30/06/2015
LEVAR JESUS E DEIXAR-SE LEVAR POR JESUS
PARA OUTRA MARGEM DA VIDA
Terça-Feira da XIII
Semana Comum
Evangelho: Mt 8, 23-27
Naquele tempo, 23 Jesus
entrou na barca, e seus discípulos o acompanharam. 24 E eis que houve
uma grande tempestade no mar, de modo que a barca estava sendo coberta pelas
ondas. Jesus, porém, dormia. 25 Os discípulos aproximaram-se e o
acordaram, dizendo: “Senhor, salva-nos, pois estamos perecendo!” 26
Jesus respondeu: “Por que tendes tanto medo, homens fracos na fé?” Então,
levantando-se, ameaçou os ventos e o mar, e fez-se uma grande calmaria. 27
Os homens ficaram admirados e diziam: “Quem é este homem, que até os ventos e o
mar lhe obedecem?”
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Para entender o relato do evangelho
de hoje com seus detalhes nós precisamos ter na mente alguns textos do AT que
servem como o pano de fundo. Controle sobre o mar e o ato de acalmar tempestade
são sinais característicos do poder divino (Jô 7,12; Salmo 73(74),13;
88(89),8-10; 92(93),3-4; Is 51,9-10). Acalmar uma tempestade no mar é a maior
prova da atenção ou do cuidado amoroso de Deus (Salmo 106(107),23-32). É digno
de notar também que dormir em paz e sem preocupar-se com nenhum problema é um
sinal da perfeita confiança em Deus (cf. Pr 3,23-24;Sl 3,6;4,9; Jô 11,18-19). Não
há tempestade maior na vida que Jesus não possa acalmar. Jesus é o Rei do
Universo, e por isso, ele é o Senhor (dominar= “dominus” = senhor) do Universo.
Na literatura antiga a barca é
imagem da comunidade. Jesus convida os discípulos a irem a “outro lado do mar”.
“Do outro lado” estão os pagãos, ou o território não- judeu. Jesus convida os
discípulos para esse território para que lá possam semear também entre os
pagãos a Boa Notícia do Reino. Atravessar, ou “ir para outro lado”, então,
significa sair de si mesmo, pensar nos outros e não ficar apenas no nosso lado.
É preciso ampliar o horizonte para ver as pessoas, a vida e seus
acontecimentos, o mundo em geral na sua justa perspectiva e no seu justo valor.
É preciso ampliar o olhar para ver o campo maior de atuação. O convite para ir
a outro lado é um convite para tomar coragem de adotar novas maneiras de viver
e de atuar. É sair de nosso mundo pequeno para o mundo maior a fim de que
renovemos nossa reflexão sobre tudo na nossa vida. Precisamos ir a “outro
lado”. Somente indo para outra margem é que podemos enriquecer nossa experiência
e logo nossa sabedoria. Precisamos estar no lugar do outro para saber e
compreender a vida do outro. Quem sabe no “outro lado” em vez de evangelizarmos
os outros, seremos muita mais evangelizados por eles do que eles por nós.
Travessia é muitas vezes sinônimo de abertura ao novo e diferente.
Mas para que possamos atravessar
para “outro lado”, precisamos vencer o “mar” de nossa vida. Andar seria
impossível. Afundaríamos. Precisamos de algum meio. E o meio para chegar no
“outro lado” para superar o “mar” a fim de
levar Jesus é “barco”. Quem sabe um dos barcos mencionados neste texto que
sumiram do relato é o nosso barco que ainda não foi usado para levar Jesus. É
preciso ter coragem para renovar ou procurar meios para que Jesus e seus
ensinamentos possam chegar até as pessoas. Usemos todos os meios para que
Jesus, o Salvador possa chegar até as pessoas. Os meios são sempre mutáveis,
mas a mensagem de Jesus é eterna, pois só Jesus “tem palavras de vida eterna”
(Jo 6,68). Não podemos eternizar os meios, pois eles podem se tornar caducos
para outro tempo e lugar ou para determinadas situações. O que é eterna é a
mensagem de Jesus: “Passarão o céu e a terra. Minhas palavras, porém, não
passarão” (Mt 24,35).
Qualquer movimento, grupo ou
pastoral que não se renovar, morrerá no caminho ou há possibilidade maior de extinção.
Renovar e transformar são código de desenvolvimento e de crescimento. Muitas vezes acontece que vivemos com nossos hábitos
de gerar pensamentos negativos e medrosos que paralisam nossa vida e
consequentemente, nosso crescimento. Para superar isso, precisamos de uma forte
disciplina espiritual. recebemos os dons do Espírito Santo para intensificar as
dimensões de do talento e da inteligência. Com a disciplina espiritual,
poderemos corrigir os erros que pareciam incorrigíveis. Todas as coisas que acontecem
são parte de um processo educacional misterioso que constituem nossa missão. A cada
nova lição, somos desafiados a mergulhar mais fundo para nos tornar mais sábios,
afetuosos, eficientes e efetivos. Qualquer que seja nosso próximo passo ou
desafio, a lição vai nos esperar onde quer que estejamos. Para Deus, todo
momento é um novo começo. Deus não é detido por nada. É preciso caminhar
permanentemente! Podemos andar no mesmo caminho, mas é preciso mudar o jeito de
andar para que a caminhada não se torne cansativa e sim agradável e leve. “Na doação, a vida se fortalece;
e se enfraquece no comodismo e no isolamento. De fato, os que mais
desfrutam da vida são os que deixam a segurança da margem e se apaixonam pela
missão de comunicar a vida aos demais. A vida se alcança e amadurece à medida
que é entregue para dar vida aos outros” (Papa Francisco: Exortação
Apostólica: Evangelii Gaudium, no. 10).
Fala-se de uma violenta tempestade
que agita o mar, a ponto de as ondas caírem dentro do barco. Para o povo da
Bíblia, o mar agitado é a imagem da revolta dos povos inimigos que gera caos
primitivo (cf. Sl 46,3-4.7; 65,8; 93,3-4). Além disto, tempestade é imagem de
incerteza e de sentimento de derrota, daí se eleva a Deus o grito do povo (cf.
Sl 18,16-20;69,2-5.15-16). E somente Deus pode dominar o mar e seu tumulto (Jô
38,7.11). Enquanto isso, Jesus parece estar ausente, dorme e parece estar
completamente alheio à tragédia. O sono tranqüilo de Jesus simboliza uma
confiança total em Deus como foi explicado nos textos do AT acima mencionados.
“Jesus entrou na barca e os
discípulos O seguiram”. Assim Mateus relatou o episodio do
evangelho deste dia. A palavra “seguir” aqui é um termo chave que tem função de
ligar este episódio com o episódio anterior sobre o seguimento radical (cf. Mt
8, 18-22). Seguir Jesus supõe riscos e renúncias. É por isso que Mt, logo
depois da exortação sobre o seguimento radical (episódio anterior), fala da
tempestade no meio do lago balançando o barco onde se encontram Jesus e seus
discípulos.
As tempestades do Lago de Galiléia
têm fama por ser súbitas e muito violentas. E Jesus dormia no meio dessa
perigosa tempestade (em grego se usa a palavra “sismo” semelhante ao terremoto,
movimento interno violento). Deus dorme! Deus parece ficar calado! Por que não se
manifesta? Por que o Senhor não intervém na minha vida?
“Por que tendes tanto medo, homens
fracos na fé?”, responde Jesus diante de nossos gritos. É o núcleo deste
relato: “Homens de pouca fé”. Jesus apela para a fé. Jesus se estranha. E Jesus
dá confiança: “Não tenhais medo!”. Para seguir Jesus a fé é condição essencial.
As exigências, as renúncias fazem parte da perspectiva de fé. Quanto mais
humanamente desesperadora e sem saída for a situação, mais a fé será
necessária.
Jesus nos chama a termos fé. Há
situações extremas para as quais todo apoio humano perde sua força. Nessas
situações somente a fé em Deus é capaz de manter alguém em pé diante dessas
situações. Para ficarmos em pé diante das situações extremas, é preciso
mantermo-nos de joelhos diante de Deus. Quando a morte se aproximar, por
exemplo, não há outra solução melhor do que a própria fé em Deus cujos braços
permanecem abertos para nos acolher em sua casa (cf. Jo 14,1-2). No curso da
vida de todo homem ou mulher há muitas situações nas quais a fé é o único
recurso, o único meio de evitar o pânico: abandonar-se em Deus, confiar nele.
Nessa situação precisamos ouvir profundamente o que Jesus nos diz hoje: “Por
que vós tendes tanto medo, homens fracos na fé?”.
Ao relatar a tempestade acalmada por
Jesus o evangelista Mateus quer nos mostrar que Jesus tem em suas mãos o poder
criador de Deus. Por isso, com sua palavra apenas, tudo lhe obedece. O
evangelista quer nos chamar a termos fé neste Jesus em qualquer situação onde
nos encontramos.
Se encontrarmos alguma dificuldade,
precisamos manter a cena do evangelho deste dia diante de nossos olhos: a
tempestade violenta, o sono de Jesus, o grito de seus amigos, a chamada a uma
fé mais forte e a paz que procede desta fé. Quando tudo parece contrario ou
contraditório, Jesus está ali, na minha barca, na barca da Igreja. Precisamos
rezar em silêncio: “Senhor, suprima meu medo, pois somente o Senhor tem
palavras da vida eterna”.
A Palavra de Deus de hoje quer que
tenhamos mais fé em Deus em qualquer situação, pois Ele é o nosso Pai e só quer
nosso bem. Precisamos estar conscientes de que Cristo, Deus-Conosco está na
barca da Igreja e na barca de nossa vida. É verdade que Jesus parece estar
dormindo. Mas, na verdade, a nossa fé é que está adormecida. E o Deus-Conosco,
Jesus Cristo, promete sua presença permanente na nossa vida: “Eis que estou
convosco todos os dias até o fim do mundo” (Mt 28,20). “Coragem! Eu venci o
mundo!” (Jo 16,33c). Temos que ter consciência dessa promessa e colocá-la em
prática.
Para Refletir:
·
“Cada cristão e cada comunidade há-de discernir qual é o
caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar esta
chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as
periferias que precisam da luz do Evangelho” (Papa Francisco:
Exortação Apostólica, Evangelii Gaudium no. 20).
· A fé nasce no encontro com o Deus vivo, que nos chama e
revela o seuamor: umamor quenos precede e sobreo qual podemos apoiar-nos
paraconstruir solidamente a vida. Transformados por esteamor, recebemos
olhosnovos e experimentamos que há nele uma grandepromessa de plenitudee nos é
aberta a visãodo futuro. A fé,que recebemos de Deuscomo domsobrenatural,
aparece-nos como luz para a estradaorientando os nossos passos no tempo (Pap
Francisco: Enciclica Lumen Fidei, no. 4).
P. Vitus Gustama,svd
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