terça-feira, 23 de março de 2021

26 de Março de 2021-Obras Boas

AS OBRAS BOAS PRATICADAS PARA O BEM DA HUMANIDADE FALAM DE DEUS

Sexta-Feira da V Semana da Quaresma

Primeira Leitura: Jeremias 20,10-13

10 Eu ouvi as injúrias de tantos homens e os vi espalhando o medo em redor: “Denunciai-o, denunciemo-lo”. Todos os amigos observam minhas falhas: “Talvez ele cometa um engano e nós poderemos apanhá-lo e desforrar-nos dele”. 11 Mas o Senhor está ao meu lado, como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos. Por não terem tido êxito, eles se cobrirão de vergonha. Eterna infâmia, que nunca se apaga! 12 Ó Senhor dos exércitos, que provas o homem justo e vês os sentimentos do coração, rogo-te me faças ver tua vingança sobre eles; pois eu te declarei a minha causa. 13 Cantai ao Senhor, louvai ao Senhor, pois ele salvou a vida de um pobre homem das mãos dos maus.

Evangelho: Jo 10,31-42

Naquele tempo, 31os judeus pegaram pedras para apedrejar Jesus. 32E ele lhes disse: “Por ordem do Pai, mostrei-vos muitas obras boas. Por qual delas me quereis apedrejar?” 33Os judeus responderam: “Não queremos te apedrejar por causa das obras boas, mas por causa de blasfêmia, porque sendo apenas um homem, tu te fazes Deus!” 34Jesus disse: “Acaso não está escrito na vossa Lei: ‘Eu disse: vós sois deuses’?  35Ora, ninguém pode anular a Escritura: se a Lei chama deuses as pessoas às quais se dirigiu a palavra de Deus, 36por que então me acusais de blasfêmia, quando eu digo que sou Filho de Deus, eu a quem o Pai consagrou e enviou ao mundo? 37Se não faço as obras do meu Pai, não acrediteis em mim. 38Mas, se eu as faço, mesmo que não queirais acreditar em mim, acreditai nas minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em mim e eu no Pai”. 39Outra vez procuravam prender Jesus, mas ele escapou das mãos deles. 40Jesus passou para o outro lado do Jordão, e foi para o lugar onde, antes, João tinha batizado. E permaneceu ali. 41Muitos foram ter com ele, e diziam: “João não realizou nenhum sinal, mas tudo o que ele disse a respeito deste homem, é verdade”. 42E muitos, ali, acreditaram nele.

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As duas leituras deste dia nos apresentam dois justos que sofrem: o profeta Jeremias e Jesus. Os adversários os atacam porque os dois fizeram ou praticaram o bem. Jeremias perseguido era já Jesus perseguido. Quando os nossos próprios interesses estiverem em jogo, seremos incapazes de enxergar o que é bom e correto, pois pensaremos e defenderemos apenas as nossas próprias vantagens. Muitos ainda não entenderam que o que ganhamos aqui neste mundo, materialmente, vai ficar aqui mesmo. O que tem a marca do mundo fica no mundo. O que tem a marca divino, vai para a eternidade: justiça, fraternidade, honestidade, caridade, bondade, solidariedade, compaixão, e assim por diante. 

Jeremias é um Justo Que Sofre Pelo Bem Que Faz 

Eu ouvi as injúrias de tantos homens e os vi espalhando o medo em redor: ´Denunciai-o, denunciemo-lo´. Mas o Senhor está ao meu lado, como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos”. 

O texto da Primeira Leitura faz parte das seções denominadas “Confissões de Jeremias(Jr 11,18-23; 12,1-6; 15,10-12; 17,2-18; 18,18-23; 20,7-18) nas quais a alma lírica do profeta mostra sua grande dor diante da calúnia e perseguição. É o grito agudo que revela o desgarro interior. Jeremias sofre por causa de Deus que não escolheu seu ministério e sim que o Senhor o chama para ser seu profeta (Jr 1,6) e arrasta-o sem poder escapar-se (Jr 20,7). Por confiar em Deus, Jeremias é objeto de escárnio da parte dos seus concidadãos. Jeremias também sofre por causa dos homens. A compreensão superficial da mensagem produz a recusa do profético nas mensagens. 

Apesar de tudo isso Jeremias continua a acreditar em Deus. Ele está convencido de que ele luta ao lado do mais forte de todos os homens, que é o próprio Deus, e por isso, vencerá: “O Senhor está ao meu lado, como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos” (Jr 20,11). Jeremias vive a experiência de Deus não somente como um fato de presença e amizade pessoal, mas também como uma manifestação na comunidade e na vida da humanidade. Por isso, Jeremias chama todos à conversão de coração. Conversão de coração porque o pecado está profundamente arraigado. Para Jeremias o verdadeiro conhecimento do Senhor não está no culto e sim na justiça social (Jr 22,16).

Por acreditar fortemente no Deus “forte guerreiro”, o lamento de Jeremias está carregado de confiança em Deus. Jeremias pede a Deus que triunfe a causa do próprio Deus. A confiança na vitória é origem de sua oração. Ele pede justiça divina e não revanche humana. Jeremias está seguro do triunfo de Deus e por isso continua sua luta contra seu povo infiel à aliança com Deus. 

Jeremias foi chamado por Deus para ser profeta quando tinha menos de vinte anos. O profeta é aquele que anuncia e denuncia tanto através de atitudes como também através de palavras. Jeremias foi chamado por Deus para anunciar desgraça e catástrofes se o povo não se converter. Mas sua mensagem foi mal recebida pelo povo, por seus familiares e pelas autoridades. Eles tramaram a morte do profeta Jeremias, e ele estava consciente disso. Apesar disso, o profeta continuava a confiar em Deus firmemente: “O Senhor está ao meu lado, como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos... Ele salvou a vida de um pobre homem das mãos dos maus”. Diante de Deus o mal não tem a última palavra e sim o bem. Quem pratica o bem, está nas mãos de Deus mesmo sua vida neste mundo seja eliminada. Mas o bem jamais pode ser eliminado, pois o valor eterno.

Jeremias representa tantas pessoas que sofrem neste mundo, como inocentes e justos, mas que continuam a pôr sua confiança em Deus e seguem adiante nesta vida. Como o Salmista eles continuam a rezar: “Meu Deus, sois o rochedo que me abriga, minha força e poderosa salvação, sois meu escudo e proteção: em vós espero!” (Cf. Sl 17- Salmo Responsorial).

As Obras Boas Revelam a Presença De Deus Na Pessoa Que As Pratica 

Se não faço as obras do meu Pai, não acrediteis em mim. Mas, se eu as faço, mesmo que não queirais acreditar em mim, acreditai nas minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em mim e eu no Pai”. 

O evangelho nos apresenta um clima cada vez mais tenso entre os judeus e Jesus. Contra Jesus os adversários reagiram com mais violência ainda em comparação com a violência contra o profeta Jeremias que terminará na crucificação de Jesus. Os seus adversários pegaram pedras para eliminar Jesus. Trata-se de uma forma de calar para sempre a voz que incomoda embora contenha tanta verdade nela. Em vez de se converter, os incomodados preferem matar a voz que os corrige para seu próprio bem. Não julguemos injustamente o inocente, pois vai chegar nosso momento de sermos julgados na mesma medida. 

Os judeus querem uma declaração clara de Jesus sobre suas origens: “Quem és tu?” (Jo 8,25). Trata-se de uma pergunta cheia de acusação. Eles continuam instalados em sua ortodoxia e com um pensamento já feito ou preestabelecido. Por isso, não permite renovação nem inovação. Consequentemente, eles não permitem outros pontos de vista. Nosso grande problema no crescimento não é colocar as coisas novas na nossa cabeça e sim tirar as coisas caducas de nossa cabeça. Nosso computador ficará cada vez mais lento, se não tirarmos lixos acumulados nele. Um armário cheio de roupas velhas não tem onde colocar as roupas novas. 

A pior prisão é a prisão mental em que não tem mais humildade em aprender, e que se torna um obstáculo para desfrutar e atingir o que está por vir. Nada mudará enquanto a minha mente não mudar. A maior meta que cada um deve ter é mudar a si mesmo, mudar a maneira de pensar para mudar a maneira de viver e de conviver. Se você não sabe quem é, para onde vai, qual é o sentido daquilo que está fazendo e vivendo, qual é a bagagem que vai levar, o que lhe falta, o que tem a mais para alcançar o crescimento e sucesso será você mesmo quem boicotará seu futuro. O problema é que não estamos acostumados a olhar para dentro de nós. Podemos encontrar em segundos as falhas ou os erros dos outros, mas podemos levar toda a vida para encontrar nossos erros e falhas. Temos facilidade de olhar para fora e não para dentro de nós simultaneamente. 

Mas querer ou não querer chegará um momento em que não poderemos continuar fingindo viver uma vida que não nos pertence. É preciso arrancar as máscaras para viver a vida na graça de Deus. Muitos seguem o padrão de vida dos outros sem saber onde vão chegar.       

O evangelho de hoje nos relata que os judeus pegaram pela segunda vez pedras para apedrejar Jesus. Mas Jesus lança a seguinte pergunta: “Tenho-vos mostrado muitas obras boas da parte de meu Pai. Por qual dessas obras me apedrejais? (...) Mas se as faço, e se não quiserdes crer em mim, crede nas minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em mim e eu no Pai(Jo 10,32. 38).

As obras de Jesus pelo bem da humanidade, especialmente pelos necessitados, demonstram sua unidade com Deus, o Bem absoluto. Quem pratica o bem é de Deus, embora ele não confesse expressamente sua em Deus. Quem não é de Deus pratica a violência, o mal e a maldade, embora se declare religioso ou adepto de uma religião ou crença. Se Deus é amor (cf. 1Jo 4,8.16), Ele não pode jamais admitir a violência ou qualquer maldade.  Quem é de Deus e tem em Deus verdadeiramente, deve praticar o bem como Jesus que “passou a vida fazendo o bem(At 10,38). Mas essas obras não convencem os contemporâneos de Jesus porque suas cabeças estão cheias de “razoes”. Ao contrário, pegaram pedras para atirar em Jesus. Quem atira pedras nos outros é porque tem um coração de pedra. Um coração de pedra sempre machuca e fere os outros. “O coração do homem é como a de um moinho; se jogardes trigo, tereis farinha; se jogardes pedras, tereis cascalho” (Fulton Sheen).

Jesus sofreu sua Paixão muito antes da Sexta-Feira Santa. Ele viveu as últimas semanas de Sua vida terrena rodeado de inimigos que querem eliminá-lo para sempre deste mundo. Ele será eliminado pelo bem que pratica. Ele experimenta o sofrimento moral e psicológico: ele é mal julgado pelas pessoas que deformam a verdade. Tudo isto é doloroso. É uma grande ironia: o mal julga o bem; o justo é julgado pelo injusto; a mentira julga a verdade. É uma ironia para todos os que defendem seus próprios interesses sem se preocupar com o bem comum, com a verdade, com a honestidade e assim por diante. Mas somente o bem tem futuro. 

Jesus sempre nos relembra que somente os limpos de coração verão a Deus (cf. Mt 5,8). Se eu não estiver preparado para amar, se não houver em mim um desejo sincero de conhecer Deus, não O verei na minha vida e em outras pessoas, mesmo que tenha tantas evidências, como aconteceu com os contemporâneos de Jesus. Que essa cegueira seja temporária para nossa vida. É preciso purificar o coração para que possamos enxergar bem o sentido da vida e vislumbrar o futuro de Deus.

Crede nas minhas obras”. “Olham para minhas obras!”, diz Jesus. A qualidade do homem, em certo sentido, se aprova pelas suas obras. Jesus demonstra ser enviado e Filho de Deus com as obras de amor que realiza. As únicas coisas que testemunham uma missão divina não são sequer as palavras, por bonitas que sejam elas (se não quiserdes crer em mim), e sim as obras boas para o bem comum. Santo Agostinho dizia: “O homem não se torna bom por possuir coisas boas. Ao contrário, o homem bom torna boas as coisas que possui, ao usá-las bem”. A própria pessoa que pratica as boas obras pode até ficar calada ou estar em silêncio, mas as obras gritam por si e por ele. Das obras boas de Jesus devem deduzir a unidade entre Ele e o Pai (v. 38b). O Pai e Jesus têm o mesmo objetivo: dar vida ao homem: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundancia(Jo 10,10).

Quando Jesus diz aos seus adversários: “Se não quiserdes crer em mim, crede nas minhas obras, para que saibais e reconheçais que o Pai está em mim e eu no Pai”, eles não têm resposta. Como de costume, eles apelam simplesmente à violência (Jo 7,30; 8,20.59). Eles querem apedrejar Jesus. O apedrejamento era o castigo por gravíssimos pecados, entre eles era a blasfêmia.

O evangelho de são João quer explicar a seus leitores quem é realmente Jesus, em nome de quem vem e atua. Também quer explicar-lhes porque as autoridades do seu tempo chegaram a crucificar Jesus: porque não entenderam Suas palavras nem interpretaram seus gestos e seus milagres (sinais).

A bondade é o preço de aluguel que devemos pagar pelo espaço que ocupamos neste planeta, pois o planeta não é nosso e sim é de Deus que o recebemos de graça. Deus criou tudo pela pura bondade e por amor à humanidade. O “preço” que devemos “pagar” é a bondade praticada e o amor fraterno vivido diariamente na convivência com os demais.

Não pode deixar de nos perguntarmos: “Quantas pedras atiramos aos que não pensam ou não falam como nós? Teríamos nós, como Jesus nos diz, que é precisoolhar para as obras” e aprender a reconhecer nelas o único sinal inequívoco do Reino: o amor. É preciso que abramos os olhos do coração e contemplemos a realidade como Deus a . No fim descobriremos que o rosto de amor nos chama à vida e que nos promete a vida. Quando usarmos o coração na convivência com os demais, as pedras que estão nas nossas mãos vão cair todas no chão e as usaremos para construir uma casa de fraternidade. Façamos cada obra por pequena que ela seja de uma forma grandiosa. O que faz grandiosa uma obra é o amor com que a fazemos. A bondade é um investimento que nunca falha, pois tem a marca de eternidade. “O bem ou é presente, ou passado, ou futuro: se é presente, causa gosto; se é passado, causa saudade; se é futuro, causa desejo”, dizia Pe. Antônio Vieira no seu sermão. 

O evangelho de hoje nos disse que os contemporâneos de Jesus pegaram pedras para atirar em Jesus, o inocente e justo. Que tipo de “pedrasque nós atiramos nos outros e que causaram sofrimentos neles? Que tipo de pedras que recebemos dos outros e que nos causaram sofrimento? O que fazemos com estas pedras? “Um monte de pedras deixa de ser um monte de pedras no momento em que um único homem o contempla, nascendo dentro dele a imagem de uma catedral” (Antoine de Saint-Exupéry). “Um dos segredos da vida é fazer degraus com as pedras em que tropeçamos” (Jack Penn). ”Se permaneceres no bem, a tristeza se afastará de ti; se persevares na justiça, a tristeza não te assaltará. Nem a peste nem a morte causarão terror, se viveres bem e piedosamente”, dizia Santo Isidoro de Sevilha.

P. Vitus Gustama,svd

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