15/07/2015
SIMPLICIDADE E HUMILDADE E A REVELAÇÃO DE
DEUS
Quarta-Feira da XV Semana Comum
Evangelho: Mt 11,25-27
25 Naquele
tempo, Jesus pôs-se a dizer: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos
sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos. 26 Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado. 27 Tudo me foi entregue por
meu Pai, e ninguém conhece o Filho,
senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o
Filho o quiser revelar”
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Para entender
o sentido do texto lido neste dia é preciso ler o texto precedente no qual
Jesus condena as cidades da Galiléia (cf. Mt 11,20-24). Por esta razão, para
manter a continuação do narrativo Mateus usa a expressão “Por esse tempo”: “en ekeinoi
toi kairõi...” (Mt 11,20).
Mateus emprega neste texto o termo “kairós”
que aqui significa mais do que simplesmente “tempo”. É um tempo determinado,
oportuno e decisivo. É o tempo de Deus. É o tempo da graça. É o tempo da
salvação. Por isso, a conotação escatológica é bem clara neste texto.
No texto
precedente Jesus dirige sua condenação às três cidades: Corazim, Betsaida e
Cafarnaum, que são sede de escolas rabínicas e, por conseguinte, centros de
cultura religiosa. Por ser centros de cultura religiosa, seus membros se enchem
de autossuficiência e orgulho que lhes impedem de descobrir as ações divinas
que se realizam por meio das obras de Jesus. Santo Agostinho perguntava
retoricamente: “Se tu estás preocupado
com tua própria glória, como poderás interessar-te seriamente pelo bem dos
demais?” (In ps. 37,8). Os sábios e os entendidos são, neste
contexto, todos aqueles que com sua atitude irresponsável não são capazes de
aceitar as intervenções de Deus na história. Sua soberba lhes impede de aceitar
e de perceber a manifestação divina. “A
alma do soberbo está cheia, mas de ar” (In
ps. 39,28). Por isso, o mesmo Santo Agostinho deu o seguinte
conselho: “Para tu alcançares as alturas
necessitas de uma escada. Para alcançares a altura da grandeza, usa a escada da
humildade” (Serm. 96,3). E "Quanto mais humildes, maiores" (In ps. 146,16).
Mesmo assim,
Deus, apresentado como “Senhor do céu e da terra” continua sua obra criadora na
história. Se Deus é apresentado como “Senhor do céu e da terra”, isto significa
que não há outro “senhor” que seja maior do que Deus. Não há senhor acima de
Deus. Todos os demais são criaturas, simplesmente. O poder humano é temporário.
A sabedoria humana é limitada. Quem estiver em sintonia com o Espírito de Deus,
captará a presença de Deus nesta vida ou na história. O desígnio de Deus (do
Pai) encontra sua realização em outros sujeitos que são classificados como
“gente simples”.
No texto do evangelho de hoje Jesus louva a
Deus em uma oração de ação de graças: “Eu Te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra...”.
É uma oração de ação de graças. É um louvor. O coração de Jesus transborda de
agradecimento ao Pai. No evangelho de hoje Jesus usa palavra “Pai” cinco vezes.
Aqui Jesus descreve o Pai como “o Senhor do céu e da terra”, que domina o
universo, mas que não atua como “dono”. Porque o Pai é Aquele que se inclina até
os pequenos, que se deleita na pequenez, que ama o simples, que defende os
pobres, os oprimidos, que sente o grito do sofrimento (cf. Ex 3,7-12). Quando
estes pequenos olham para Ele, Deus se revela. O atuar do Pai é gratuito,
preferencial.
O louvor se refere principalmente a Deus. Um
cristão é vivo quando ergue o olhar para algo maior do que qualquer criatura, e
o louva. Ao louvar a Deus, o homem olha tudo além de si mesmo. O homem louva
porque percebe sua vida e seu sentido, e a beleza do mundo a partir de Deus, e
louva a Deus por tudo de bom que existe. O louvor é sinal de uma alma saudável
e sempre faz bem para a alma. O louvor relativiza os problemas cotidianos. O
homem que louva sempre ganha nova força para superar os problemas diários. O
louvor é uma maneira de ver o mundo sob a nova luz que é a luz de Deus. Quem
vive louvando a Deus vive feliz e sereno. Somente quem olha para o lado
positivo desta vida, sabe louvar a Deus.
Somente quando estivermos serenos é que
percebemos a beleza da vida. A serenidade é a expressão da tranquilidade vivida
com gratidão por nos sentirmos amparados por Deus e em Deus. A serenidade
oferece e garante a justa perspectiva das coisas. Diante da glória e da bondade
do Deus misericordioso qualquer sofrimento ou dificuldade perde o seu caráter
ameaçador.
Jesus louva a Deus com o seguinte motivo:
“... porque
escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelastes aos pequeninos”
(Mt 11,25). “Estas coisas” das quais o texto fala se
referem às obras messiânicas de Jesus das quais o capítulo inteiro fala por
ocasião da pergunta dos enviados de João Batista (cf. Mt 11,2-6).
Jesus dá
graças ao Seu Pai pelas pessoas simples e humildes. São estas pessoas, chamadas
de “pequeninos” que escutam sua Palavra; são pessoas que compartilham Sua
amizade, as que creem em Sua Pessoa e confiam n´Ele; são pessoas boas que
desafiam as correntes de incredulidade e de progresso orgulhosamente humano. São
pessoas que se ajoelham diante de Deus e por isso, ficam com os pés firmes
diante das dificuldades da vida. São as pessoas que sabem mais de Deus do que
muitos outros chamados “sábios”. Há conhecimento que se ganha com fé,
simplicidade e pobreza interiores.
Os pequeninos dos quais Jesus fala são os
que se sabem necessitados e limitados. Esta é a razão pela qual eles abrem seu
coração à misericórdia divina. Sempre necessitamos ser amados por Deus e pelos
homens, pois somente o amor é que nos faz crescer e chegar à maturidade como
pessoa. A simplicidade e a humildade são a porta de entrada ao conhecimento de
Deus. Se não fizermos este primeiro passo, avançaremos na direção da falsidade
e ficaremos cheios de vangloria. As pessoas simples, as de coração humilde, são
as que sabem entender os sinais da proximidade de Deus. Elas têm um coração sem
demasiadas complicações. Os humildes têm um coração limpo e simples que lhes
permite ver tudo com os olhos de Deus. É a pureza de coração, a ausência de
todo interesse distorcido que nos permite discernirmos as coisas de Deus na
nossa vida e na história. Jesus chama bem-aventurados os que têm o coração
puro: “Bem-aventurados os puros do
coração, porque verão a Deus” (Mt 5,8).
Os pequeninos sempre são simples. E o
simples não se louva nem se despreza. Ele é o que é, sem desvios, sem afetação,
faz o que faz, mas não vê nisso matéria para discursos ou para comentários. É a
vida sem mentiras, sem exagero, sem grandiloquência. Ele acolhe o que vem, sem
nada guardar como coisa sua. Ele ocupa-se do real, não de si. Por isso, a vida
de um simples é leve.
Deus quer que os homens não se ocupem de si
mesmos para que ele possa ter espaço neles para Sua graça, pois aquele que se
enche de si não sobra espaço nem para Deus nem para os outros. Em outras
palavras, que os homens voltem a ser simples.
Deus se revela certamente àquele que se
despoja de si mesmo e de tudo, ao simples, àquele que vive segundo o Espírito,
àquele que tem um olhar e o coração limpos. O coração limpo e a ausência de
todo interesse torcido permitem o simples discernir a ação de Deus na história.
Os simples são os que, ao se esvaziarem de si mesmos, se abrem a Cristo e aos
irmãos. Por isso, eles são preferidos de Deus. A atitude dos simples é,
portanto, a alternativa diante da obstinada petulância dos soberbos. Não é por acaso que Mahatma Gandhi dizia:
“Como Deus se encontra mais frequentemente entre suas criaturas mais humildes
do que entre os poderosos, esforço-me por me colocar no nível das primeiras- o
que só se pode fazer colocando-se a seu serviço. Daí minha paixão pelo serviço
das classes oprimidas. Servir é a minha religião. Não me inquieto com o
futuro”.
“Eu Te
louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra porque
escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelastes aos pequeninos”.
Que esta oração de Jesus seja um grande motivo para voltarmos a viver no louvor
e na simplicidade, pois uma vida de louvor a Deus e uma vida vivida na
simplicidade é uma vida leve, alegre, animada e cheia de esperança.
Nosso Deus Pai nos revela tudo, quando nos
tornamos suficientemente simples para poder entender e administrar
adequadamente tanta graça. Quando começarmos a viver ocupando o lugar de Deus,
como os sábios e entendidos no evangelho deste dia, Deus continuando revelando
Seu nome e Sua vida, mas não teremos disposição para entende-Lo.
Vale a pena ser simples e humilde porque
conhecer Deus e tê-Lo no coração significa começar a viver o céu já aqui na
terra.
P.Vitus Gustama, SVD
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