12/01/2017
“LEPRA” QUE MATA É VIVER SEM
AMOR FRATERNO
Quinta-Feira da I Semana do Tempo
Comum
Irmãos,
7 escutai o que declara o Espírito Santo: “Hoje,
se ouvirdes a sua voz, 8 não endureçais os vossos corações, como aconteceu na
provocação, no dia da tentação, no deserto, 9 onde vossos pais me tentaram,
pondo-me à prova, 10 embora vissem as minhas obras, durante quarenta anos. Por
isso me irritei com essa geração e afirmei: sempre se enganam no coração e
desconhecem os meus caminhos. 11 Assim jurei na minha ira: não entrarão no meu
repouso”. 12 Cuidai, irmãos, que não se
ache em algum de vós um coração transviado pela incredulidade, levando-o a
afastar-se do Deus vivo. 13 Antes, animai-vos
uns aos outros, dia após dia, enquanto ainda se disser “hoje”, para que
nenhum de vós se endureça pela sedução do pecado – 14 pois tornamo-nos
companheiros de Cristo, contanto que mantenhamos firme até o fim a nossa
confiança inicial.
Evangelho: Mc 1,40-45
Naquele tempo ,
40 um leproso
chegou perto de Jesus, e de joelhos pediu: “Se queres
tens, o poder de curar-me”. 41 Jesus, cheio de compaixão ,
estendeu a mão , tocou nele, e disse: “Eu quero: fica curado!” 42 No mesmo
instante , a lepra
desapareceu, e ele ficou curado. 43 Então Jesus o mandou logo
embora , 44 falando com
firmeza : “Não
contes nada disso a ninguém !
Vai, mostra-te ao sacerdote e oferece, pela tua purificação ,
o que Moisés ordenou, como prova para
eles !” 45 Ele
foi e começou a contar e a divulgar
muito o fato .
Por isso
Jesus não podia mais
entrar publicamente numa cidade :
ficava fora , em
lugares desertos .
E de toda parte
vinham procurá-lo.
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Somos Chamados a Ser Fiéis Ao Senhor Permanentemente
“Não
endureçais os vossos corações, como aconteceu na provocação, no dia da
tentação, no deserto... Cuidai,
irmãos, que não se ache em algum de vós um coração transviado pela
incredulidade, levando-o a afastar-se do Deus vivo. Antes, animai-vos uns aos outros, dia após dia, enquanto ainda se
disser “hoje”, para que nenhum de vós se endureça pela sedução do pecado –pois
tornamo-nos companheiros de Cristo, contanto que mantenhamos firme até o fim a
nossa confiança inicial”, assim a Primeira Leitura nos alerta.
Como fez São Paulo em 2Cor 10, o autor da
Carta aos hebreus faz uma ampla alusão às murmurações de Israel no deserto (cf.
Sl 94/95,7-11; Ex 15,23-24; Nm 20,5) para alertar os cristãos-hebreus, aos
quais se dirige a Carta. A murmuração era uma tentação séria. Murmurar equivalia
para os hebreus no deserto não aceitar seu estado de nomadismo pelo deserto
rumo à Terra prometida. Murmurar seria voltar para o passado de escravidão. Murmurar
seria recusar a perceber a presença de Deus na situação atual para se refugiar
num sonho em que Deus fosse supostamente mais encontrável.
Sem dúvida, o autor da Carta aos hebreus
percebe que os cristãos-hebreus para quem a Carta é dirigida vivem murmurando
pela situação na qual vivem. Daí a exortação: “Não endureçais os vossos corações, como aconteceu na provocação, no dia
da tentação, no deserto... Cuidai, irmãos, que não se ache em algum de vós um
coração transviado pela incredulidade, levando-o a afastar-se do Deus vivo”.
O autor da Carta fala sobre o coração. O coração simboliza
para a grande maioria das culturas, o centro da pessoa onde gira a unidade e se
funde a múltipla complexidade de suas faculdades, dimensões: o espiritual e o
material, o afetivo e o racional, o instinto e o intelectual. O coração é o
centro de nosso ser, a fonte de nossa personalidade, o motivo principal de
nossas atitudes e escolhas livres, o lugar da misteriosa ação de Deus. Através de suas escolhas, de seu
comportamento diariamente, todos vão perceber se você é uma pessoa com coração
ou sem coração. Muitos tem sabedoria na cuca, mas ignorantes de coração; sábios
intelectualmente, mas pobres de coração. Para o homem antigo ter coração equivale a
ser uma personalidade íntegra.
A espiritualidade do coração é uma
verdadeira espiritualidade, pois inclui a oração, a conversão, a escuta do
Espírito, o cuidado para o próximo, a compaixão, a solidariedade e a partilha: “...
animai-vos uns aos outros, dia após dia,
enquanto ainda se disser “hoje”, para que nenhum de vós se endureça pela
sedução do pecado”.
Nos seis primeiros versículos de Hb 3 o
autor da Carta começa a propor a contemplar a fidelidade de Jesus Cristo. Jesus
Cristo se manteve fiel a Deus na missão de “construir a casa como Filho”, isto
é, de salvar os homens pela entrega total de si mesmo até a morte (cf. Jo
13,1). A partir da fidelidade de Jesus, o autor exorta aos cristãos, da segunda
geração, à fidelidade própria. É a segunda geração, pois trata-se de uma
geração que não conheceu Jesus com os olhos da carne: “Cuidai, irmãos, que não
se ache em algum de vós um coração transviado pela incredulidade, levando-o a
afastar-se do Deus vivo”.
Nós somos os cristãos da segunda geração. É
uma geração que se tornou cristã. Qual é o ambiente que reina em qualquer
geração que se tronou cristã? É a negação, a despreocupação, a típica
indiferença de que se sabe cristã e nunca pensou em abandonar a fé cristã
precisamente porque já não lhe preocupa. É a situação de mediocridade
totalmente contrária à conversão permanente que pode terminar na apostasia. Por
isso, o autor exorta: “Cuidai, irmãos, que não se ache em algum de vós um
coração transviado pela incredulidade, levando-o a afastar-se do Deus vivo”. A
incredulidade pode esconder-se no coração na maior tranquilidade do mundo. É um
problema de fé.
Jesus Quer Nos Curar De Nossas “Lepras” Que Discriminam e
Excluem As Pessoas
Lepra! Que horrível é a lepra. Ainda hoje o
leproso fica marginalizado da sociedade, fechado numa leprosaria. Mas há uma
vantagem: a medicina se interessa por ele; a investigação cientifica busca sua
cura. Na época de Jesus não era assim.
O evangelho
deste dia fala ,
certamente , da cura
de um leproso
(cf. Mt 8,2-4; Lc 5,12-16). Naquela época , lepra não se
restringia apenas à doença
que a medicina
moderna chama
de lepra , mas
qualquer doença
da pele era
considerada como lepra .
E todas as doenças eram consideradas como um castigo de Deus ,
mas a lepra era o próprio símbolo do pecado .
A lepra era
considerada como a própria
morte , pois dificilmente
podia ser curada. A cura
da lepra era ,
por isso ,
considerada um milagre ,
como se fosse uma ressurreição
de um morto .
Isto quer
dizer que somente Deus podia
curá-lo dessa lepra . Acreditava-se, além disso, que
a lepra era um instrumento eficaz usado por
Deus para castigar os invejosos ,
os arrogantes , os ladrões ,
os assassinos , os responsáveis
por falsos
juramentos e por
incestos .
Os leprosos
eram considerados no AT como impuros (cf. Lv 13,3), por
isso eram excluídos de quaisquer direitos sociais
e eram marginalizados do convívio da comunidade até
a sua cura
(eles deviam ficar
fora dos povoados ),
pois a lepra era considerada como
uma impureza contagiosa
(cf. Lv 13,45-46). Qualquer judeu piedoso
evitava o contato com
um leproso
para não se tornar impuro . Por isso , um leproso , além de sofrer a dor da lepra (fisicamente),
sofria também o preconceito
(psicologicamente e socialmente ), pois era excluído da comunidade
por ser impuro . Além
disso, era acusado como
um grande
pecador , porque
a lepra era
considerada como um
grande castigo
de Deus . O leproso
é o protótipo da marginalização religiosa e social
imposta pela
Lei (Lv.13,45-46).
E Jesus, embora
saiba da proibição
de fazer contato
com qualquer
leproso , estende a mão
e o tocou: “Jesus, cheio de compaixão , estendeu a mão ,
tocou nele, e disse: ‘Eu quero: fica
curado! ’” (Mc 1,41). Por que Jesus tocou o leproso ?
Por compaixão :
“Jesus cheio de compaixão ...”.
As misérias humanas tocam Jesus profundamente . Se no Batismo ,
Jesus se solidarizou com a multidão de pecadores ,
também o faz aqui
nessa cena com
o leproso . Aqui
Jesus não se limita apenas
nas palavras , mas
Ele se aproxima e toca
no leproso , pois
quer transmitir
toda Sua
solidariedade . Para
Jesus, o leproso não
era um
marginalizado e sim uma pessoa
digna de Sua
bondade , capaz
de se abrir à misericórdia
divina .
O leproso
“foi e começou a contar e a divulgar
muito o fato ”.
É assim que
Marcos concluiu o episódio .
Mc apresenta o leproso curado como um verdadeiro anunciador do Evangelho .
O leproso purificado se converte em apóstolo e
anuncia Jesus a todos . E por isso , “de
toda parte
vinham procurar Jesus”.
O ato
dos dois (do leproso
e de Jesus) era verdadeiramente audacioso para a sua época . Os dois quebram o costume de longa data . O leproso tem grande
vontade de ficar
curado e acredita no poder de Jesus. E Jesus, por sua vez , tem compaixão
pela miséria
do homem , e, por
isso , se aproxima do homem e quer
integrá-lo à vida normal
como qualquer
ser humano .
O Reinado
de Deus não
exclui ninguém da salvação (cf. At
10,34-35; Mt 5,45). Neste contexto , o leproso personifica a multidão
de marginalizados em busca da salvação. E Deus
sempre acolhe quem
o busca com
sinceridade e fé .
Deus não
decepciona quem o procura
permanentemente . O gesto
exterior de Jesus de estender
a mão e de tocar
no leproso é sua
identificação interior
profunda com
o sofrimento do leproso .
O evangelho
de hoje nos
convida a fazermos o exame de consciência
sobre como
tratamos os marginalizados da sociedade , os “leprosos ” de nossa
sociedade . O exemplo
de Jesus é claro . Ele
nunca permaneceu indiferente
diante do sofrimento humano . Nós , como cristãos ,
devemos imitar Jesus. Devemos afastar “as lepras”
de nosso coração, “lepras” que discriminam, que excluem as pessoas de nossa convivência,
lepras de falta de perdão e de benevolência e de misericórdia e assim por
diante. Quem tem um coração pura, ama o outro de verdade e com liberdade.
O ato
de Jesus de se aproximar do leproso
e de tocá-lo nos leva
a nos perguntarmos: “Como você se posiciona perante “os leprosos ”
(marginalizados) da humanidade : fugir , aproximar-se ou
procurar erguê-los como
Jesus fez?” Ou o nosso
coração está cheio
de “lepra ” faz com
que nos
afastemos dos outros e afastemos os outros ? A “lepra ” que mata é a vida sem amor pelo próximo :
mata quem
vive sem amor
e mata quem precisa deste amor .
“Não
contes nada disso a ninguém! Vai, mostra-te ao sacerdote e oferece, pela tua
purificação, o que Moisés ordenou, como prova para eles!”, assim disse
Jesus ao homem curado da lepra.
Mas como pode o homem que foi tocado pelo
amor de Deus permanecer calado? É impossível! Muitos cristãos permanecem
calados para dar testemunho sobre o amor de Deus, o amor que cura e salva. Será
que ainda não foram tocados pelo amor de Deus que cura? Muitos cristãos permanecem
calados cheios de medo, vivendo como faziam os leprosos, isolados da
comunidade. É necessário que peçamos a Jesus: “Senhor, se queres, podes
purificar-me”. Ao mesmo tempo é necessário que Jesus nos diga outra vez: “Eu
quero: fica curado!”. Creio que Jesus vai fazer toda vez que lhe fizermos o
mesmo pedido. Só assim ficaremos cheios de vida no Espirito. Assim uma vez
tocados pelo amor de Deus que cura, nos converteremos em verdadeiras
testemunhas deste amor no mundo.
“Pai
misericordioso e Deus fiel , Vós nos destes vosso
Filho Jesus Cristo ,
nosso Senhor
e Redentor . Ele
sempre se mostrou cheio
de misericórdia pelos
pequenos e pobres ,
pelos doentes
e pecadores , colocando-se ao lado dos perseguidos e marginalizados. Com a vida e a palavra anunciou ao mundo
que sois Pai
e cuidais de todos como
filhos e filhas... Dai-nos olhos para ver
as necessidades e os sofrimentos dos nossos irmãos e
irmãs; inspirai-nos palavras e ações para confortar
os desanimados e oprimidos ; fazei que , a exemplo
de Cristo , e seguindo o seu mandamento ,
nos empenhemos lealmente
no serviço a eles .
Vossa Igreja
seja testemunha viva
da verdade e da liberdade ,
da justiça e da paz ,
para que toda a humanidade
se abra à esperança de um mundo novo ”
(Oração Eucarística VI-D).
P. Vitus Gustama,svd
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