domingo, 7 de março de 2021

11 de Março de 2021

ESCUTAR DEUS E SUA PALAVRA PARA ESTAR DO LADO DO BEM CONTRA O ESPÍRITO DO MAL

Quinta-Feira da III Semana da Quaresma

I Leitura: Jr 7,23-28

Assim fala o Senhor: 23 Dei esta ordem ao povo dizendo: Ouvi a minha voz, assim serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo; e segui adiante por todo o caminho que eu vos indicar para serdes felizes. 24 Mas eles não ouviram e não prestaram atenção; ao contrário, seguindo as más inclinações do coração, andaram para trás e não para a frente, 25 desde o dia em que seus pais saíram do Egito até ao dia de hoje. A todos enviei meus servos, os profetas, e enviei-os cada dia, começando bem cedo; 26 mas não ouviram e não prestaram atenção; ao contrário, obstinaram-se no erro, procedendo ainda pior que seus pais. 27 Se falares todas essas coisas, eles não te escutarão, e, se os chamares, não te darão resposta. 28 Dirás, então: Esta é a nação que não escutou a voz do Senhor, seu Deus, e não aceitou correção. Sua fé morreu, foi arrancada de sua boca.' 

Evangelho: Lc 11,14-23

Naquele tempo 14 Jesus estava expulsando um demônio que era mudo. Quando o demônio saiu, o mudo começou a falar, e as multidões ficaram admiradas. 15 Mas alguns disseram: 'É por Belzebu, o príncipe dos demônios, que ele expulsa os demônios.' 16 Outros, para tentar Jesus, pediam-lhe um sinal do céu. 17 Mas, conhecendo seus pensamentos, Jesus disse-lhes: 'Todo reino dividido contra si mesmo será destruído; e cairá uma casa por cima da outra. 18 Ora, se até Satanás está dividido contra si mesmo, como poderá sobreviver o seu reino? Vós dizeis que é por Belzebu que eu expulso os demônios. 19 Se é por meio de Belzebu que eu expulso demônios, vossos filhos os expulsam por meio de quem? Por isso, eles mesmos serão vossos juízes. 20 Mas, se é pelo dedo de Deus que eu expulso os demônios, então chegou para vós o Reino de Deus. 21 Quando um homem forte e bem armado guarda a própria casa, seus bens estão seguros. 22 Mas, quando chega um homem mais forte do que ele, vence-o, arranca-lhe a armadura na qual ele confiava, e reparte o que roubou. 23 Quem não está comigo, está contra mim. E quem não recolhe comigo, dispersa.

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Escutar a Palavra De Deus Para Viver Frutífero

Ouvi a minha voz, assim serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo; e segui adiante por todo o caminho que eu vos indicar para serdes felizes”, assim fala o Senhor através da boca do profeta Jeremias. É uma das expressões mais perfeitas da Aliança. É uma pertença reciproca: “Serei vosso Deus e vós sereis o meu povo”.

O profeta Jeremias pronunciou, no tempo do rei Joaquim (609-598 a.C), uma série de oráculos contra o formalismo do templo. Os versículos que lemos na Primeira Leitura fazem parte do terceiro oráculo. Aos olhos do profeta Jeremias, os sacerdotes estão de tal modo preocupados com as rubricas e com o formalismo dos sacrifícios que Deus já não deve reconhecer neles os executantes de sua vontade (Jr 7,21-22). O que Deus pediu ao povo foi a obediência à sua vontade e não a uma regulamentação precisa de sacrifícios: “Dei esta ordem ao povo dizendo: Ouvi a minha voz, assim serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo; e segui adiante por todo o caminho que eu vos indicar para serdes felizes” (Jr 7,23). Mas infelizmente os profetas não foram ouvidos a tal ponto que a Palavra de Deus não reside mais nesse povo de surdos (Jr 7,27-28).

Ouvi a minha voz, assim serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo; e segui adiante por todo o caminho que eu vos indicar para serdes felizes”. Escutar é uma das chamadas constantes da Sagrada Escritura. Escutar significa fazer próprio o que se proclama e o que se escuta. Escutar também significa atender, ir assimilando o que se ouve, reconstruir interiormente o conteúdo da mensagem. Escutar é a primeira forma de fé e de oração, antes que dizer palavras ou entoar cantos. Escutar é uma das atitudes mais cristãs. Somente os que têm a humildade é que são capazes de escutar. O autossuficiente e o prepotente não sabem escutar e não querem escutar. Ouvir profundamente significa escutar as palavras, os pensamentos, a tonalidade dos sentimentos, o significado pessoal, até mesmo o significado que subjaz às intenções conscientes, até os gritos enterrados muito abaixo da superfície do interlocutor. O povo eleito é formado pela escuta da Palavra de Deus. E a maior das tragédias na Bíblia é causada pela falta da escuta da Palavra de Deus. Quando nos abrirmos para o discurso divino, aprenderemos que nós somos escuta, dom e que nos realizamos na gratuidade. 

Mas, em vez de escutar Deus, o povo fez seu próprio caminho fora de Deus: “Mas eles não ouviram e não prestaram atenção; ao contrário, seguindo as más inclinações do coração, andaram para trás e não para a frente”. 

É a queixa amarga de Deus por meio do profeta Jeremias. É uma contra seu povo Israel porque não cumpre a Aliança que havia feito entre Deus e seu povo. Trata-se de uma acusação que clama o céu.

Escutar é uma coisa mais séria, requer uma certa dose de interesse, de preocupação, de atenção. Há que parar-se para detectar o que ouvimos, para clarificá-lo, para assimilá-lo e para respondê-lo. Escutar é um exercício humano para certa categoria. Muitas vezes acontece que ouvimos mas não escutamos.

Um dos grandes temas da Escritura é a escuta da Palavra de Deus. Na Bíblia, a escuta é uma palavra–chave que caracteriza toda a tradição do povo hebraico. O povo foi formado pela escuta da Palavra de Deus, assim como o próprio cristianismo foi formado pela escuta da palavra do Senhor Jesus Cristo. Cada piedoso e observante israelita, para se compenetrar da vontade de Deus, repete dia a dia esta frase: “Escutai, ó Israel”, conhecida como “Shemah” (Dt 6,4; Mc 12,29), que desde o fim do século I d. C não deixou de ser rezado de manhã e à tarde. Por trás da palavra “Shemah”, que convida Israel a se colocar numa atitude de escuta, proclama-se solenemente a unidade de Deus que causa a união plena e total de Israel com o Senhor. 

Escutar é a primeira forma de fé e de oração, antes que dizer palavras ou entoar cantos. Escutar é uma das atitudes mais cristãs. Somente os que têm a humildade é que são capazes de escutar. O autossuficiente e o orgulhoso não sabem escutar e não querem escutar. Quem não aprender a escutar e a perguntar, não poderá ir longe nem pode crescer na vida.

Certamente a Boa Notícia consiste no fato de que Deus tem uma palavra para mim, para minha família, para meu casamento, para meu trabalho, para meus problemas e dificuldades e assim por diante, e eu posso e preciso escutar esta palavra no silêncio e na paz. Eu devo me alimentar desta escuta, para que eu cresça na fé e me realize como pessoa. Na escuta da Palavra de Deus Eu cresço junto a tantos outros que, como eu, formam a Igreja que caminha, escutando a Palavra de Deus. 

O drama do homem, na verdade, consiste em não escutar a Deus e a Sua Palavra, não escutar os bons conselhos, não escutar as boas orientações, não escutar os alertas (leia Dt 18,16.19).

Estamos no tempo da Quaresma. É um tempo forte para nos abrirmos para Deus (oração, meditação, reflexão etc.), para nos abrirmos para os outros (obra de caridade, a esmola) e para nos abrirmos para nós mesmos (jejum, autocontrole a fim de dar maior espaço para Deus na nossa). São três pilares de nossa Quaresma. É bom cada um se perguntar: será que me esforço para esta abertura? Se não, a Páscoa deste ano será mais uma páscoa na minha vida, sem novidade nem renovação dentro de mim. E será cumprida em nós a Palavra de Deus em forma de um crítica forte: “Esta é a nação que não escutou a voz do Senhor, seu Deus, e não aceitou correção. Sua fé morreu, foi arrancada de sua boca”. Que nossa fé não morra em nós. E por isso ela precisa ser alimentada pela escuta, pela oração, pela obra de caridade e pelo jejum que expressa nosso autocontrole. 

É Preciso Estar Unido a Cristo Para Combater Todos Os Tipos de Demônio Na nossa Sociedade 

A história se repete no tempo de Jesus. Israel foi surdo à Palavra de Deus através das palavras do profeta Jeremias. E os contemporâneos de Jesus foram cegos aos sinais do Mestre.

Jesus veio para expulsar o demônio do egoísmo que divide e luta contra a força do Espírito de partilha e de fraternidade que há dentro de cada pessoa. Ele veio para expulsar o demônio do individualismo que se coloca contra as correntes solidárias na sociedade. Ele veio para destruir os demônios com o poder de Deus e implantar Seu Reino de justiça e de paz.

A história se repete! Depois que Jesus expulsou de uma pessoa um demônio que era mudo, os adversários de Jesus o acusaram dizendo: “É por Belzebu, o príncipe dos demônios, que ele expulsa os demônios”. Quando ficam sem meios justos para criticar Jesus (ad rem), os adversários atacam a pessoa de Jesus (ad hominem) através dos meios injustos. Eles atribuem o poder de Jesus para expulsar os demônios não a Deus e sim ao Satanás. Mas os simples percebem, que através da ação de Jesus que liberta as pessoas de suas prisões, o Reino de Deus chegou. Jesus não só salva a alma, mas a pessoa inteira.

Contra a esta acusação Jesus responde com algumas intervenções ou alguns ditos.

Primeira intervenção: “Todo reino dividido contra si mesmo será destruído; e cairá uma casa por cima da outra”.

Segunda intervenção: “Se até Satanás está dividido contra si mesmo, como poderá sobreviver o seu reino?”.

Satanás não pode estar em contra de si mesmo, assim como um reino não pode estar dividido, tampouco Satanás pode estar dividido.

Depois vem a parábola do homem forte que muito mais armado do que aquele que guarda a casa e por isso, consegue derrotar o guarda da casa.

Com esta parábola o texto quer nos dizer que Jesus veio para expulsar o Satanás e dificultar sua obra e despojar sua casa, pois Jesus é muito mais forte do que qualquer Satanás. A ação de Jesus e a dos que O seguem sempre produzem unidade, paz, bondade, misericórdia, perdão, liberdade e libertação, atenção aos demais, que são as características das ações evangélicas. São Paulo, na sua carta aos gálatas, escreveu: “Vós fostes chamados à liberdade. Não abuseis, porém, da liberdade como pretexto para prazeres carnais. Pelo contrário, fazei-vos servos uns dos outros pela caridade, porque toda a lei se encerra num só preceito: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Gl 5,13-14). Segundo São Paulo, os que têm o espírito evangélico possuem as seguintes características: “Os frutos do Espírito são: amor, alegria, paz, generosidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, continência” (cf. Gl 5,13-21. 22-23). Quando encontrarmos estas características em nós e em nossas ações, poderemos estar seguros de que estaremos diante de um espírito evangélico. Pelo contrário, “se vos mordeis e vos devorais, vede que não acabeis por vos destruirdes uns aos outros?” (Gl 5,15). 

Outros pensamentos para nossa reflexão:

1. Importância da Unidade                       

Todo reino dividido contra si mesmo será destruído; e cairá uma casa por cima da outra”, diz o Senhor. Nesta controvérsia Jesus sublinha a importância da unidade. Pela história sabemos que a guerra civil destrói mais os impérios do que os ataques exteriores. Quem usar a “ação de dividirpara atacar será destruído pela mesma divisão que recairá contra suas próprias tropas. Coração dividido é o coração ferido. O Corpo Eucarístico o qual comungamos torna cada um Corpo de Cristo para os outros.

A unidade é a expressão e a prova mais evidente do amor. Quem estiver unido com Cristo que está unido ao Pai, jamais será causador da desunião e da divisão entre os cristãos ou entre as pessoas; ele buscará sempre a reconciliação. A comunhão com Cristo é impossível sem a vivência do amor fraterno. Assim como o amor fraterno cria unidade, assim também a comunhão com Jesus deve criar a comunhão entre os cristãos. 

2. Estar do lado da justiça, do bem e da verdade é estar do lado de Jesus 

Quem não está comigo, está contra mim; quem não recolhe comigo, espalha”, alerta-nos o Senhor hoje. 

Na sua pregação o Apóstolo Pedro deu seu testemunho sobre Jesus ao dizer que Ele “passa a vida fazendo o bem” (At 10,38). Apesar disso Jesus enfrentou muitas oposições. Muitos se consideravam proprietários das boas obras, do poder divino, e demonizavam aquelas pessoas que não atuavam segundo seus parâmetros. Eles davam esmolas ou conselhos com intuito de ter o bom nome, o prestígio e a admiração (cf. Mt 23,1-36). Quando Jesus veio para dar sua vida generosamente sem esperar nada em troca, eles o consideraram comodemônio”, “Belzebu”. Era uma maneira fácil que eles encontraram para desprestigiar e eliminar o oponente, neste caso, Jesus. No entanto, Jesus os enfrentou com a verdade, o bem e a justiça. 

Na atualidade continua sendo corrente a prática de demonizar o oponente, de desprestigiá-lo para aumentar o brilho próprio. Pois, atuar a favor dos demais sem buscar o bom nome e o prestígio é uma coisa que não chama a atenção de ninguém. 

3. Vida cristã como um combate permanente contra o poder do mal 

No evangelho de hoje, Jesus nos apresenta a vida cristã como um combate: “Quem não está comigo, está contra mim; quem não recolhe comigo, espalha”. Ele nos apresenta que há dois poderes sempre em guerras: o poder divino e o poder de Belzebu ou o poder do mal. Estamos, às vezes, obrigados a constatar que o mal tem raízes extremamente profundas por causa das forças destruidoras e violentas que aparentemente, nenhum homem é capaz de dominar.  O poder de Belzebu ou do mal, conforme o evangelho de hoje, prende as pessoas (se tornam presos do poder do mal) e cria a mudez nas pessoas (lei de silêncio). Este poder faz com que as pessoas sejam incapacitadas de se comunicar com os demais e com o mundo, não permite diálogo e relacionamento (viver no isolamento). É como o mudo no evangelho de hoje. O poder divino em Jesus suscita consciência crítica nas pessoas, são chamadas e capacitadas a se dialogar com os outros na igualdade e na fraternidade, a entrarem em relacionamento com as outras pessoas e com o Deus que liberta. O evangelho quer nos dizer que é preciso voltarmos para Jesus e vivermos seus ensinamentos e estarmos vigilantes para que o poder do mal não nos surpreende em qualquer momento. 

Portanto, o evangelho de hoje nos convida a estarmos do lado de Jesus, isto é, do lado do bem, da verdade e da justiça, não para adquirir ganâncias pessoais e sim para ser as mãos de Deus que atuam eficazmente no mundo. Por isso, o mundo de hoje exige que lutemos contra o mal com as armas da verdade, do bem, da honestidade, da solidariedade e da justiça. Não podemos combater o mal com suas próprias armas: a violência somente gera violência e a manipulação ideológica somente gera opressão e desequilíbrio mental. Lutar para acumular os bens e o poder é uma ilusão, pois tudo isso termina no leito da morte. Um morto não tem título nem poder nem status social. No leito da morte tudo se iguala como na hora do parto. Somos chamados a conviver como irmãos em que um cuida do outro; um protege o outro; um se preocupa com a dignidade do outro.  Necessitamos combater o mal como o fez Jesus: com a bondade e generosidade de um Deus que defende incondicionalmente a vida das pessoas humanas e sua dignidade como seres humanos. O cristianismo e o mal e a maldade são incompatíveis. Fazer o bem permanentemente significa que estamos no Reino da verdade, da justiça e da caridade que é o Reino de Deus. Para viver uma vida autenticamente humana, temos que nos amar muito com a verdade, a justiça, o bem e a caridade que são, em certo modo, coisas sagradas que requerem ser tratadas com amor e respeito e são os valores que têm a marca de eternidade.

·        Como eu era miserável! E Tu, Senhor, tocavas na minha chaga viva, a fim de que eu deixasse tudo e me convertesse a Ti, que estás acima de todas as coisas (Santo Agostinho: Confissões VI, 6).

·        O mundo não está ameaçado pelas pessoas más, e sim por aquelas que permitem a maldade. (Albert Eisntein).

·        O mal não pode vencer o mal. Só o bem pode fazê-lo (Leon Tolstoi).

·        Quem faz o bem, conquista paz interior (ditado judaico).

·        Ver o bem e não fazê-lo é sinal de covardia (Confúcio, sábio chinês)

P. Vitus Gustama,svd

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