sábado, 5 de dezembro de 2020

III DOMINGO DO ADVENTO, 13/12/2020-SER PRECURSOR DE CRISTO

SER ENVIADO DE DEUS É SER VOZ DIVINA PARA OS DEMAIS

III Domingo Do Advento Ano B


Primeira Leitura: Is 61,1-2a.10-11

1 O espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque o Senhor me ungiu; enviou-me para dar a boa-nova aos humildes, curar as feridas da alma, pregar a redenção para os cativos e a liberdade para os que estão presos; 2ª para proclamar o tempo da graça do Senhor. 10 Exulto de alegria no Senhor e minh’alma regozija-se em meu Deus; ele me vestiu com as vestes da salvação, envolveu-me com o manto da justiça e adornou-me como um noivo com sua coroa, ou uma noiva com suas joias. 11 Assim como a terra faz brotar a planta e o jardim faz germinar a semente, assim o Senhor Deus fará germinar a justiça e a sua glória diante de todas as nações.

Segunda Leitura: 1Ts 5,16-24

Irmãos: 16 Estai sempre alegres! 17 Rezai sem cessar. 18 Dai graças em todas as circunstâncias, porque essa é a vosso respeito a vontade de Deus em Jesus Cristo. 19 Não apagueis o espírito! 20 Não desprezeis as profecias, 21 mas examinai tudo e guardai o que for bom. 22 Afastai-vos de toda espécie de maldade! 23 Que o próprio Deus da paz vos santifique totalmente, e que tudo aquilo que sois — espírito, alma, corpo — seja conservado sem mancha alguma para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo! 24 Aquele que vos chamou é fiel; ele mesmo realizará isso.

Evangelho: Jo 1,6-8.19-28                             

6 Surgiu um homem enviado por Deus; seu nome era João. 7 Ele veio como testemunha, para dar testemunho da luz, para que todos chegassem à fé por meio dele. 8 Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz. 19 Este foi o testemunho de João, quando os judeus enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para perguntar: “Quem és tu?” 20 João confessou e não negou. Confessou: “Eu não sou o Messias”. 21 Eles perguntaram: “Quem és, então? És tu Elias?” João respondeu: “Não sou”. Eles perguntaram: “És o Profeta?” Ele respondeu: “Não”. 22 Perguntaram então: “Quem és, afinal? Temos que levar uma resposta para aqueles que nos enviaram. O que dizes de ti mesmo?” 23 João declarou: “Eu sou a voz que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor’” — conforme disse o profeta Isaías. 24 Ora, os que tinham sido enviados pertenciam aos fariseus 25 e perguntaram: “Por que então andas batizando, se não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?” 26 João respondeu: “Eu batizo com água; mas no meio de vós está aquele que vós não conheceis, 27 e que vem depois de mim. Eu não mereço desamarrar a correia de suas sandálias”. 28Isso aconteceu em Betânia, além do Jordão, onde João estava batizando.

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I. Um Olhar Geral Sobre As Leituras e Sobre o Espírito Do III Domingo Do Advento

Somos Chamados À Alegria No Senhor

O tema deste Terceiro Domingo do Advento é o de alegria e gozo na perspectiva de uma realidade salvífica esperada, mas já “misteriosamente” presente. É o Domingo “Gaudete”. Neste clima se move a Primeira Leitura (Is 1,1-2ª. 10-11) e o Salmo Responsorial (Cânt: Lc 1,46-48.49-50.53-53). A Segunda Leitura (1Ts 5,16-24) é um convite à alegria. O Evangelho (Jo 1,6-8.19-28) nos apresenta o motivo ou fundamento da mesma: a vinda do Senhor ao nosso encontro para nos salvar. A missão de João Batista é dar testemunho do Messias que vem.

A alegria é um dos principais temas da Sagrada Escritura. É o tema que se encontra em todas as partes no Antigo Testamento e no Novo Testamento. A mensagem da Bíblia é profundamente otimista: Deus quer a felicidade dos homens, seu êxito, sua expansão. Deus quer cobrir os homens de abundância de sua graça e de uma vida em plenitude.

Os cristãos devem saber que a Boa Nova da Salvação é uma mensagem de alegria.  Em um mundo rico em possibilidades, os cristãos devem comunicar aos que se encontram ao seu redor, a alegria que eles vivem: uma alegria extraordinária realista e que expressa sua certeza, baseada na vitória de Cristo, de que o futuro da humanidade vai se construindo através de dificuldades e contradições aparentes. O mundo não é absurdo (sem sentido), pois Deus o ama, e o princípio vital de seu êxito nos é dado uma vez por todos em Jesus Cristo. A alegria adquire maior profundidade na medida em que o homem deixa de estar dominado pela possessão de um bem material. Deus reserva a verdadeira alegria aos que se fazem pobres diante d´Ele e esperam tudo de seu Deus e da fidelidade a sua Lei. Se a verdadeira alegria vem de Deus, então nada nem ninguém pode tirá-la do homem: nem a angústia, nem o sofrimento. A alegria de Deus é a força daqueles que O buscam.

A alegria do Evangelho é uma alegria que vem do Alto, mas que, ao mesmo tempo, deve surgir de um coração de homem: é uma alegria divino-humana. Jesus é o Iniciador definitivo desta alegria: esta alegria é pascal, já que está, necessariamente, ligada ao ato último pelo qual Jesus expressa sua obediência ao Pai dando sua vida por todos os homens.

A celebração eucarística constitui um dos terrenos privilegiados na qual deve comunicar-se e experimentar-se, de alguma maneira, a verdadeira alegria. A ambição que a Igreja persegue ao reunir seus fiéis em torno das Duas Mesas: Mesa da Palavra e Mesa do Pão, é fazer todos os fiéis viverem, por antecipação, a própria salvação do Reino e a fraternidade sem limites que leva consigo. Neste sentido, a participação eucarística é objetivamente fonte de alegria.

Mas tudo o que foi dito não é automático. Para que a Eucaristia seja fonte de alegria é preciso, em primeiro lugar, que a Eucaristia seja uma verdadeira celebração: os cristãos reunidos devem se ver nela como penetrados na fonte da verdadeira alegria. Além disso, que a própria reunião eucarística simbolize o projeto de catolicidade da Igreja: os cristãos convocados para a celebração devem pôr em destaque que, dentro de sua diversidade, estão constituídos irmãos mediante a graça de Cristo que sobrepõe os muros de separação entre os homens. 

A alegria cristã é independente de qualquer coisa no mundo porque tem sua fonte na contínua presença de Cristo (cf. Mt 28,20). O cristão pode perder todas as coisas e todas as pessoas, mas ele jamais perderá Cristo Jesus (Rm 8,35-39), fonte de sua alegria. Embora se encontre numa circunstância em que a alegria se tornaria impossível, a alegria cristã permanece, pois “Jesus Cristo é o mesmo, ontem e hoje; Ele o será para sempre” (Hb 13,8). O mistério de alegria nasce de Deus, é um dom, e por isso não se compra em nossos mercados nem se encontra em nossas salas de festa. A alegria brota de dentro e tem sua origem no Espírito Deus: fruto do Espírito Santo (Gl 5,22). O homem foi criado para expandir-se na alegria e é, por isso, chamado por Deus para expandir a alegria.  Não é por acaso que para o evangelista Lucas, por exemplo, a alegria é um mandamento: “Alegrai-vos porque vossos nomes estão inscritos nos céus” (Lc 10,20). Se o Reino de Deus é paz, amor e alegria, o cristão deve ser testemunha de alegria: em seus talentos, em sua vida, em suas celebrações e assim por diante. Seria blasfêmia apresentar Deus como inimigo da vida e da alegria.

Saber-se Enviado Do Senhor

Uma das figuras-modelo da espera do Advento é João Batista que é destacado também na liturgia do Terceiro Domingo do Advento. Não se pode falar de João Batista sem falar de Cristo. Por isso, a Igreja nunca invoca a vinda do Salvador sem lembrar-se de João Batista, de quem o próprio Jesus fez o maior elogio: “Entre os nascidos de mulher, ninguém é maior do que João”, embora “o menor no Reino de Deus seja maior do que ele” (Lc 7,28).

Ele é o último dos profetas e resume na sua pessoa e palavra toda a história precedente, no momento em que esta desemboca no seu cumprimento em Jesus Cristo (Messias). João Batista encarna muito bem o espírito do Advento. Como Precursor do Messias, ele tem a missão de preparar os caminhos do Senhor (Cf. Is 40,3), de oferecer a Israel o “conhecimento da salvação”, que consiste na remissão dos pecados, obra da misericórdia divina (Cf. Lc 1,77-78), e, sobretudo, de indicar Cristo já presente no meio de seu povo (Cf. Jo 1,29-34). João Batista está muito lúcido sobre sua missão como Precursor e por isso, não tem dificuldade de ceder lugar para Cristo que deve crescer, enquanto ele deve diminuir (Cf. Jo 1,19-28). Isto torna João Batista uma figura sempre atual. 

João Batista, que reconhece honestamente sua função no plano de Deus, se sabe enviado como testemunha da Luz, do Messias por todos esperado, como fala o Evangelho deste Domingo. João Batista é muito consciente de quem é ele e de qual é sua missão. Ele não é o Messias; ele não realiza a figura messiânica do texto do profeta Isaías que lemos na Primeira Leitura. João Batista é somente uma voz que prepara os caminhos do Messias; ele é somente uma testemunha da Luz que ilumina todos os homens.

Saber que há missão na Igreja não é suficiente. Há que reconhecer qual é a própria missão para cada cristão nos desígnios de Deus. Nossa missão, como a de João Batista, é a de ser testemunha da Luz, como a de são Paulo, apóstolo-enviado de Cristo que leva a cabo sua missão mediante a pregação e através das cartas escritas para as comunidades como lemos na Segunda Leitura de hoje que contém a exortação aos Tessalonicenses para viverem em conformidade com a salvação que Cristo, o Enviado de Deus. Nossa missão como a de João Batista e a de são Paulo é ser apóstolos de Jesus Cristo. Há, portanto, uma cadeia contínua entre a missão do profeta, a de João Batista, a de Jesus, a de são Paulo e a missão dos cristãos de todos os tempos. Esta continuidade garante e dá credibilidade à nossa consciência e ao nosso sentido de missão entre os homens.

Não se pode separar o nome de cristão da missão. Por definição, cristão é o discípulo de Cristo que participa da mesma missão de Jesus Cristo. Cada cristão, a exemplo de João Batista e de são Paulo, há de ser consciente de que tem uma missão para realizar na Igreja: santificar sua vida e colaborar na santificação da vida dos demais. Os primeiros destinatários da missão somos nós mesmos, porque somente quando somos evangelizados, podemos ajudar na evangelização dos outros. Somos missionários, isto é, enviados pelo próprio Cristo a anunciar na escola, na casa, no trabalho, na rua, no clube, na política e assim por diante, que Jesus Cristo é o Salvador de todos, que Ele é a Luz do mundo que ilumina todas as obscuridades da consciência individual e da existência social e coletiva pela verdade e pelo amor.

Qual é minha missão? Qual é meu ideal? O que devo fazer durante minha passagem neste mundo em termos de missão? O mais importante na vida de um homem não é somente o que faz, mas também o que é, simultaneamente. O que faz deve ser consequência do que é, fruto de suas convicções profundas. De outra maneira, será um “fariseu” ou um “hipócrita”.

Vivemos numa sociedade pragmática que dá primazia ao fazer, à técnica. Nosso mundo se preocupa com a eficácia e descuida das motivações profundas que deveriam determinar o comportamento de uma pessoa. Descobrir, inventar, fazer, ganhar dinheiro com rapidez parece ser o objetivo que se inculca no homem de hoje. Mas será que o homem pragmático, o homem que se considera “moderno” é mais feliz do que os demais homens?

O cristianismo necessita de crentes que saibam oferecer aos homens grandes ideais. Ideais que justifiquem e deem sentido ao serviço que a humanidade necessita. É o projeto sobre a vida que deve determinar as práticas. Diante da mínima dificuldade, as pessoas carentes de convicções profundas não sabem o que fazer.  Não é possível perseverar se carece de princípios sólidos, se não há motivações profundas e constantemente alimentadas. Para seguir adiante necessita-se da solidez interior, que procede da profundidade de uma pessoa que encontrou o sentido da vida. João Batista sabe se definir quem é e por isso, sabe o que fazer.

II. Um Olhar Específico Sobre o Evangelho Deste Domingo

Logo no Prólogo de seu evangelho, o evangelista João nos apresenta o testemunho de João Batista durante três dias. No primeiro dia, João Batistatestemunho sobre sua própria missão (Jo 1,19-28). No segundo dia, eletestemunho sobre Jesus como “o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1,29-34). E finalmente, no terceiro dia, fala-se da consequência do testemunho de João Batista que leva dois dos seus discípulos a seguirem a Jesus (Jo 1,35-42).

Para nossa reflexão neste terceiro Domingo do Advento partimos da primeira frase do Evangelho desta Santa Missa que podemos dizer como um resumo do texto todo. Eis a frase: “Apareceu um homem enviado por Deus; seu nome era João”. João Batista a quem se refere é descrito sucessivamente, em primeiro lugar como homem (um homem); em seguida como enviado, determinando quem o envia e finalmente, pronuncia-se seu nome próprio: João.

1. João Batista É Um Homem (como qualquer um de nós)         

Para transmitir sua mensagem, Deus escolhe um homem sem mais qualificação de povo, condição social nem estado religioso. Deus chama qualquer um de nós para dar testemunho aos outros, especialmente àqueles que mergulham nas trevas desta vida, acerca da Luz-Vida. A palavratrevas” aparece nove vezes no Evangelho de João. Trevas é aquele estado de desordem ou de desorientação interior em que não se sabe aonde se vai e como se vai. Com a palavratrevas” João quer indicar aquele caminhar ao acaso e mal, que é típico de quem não tem um ponto de referência. João nos diz que o fato de não conhecer Jesus, Luz do mundo, feito homem entre nós, como o sentido último da realidade quevalor a todas as coisas, faz com que as pessoas se encontrem nas trevas, sem pontos de referência. Então se vai em frente ao acaso sem nunca se saber bem o que se faz e por que se faz, com todas as consequências desastrosas desta desorientação. As pessoas estão tão mergulhadas nas trevas/escuridão que com frequência chegam ao ponto de não querer sair dela; então levantam problemas sobre problemas. Esta é a situação das trevas.        

Deus, por isso, precisa do homem, pode ser que seja eu, você ou todos nós desta assembleia para apresentar Jesus como Luz que ilumina a caminhada de todos e como o sentido último de nossa vida e de toda a realidade. Por isso, chega de sermos consumidores da . Chegou nossa vez para sermos colaboradores de Deus para tirar as pessoas das trevas desta vida. Elas precisam de nós como Deus precisa de cada um de nós. Mas para ser luz aos outros temos ser reflexos da própria Luz que é Jesus, Luz do Mundo (Jo 12,8); é aproximar-se da Luz para ser depois ser luz na vida dos demais.

2. João Batista É Enviado Por Deus    

Com esta expressão o evangelista João quer nos dizer que o principal agente nesta cena é Deus, que envia João. A presença de João Batista se deve precisamente à vontade divina. Por ser enviado por Deus João Batista tem uma missão a se exercer ou a ser cumprida. Qual é a missão de João como enviado?       

2.1. Ser Testemunha Da Luz

Em primeiro lugar, a missão de João Batista é dar testemunho ou declarar-se em favor da luz, avivar a percepção de sua existência e o desejo de alcançá-la. A luz ilumina. A luz ajuda os olhos a enxergarem melhor, pois sem a luz os olhos não funcionam bem na escuridão. João está encarregado de apontar a possibilidade da vida, da luz que vai escapar das trevas, despertando em todos o desejo e a esperança. A luz sempre é existente, a plenitude da vida, ideal que brilha para o homem. Esta Luz é Jesus Cristo.         

Israel esperava pelo Messias, mas quando ele chegou não soube reconhecê-lo. Apesar disso, João Batista ia repetindo: “...no meio de vós está aquele que vós não conheceis...” (v.20). O que os impedia de reconhecê-lo era a própria maneira de pensar e de viver. Tinha ideias, hábitos, tradições religiosas e tribais que em absoluto não queriam modificar. João Batista tentou abrir-lhes os olhos e ouvidos, convidando-os para a conversão. Alguns o entenderam, mas os outros não o entenderam.        

Poderia acontecer a mesma coisa também conosco, nos dias de hoje. Recusando aderir à Luz de Cristo que alguma “voz” indica, corremos o risco de continuarmos a ficar nas trevas e de não conseguirmos experimentar a verdadeira alegria e libertação. Todos nós sabemos o que acontece quando caminhamos nas trevas: não conseguimos distinguir as cores nem podemos medir a distância nem percebemos se nossa roupa está suja ou limpa. Somente com a chegada da luz é que poderemos perceber bem cada coisa ou pessoa.      

A vinda de Jesus ao mundo é como a chegada da luz. De si mesmo ele disse: “Eu vim como luz do mundo”. A luz ilumina. Até as sombras são iluminadas também. Quem primeiro reconhece e dá testemunha da presença da Luz é João Batista. Porque ele é uma pessoa atenta à Palavra de Deus e aos sinais do tempo. Quem abre o coração para a Luz de Cristo, não deve temer de nada, não desilude, sinaliza os valores autênticos e dificilmente erra, pois Jesus Cristo, Luz do mundo ilumina seu caminho.        

2.2. Ser Voz De Deus Para Os Outros

Em segunda lugar, a missão de João Batista é como VOZ. Por três vezes os dirigentes do povo lhe perguntam: “Quem és tu?” (vv.19.21.22). Ele é muito honesto e não se deixa seduzir por nenhuma das falsas opiniões que correm sobre sua pessoa. Não aceita nem honras nem títulos que não lhe pertencem. Ele afirma não ser nem o Messias, nem Elias e nem o grande profeta. Ele se define: uma Voz, nada mais: “Eu sou a voz que grita no deserto: ‘Aplainai o caminho do Senhor’” (v.23).

O que é a voz? É o conjunto de sons que servem para transmitir uma mensagem. E o que acontece depois com a voz? Desaparece. Fica somente a mensagem que transmitiu. Eis o que é João Batista: uma voz quetestemunho da vinda da luz ao mundo e depois, cumprida a sua missão, desaparece, temendo que as pessoas se interessem por ele, em vez de seguirem a Luz que é Jesus Cristo: “Ele deve crescer, eu, ao contrário, diminuir”, dirá algum tempo depois (Jo 3, 30). Então, ele tem consciência da provisoriedade de sua missão. Sua pessoa está fadada a cair no esquecimento. Contudo, ele não se sente diminuído no exercício da missão que lhe confiada.

João Batista testemunha Jesus Cristo com fidelidade e valentia. Não quer falar de si mesmo, nem contar seus méritos nem suas façanhas. João Batista somente quer que os outros o considerem como “a voz que clama no deserto”, a voz que prepara os caminhos de Deus, a voz que chama todos a preparar o lugar de Deus no mundo, especialmente no coração de cada um.           

Também nós, como João Batista, deveríamos falar menos de nós mesmos, acreditar menos em nós mesmos e nos converter em “a vozquetestemunho de Deus, de seu amor presente em Jesus Cristo.           

Santo Agostinho comenta: “João era voz, mas o Senhor é a Palavra que no principio existia. João era uma voz provisional; Cristo, do princípio, é a Palavra eterna. Ao tirar a palavra, o que será a voz? Se não houver conceito, tudo será nada mais do que ruído vazio. A voz sem palavra chega ao ouvido, mas não edifica o coração. João é a voz que grita no deserto, a voz que rompe o silêncio...”.           

Ser voz é uma vocação muito humilde, mas é maior de todas. Ser voz é ser uma mensagem, é ser uma chamada aos demais para o bem, para a Luz que ilumina. A voz é feita para proclamar, para anunciar e para denunciar. A voz deixará de ser voz, se não gritar, se não proclamar, anunciar e denunciar. A voz se condenará, se deixar de anunciar a mensagem sobre o bem. Uma voz do bem é capaz de renovar o mundo. Se faltarem as vozes do bem para anunciar e denunciar, o mundo perderá sua consciência. Por esta razão, como vale e quanto vale sua voz! Como vale e quanto vale sua palavra! Como vale e quanto vale sua mensagem! Como vale e quanto vale seu grito que rompe o comodismo, que rompe o modo de viver sem vida.         

Tudo isso, requer uma maturidade emocional e espiritual bastante profunda. Quem consegue tal maturidade está em condições de prestar serviço com tranquilidade, sem criar problemas maiores do que aqueles que se propõe a resolver.         

Por falta dessa maturidade, vemos tanta gente boa, generosa mesmo cair na vaidade e exibicionismo e ficar presa em pequenas disputas, mágoas que atrapalham os relacionamentos e ofuscam a luz que poderia brilhar bem mais forte. Muitas obras boas geram um sistema de cobrança de reconhecimento de méritos que acaba sendo um peso para os beneficiados e a comunidade em geral. Assim esquecemos de apresentar Jesus Cristo que está no meio de nós que é o motivo de nossa alegria.

A última frase do evangelho de hoje (Jo 1,28) nos indica que João Batista desenvolveu seu ministério em Betânia. O significado mesmo do nome do lugar é “casa de testemunho”. Comocasa de testemunho” o local tem, então, um valor simbólico que indica o que deve ser toda comunidade: deve ser uma verdadeira casa de testemunho. Qualquer página do evangelho ilustra em que consiste concretamente o testemunho.

No evangelho de hoje João Batista se apresenta como o modelo por excelência de testemunho: “Eu não sou a luz. Eu sou testemunha da Luz. Eu sou a voz”. Cada um pode e deve ser “sinal” de Jesus para os outros mantendo a capacidade de desaparecer, exatamente como João Batista, para deixar somente Jesus aparecer.         

Tentemos rever por um instante o modo como cada um de nós chegou à : qual foi a primeiravozque nos levou ao conhecimento de Jesus Cristo, Luz do mundo. E ao mesmo tempo tentemos nos perguntar: e hoje somos a “vozque anuncia Cristo aos irmãos? Que espécie de “voz” somos? Não acontece, às vezes, que, em vez de anunciar Jesus Cristo, colocamos a nós mesmos em primeiro plano e deste modo impedimos as pessoas de conhecer a verdadeira luz? Quando e por que isto acontece?      

3. Seu Nome Era João

É importante ter nome! Quando podemos chamar alguém pelo próprio nome, estabelecem-se logo entre nós e ele relações pessoais. Ter nome faz nos escapar à multidão anônima. E Deus tem para nós um nome particular: “...chamei-te pelo teu nome: tu és meu”, diz o Senhor através do profeta Isaías (Is 43,1). Quando Deus nos chama pelo nome atinge a nossa personalidade profunda. Isto significa que Deus nos e nos compreende tão bem como nos fez. Sabe o queem nós: todos os nossos sentimentos e pensamentos, nossas inclinações e nossos gostos. Ele nos em nossos dias de alegria e em dias de sofrimento. Conhece nossa força e nossa fraqueza. Ele se interessa por nossas esperanças e nossas recordações. Ele nos conhece de ponta a ponta, pois foi ele que nos formou: “Antes mesmo de te formar no ventre materno, Eu te conheci...” diz o Senhor através do profeta Jeremias (Jr 1,5).         

Cada nome é um apelo. Cada nome é uma missão. Quando uma criança chamaMãe” a uma mulher é um apelo para que ela seja verdadeiramente para a criança, a sua mãe. Quando Deus chama o seu amigo “Abraão” é para que ele seja verdadeiramente “pai dos fiéis”. O nome que Deus nos dá é único e é para nós um apelo para uma missão única, como João, o Batista, significa Deus fez graça ou Deus é misericórdia/bondade.      

Se alguém nos perguntar qual é nosso nome, facilmente o respondemos. Será que sabemos o que significa o nosso nome, o que representa nosso nome e que nosso nome é um apelo para uma missão única? Qual é nossa missão que tem dentro desse nome? Será que estamos conscientes de que Deus nos chama pelo nome? Para Deus não somos pessoas anônimas? Chamar alguém pelo nome é o sinal de intimidade. Ter nome é ter missão.

O Evangelho De Hoje Nas Palavras De São Cirilo de Alexandria, Doutor da Igreja (século V):

O que significa: Preparai o caminho ao Senhor, aplainai os seus caminhos, o explica quando acrescenta: Elevem-se os vales, desçam os montes e as colinas; que se endireite o que é torcido, e que o acidentado se nivele. Pois existem acessos públicos e trilhas quase impraticáveis, íngremes e intransitáveis, que algumas vezes obrigam a subir os montes e as colinas, e outras a descê-los; ora te colocam à beira de precipícios, ora te fazem escalar altíssimas montanhas. Porém, se estes lugares isolados e abruptos descerem, e se preencherem as cavidades profundas, aí sim, o torcido se endireita totalmente, os campos se aplainam, e os caminhos, antes íngremes e tortuosos, tornam-se transitáveis. É isso, só que em nível espiritual, o que faz acontecer o poder de nosso Salvador.  ... Cristo nivelou o caminho para nós, um caminho muito apto para correr pelas sendas da piedade; um caminho sem encostas acima, nem declives ladeirentos, sem altos e baixos, mas realmente liso e plano” (Lecionário Patrístico Dominical 2ª Edição, Ed. Vozes, 2019 pp.279-280).  

P. Vitus Gustama,svd

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