Domingo,15/03/2020
JESUS
É A ÁGUA VIVA
QUE SATISFAZ NOSSOS
ANSEIOS MAIS PROFUNDOS
III DOMINGO
DA QUARESMA Ano “A”
I Leitura: Êx 17,3-7
Naqueles dias, 3 o povo, sedento de água, murmurava
contra Moisés e dizia: “Por que nos fizeste sair do Egito? Foi para nos fazer
morrer de sede, a nós, nossos filhos e nosso gado?” 4 Moisés clamou ao Senhor, dizendo: “Que farei por este povo? Por pouco
não me apedrejam!” 5 O Senhor disse a Moisés: “Passa adiante
do povo e leva contigo alguns anciãos de Israel. Toma a tua vara com que
feriste o rio Nilo e vai. 6 Eu estarei lá, diante de ti, sobre o
rochedo, no monte Horeb. Ferirás a pedra e dela sairá água para o povo beber”.
Moisés assim fez na presença dos anciãos de Israel. 7 E deu àquele lugar o nome de Massa e Meriba, por causa da disputa dos
filhos de Israel e porque tentaram o Senhor, dizendo: “O Senhor está no meio de
nós ou não?”
II Leitura: Rm 5,1-2.5-8
Irmãos: 1 Justificados pela fé, estamos em paz com Deus, pela mediação
do Senhor nosso, Jesus Cristo. 2Por ele tivemos acesso, pela fé, a esta graça,
na qual estamos firmes e nos gloriamos, na esperança da glória de Deus. 5E a
esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos
corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. 6Com efeito, quando éramos ainda
fracos, Cristo morreu pelos ímpios, no tempo marcado. 7Dificilmente alguém
morrerá por um justo; por uma pessoa muito boa, talvez alguém se anime a
morrer. 8Pois bem, a prova de que Deus nos ama é que Cristo morreu por nós,
quando éramos ainda pecadores.
Evangelho: Jo 4,5-15.19b-26.39a.40-42
Naquele tempo, 5 Jesus chegou a uma cidade da Samaria, chamada
Sicar, perto do terreno que Jacó tinha dado ao seu filho José. 6 Era aí que ficava o poço de Jacó. Cansado da
viagem, Jesus sentou-se junto ao poço. Era por volta de meio-dia. 7 Chegou uma mulher de Samaria para tirar água.
Jesus lhe disse: “Dá-me de beber”. 8 Os discípulos tinham ido à cidade para comprar alimentos. 9 A mulher samaritana disse então a Jesus: “Como é
que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana?” De
fato, os judeus não se dão com os samaritanos. 10 Respondeu-lhe Jesus: “Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te
pede: ‘Dá-me de beber’, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva”.
11 A mulher disse a Jesus: “Senhor, nem sequer tens
balde e o poço é fundo. De onde vais tirar água viva? 12 Por acaso, és maior que nosso pai Jacó, que nos
deu o poço e que dele bebeu, como também seus filhos e seus animais?” 13 Respondeu Jesus: “Todo aquele que bebe desta água
terá sede de novo. 14 Mas quem
beber da água que eu lhe darei, esse nunca mais terá sede. E a água que eu lhe
der se tornará nele uma fonte de água que jorra para a vida eterna”. 15 A mulher disse a Jesus: “Senhor, dá-me dessa água,
para que eu não tenha mais sede e nem tenha de vir aqui para tirá-la”. 19b “Senhor, vejo que és um profeta!” 20 Os nossos pais adoraram neste monte, mas vós dizeis
que em Jerusalém é que se deve adorar”. 21 Disse-lhe Jesus: “Acredita-me, mulher: está chegando a hora em que nem
neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai. 22 Vós adorais o que não conheceis. Nós adoramos o que conhecemos, pois a
salvação vem dos judeus. 23 Mas está
chegando a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em
espírito e verdade. De fato, estes são os adoradores que o Pai procura. 24 Deus é espírito, e aqueles que o adoram devem
adorá-lo em espírito e verdade”. 25 A mulher
disse a Jesus: “Sei que o Messias (que se chama Cristo) vai chegar. Quando ele
vier, vai nos fazer conhecer todas as coisas”. 26 Disse-lhe Jesus: “Sou eu, que estou falando contigo”. 39ª Muitos samaritanos daquela cidade abraçaram a fé
em Jesus. 40 Por isso,
os samaritanos vieram ao encontro de Jesus e pediram que permanecesse com eles.
Jesus permaneceu aí dois dias. 41 E muitos
outros creram por causa da sua palavra. 42 E disseram à mulher: “Já não cremos por causa das tuas palavras, pois
nós mesmos ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o salvador do mundo”.
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Situar
As Leituras Dentro Da Liturgia Quaresmal Na Caminhada Rumo à Páscoa
A liturgia da
Palavra do III Domingo da Quaresma
do Ciclo A é um conjunto de textos claramente “tematizados” em função do
Evangelho, que é o texto fundamental que guiará toda a celebração do Primeiro Escrutínio
da Iniciação Cristã.
A
imagem central é o dom da água ao sedento (Primeira
Leitura e o Evangelho) e as realidades significadas são a Palavra de
Deus que conduz à fé (Salmo Responsorial
e Evangelho) e o Espírito derramado no coração dos homens (Segunda Leitura
e Evangelho). Do ponto de vista do coração humano há uma descrição
das trevas no homem: falta de sentido de
Deus (Primeira
Leitura), endurecimento do
coração (Salmo
Responsorial), inimizade,
amor rebelde, mas também de sua capacidade de abertura e de desejo da verdade
(Evangelho).
A centralidade de Jesus no conjunto é clara: Ele é o grande protagonista: se
apresenta na totalidade de Sua pessoa. Jesus é capaz de cansar-se, de sentar-se
fatigado e rendido à meio-dia, de ter sede, e, ao mesmo tempo, capaz de
anunciar o dom messiânico do Espirito, fruto de sua ressurreição, e de
apresentar-se como a plenitude de adoração do Pai.
Há um denominador
comum nas leituras deste Domingo: a sede. Portanto, há um desejo de saciar esta sede que
aponta para a água. Este denominador encaixa com o acento “batismal” que é próprio
deste Ciclo A de leituras, e que se irá acentuando com os textos do Evangelho
de são João que nos guiarão até o final da Quaresma. Propósito de hoje: admirar
mais e mais o poder da água que nos regenera, água que “jorra para a vida
eterna” que é o próprio Jesus Cristo.
A Quaresma, com
efeito, pode ser vista como um caminho de recuperação da graça batismal. É também
como ir ao deserto com o povo eleito que saiu já do Egito, mas ainda não entrou
à Terra Prometida. E é como estar com Jesus naquele deserto que foi conduzido
pelo Espirito Santo. É normal que, no deserto, se sinta sede, e é bom, porque
essa sede nos conduzirá ao Manancial da vida que é o próprio Jesus Cristo.
Com razão, se põe
em relação a cena da Samaritana com o “Tenho sede” da cruz (Jo 19,28). Também ali,
tem sede
material, compreensível, mas ao mesmo tempo está proclamando a sede messiânica:
“Tenho sede de ver o Espirito difundido no coração dos homens, para que possam
ter sede de Deus, isto é, amá-Lo com desejo fervente”. Sua obra redentora,
através da cruz, recebe assim sua consumação, uma vez Ele cumpriu tudo o que
era necessário segundo as Escrituras. O “Tenho sede” seria, como uma grande epiclesis
de Cristo sobre a humanidade, invocando sobre ela o dom do Espirito.
Portanto, o que
mais caracteriza o Terceiro Domingo no Ciclo A é o começo dos três textos do
Evangelho de João com temática
batismal: água, luz e vida (Samaritana que encontrou o
Messias e tornou-se missionária para seu povo; o Cego de nascença que volta a
enxergar e Lázaro
ressuscitado) que tradicionalmente serviram para motivar e valorizar
o caminho batismal dos catecúmenos ou também da comunidade cristã em sua
caminhada quaresmal para a Páscoa. São textos claramente cristológicos com sua
revelação progressiva até EU SOU (a Água
viva, a Luz, a Vida). Vale a pena que os três textos
sejam lidos inteiramente de modo lento e expressivo na meditação pessoal ou em
grupos de reflexão. Podemos não comer durante uma semana, mas sem beber
em poucas horas podemos morrer. Água, Luz, Vida são elementos muito importantes
para uma vida saudável e humana.
Seria bom que
nestes três domingos da Quaresma (III, IV e V) fosse aprofundada a compreensão
do que é o Batismo cristão e fosse acentuado o caminho quase catecumenal de
todos os cristãos até o cume da Vigília Pascal, noite batismal por excelência,
e por fim, que fosse colocado em destaque o grande dom de sermos filhos de Deus
por amor que Deus tem por nós como enfatiza a segunda leitura da Carta ao
romanos.
Uma primeira aplicação, na linha do tema dos escrutínios, é convidar a examinarmos nosso coração.
Nosso coração é como o dos israelitas, duro e rebelde, desconfiado da presença
de Deus na vida? Estamos abertos à Palavra do Senhor para seguir seus caminhos?
O que fazemos de especial durante a Quaresma para intensificar o contato com a
Palavra de Deus? Temos o sentido do pecado como afastamento de Deus e como
recusa de seus dons? Como alimentamos esta chama do Espirito que há em nós? De
que temos sede, exatamente? Ou estamos demasiadamente satisfeitos? Uma segunda
aplicação, sugerida pela Coleta de hoje, é a prática das obras de
penitencia, como manifestação e exercício de conversão. Dar de beber ao sedento
adquire hoje um sentido altamente simbólico, que vai da atenção aos
pobres/necessitados até o testemunho da vida cristã.
O
Simbolismo Da Sede e Da Água Viva
A Primeira
Leitura tomada do Livro do Êxodo nos propõe uma pessoa e um sinal: a
pessoa é Moisés e o sinal é a água.
Quando se fala de
Moisés não se trata apenas de uma figura entre outras figuras do AT. Para os
judeus, Moisés é o líder fundador da nação, o mediador da Primeira Aliança.
Assim como para nós, Jesus é o profeta definitivo, o enviado escatológico de
Deus, o Mediador da Nova Aliança.
A Primeira Leitura
nos relatou que o povo torturado pela sede não suportou mais e acabou falando
mal de Deus e de Moisés, Seu enviado. É explicável o desgosto muito humano do
povo. Se há uma sensação poderosamente desagradável é a sede. Mas sobre a base
dessa sensação não há uma reação predeterminada. É possível sofrer e confiar,
ou sofrer e já não confiar. É possível fazer da dor do deserto um caminho que
nos une mais a Deus e que nos une também entre nós mesmos, ou um caminho que nos
afasta de Deus e dos irmãos. Finalmente, as circunstancias não tomam a decisão
para nós: somos nós mesmos que tomamos a decisão diante destas circunstâncias.
Observemos ainda
mais que a dor nos obriga a fazermos uma pergunta. No caso dos israelitas a
pergunta era: Com que propósito Deus nos tirou da escravidão? Esta pergunta se
converte em rebeldia quando se pressupõe que Deus não seja de confiar. Neste
caso, a interrogação se volta ao que temos ouvido: “O Senhor está ou não está no meio de nós?”. Perder Deus, ainda que
seja sobre a base “razoável” da dor, é perder TUDO.
A água vivificante
é como um dom, um presente de Deus quando o povo já desesperava de encontrá-la
e enfrentava a morte. É um sinal natural: todos nós captamos seu significado ao
longo do tempo e para o mundo inteiro. Nas antigas mitologias a água era origem
de todas as coisas, o elemento fundamental do qual todas as coisas foram
feitas. Sem a água tudo morre. Para o AT a água pode se converter em
instrumento de castigo, como no dilúvio, ou em dom sonhado e inesperado, como
lemos no texto da primeira leitura.
São Paulo, na
passagem de sua carta aos romanos que lemos hoje na Segunda leitura, define
qual é agora nossa condição de cristãos: salvos por crer em Cristo,
reconciliados com Deus e cheios de seus dons, podemos nos gloriar como filhos e
filhas de Deus. O maior dos dons divinos é o Espirito Santo que nos foi dado,
dom imerecido e inesperado, como a água das fontes de água que brotam do Horeb
para saciar a sede do povo.
No evangelho lido
neste domingo, a mulher samaritana se encontra com o Enviado de Deus, Aquele
que pode dar a água da vida. A mulher não somente tem sede da água, mas
principalmente tem sede da felicidade e da liberdade. Jesus é a resposta de
Deus para a sede da humanidade.
Também temos sede.
É uma experiência que todos nós conhecemos em nossa vivência humana e
espiritual. Temos a sede de verdade, de
felicidade, de amor, de respeito, de vida, de convivência fraterna, de mútuo
apoio e assim por diante. É bom que sintamos sede. Onde busca o homem de
hoje água para saciar sua sede? Das múltiplas respostas que o mundo nos
oferece, nunca ficaremos satisfeitos. O “Eu Sou” de Jesus continua sendo a resposta
mais profunda para nossa sede e nossos anseios mais profundos, para nosso
cansaço (físico e existencial) e para nossa busca de sentido à nossa vida. Para
cada um de nós, para a comunidade paroquial ou religiosa, Cristo nos diz
novamente hoje: “Eu Sou a Água Viva, o Salvador, a resposta para tuas
interrogações”.
A Páscoa nos
convida a renovarmos cada ano o caminho que começamos em nosso Batismo, quando
pela primeira vez nos unimos a Cristo e entramos em Sua vida ou Ele entrou na
nossa vida. E hoje é com a imagem de água. E nos dois próximos domingos com a
imagem da luz (Cego de nascença) e com a imagem da vida (ressureição de
Lázaro). E na Vigília Pascal o Ressuscitado nos quer fazer participantes de Sua
nova vida feita de novidade, força e esperança.
E na Eucaristia
Jesus nos dá o verdadeiro alimento que é Ele próprio: “Quem come minha Carne e
bebe meu Sangue terá a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6,54).
Sobre o Texto Do Evangelho Deste Domingo
No quarto
Evangelho são narrados vários encontros paradigmáticos de Jesus: com os
primeiros discípulos, com Nicodemos, com o enfermo de Betesda, com o cego de
nascença (próximo domingo) etc., como também o encontro com a samaritana e os
samaritanos no evangelho deste domingo. Em cada encontro existe diálogo. Estes
encontros nos convidam a fazer uma contemplação, de maneira especial, o
encontro de Jesus com a mulher samaritana. Quanto mais longa e aprofundada for
a contemplação, mais inesquecível será a experiência do nosso encontro com
Jesus.
O texto pertence
ao livro chamado “Livro dos Sinais” (Jo 2,1-12,50). Chama-se “Livro dos Sinais”
porque nesta primeira parte se referem aos sete sinais realizados por Jesus
Cristo:
•1º sinal
(2,1-12): O casamento em Caná/transformação de água em vinho;
•2º sinal
(4,46-54): A cura do filho do funcionário real;
•3º sinal(5,1-9):
A cura do paralítico;
•4º sinal(6,1-15):
A partilha dos pães;
•5º
sinal(6,16-21): Jesus caminha sobre as águas;
•6º sinal(9,1-41):
A cura do cego de nascença;
•7º
sinal(11,1-44): A ressurreição(reanimação) de Lázaro.
O Evangelho de João
chama “sinais” aos milagres (em nenhuma parte João usa o termo “milagre”). O
mesmo nome indica que se trata de ações simbólicas, indicadoras que nos
impulsionam a buscar, muito além do episódio concreto, uma realidade mais
profunda até a qual aponta o relato narrado. O importante não é a cura do cego
de nascença, nem a ressurreição/reanimação de Lázaro, nem que Jesus dê de comer
a cinco mil pessoas...sim que Jesus é a Luz, a Ressurreição e a Vida e o Pão
descido do céu. Os atos narrados são importantes na medida em que apresentam a
Jesus como a realidade autêntica até a qual aponta o conteúdo do relato: a luz,
a ressurreição e a vida, o pão da vida.
O evangelho deste
dia narra o encontro entre Jesus e uma samaritana. A região da Samaria (chamada
de Samaria por causa de sua capital) foi fundada pelo rei Omri (886-875 a .C. cf. 1Rs 16,24). No
ano 722 a .C.,
os assírios apoderaram-se dela e deportaram uma parte dos habitantes e
instalaram colonos ou migrantes não-judeus. Eram de cinco nações (povos):
Babilônia, Cuta, Ava, Emat e Sefarvaim (cf. 2Rs 17,29-41). E em quase todos os
povos antigos, ao mudarem-se para outro lugar/país, tinham direito de levar
consigo os seus deuses, suas divindades e cultos. Nas novas terras eles
conservavam seus princípios religiosos originais. Aconteceu também quando esses
cinco povos mudaram-se para a Samaria. O nome hebraico usado para Deus era o
mesmo para falar do marido: ba’al = senhor (marido ou Deus). Com a vinda dos
estrangeiros, os samaritanos (que eram judeus) viram sua religiosidade
confundida, e sua fidelidade a Deus (Javé) sofreu muitos abalos. Muitos
estudiosos concordam que os cinco maridos da Samaritana (cf. Jo 4,17-18)
representam esses cinco deuses pagãos. Por tudo isto, os judeus consideravam os
samaritanos como um povo impuro porque seu sangue estava contaminado pelo de
outros povos estrangeiros e seus deuses. Tudo o que um samaritano toca se torna
impuro para um judeu. Por isso, para um judeu não existia injúria pior do que
ser comparado com um samaritano. Um rabino não podia falar publicamente com uma
mulher (imagine falar sozinhos); muito menos de temas religiosos. Até um rabino
de então havia dito que é melhor queimar a Bíblia (a Lei) do que entregá-la a
uma mulher. E Jesus dialoga com uma mulher samaritana. Para um judeu há aqui um
duplo grave erro de Jesus. Primeiro, porque a conversa a sós entre pessoas de
sexos diferentes não era bem-vista naquele mundo. Segundo, porque essa mulher
com quem Jesus conversa pertence ao povo samaritano.
Mas Jesus veio
para salvar a humanidade toda. Para ele, por isso, não há espaço para qualquer
preconceito. Ao conversar com uma mulher que é uma samaritana, o texto quer nos
dizer que, em primeiro lugar, Jesus põe
um fim a qualquer discriminação na convivência humana. Por isso, os seus
seguidores devem ser promotores da fraternidade universal. Em
segundo lugar, a Palavra de Deus que é criadora, não se dirige a
nós somente quando somos perfeitos. A Samaritana é uma mulher que é excluída,
que é excomungada, porque se relaciona com deuses pagãos. É interessante ver
que Jesus escolhe uma mulher como esta para dialogar e para ensinar a prece
profunda. Talvez porque os seus ouvidos não estejam fechados pela certeza de
ter razão, pela certeza de ser a melhor, pela certeza de possuir a Verdade. A Samaritana é imagem de quem não tem a
verdade, mas ela a busca e se deixa
levar por Jesus (que é a Verdade, cf. Jo 14,6) que vem sentar-se à borda do
poço.
Através deste
diálogo com a Samaritana percebemos o que Jesus quer nos transmitir. Ele não se
fecha dentro da “sua religião” nem dentro da “sua etnia” nem dentro da “sua
geografia”. Ele é para todos. Apesar de não ser uma pessoa judia e não
praticante da religião judaica, nesta Samaritana existe o “dom de Deus” segundo
Jesus(v.14). É para esta mulher que Jesus revela, primeiramente, a sua condição
de Messias (v.26). Esta atitude ecumênica de Jesus tinha muita importância para
a comunidade de João no fim do primeiro século.
Portanto, a
intenção primordial e central de todo o relato do evangelho deste domingo é
encontrar a resposta à pergunta: “Quem é Jesus?”. Resposta que só é encontrada
depois de muita busca e de muito diálogo. O
itinerário do discípulo de Jesus até chegar à profissão de fé plena tem de superar
uma série de obstáculos: preconceitos, hábitos adquiridos, barreiras
religiosas, preocupações materiais, incompreensões e mal-entendidos.
O que tem, então,
por trás deste relato? O evangelho de João foi escrito no fim do primeiro
século. Nas suas linhas e entrelinhas transparecem os traços de uma comunidade
cristã aberta, acolhedora e pluralista. A comunidade que transparece no texto
supõe como normal que mulheres tenham liderança na comunidade e anunciem a Boa
Nova, até com maior resultado que os homens (Jo 4,8. 27). Por causa da palavra
desta mulher, muitos se converteram. O texto nos transmite também que os
samaritanos participam da vida comunitária e aceitam Jesus como Messias (v.29)
e o aceitam como “o Salvador do mundo” (Jo 4,42). E os samaritanos vão ao
encontro de Jesus movidos pelo testemunho da Samaritana e reconhecem a
identidade de Jesus e o confessam como Salvador do mundo.
Isto quer nos
dizer que o acesso à fé dá-se através do testemunho. E o testemunho, por sua
vez, só tem força para conduzir ao encontro de Jesus quando é dado por alguém
que fez a experiência do encontro pessoal com Jesus. O processo da fé começa pela escuta e
acolhida da palavra proclamada por um testemunho externo, mas só se torna fé
pessoal na experiência da relação pessoal com Jesus Cristo. Quando nós fazemos
a experiência do “Eu sou”, quando fazemos a experiência desta fonte de Água
Viva, podemos nos voltar para as realidades, mas seremos livres em relação a
elas.
De
Que Temos Sede ?
Jesus começa
o diálogo com este
pedido à samaritana :
“Dá-me de beber !”. O pedido
supõe a sede e a necessidade
de matar a mesma .
Jesus pede à samaritana um dos elementos
essenciais para
a vida humana ,
um elemento
que se torna
uma das permanentes preocupações
humanas: a água . É um
paradoxo do evangelho de São João! Aquele que é a fonte de água viva pede a
água àquela que tem a verdadeira sede. Jesus é Aquele que ensina e vem ao
encontra da mulher samaritana aí onde ela está, em sua sede; e aos poucos vai
conduzi-la até a verdadeira fonte. A partir dos objetos com os quais ela pensa
satisfazer seu desejo, Jesus a leva ao próprio sujeito do desejo, ao sujeito
desejante que rejeita ser satisfeito por um dos “objetos”.
De que temos sede na vida essencialmente? De
que maneira satisfazemos esta sede?
Confessamos que como a Samaritana, nós sentimos necessidade de amor, mas bebemos egoísmo para aplacar a
sede que cria outra sede. Sentimos necessidade de
felicidade e bebemos entretenimentos passageiros. Sentimos necessidade da profundidade, e nos alimentamos de
superficialidade que faz o coração vazio. A insaciável sede humana não tem poços suficientes para saciar-se. De
cada poço de “água” levamos à boca um ardente deserto ainda que estejamos convencidos
de que temos suficiente frescura e umidade para viver no momento.
Jesus é a Água viva que bastará beber uma vez
para que a sede se acalme para sempre porque o Espírito ficará interiorizado no
homem. É o “novo nascimento”, desenvolvido no diálogo com Nicodemos (Jo
3,1-21). Jesus não condena nossas pobres alegrias; o que faz é propor-nos algo
melhor, mais definitivo. E este algo tem que brotar de dentro, porque as
ilusões, o desejo do infinito, nós os temos dentro de nós e dentro temos que
descobri-los. Quem se aproxima de Jesus experimenta o essencial, pois Ele é o
único que tira a sede. Sentimos, como a Samaritana, que o fundamental é crer
n’Ele e seguir seus passos.
O coração do homem foi criado demasiadamente
grande e por isso, todas as possibilidades que nos oferece a sociedade nos
deixam um enorme vazio, pois nosso coração está necessitando de algo superior
para enchê-lo. “Meu
coração continuará inquieto enquanto ele não repousar em Ti, Senhor”,
confessou Santo Agostinho. A água que
nos oferecem todos os poços que se encontram pelos caminhos do mundo somente
nos podem acalmar a sede momentaneamente. Mas a sede do infinito aparece cada
vez com mais insistência e nos exige uma água superior para saciá-la. Por
isso, diante das propostas humanas, Jesus nos apresenta também suas. Para a
água do poço propõe a água que brota para a vida eterna que é ele próprio.
A verdadeira vida, a que sacia o coração
humano, não está fora do homem, mas está no seu coração. Jesus não nos
proporciona a água viva do exterior: ele faz cada um de nós descobrir o
mistério da própria personalidade. Mas o caminho para o próprio coração é um
duro caminho porque temos que encarar nossos próprios desvios da retidão,
nossos deuses adorados por um longo tempo, mas que até então nenhum deles nos
salvou, e limites e fraquezas que temos que reconhecer.
De que você tem sede nesta vida? Procure
momento para dialogar com Jesus a sós.
Novo Culto Em Espírito e Verdade
“Mas
vem a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão em espírito e
verdade, pois tais são os adoradores que o Pai procura. Deus é espírito e
aqueles que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade”, disse Jesus à
mulher samaritana.
“Adorar em espírito e verdade”. “Espírito”
(pneuma)
para João significa o que pertence ao mundo celeste em contraposição ao mundo
terreno. O homem terreno não tem, por suas próprias forças, acesso ao reino
celeste (Jo 3,31). Deus só pode ser adorado como Pai por aqueles que possuem o
espírito que os faz filhos de Deus, que os faz nascer do alto. Para o encontro
verdadeiro e autêntico com Deus é necessário que a força de Deus eleve o homem,
faça dele uma nova criação, seja penetrado pelo Espírito de Deus. Por isso, a
adoração em espírito não é o culto interior, espiritualista, individual,
contraposto ao culto externo e público.
E “em verdade”. A adoração “em verdade” não se opõe à falsa
adoração. “Verdade” é, para João, a realidade de Deus revelada em
Jesus Cristo, nas suas palavras, nas suas ações, e na sua pessoa. A verdadeira
adoração do Pai pressupõe, por conseguinte, a acolhida da palavra de Jesus, a
fé em Jesus. O novo culto é verdadeiro porque procede da revelação de Deus em
Jesus Cristo. Só com a revelação de Jesus, com a presença de Jesus, pode haver
“verdadeiros adoradores”, porque os que creem em Jesus são regenerados pelo
Espírito e vivem a relação com o Pai na atitude filial de Jesus. Para que haja “verdadeiros adoradores”, é
necessário a ação do Espírito que faz nascer “de novo, do alto” (Jo 3,3-8). A
presença de Jesus acaba com o dilema sobre o lugar da adoração a Deus. Com ele
vem a hora em que os lugares de culto do passado por mais veneráveis que tenham
sido, vão perder sua importância. O verdadeiro culto de adoração começa a
realizar-se em Jesus (cf. Jo 2,13-22 em que Jesus fala do seu corpo
ressuscitado como o novo templo). O lugar onde se revela o Pai, o lugar do novo
e verdadeiro culto é doravante e para sempre, Jesus Cristo, o único caminho
para chegar ao Pai. A nova adoração, que é expressa no futuro (adorarão) não
será simplesmente a Deus, mas ao “Pai”, e não está mais vinculada a lugares
(“nem...nem...”).
Deus é dinamismo, força de amor que tende a
comunicar-Se em forma de vida e de amor. Por isso, Deus se chamará Pai que por
amor dá a vida. Não é um Deus distante que há que buscar nos lugares sagrados,
nem um Deus terrível que há que ser adulado constantemente para conseguir
escapar de Sua ira, nem um Deus alheio de nossa vida com seus problemas e
dificuldades. Ele é o Pai que cuida de nós com Sua providência e nós como
filhos e filhas devemos nos comportar e nos abrir como filhos e filhas de Deus:
sem inimizade, divisão preconceito como aconteceu entre os judeus e os
samaritanos. Os que aceitam ser filhos e filhas de Deus devem corresponder ao
amor gratuito de Deus (Jo 3,16) fazendo os outros felizes como o Pai quer para
todos. O culto que Deus quer é este: a prática do amor leal; amar com o mesmo
amor de Deus, com a força de Seu Espirito para todos os homens, nossos irmãos,
filho do Pai comum.
P. Vitus Gustama,SVD
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