sábado, 13 de junho de 2015

16/06/2015
 
INIMIGO: POR QUE DEVO AMÁ-LO E REZAR POR ELE?

Terça-Feira da XI Semana Comum

 

Evangelho: Mt 5,43-48 

43“Vós ou­vistes o que foi dito: ‘Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo!’ 44Eu, porém, vos digo: ‘Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem!’ 45Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos céus, porque ele faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre os justos e injustos.46Porque, se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os cobradores de impostos não fazem a mesma coisa? 47E se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Os pagãos não fazem a mesma coisa? 48Portanto, sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito(Mt 5,43-48).
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Estamos ainda no Sermão da Montanha (Mt 5-7). O texto do evangelho de hoje faz parte das seis antíteses nesse Sermão. Encontra-se no texto de hoje a última antítese. Nesta ultima antítese Jesus nos diz: “Ouvistes o que foi dito: ‘Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo’”. Através desta antítese o cristão é chamado a não apenas superar a justiça dos fariseus (Mt 5,20), mas também a dos publicanos (pecadores), inclusive a dos pagãos. O cristão é chamado a viver sua filiação divina na convivência com os demais seres humanos. Viver na filiação divina é viver na sintonia com o coração do Pai que “faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre os justos e injustos”.


Por isso, diante da lei antiga Jesus faz seu comentário e sua reflexão que servem de instrução para os cristãos: Eu, porém, vos digo: Amai os vossos inimigos e orai por aqueles que vos perseguem, para serdes filhos do vosso Pai que está nos Céus».


Inimigo” é uma palavra muito forte. Geralmente se refere àqueles que estão em estado de guerra. Pode também ser usada para descrever grupos ou indivíduos que atacam ou oprimem outros, que algemam sua liberdade e impedem seu crescimento. Inimigo também é alguém que se coloca no caminho da nossa liberdade e dignidade. É alguém a quem evitamos e com quem nos recusamos comunicar. Nem sempre temos coragem de dizer que temos inimigos, pois esta palavra é muito forte.


Porém, consciente ou inconscientemente a atitude de uma pessoa de não querer se comunicar com seu rival/inimigo vai virar a antipatia e a antipatia pode se transformar em mágoa; a mágoa se torna raiva e a raiva vai virar ódio. O ódio é como uma gangrena: devora a pessoa. Também o ódio é igual alguém a tomar o veneno e espera que o outro morra. Mas na verdade, quem toma o veneno é que vai morrer. Todas as nossas recusas em nos comunicarmos com os outros e nos abrirmos a eles encerram-nos na prisão. Em vez de nos ajudar a crescermos no amor, no perdão e na abertura, esse processo pode nos fechar em formas sutis de depressão e inércia. Nesse caso somos prisioneiros de nós mesmos ou do nosso grupo.


Creio que ainda temos plena consciência que as forças da vida e os desejos de comunhão são maiores do que a força da morte e do ódio. Por isso, no fundo, em todos os momentos nós somos chamados à liberdade e à abertura. Viver é uma permanente busca da liberdade para a salvação.


Amai os vossos inimigos e orai por aqueles que vos perseguem”, diz-nos Jesus. Aqui amar o inimigo consiste em se tornar seu intercessor: “Orai por aquele que vos persegue”. O verdadeiro amor recusa qualquer tipo de vingança contra o inimigo. Ao contrário, deve-se oferecer-lhe alternativa para conviver. A motivação para fazer tudo isso é o modo de agir do Pai que “faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre os justos e injustos”.


Amai os vossos inimigos e orai por aqueles que vos perseguem”. Trata-se de um apelo à mudança, a não mais sermos controlados por nossas mágoas e nossos medos, mas em pensarmos sobre a paz na direção à maturidade cristã.  Essas palavras parecem impossíveis de serem vividas quando o relacionamento foi profundamente atingido, ou mesmo rompido; quando o inimigo é aquele ou aquela que está na origem das graves feridas ou dos profundos sofrimentos, que talvez tenham destruída toda a nossa vida; quando nos encontramos diante do imperdoável.


Quando Jesus nos diz: “Amai vossos inimigos e orai por aqueles que vos perseguem”, ele não vive no sonho. Em nenhum caso, amar o inimigo e orar por ele poderia significar que lhe damos licença de nos destruir. O amor é nunca destrutivo.
 

Amar o inimigo não pertence ao âmbito do sentimento, do sensível, mas ao domínio da vontade profunda, da opção, da vontade de estar em concordância com as leis do Reino. A palavra de Cristo é uma ordem de vida, não se refere ao sentimento. É preciso ter bastante maturidade e uma espiritualidade profunda para viver tudo isso.
 

Por isso, o mandamento do amor ao inimigo é a maior exigência da mensagem de Jesus. Segundo Jesus, o amor há de chegar a todos porque todo homem há de ter a experiência do amor de Deus. Neste ponto o homem há de ser colaborador de Deus. A medida da ação do homem é Deus: “Sejam perfeitos como o Pai do céu é perfeito”. Deus está no ato de amar. É o que diz o evangelho falando de “imitação de Deus” no mesmo ato de amar acima das comunidades naturais e sagradas nas quais vivemos. É o mesmo ato de amar que constitui caminho para Deus e não a qualidade sagrada do objeto amado.


Amar os inimigos e rezar por eles quando nos tratam mal superam todo preceito. É uma exigência que se apóia no exemplo do próprio Deus, que vê todos, bons e maus, como os Seus filhos. Amar os inimigos é gratuidade do amor que é vivido na presença de Deus e palavras que encontram a sua garantia na própria prática de Jesus. Na cruz Jesus rezou pelos inimigos: “Pai perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Tão integral foi sua identificação com os pecadores e criminosos, que ele teve que suplicar ao Pai que perdoasse aos responsáveis por sua crucificação. O perdão é a maior necessidade de toda a humanidade, pois somente através do perdão de nossos pecados e através do perdão que oferecemos aos outros é que alcançaremos paz de espírito, sem o qual a vida se tornará um tormento, uma infindável procura de uma satisfação que jamais chega. O perdão é o testamento escrito por Jesus na cruz.


Jesus não dá apenas leis novas para os cristãos e para as pessoas de boa vontade. Ele dá aquilo que não cabe dentro de nenhuma lei: uma atitude totalmente nova que não se explica humanamente.  “Amigo” e “inimigo” não serão nem salvos por minha simpatia, nem malditos por meu ódio. Pelo contrário, o que será julgado, salvo ou maldito, será meu ódio e meu amor. No relacionamento com o próximo, na minha facilidade de classificar amigos e inimigos, o julgado sou eu. O decisivo, portanto, não é o meu sentimento, mas a fé de que eles também estão colocados diante da face de Deus. A partir do meu comportamento diante deles e contra eles, eu serei julgado por Deus.


"Ama os teus inimigos, porque eles falam-te dos teus defeitos. Causar um dano coloca você abaixo do inimigo, vingar-se faz com
que você se iguale a ele, perdoá-lo coloca você acima dele
"
(Benjamin Franklin).

P. Vitus Gustama, SVD

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