e de sermos sinais de seu amor para este mundo (cf. Mt 5,43-48).


O Senhor nos reúne na Eucaristia para nos fazer conhecermos Sua vontade. Não viemos somente para rezar a fim de expor-lhe nossas angustias e esperanças. Viemos porque queremos entrar em comunhão de vida com Ele para estar em comunhão de vida com os demais.


Jesus se queixa dos seus contemporâneos porque eles pedem um sinal do céu para comprovar que ele é o Messias. Mas Jesus recusa qualquer tipo de sensacionalismo. Será que Jesus tem motivos para queixar-se de nós? Sim, se não nos convertermos.


A Quaresma é um tempo oportuno para a conversão e a confissão. A confissão é o momento do encontro de dois amores: o amor misericordioso de Deus por mim que não se esgota jamais, e meu amor por Deus no próximo (cf. Jo 15, 12). A confissão sincera deixa no nosso coração uma grande paz e alegria.

P. Vitus Gustama,svd

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