segunda-feira, 21 de setembro de 2015

23/09/2015
 
SOMOS CHAMADOS A SER ENVIADOS DO SENHOR

Quarta-feira da XXV Semana
 

Evangelho: Lc 9,1-6

Naquele tempo, 1 Jesus convocou os Doze, deu-lhes poder e autoridade sobre todos os demônios e para curar doenças, 2 e enviou-os a proclamar o Reino de Deus e a curar os enfermos. 3 E disse-lhes: “Não leveis nada para o caminho: nem cajado nem sacola nem pão nem dinheiro nem mesmo duas túnicas. 4 Em qualquer casa onde entrardes, ficai aí; e daí é que partireis de novo. 5 Todos aqueles que não vos acolherem, ao sairdes daquela cidade, sacudi a poeira dos vossos pés, como protesto contra eles”. 6 Os discípulos partiram e percorriam os povoados, anunciando a Boa Nova e fazendo curas em todos os lugares.
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O texto do evangelho deste dia fala da missão dos discípulos de Jesus e, portanto, a missão de toda a Igreja, de todos os cristãos. Depois de uma longa temporada de formação e de instrução, Jesus convoca seus discípulos e os envia. A missão consiste na proclamação da Boa Nova e em ações concretas que o evangelho usa a expressão “expulsar demônios e curar os doentes”. É um trabalho libertador. Para isso, antes de partir Jesus lhes dá o poder para vencer a força do mal.


A missão se resume em dois pontos precisos: um é uma palavra, uma proclamação, um anúncio; outro é um ato propriamente dito, uma cura/libertação.


Anunciar Com Palavras


Em sentido técnico é chamado “anúncio”, aquela mensagem particular que suscita a fé. O Papa João Paulo II, na encíclica Redemptoris Missio, recorda que “Na realidade complexa da missão, o primeiro anúncio tem um papel central e insubstituível, porque introduz no mistério do amor de Deus, que, em Cristo, nos chama a uma estreita relação pessoal com Ele e predispõe a vida para a conversão. A fé nasce do anúncio, e cada comunidade eclesial consolida-se e vive da resposta pessoal de cada fiel a esse anúncio...” (n. 44). Para a Igreja, o anúncio do Evangelho (evangelho= anúncio alegre) é sua graça e sua própria vocação, sua identidade mais profunda. No NT o anúncio  sempre contém a mensagem salvífica. Por isso, não se trata apenas de ensinamento ou doutrina. A vida das pessoas tem que ser tocadas pela mensagem de Jesus para que se convertam em novos anunciadores/evangelizadores da salvação. A Igreja é a comunidade que se constitui em torno do Senhor. A tarefa de levar o anúncio do Evangelho incumbe a toda Igreja.


A palavra e a linguagem são os meios pelos quais o homem entra em relacionamento com o seu próximo. Para os antigos (especialmente para o mundo oriental), a palavra não é apenas a manifestação do pensamento ou da vontade, mas uma coisa concreta que opera e é como que carregada com a força da pessoa que a pronuncia. Neste sentido, uma palavra não é apenas como portadora e mediadora do conteúdo significante, mas sim como poder eficaz, especialmente nas bênçãos (cf. Gn 27,35-37 em que a bênção derramada sobre Jacó não pode mais ser abolida) e nas maldições (cf. a maldição proferida por Josué em Js 6,26, dois séculos mais tarde ainda pesava sobre aquele que queria reconstruir Jericó, como lemos em 1Rs 16,34. A maldição, uma vez pronunciada, só pode ser desfeita por uma bênção contrária, como lemos em Jz 17,2;1Sam 21,3).
           

Temos que estar conscientes de que a Palavra de Jesus (Deus) continuará a ser eficaz, curadora, e libertadora, se nós soubermos ouvi-la atentamente e vivê-la na nossa vida cotidiana. Se ela curou tantas pessoas, converteu tantos pecadores, libertou tantas pessoas de seus problemas, guiou a vida de tantos homens, esta mesma palavra continua tendo o mesmo poder e a mesma eficácia. A palavra humana pode errar e enganar, porque o homem é fraco. Mas a Palavra de Deus não erra nem engana. A Palavra de Deus é firme para sustentar a vida de quem nela se agarra e por ela se orienta. Precisamos anunciar a Palavra de Deus.


Toda a vida do cristão deve ser evangelizadora. “Não podemos ficar encerrados na paróquia, nas nossas comunidades, quando há tanta gente esperando o Evangelho! Não se trata simplesmente de abrir a porta para acolher, mas de sair pela porta fora para procurar e encontrar. Decididamente pensemos a pastoral a partir da periferia, daqueles que estão mais afastados, daqueles que habitualmente não frequentam a paróquia. Também eles são convidados para a Mesa do Senhor”. (Papa Francisco: HOMILIA NA MISSA COM OS BISPOS – CATEDRAL METROPOLITANA, Rio de Janeiro- Brasil, Sábado, 27 de julho de 2013).


Libertar As Pessoas


Porém, o texto do evangelho de hoje nos lembra que o missionário não pode ficar contente apenas com “palavras”, mas são necessários “atos” concretos que mostram aos homens que estes contribuem para libertá-los do poder do mal: expulsar os demônios, curar os doentes. Trata-se de libertar as pessoas de tantas escravidões. É preciso identificar e procurar que são os últimos de cada cidade, de cada comunidade, de cada rua, onde moramos e mobilizar os irmãos para procurar soluções concretas para aliviar as pessoas de suas necessidades. As pessoas necessitadas são carne e sangue visíveis de Jesus (cf. Mt 25,40.45).


O Papa Francisco nos alerta na sua exortação apostólica, Evangelii Gaudium: ”O grande risco do mundo atual, com sua múltipla e avassaladora oferta de consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada. Quando a vida interior se fecha nos próprios interesses, deixa de haver espaço para os outros, já não entram os pobres, já não se ouve a voz de Deus, já não se goza da doce alegria do seu amor, nem fervilha o entusiasmo de fazer o bem. Este é um risco, certo e permanente, que correm também os crentes. Muitos caem nele, transformando-se em pessoas ressentidas, queixosas, sem vida. Esta não é a escolha duma vida digna e plena, este não é o desígnio que Deus tem para nós, esta não é a vida no Espírito que jorra do coração de Cristo ressuscitado” (no.2).


É bom cada  um fazer o exame de consciência se tem apenas muito dinheiro no bolso, mas o coração fica vazio.


Viver a Pobreza Evangélica


Para exercer esta missão cada enviado, cada cristão deve ser revestido de a “pobreza evangélica”: “Não leveis nada para o caminho: nem cajado nem sacola nem pão nem dinheiro nem mesmo duas túnicas”.


Cada cristão deve estar livre interiormente, sem demasiada bagagem. O cristão não busca a si mesmo e sim deve dar exemplo de desapego e deve confiar na força intrínseca da Palavra de Deus. O cristão deve estar despojado, ter um coração livre e desarmado. Somente aquele que se esvazia de si tem espaço para a graça de Deus. E quando uma pessoa estiver cheia da graça de Deus, como a mãe de Jesus, ele será uma bênção para os demais.


Não leveis nada para o caminho: nem cajado nem sacola nem pão nem dinheiro nem mesmo duas túnicas. Em qualquer casa onde entrardes, ficai aí; e daí é que partireis de novo”.


A vida do próprio Cristo foi marcada pelo sinal de pobreza. Ele nasceu na pobreza, viveu sob a pobreza e morreu pobre.


A Igreja primitiva cuidava muito de manter esse ideal de pobreza real. A pobreza era para ela um sinal do Reino (Lc 6,20;14,25-33; 16,19-31; 18,18-30).


A virtude cristã de pobreza é baseada sobre fé. A razão da pobreza evangélica é para imitar Cristo, para viver como ele viveu e para caminhar como ele caminhou.


Toda vez que nos encontrarmos com essa exigência evangélica devemos nos interrogar, pois somos muito propensos a esquecê-la e a nos instalar no conforto e no bem-estar com o risco tremendo de nos contentar com esses bens materiais e nos falte a disponibilidade. Vale a pena fazer uma reflexão sobre as seguintes palavras do Papa Francisco na sua entrevista com Gerson Camarotti da Globo News durante a Jornada Mundial da Juventude de 2013 no Rio de Janeiro, Brasil: “Penso que temos que dar testemunho de uma certa simplicidade, eu diria, inclusive, de pobreza. Nosso povo exige a pobreza de nossos sacerdotes. ... O povo sente seu coração magoado quando nós, as pessoas consagradas, estamos apegadas ao dinheiro. Isso é ruim. E realmente não é um bom exemplo que um sacerdote tenha um carro último tipo, de marca” (Papa Francisco, Mensagens e Homilias- JMJ Rio 2013 , pp. 130-131. Ed. Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).


A Igreja que somos nós todos, devemos servir de ponte entre Deus e a humanidade, deve servir de testemunha da simplicidade e do amor de Deus aos homens. A fé, que é a resposta humana ao convite de Deus deve ser refletida na terra em que vivemos e em que trabalhamos. Toda a atividade da Igreja ou de cada cristão deve ser dirigida para este fim: ser espelho do amor de Deus.


A imagem da Igreja, que somos nós todos, deve ser a imagem de uma realidade acolhedora e não excludente, deve ser a imagem de um “recinto” em que todos cabem porque todos são recebidos com amor. Neste sentido, toda a vida do cristão há de ser evangelizadora. Onde há amor, há espaço. Onde não há amor, há apenas um sufoco e agressividade e mútuo ataque.


Na Eucaristia celebramos o amor daquele que, conhecendo nossa fragilidade, faz suas nossas dores, carregou sobre si nossas misérias e nos curou com suas chagas (cf. Mt 8,17; Is 53,4). Ele se apresentou não como um Deus terrível que dá medo e sim com simplicidade de quem nos ama entranhavelmente e se aproxima de nós para se manifestar a nós como a Boa Notícia que o Pai misericordioso pronuncia a nosso favor.


Que Deus nos conceda a graça de viver confiados no amor de Deus, mas ao mesmo tempo, de viver fieis a todo aquilo que nos foi encomendado, especialmente proclamar seu Evangelho não somente com palavras, principalmente com obras, de tal forma que sejamos construtores de seu Reino neste mundo.


Reflitamos as seguintes palavras do Papa Francisco na exortação apostólica, Evangelii Gaudium:

“Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo! Repito aqui, para toda a Igreja: prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos. Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: ´Dai-lhes vós mesmos de comer´ [Mc 6, 37]. (EG 49)

P. Vitus Gustama,svd

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